Escolha-me [EM REVISÃO] escrita por Moriah


Capítulo 6
Música sobre prometer o mundo, ficar cego e ir embora


Notas iniciais do capítulo

Olá anjinhos ^-^



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Capítulo Seis:

Música sobre prometer o mundo, ficar cego e ir embora

 

America soltou a respiração quando chegou aos pés da escadaria, o mais afastada possível do salão de jantar. A sensação de dejavu a perseguia em todas as direções que olhava. Enquanto analisava o corredor de onde viera, viu Oda e outra criada saindo de outro cômodo.

— Oda!

Levou apenas dois segundos para Oda virar-se e fazer uma mesura, após se despedir de sua amiga.

— Senhorita Singer, o que deseja?

Apesar da agilidade em se aproximar, Oda não escondia aquele olhar desaprovador todas as vezes que olhava para America.

— Desculpe incomodar, eu ainda não sei chegar até a sala de música... Poderia me ajudar?

Oda olhou para America de cima abaixo antes de suspirar. America notou que Oda trazia o cabelo firmemente trançado e não usava roupas de trabalho, mas botas de borracha e calças legging. Claramente, Meri estava atrapalhando algo.

— Só um minuto — Oda pediu e se retirou, entrando em um cômodo depois da escadaria. Cerca de três minutos depois voltou seguida por um jovem guarda. — Esse é o soldado Eisley, ele acompanhará a senhorita.

— Ah, claro — America estendeu a mão. — É um prazer Eisley, me chamo America.

Vagarosamente Eisley estendeu e apertou a mão de America.

— Prazer, senhorita Singer. Vamos?

— Pode me alcançar o braço? — America solicitou, estendendo o seu. Acabava divertindo-se com a surpresa que Oda e Eisley demonstravam.

Antes de subirem as escadas, America observou Oda sair pela porta, do lado de fora três outras criadas a esperavam. Talvez fossem para algum tipo de noitada, ela pensou consigo.

Eisley se mostrou uma boa companhia, andando calmamente e deixando America tomar seu tempo para admirar os quadros e decorar o caminho. Quando chegaram a sala de música, America lhe agradeceu. Eisley prestativamente se colocou do lado de fora da porta. Sem pensar muito a respeito, America pegou o violino e se deixou ficar lá por horas. A luz iluminava a sala de música mesmo após America desligar a luz e ficar na escuridão, só com seus pensamentos. O violino fazia tudo, expressava sua aflição, sua confusão, seu vazio em uma, duas, três músicas.

Quando olhou à esquerda da porta, Maxon estava sentado com as pernas cruzadas no banco do piano. Os cabelos estavam desgrenhados sem a coroa e no seu terno não havia faixa com medalhas, estava despido da pompa — um homem de negócios comum e sexy. E perigoso.

— Pude ouvir o violino durante o jantar — ele murmurou, sem deixar claro a quanto tempo esteve ali. — As suas versões de cada música são magnificas.

Ele parecia ter procurado por muito tempo pelo adjetivo perfeito.

— Não ouvi você entrando — America suspirou, respirando fundo como quem corre uma maratona. Estava cansada, suada e momentaneamente satisfeita. Guardou o violino conforme havia encontrado.

Maxon sorriu.

— Você não estava exatamente aqui e não quis interromper.

America concordou escorando-se perto da janela.

— Gostaria de me desculpar pelo jantar.

— Então se desculpe — America debochou, erguendo uma sobrancelha. O vazio que ficara após suas músicas parecia ecoar por todo o castelo.

Esperou que Maxon devolvesse com mais deboche, ao invés disso o Rei se levantou e se aproximou, escorando-se do outro lado da janela de frente para ela.

 — Me desculpe.

Não parecia ser difícil para ele pedir desculpas, como America imaginou que seria. Talvez fosse fruto de um casamento e convivência com outra mulher. America concordou, engolindo em seco.

— Perdoe meus filhos.

— São jovens.

Eles não se olhavam, ao invés disso admiravam o jardim e as estrelas. America observou peloc anto dos olhos como Maxon parecia normal. Maxon gostaria de falar mais, mas não sabia o que dizer. Era um dia complicado. America e Maxon rapidamente deram atenção para um canto distante do jardim, de onde saiam Oda com outras criadas e alguns soldados. A cena e todo seu significado pesaram uma pedra no coração de Maxon.

— Do que se trata? — America perguntou, vendo Maxon fechar os olhos e respirar fundo.

Maxon engoliu em seco.

— Foram levar flores para Kriss — explicou.

