Atração Implacável escrita por Lia Pallomare


Capítulo 10
Irmãos




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O dia estava lindo, mesmo para àquela hora da manhã. O sol brilhava e mostrava todo o seu esplendor. Não havia nuvens no céu. Era um perfeito contraste diante de como eu estava. Ao contrário do céu, meu interior estava nublado e com possíveis pancadas de chuva a qualquer hora do dia.

Eventualmente meu coração ficava novamente aos pedaços e a saudade era tanta que me deixava com febre. Era assim que eu me sentia. Meu corpo estava marcado permanentemente com palavras que eram um lembrete de que Enzo era real e, mesmo assim, parecia que um buraco negro estava engolindo meu coração.

Precisei juntar todas as minhas forças para não desabar pelo caminho. Ainda faltavam horas na faculdade antes de ver a única pessoa que podia ouvir e compreender o vazio que eu estava me tornando. Sentia uma dor lancinante no peito e lágrimas se nublaram a minha visão.

Quero ir para casa, pensei. Precisava ouvir as risadas descontroladas da minha mãe; o rosto barbado do meu pai. Queria dormir com Naomi aninhada em mim sempre que nossos pais discutissem, assim como queria que Lucas discutisse com Caleb sempre que notasse um roxo no meu corpo. Mas, acima de tudo, queria que Enzo viesse para o jantar, dia sim, dia não, exatamente como naquela época.

Éramos em cinco irmão e, de uma hora para outra, restaram somente três. Porque a realidade era que, Alexia Hill também estava morta. Não restou-me nada daquela época, além de lembranças um tanto quanto vagas e uma saudade arrasadora.

Tentei imaginar como minha família estaria agora e era simplesmente impossível imaginar. A única família que me restara era a que me adotou, sabendo os riscos de ter-me por perto e mesmo assim, jamais consegui amá-los como amei meus pais biológicos. Lílian e Shane eram compreensivos e nunca se importaram com as barreiras que eu criei entre nós. Eles me amavam, mesmo sabendo que eu talvez não os amasse.

Passei a manhã inteira no piloto automático, e só tomei consciência do que quando estava subindo para o quarto em que Trevor tinha passado a noite. Imaginei que vê-lo diminuiria um pouco a minha dor, mas ela só piorou.

Seu rosto era pura preocupação quando comecei a chorar e ao contar-lhe o que estava sentindo, ele era a compreensão em carne e osso.

— Você deveria ir para casa. — Sugeriu.

— Acho que não suportaria olhar para a minha família sabendo que eles nem imaginam quem eu sou. — Minha voz estava mergulhada em dores que eu não estava mais acostumada a sentir. — Além disso, se eles me reconhecerem, vai ser pior.

— Estava falando da sua outra família.

—Não é uma má ideia.

— Vou embora hoje. Vou sentir falta de você, Alexia. — Ele sussurrou ao meu ouvido quando me abraçou. — Você mudou tanto e, ainda assim, consigo ver em você o mesmo brilho de quando era pequena.

— Eu mudei muito, Trevor. Aquela garota cheia de amor, não existe mais. — Baixei os olhos, temendo voltar a chorar.

— Ela continua no mesmo lugar. — Sua mão acariciou meu rosto e imaginei que estivesse sorrindo, mas não tive coragem de olhar. — A única diferença é que você tem medo de mostrar que ela existe.

Acompanhei Trevor até o aeroporto, mas não fiquei para vê-lo embarcar. A sensação de olhar a porta do carro ser fechada e pensar que ficaríamos mais alguns anos, provavelmente, sem nos vermos era angustiante e, estranhamente, reconfortante. A única pessoa envolvida com o meu passado estava voltando para sua casa, milhares de quilômetros longe de mim.

Apesar de ainda sentir saudades de casa, da minha família, tudo estava mais ameno. As dores estavam voltando para sua pequena caixinha secreta.

Eram cinco da tarde quando cheguei em casa e vi um carro estacionado na vaga que deveria ser minha. Pior do que saber que o carro ficaria estacionado na rua, era o fato de o carro estacionado ser do Zack. Não me importei com mais nada, mandei uma mensagem para o Erick, avisando-o que mataria alguém e subi as escadas, de dois em dois degraus até o apartamento.

Entrei no apartamento, vermelha como um pimentão e pronta para socar aquele imbecil mulherengo, mas não foi ele quem encontrei sentado no meu sofá, com uma expressão aliviada no rosto.

