Atração Implacável escrita por Lia Pallomare


Capítulo 6
Perdendo o controle




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Meu sono foi tranquilo e quando acordei precisei lutar contra a vontade de permanecer deitada na cama. Jordan ainda estava dormindo e entre nossos corpos havia uma pilha de travesseiros; uma barreira física para que eu ficasse longe dele. Do jeito que eu estava bêbada, não duvido nada que tenha feito grandes idiotices na noite passada. O único lembrete que eu tinha daquela noite era uma dor de cabeça insuportável.

Levantei-me com relutância da cama e fui ao banheiro me trocar e quando sai encontrei Jordan parado de frente para a janela. Eu não podia ver seu rosto, mas os músculos de suas costas estavam tensos.

— Bom dia — falei ao bocejar.

— Dia — ele disse simplesmente.

— Eu... hum... — por não me lembrar direito dos acontecimentos da noite passada eu estava constrangida — Você pode me dar uma carona?

— Não vou sair agora — por algum motivo ele estava irritado e talvez fosse por minha causa — Mas sempre existe o Zack, que faz qualquer coisa se você souber negociar.

— O que?

— Você sabe — ele me encarou, com uma carranca — Alguns favores sexuais...

— Que merda aconteceu com você? — perguntei confusa — O que aconteceu na noite passada?

— Nada — ele voltou a olhar pela janela e decidi que não iria começar uma briga logo de manhã.

— Você não vai mesmo me dar uma carona? — perguntei medindo cada timbre da minha voz.

— Não. O que você vai fazer a respeito? Me socar?

Sai do quarto e encontrei Zack sentado no sofá, comendo cereal. Ele levantou as sobrancelhas e em seguida fez uma cara de safado, como se falasse “quem diria que ele te levaria para cama”. Ignorei a forma divertida que ele me olhava quando Jordan chamou meu nome.

Voltei para o quarto, sentindo uma confusão de sentimentos tomarem conta de mim. Minha cabeça latejava cada vez mais e eu começava a lembrar de algumas coisas da noite passada. Meu desabafo seguido de lágrimas e as palavras sem sentido que Jordan sussurrou ao pensar que eu estava desmaiada.

— O que foi?

— Você esqueceu o meu beijo de bom dia — aquele maldito sorriso travesso apareceu em seu rosto e eu não consegui me segurar mais.

Caminhei até ele e rocei meus lábios nos dele e seus músculos ficaram novamente tensos. Afastei-me de seu rosto e sussurrei em seu ouvido.

— Vá para o inferno você e o seu beijo.

Voltei para a cozinha e antes de sair do apartamento encontrei as chaves de Jordan jogadas sobre o balcão. Zack me encarou enquanto me via pegar as chaves e caminhar até o elevador. Nunca havia roubado um carro antes, mas eu tinha uma desculpa: precisava ir para casa.

— Jordan — pude ouvir o Zack gritar do sofá — Uma gostosa, morena e furiosa acabou de sair daqui com as chaves do seu carro!

Assim que liguei o carro, Jordan apareceu no estacionamento, furioso. Engatei a marcha e o deixei gritar inúmeros xingamentos enquanto desaparecia em uma esquina qualquer.

Meu telefone não parava de tocar e depois da quinta ligação, eu atendi.

— Oi — falei com todo o charme que se pode usar.

— Onde você tá? — Jordan gritou.

— Na estrada — dei risada como se a pergunta não merecesse outra resposta.

— Eu vou te matar Jennifer. Juro que ainda te mato! Você roubou a porra do meu carro!

— Se ele é uma porra, por que você se importa?

— Eu te mato — ele repetiu ainda mais furioso — Você tá me deixando louco!

— Bom, — forcei minha voz a sair mais firme — Dá próxima vez não insinue que eu deveria transar com o Zack pra conseguir uma carona! E também não diga que gosta de mim quando pensa que estou dormindo, se no dia seguinte você vai agir como um tremendo idiota!

— VOCÊ OUVIU ISSO? — ele parecia incrédulo e ainda sim, furioso — Jenn...

— Não posso falar enquanto dirijo — apressei-me em falar — Tchau.

Entrei em casa pouco depois de desligar o telefone e ao abrir a porta do quarto, encontrei uma quantidade absurda de cabelos ruivos espalhados pelo chão. Encarei minha colega de quarto, que parecia contente em ver meu rosto confuso. Seu cabelo que antes chegava à cintura, agora estava um pouco acima dos ombros. Era incrível como ela parecia ainda mais bonita desse jeito.

— Não é só você que gosta de mudanças — ela sorriu e pouco depois fez uma careta — O Jordan ligou.

— O que ele disse?

— Que você roubou seu carro — ela deu risada — Você realmente fez isso?