O silêncio fora curto, mas suficiente para America sentir a dor do luto ressoar pelo castelo.

— Todos estamos aprendendo a continuar — ele explicou, limpando a garganta. — A primeira semana está sendo difícil.

— Eu sinto muito — Ames se aproximou.

Maxon ajeitou a postura e sorriu fracamente.

— Gostaria que pudéssemos facilitar nosso convívio — ele começou, esforçando-se para lembrar do discurso que havia pensando enquanto tomava banho. — Com menos aspereza e...

— Amargor — ela completou.

Maxon não podia deixar de notar como ela estava deslumbrante contra a luz da janela, com seu vestido verde e seus cachos de fogo. O tempo havia transformado sua beleza em algo divino e surreal. Era difícil lembrar-se que ela estava mesmo ali e que não eram mais jovens e inconsequentes. Que ele era rei e viúvo.

— Eu sei que temos pendências e há muitas coisas para serem ditas, eu apenas-

— Compreendo que esse não seja o melhor momento, Majestade. Não estou aqui para falarmos sobre nós, estou aqui para auxiliar com a princesa Esther — America o interrompeu, tocando levemente em seu ombro. — Não há necessidade de voltar atrás e revermos tudo, vamos apenas seguir em frente. Respeito você, respeito sua história e seu reinado e desejo que respeite minha história e meu legado também. Isso é o suficiente, não?

Maxon queria apenas seu respeito? Ele queria conversar com ela sobre sua vida, sobre seus gostos e descobrir o que mudara, o que continuara o mesmo, o que nunca nem mesmo conheceu. Queria saber a cor favorita e quando se transformou em uma cantora famosa, como fora para elas os primeiros anos após a seleção e os últimos e, sobretudo, como ela se sentia agora. Queria conversar como amigo, como amantes, como enamorados e ao menos como conhecidos civilizados que eram.

— Não pode simplesmente achar que isso pode sustentar-se com cordialidades — Maxon gesticulou para o ar entre eles e America viu o anel real em seu dedo, com o grande brasão de Illea, viu também sua aliança grossa e escura. — A gente pode ter conversas reais e livres de amargura?

Agora que falara em voz alto, parecia infantil esperar por isso.

— Se o senhor deseja, Majestade, podemos tentar — America disse, seus olhos retesando no olhar gélido que Maxon lhe entregou — digo, senhor schreave? Senhor Maxon?

— Maxon, America. Como sempre foi.

 — Certo. America, como você já diz — um sorriso brincou nos seus lábios.

Mais pessoas vinham daquele canto do jardim, trazendo lanternas, flores secas e semblante caído. America começava a entender porque Oda não lhe dava aberturas, considerando que se sentia disposta a ver o tumulo de sua rainha toda semana.

— Você já prestou suas homenagens? — America sussurrou.

— No terceiro dia, na terceira semana, no terceiro mês, no terceiro ano... Kriss deixou um jeito espetacular de se encaixar em minha memória, em meu cronograma e em minha vida. Nunca fora diferente.

Maxon limpou a garganta ao notar o que havia falado.

— A primeira semana é sempre muito... confusa — America comentou, suspirando. Maxon lembrou-se de quando ela precisou partir para o enterro de seu pai, onde ele se aproximou mais de Kriss. Ames não sabia se deveria falar algo para consolá-lo ou deixa-lo tomar seu tempo.

— Completamente fora deste tópico, mas ainda relacionado, Magda está magnifica.

Ele queria dizer: ela está muito bem, apesar do luto. America sorriu.

— Mas ainda usando preto, como você pode perceber.

Maxon concordou.

— Levou um tempo para todos nós entrarmos nos eixos, May foi muito importante durante esse processo, pois todos os outros partiram. Nós três, juntas, conseguimos entrar nos eixos e seguir — América lembrou dos primeiros meses, após sua saída, quando encontrou sua mãe desolada e May sem saber o que fazer. A dor da ausência de seu pai era algo com o qual Ames já havia se acostumado, sendo sempre diária e dolorosa. Seria assim até sua morte, ela tinha certeza. — Magda está sempre disponível, se precisar conversar sobre perdas.

— Pode ter certeza que conversaremos muito — ele respondeu. Aquilo, de certa forma, aqueceu o coração dela, mas também socou seu estômago.

— Eu realmente sinto muito pela sua perda, Maxon.

— Eu sei, America. Obrigada.

 Maxon ajeitou novamente a postura perfeita, limpou a garganta e como em um passe de mágica, era um novo homem. Uma máscara intocável.

— Além de vir pedir sinceras desculpas, gostaria de fazer-lhe uma proposta.