—Onde você estava? — Jordan perguntou em seu tom autoritário. Odiava quando ele falava assim.

— Fora.

— A onde? — Ele repetiu. — Responde logo!

— Calma ai, papai. — Tranquei a porta e o encarei. — Eu estava com um amigo.

Sua boca se contraiu em um sorriso amargo e meus olhos desceram de seu rosto para o corpo. Ele estava usando uma regata branca, que deixava visível as inúmeras tatuagens que cobriam seu tronco, além de uma bermuda e tênis de corrida.

— Você veio correndo até aqui? — Perguntei, estranhando o carro de seu irmão estar lá embaixo e não haver sinal dele por aqui. Ele balançou positivamente a cabeça, então continuei a falar. — Certo. Então, o que o carro do Zack faz aqui?

— Ele estava aqui. — Jordan deu de ombros. — Quando eu cheguei ele estava saindo com a Wendy e a Paige.

Pensar na possibilidade de Wendy estar saindo com Zack faz meu estômago revirar, mas preferi não demonstrar o que estava sentindo para o irmão do traidor. Pobre Erick, seu coração partido se tornaria estilhaçado muito antes do que imaginei.

— E o que você está fazendo aqui? — Arqueei a sobrancelha, sem saber o que esperar.

— Vim ver você.

— Que tocante, Jordan. Estou emocionada, de verdade. — Coloquei a mão sobre o coração, de forma teatral e forcei um sorriso. — Já pode ir embora.

Eu não daria o braço a torcer, não depois da noite passada. Minhas emoções borbulhavam só de olha-lo, entretanto, ele não me faria perder a cabeça tão facilmente.

— Jenn. — Seu sorriso era uma mistura irresistível de surpresa e diversão, um sorriso torto, com direito a uma amostra de sua pequena covinha.

Ele andou na minha direção e tocou meu rosto. Assim era difícil não perder a cabeça. Respirei fundo e fui até o banheiro, sabendo que era minha melhor chance de conseguir alguns minutos longe dele.

— Preciso tomar um banho. — Expliquei quando vi em seus olhos a mais pura confusão.

Tranquei a porta do banheiro e tomei um banho demorado. Enrolei-me em uma toalha e fui até meu quarto. Vi Jordan me olhar quando passei pelo corredor, mas não lhe dei atenção. Vesti um shorts e uma camiseta de ombro caído e voltei para a sala, com um sorriso no rosto.

Passei meia hora escondida no banheiro, de baixo da água morna, tentando pensar no que eu faria para me livrar dele, mas uma pergunta me deixou indecisa. Eu queria mesmo que ele fosse embora? Eu não tinha essa resposta, mas sabia que sentia algo por ele.

— Sobre o que estávamos falando? — provoquei-o ao me escorar na parede.

— Eu estava tentando conversar com você sobre...

— Sobre você ser um idiota? — sorri. — Eu concordo com você sobre isso. Eu quero saber o que aconteceu ontem à noite, ou melhor, porque não aconteceu.

— Você estava, obviamente, irritada com algo e estava querendo dormir comigo, para diminuir a raiva. — Seus olhos verdes fitaram os meus, implorando que eu o entendesse. — Não queria que você achasse que eu estava tentando tirar vantagem da situação.

— Em outra situação — falei enquanto caminhava em sua direção, com passos muito mais lentos que o necessário. — Eu teria ficado furiosa por pensar que você estava se aproveitando de mim, mas...

— Mas? — Jordan perguntou confuso. — Jenn, não ferra comigo. Eu não sou como o Zack ou o Matt e você sabe disso.

— Mas — Ignorei o que ele estava falando. — Eu gosto de você.

Era estranho dizer aquelas palavras e sentir meu corpo se aquecer com a expectativa. Depois da minha conversa com Trevor, eu havia decidido que não iria lutar tanto contra meus sentimentos e, ver Jordan tão vulnerável deixou-me ainda mais respectiva à ideia de que eu era capaz de me apaixonar. Assim que saí do banho, tive a certeza que mesmo que ele me machucasse, eu faria isso.

Jordan me estudou por algum tempo, como se tentasse decifrar um código muito complexo e, aparentemente, não havia chegado a lugar nenhum. Em momentos como esse, era comum minhas mãos tremerem levemente, mas não dessa vez. Eu estava no controle da situação, porque não estava mentindo ou escondendo nada.