— Ele estava sendo um idiota — dei de ombros. Isso não era justificativa, mas eu apenas roubei o carro dele. Não pensei muito nos motivos, ou nas consequências.

— Pensei que a fase de amor e ódio de vocês tivesse chegado ao fim.

— É o que nós somos. Nós brigamos e pedimos desculpas — dei uma risada desajeitada.

— Vocês nunca pedem desculpas! — Dakota jogou um travesseiro em mim — Ele ainda vai te pegar de jeito.

Dei de ombros e Dakota gargalhou. A garota sempre quis ser capaz de loucuras, mas ela temia tanto as consequências que acabava sempre ficando em cima do muro. Até agora. A mudança de cabelo e suas futuras tatuagens demonstravam que dentro dela havia um novo fogo borbulhando e eu adoro esse tipo de coisa.

Um gritinho agudo saiu de sua garganta quando a porta da sala se escancarou e bateu na parede. Os passos ecoavam pelo apartamento, Até que Jordan e Zack pararam no batente da porta. Eles tinham expressões opostas nos rostos. Um parecia estar se divertindo muito com toda a confusão e o outro estava tendo um lapso nervoso.

Dakota se enfiou no meio dos dois e fugiu da zona de tensão. Era apenas eu e dois caras fortes. É, isso parece muito com um déjà vu. Se as coisas acabarem como da ultima vez, terei grandes problemas em explicar como meu rosto ficou tão machucado.

Jordan andou na minha direção e sua expressão era capaz de aterrorizar uma criancinha, e infelizmente, era assim que eu estava me sentindo nesse momento: como uma criança apavorada. O problema não era simplesmente ele andar na minha direção com essa expressão assassina, mas sim as lembranças de quando Caleb fez o mesmo comigo. Droga de lembranças.

Recuei até a parede e ele prendeu minhas mãos acima da cabeça e, como se fosse capaz de imaginar o que eu faria, pressionou seu corpo contra o meu, me deixando completamente imóvel.

De novo não. De novo não! Por favor, de novo não! Minha cabeça doía demais e antes que eu pudesse me segurar, já estava chorando. Malditas lembranças. Maldito e irrefreável Caleb.

Fechei os olhos com força e meu corpo começou a tremer involuntariamente. Eu não estava com medo, estava apavorada. As pontas dos meus dedos formigavam incomodamente e minha respiração estava ofegante, exatamente como naquele dia infernal. Senti o peso do corpo de Jordan parar de comprimir o meu e quando abri os olhos, ele parecia preocupado e Zack tentava conter Dakota que gritava e o esmurrava. Eu conseguia ver tudo, mas não era como se estivesse presente naquela cena. Sentia-me como se estivesse assistindo à televisão no mudo. Eu sabia que Dakota gritava pela forma como sua boca se abria e seu rosto ficava vermelho, mas mesmo que quisesse, não seria capaz de ouvi-la.

Foram necessários alguns minutos para que eu pudesse me recompor e quando os soluços pararam, meu corpo parecia uma enorme e pesada rocha. Não era incomum que ataques de pânico acontecessem comigo e, infelizmente depois de muito tempo convivendo com eles, eu já não os temia tanto. A pior parte disso era o olhar confuso de quem nunca presenciou algo do tipo. O único que parecia normal era Jordan, que continuava com seus olhos cravados em mim. Zack era o pior. Ele estava me abraçando de um jeito desengonçado, como se não soubesse como de fato fazer isso ser reconfortante para mim.

— Você sabe que eu não te machucaria, não é? — a voz de Jordan quebrou o silêncio incomodo do quarto. Balancei a cabeça, mas não ousei abrir a boca.

— Então ela estava gritando para você parar, com seja lá o que você estava fazendo, sem nenhum motivo? — Dakota esbravejou pronta para matar qualquer um que não lhe desse uma boa resposta.

— Eu não... — comecei a falar, mas havia um nó na minha garganta, que quase nem me deixava respirar.

— Você gritou — Jordan se mexeu na cama, desconfortável — para que eu parasse, mas não parecia você...

— Claro que não era ela, Jordan — zombou Dakota — Um fantasma estava dentro do corpo dela e estava pedindo ajuda, porra! Você é tão imbecil!

Ergui as sobrancelhas ao ouvir Dakota tão irritada. Isso sim era inesperado.

— Cala a boca Dakota — Jordan retrucou — Você não tá entendendo.

— QUEM NÃO ENTENDE É VOCÊ! — ela saltou da cama enquanto gritava histericamente — VOCÊ NÃO É BEM-VINDO NESSA CASA. PEGA A DROGA DAS CHAVES DO SEU MALDITO CARRO E SE MANDA!

— É isso o que você quer? — ele me encarou com expectativas.

— É exatamente isso o que ela quer — Dakota respondeu por mim — Você precisa manter distância.