— Mais uma? Ainda não consegui cumprir nem uma parte deste acordo.

— Haverá tempo para tudo, mas para que você possa influenciar as reuniões o suficiente para participar delas, precisamos que caia nas graças dos ministros. E é necessário que a nação saiba que Esther está sendo bem instruída para a seleç-

— Depois de tantas aparições no canal oficial, não sei se sou vista como um bom exemplo. E você sabe.

— Sim, mas é fácil fazer esses homens esquecerem. Você precisa conquistá-los. Além disso, preciso pagar seus empregados para que sua carreira não acabe enquanto estiver aqui. — Sua voz era baixa e seu olhar continuava naquele ponto da janela onde tantas pessoas haviam aparecido. — Você se importaria de cantar para nós?

America deixou sua cabeça cair para o lado, como um cão confuso.

— Nós? O quê? Não!

— Não? Isso é perfeito! — Maxon pegou seu telefone e digitou algumas coisas em silêncio. — Sua secretária ligou, aquela mulher baixinha e encantadora. Antes de poder ficar em paz nesse seu retiro sabático no meu castelo é preciso que você realize um clipe a fim de não perder patrocinadores. Inicialmente, eu não sabia como fazer os ministros aceitarem essa demonstração de gasto, mas como estão me pressionando para apresentar Esther à corte como mulher antes d’Seleção, pensei que podíamos unir os eventos.

Possivelmente, Maxon não reparava em como falava sem deixar brechas para outras pessoas. Talvez estivesse acostumado com isso, então America esperou.

— Um baile em um clipe? Acha que vai funcionar?

— Na verdade é um clipe em um baile. E se você aceitar, já temos ajuda, cenário e figurantes.

— Katia aceitou sua ideia?

— Kat, na verdade, adorou a ideia.

Maxon, na verdade, quase implorara pela ideia. America refletiou sobre como não precisar se preocupar com figurino e local já era uma benção e tanto, podendo focar apenas em qual música seria feita ali.

— Já sabe o que vai cantar?

— Por quê? — America tornou a olhá-lo.

Ele apertou os lábios, sinalizando que fora uma pergunta inocente.

— Podemos falar mais sobre o assunto e ver os preparativos amanhã, agora vou deixá-lo, Majestade, e ir atrás das minhas crianças. — Rapidamente America levantou-se e ajeitou o vestido.

— Você está deslumbrante — Maxon se ouviu dizer. Não queria dizer apenas com aquele vestido, mas na pessoa que se tornara. Era uma mulher digna de respeito e admiração, esperava que ela soubesse disso. Kriss acharia isso.

— Obrigada, Majes- Maxon — America se riu e rumou para a porta, virando-se rapidamente para comentar: — As aulas da sua filha, podem começar quando?

— Quando você desejar, querida.

Maxon não olhava para ela, olhava para as grandes janelas meio perdido, fitando o céu do lado de fora. Ainda assim havia algo sobre seus ombros que o fazia suspirar, como se o rei vestisse uma longa capa preta. O luto. Ele nunca pareceu tanto como um sonho ou pesadelo antes, America contou seus dedos ao murmura sim e se retirar, para ter certeza que estava acordada.

Quando se aproximava do fim do corredor America conseguiu ouvir Maxon dedilhar o piano, como quem nem mesmo sabia o que fazia, mas gostava do som de cada nota. Ele murmurava uma canção baixo demais para que ela reconhecesse, mas alto o suficiente para esbanjar sua bela afinação.

 — Ei, você deveria ir dormir — America gritou, não achando que receberia respostas.

— Illea não dorme — Maxon apareceu pela porta, trazendo seu paletó sobre um dos ombros. — Poderia seu Rei se dar ao luxo?

— Poderia seu Rei não morrer de cansaço em plena idade forte — America murmurou, observando seriamente as bolsas de chá e grife escuras embaixo dos olhos claros de Maxon. — Como ainda não tropeçou nas próprias olheiras?

Maxon sorriu como um gato preguiçoso e sedutor.

— A noite é uma criança, querida America. Você não está com vontade de dançar?

America arregalou seus olhos, ele parecia bêbado mesmo que não estivesse.

— Você está bêbado de sono e olhar você me deixa exausta, tome vergonha na cara, delegue seu serviço e vá dormir por uns três dias, quem sabe é o suficiente para melhorar essa carranca aí.

Dizendo isso America sorriu, então virou-se de costas e saiu andando.

— Como a senhora desejar, patroa.