Estava em pé diante dele e, por um momento, eu não fazia ideia do que fazer. E Jordan estava rígido no sofá, tão confuso quanto eu, mas sua mão tocou a minha e ele me puxou para o seu colo. Nossos narizes se tocavam e nos olhávamos de uma forma terna e digna de filmes de romance. Era estranho estar tão próxima de alguém sem todo aquele desejo me queimando; tudo o que eu era capaz de sentir era meu coração acelerado a nossas respirações um tanto quanto ofegantes.

Antes que nossos lábios se tocassem a porta foi escancarada e eu saltei do colo de Jordan bem a tempo de ver Wendy agarrada ao pescoço de um Zack risonho. Senti meu rosto queimar, tanto de vergonha quanto de raiva.

— O que é isso? — Resmunguei.

— Isso o que? — Wendy falou enrolado e eu quis socá-la. Ela nunca foi de beber e agora estava completamente bêbada e abraçada com um idiota. — Só estou me divertindo com o Zack.

Em um movimento inesperado, ela o beija e as mãos dele vão direto para a sua bunda. Inferno. Isso é ridículo.

— Que merda, Wendy! O que deu em você? — esbravejei e caminhei na direção de Zack, mas Jordan me segurou pela cintura. — Eu quero você fora daqui!

— Jenn. — Jordan tentou me acalmar, mas eu estava irada. Ela não iria fazer isso com o Erick.

— Me solta. — disse com o mesmo tom autoritário que Jordan usava comigo. — Eu não vou encostar nesse pedaço de merda!

Meu corpo foi para frente quando Jordan me soltou e longe de suas mãos, eu cogitei bater em Zack, mas decidi que acertaria as minhas contas com ele quando a bebida não o deixasse tão ridículo.

Desci as escadas com Jordan em meu encalço, mas somente quando estava perto do carro é que ele conseguiu me parar. Sua mão tocou meu braço, mas me afastei de seu toque. A raiva que sentia era maior que tudo.

— A onde você vai?

— Ver o Erick. — Gritei — E acho bom seu irmãozinho ficar longe de mim por algum tempo, por que eu vou acabar com aquele rostinho bonitinho assim que a bebida sair da corrente sanguínea dele.

— Esse seu acesso de raiva foi por causa do beijo? — Ele pergunta confuso.

— Sim! O Erick pediu pra ele ficar longe. — Bato a mão no vidro do carro e encaro Jordan. — Ele tem todas as malditas garotas que quer, mas ele vai atrás de única que um de seus amigos ama.

— Eles terminaram, Jenn. O Erick não é dono dela e não é culpa do Zack que ela terminou o namoro para vir atrás dele.

— Não o defenda! — grito ainda mais furiosa. — Não defenda aquela merda na minha frente.

Abri a porta do carro e liguei o motor e, antes que Jordan conseguisse me impedir, guiei o carro até a rua. Eu não discutiria com ele sobre isso.

Nenhuma das ligações que fiz teve resultado, então andei pelo campus até o dormitório Lambda e esmurrei a porta do dormitório em que Erick morava. Demorou uns dois minutos para que ele a abrisse, com a cara amassada e a barba ainda por fazer.

— Por Deus, mulher. — ele disse sorrindo. — Vai tirar o pai da forca?

— Vou é colocar um imbecil nela. — joguei-me em sua confortável cama e o olhei. — Acho melhor você repensar o quanto o Zack é seu amigo e seus sentimentos pela Wendy.

— Aconteceu? — Ele me olhou, esperando uma negativa, mas eu não mentiria para ele.

Meu coração se partiu ao vê-lo sentar na cama e olhar para a parede com aquele olhar derrotado; ele não merecia isso. Cara nenhum foi capaz de me destruir dessa forma, alem do meu irmão e ao pensar na minha família lembrei-me do que Trevor sugeriu antes de ir embora.

— Que tal uma viagem? — Perguntei, animada.

— Viagem? — Seus olhos negros eram a mais pura confusão e isso me fez sorrir.

— Estou com saudades de casa. — dei de ombros. — Você podia vir comigo. Passar umas semanas longe dessa confusão pode ser uma boa ideia.

Erick pensou por alguns minutos e então um sorriso surgiu em seu rosto e aquela era a resposta que eu queria. Iria ver minha família, parte dela pelo menos e, com o meu melhor amigo. Isso melhoraria nosso humor.

— Faça suas malas. — Beijei sua bochecha e saltei da cama. — Vou comprar as passagens e te ligo para avisar quando partiremos.


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