Zack levantou e puxou o amigo até a porta. Imagino que Jordan fosse continuar parado, me encarando até eu conseguir falar alguma coisa, mas por sorte Zack estava ali para levá-lo embora. Aporta do apartamento se fechou e assim que tudo voltou a ser silencioso, joguei-me na cama, mesmo com aquela imensa quantidade de roupas espalhadas e chorei até pegar no sono. Meus sonhos foram perturbados pelas lembranças de Caleb. E quando acordei, ao meio dia, estava ensopada de suor.

Passei boa parte daquela tarde sentada no sofá assistindo filmes e seriados, com Paige e Dakota, até ficar entediada. Saltei do sofá e liguei para o estúdio de tatuagens, que por sorte, tinha a tarde toda livre. Mandei Paige e Dakota se trocarem rápido e dirigi até o Black Poison tattoo.

Entrei no estúdio e Lucy estava jogando paciência no computador, enquanto Ed tentava chamá-la para sair. Sempre a mesma coisa. Sorri para os dois e puxei minhas amigas para a sala de Kent.

Ele estava sentado em sua cadeira olhando uma pasta cheia de rascunhos. Seus corpo era quase totalmente coberto por tatuagens e seu cabelo cacheado emoldurava seu rosto quadrado.

— Quem vai primeiro? — Kent perguntou analisando o rosto de Dakota, que era uma mistura de inúmeros sentimentos.

— Que tal você dar uma olhada em alguns esboços, docinho? — Falei para Dakota, que balançou a cabeça e fingiu folhear a pasta que Kent tinha nas mãos — Você vai fazer uma, Paige?

— Talvez.

— Ótimo — sorri e sentei em uma cadeira — Então eu vou primeiro. Tenho mais algumas tatuagens para você.

— Um dia seu corpo vai ter tantas tatuagens quanto o meu — ele sorriu — Adoro essa ideia.

— Não acho impossível — dei risada — Já fiz quantas mesmo?

— Uma em latim, na costela direita “Alis volat Propriis” — ele começou a contar — A mão de Ganesha abaixo do pescoço; o dente de leão no quadril e... só.

— Puta merda! Você se lembra de todas as minhas tatuagens! — sorri e então bati em seu ombro — Acrescente mais quatro à lista.

Meia hora depois, já havia alguns rascunhos prontos: a frase “for all eternity” seria tatuada na minha clavícula; as palavras “carpe diem” no pulso esquerdo; uma ancora com traços finos no tornozelo esquerdo e uma pena delicada, junto com a frase “see you in another life” iria ocupar minha costela direita, logo abaixo do peito. Os quatro desenhos eram delicados e a escrita era fina e maravilhosa, mas Kent decidiu que faria apenas duas hoje. A próxima seção seria amanhã.

Uma hora mais tarde Dakota já tinha decidido sua tatuagem e me fez sair da cadeira. Minha clavícula e a costela direita estavam sensíveis, mas os desenhos me animaram. Era bom pensar que aquelas frases estavam escritas no meu corpo, como um lembrete do meu amor por meu irmão.

O desenho que ela tinha escolhido era um filtro dos sonhos que começava na altura de seu peito direito e terminava a poucos centímetros de onde estava sua calcinha. Era uma tatuagem colorida e muito parecida com Dakota: delicada e ainda conseguia ser provocante e sexy. A expressão em seu rosto era semelhante à minha, quando olhei para a minha primeira tatuagem.

Paige, com relutância, tatuou a palavra “hope” no seu dedo anelar, que quase poderia passar despercebido, mas com seu grande pavor de agulhas, eu nem podia acreditar que no que ela tinha feito.

Quando chegamos em casa, nos deparamos com Wendy encolhida no sofá, com a cara mais mau-humorada do mundo. Ela nos encarou e quando viu os curativos em nossas peles, suspirou.

— Vocês fizeram tatuagens? — ninguém respondeu então ela continuou falando — As três fizeram tatuagens e nem sequer me chamaram?

— Você é contra tatuagens — repliquei — Quer dizer, desde que começou a namorar.

— Mudei de ideia. Eu quero uma bem grande! — ela cruzou os braços — Se o Erick não gostar, o problema é dele.

— Ok, qual é o problema? — Paige perguntou tentando ligar os fios soltos — Vocês brigaram.

— Terminamos — ela deu de ombros — Ele não me deixava respirar.

Nesse instante meu celular vibrou quando uma mensagem chegou.

Erick: Precisamos conversar

Eu: Definitivamente sim! Porque diabos vocês terminaram?

Erick: Minha casa. Amanhã de manhã.

Eu: O.K.

Olhei para Wendy, esperando ver lágrimas em seus olhos, mas não havia nenhuma emoção. Ela estava mau-humorada, mas não parecia chateada, feliz, devastada. Absolutamente nada.

Havia algo errado nessa história.


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