♫ ♫ ♫

Oda esperava America dentro do quarto, olhando para a janela. Quando a ruiva entrou a criada rapidamente ajeitou sua postura. A ruiva levara um susto ao ver Oda com roupas de serviço e disposição em seu quarto. Havia a pouco visto ela voltando do cemitério no jardim.

— Você parece um abajur humano, Oda. Pode se sentar, enquanto me espera.

Oda apenas concordou.

— Estou exausta. O que fez hoje?

Oda parecia surpresa.

— Desculpe... senhorita?

America de repente ficou vermelha e puxou seus longos cabelos para trás enrolando-os.

— Me desculpe, estou acostumada com as meninas — America balançou a cabeça. — Sally, Pâmela... Esta hora da noite todas nos unimos no quarto de May para ouvi-las falar de seus dramas — America sorriu.

Oda se permitiu sorrir, com piedade. Parecia custar-lhe, mas mesmo severa ainda assim era muito bonita.

— Elas estão nos quartos do corredor, senhorita — Oda respondeu, tentando esconder sua confusão.

— Eu sei — America sussurrou. — Estou me escondendo, na verdade — os dedos de Meri continuavam escovando seu próprio cabelo. — Arrastá-las para cá agora não me parece tão correto. Tinham todos uma vida, não é?

— Acredito que sim, senhorita.

America suspirou, recostando-se na cabeceira da grande cama.

— Elas pensam o mesmo, senhorita? — Oda perguntou calmamente, sentando-se aos pés da cama de America. Ames observou como aquele movimento era natural para Oda, como uma criada que estava acostumada a ser confidente de seus patrões. Isso mostrava que Oda e Kriss eram possivelmente amigas.

— Não faço ideia — a ruiva admitiu.

— Então... por que não procura, saber? — Oda levantou-se e abriu a porta, sinalizando para America. Parecia sincera em querer ajudá-la.

— Quer juntar-se conosco?

— Oh, não senhorita. Se não precisar mais de meus trabalhos irei me retirar. Fora uma longa noite.  

— Claro, boa noite Oda. A partir das sete você não precisa mais se dar ao trabalho, certo?

— Se a senhorita diz — com um sinal de cabeça e um “boa noite” murmurado Oda saiu. Por baixo da vestimenta de trabalho America notou que ela ainda usava legging.

De fora do quarto de May não era possível ouvir nada, mas após as batidas de Meri um burburinho cresceu antes de uma Pâmela abrir a porta desconfiada e deixar America entrar com um sorriso.

— Fale baixinho, Em acabou de dormir — May sussurrou da cama, onde uma jovenzinha de cabelos ruivos descansava a cabeça em seu colo ressonando.

— Desculpem a demora, meninas — America deixou-se cair em uma poltrona confortável.

As conversaram rolaram aos sussurros, até May lançar uma pergunta que congelou Pâmela.

— Quanto a Benjamin, gostaria de saber o que houve.

— Como assim? — Pâmela tossiu, olhando para ver se não acabara acordando  Emily com sua voz estridente.

— Estávamos todos no salão, Pâm — Sally apontou.

— Não entendo o que estão insinuando — Pâmela abraçou-se.

— Eu gostaria de saber o suficiente para poder finalmente insinuar algo — America comentou, fazendo todas rirem menos sua filha.

— Vamos, irmã — Sally jogou um travesseiro em Pâmela que devolveu com um pouco de força exagerada. Sally sempre soubera como apelar para Pâmela: chamá-la de irmã, mesmo que legalmente não fossem. Mesmo que legalmente Pâmela fosse chefe de Sally.

— Foi no show. — Pâmela começou, dando indícios de que iria corar. — Havia um homem e ele me puxava para longe da tia e da vó...

— Meu deus, Pam — May murmurou, assustada.

— Mas não houve nada, não se preocupe. Por sorte esse garoto apareceu e eu não fazia ideia que ele era... bem, que trabalhava aqui. Ele meio que começou a brigar com esse cara, mas então veio outro, um grupo de bêbados inconsequentes. Nós todos fomos expulsos pelos seguranças e a briga recomeçou do lado de fora...

— Mas...? Antes do fim você estava lá, deixamos você e mamãe responsável por Emily — May apontou e sua cara não escondia a desconfiança.

— Sim, porque o segurança não estava bêbado. Ele me reconheceu, foi educado e me deixou provar quem eu era. Na confusão eu perdi o maldito passe e foi uma burocracia conseguir outro. Quando estava prestes a entrar Benjamin começou a choramingar.

— Ele chorou? — Emily acordou num salto e então pressionou os lábios. — Oi, gente.

Todos gargalharam e Pâmela se permitiu um ou dois sorrisos.

— Não, ele ficou resmungando sobre ter me ajudado e que deveria ter direito a entrar. Como não estava fardado ninguém acreditou que era segurança de Esther, nem mesmo eu.

— Imagine se John descobre que ele não ficou na cola da Princesa — Sally murmurou — ele ia surtar.

— E o Rei também, foi um risco muito sério que ele correu. Mas ele salvou você, Pam, então qual o motivo da cena que todas nós presenciamos? — America perguntou, buscando os olhos de Pâmela que se virava de costas ao olhar inquisitivo dela.

— Ele queria obrigar-me a levá-lo comigo. Parecia um pouco alterado também, então eu lhe chutei... entre as pernas. E entrei. Quando chegamos ele me procurou no quarto e fez ameaças, achando que eu poderia contar algo ao príncipe ou ao rei... Dizendo-me para me afastar de Esther e coisas mais ridículas e além...

— E o que você fez?

— Eu fechei a porta na cara dele. Ora, o que eu vou falar? Perder meu tempo com intrigas? Por favor!

— Você agradeceu?

— Sim, e ele disse que um beijo vale mais que palavras.

Ugh. — Emily murmurou.

— Pelo menos não estava bêbado? — Pam disse, sem muita convicção.

— Tem certeza que ele estava bêbado protegendo a princesa? — America perguntou, juntando as sobrancelhas.

— Como saber se ela mesmo não estava? — Pâmela perguntou.

Um silêncio caiu. Era uma acusação boba, a princesa poderia beber tudo o que desejasse, ainda assim era meio estranho pensar numa monarca bêbada.

— Talvez ela mesmo tenha dispensado ele, com aquela cara feia — Pâmela concluiu. — Quem há de querer ele perto?

— Eu consigo pensar em muitas meninas — Sally deu de ombros, rindo. — Fico feliz que aquele estúpido tenha ajudado você, não pense em se afastar outra vez.

— Isso nem mesmo vai acontecer, eu falarei com Katia sobre um guarda-costas.

— Ah não Meri — Pâmela rugiu, mas America calou-a com um erguer de mãos.

— Não é um debate, Pam. Se por sorte Benjamin não tivesse chegado isso seria uma conversa ainda pior, desastrosa e não imagino onde poderiam estar nossos corações. Você é mulher, compreende o risco.

Todas calaram-se.

— Bem, não há porque pensar nisso enquanto estamos aqui neste imenso palácio, certo? — May declarou, juntando as mãos. — Estão com vontade de assaltar a cozinha?

— Eu estou indo dormir, mas antes queria pedir desculpas. — America respirou fundo. — Por tê-las arrastado para isso, todas tínhamos vidas e afazeres e eu trouxe tudo isso sobre nós.

— Eu lembro nós nos reunirmos em uma sala e escolher isso, Ames — May relembrou.

— Pra mim é como férias, vocês sabiam que há um salão de mulheres? Esther nos convidou para fazer um “tratamento de beleza”, eu adorei — Sally bateu palminhas.

— Eu estou bem aqui, mãe. Não se sinta culpada. — Pâmela apertou a mão de America. — Agora sobre assaltar a cozinha, se não formos agora eu vou sozinha, estou morrendo de vontade de um doce. Será que há doces guardados?

— Vamos descobrir — Emily gritou, pulando na cama.

— Vai mesmo deitar? — May perguntou preocupada para a irmã.

— Estou exausta, May. Preciso de um sono rejuvenescedor.

Deste modo America levantou, beijou a testa de cada uma e sorriu, antes de ir para o quarto. Sonhou com montes vermelhos de tulipas, que de repente derretiam e tornavam-se sangue, escorrendo dos montes para uma poça onde ela estava sentada. Maxon estava lá, mas era jovem e inexperiente como quando America o conhecera, sujo de sangue e oco como alguém que conhecera demais a morte, lembrando America de todas as suas perdas como Clarkson, Amberly, Celeste e recentemente Kriss. Ele gritava de dor no alto de um dos montes, mas nada saia e sobre ele erguia-se uma aurora azul e roxa resplandecente.

America acordou em um salto, assustando Oda que deixou cair a roupa que tirava do armário.

— Está tudo bem, senhorita Singer? — Aparentemente a rabugenta Oda havia voltado.

— Um pesadelo, Oda — America murmurou. — Que horas são?

— Oito e meia.

Meu deus, dormi demais. E o café? E todos? — America senta em um pulo e sua juba ergue-se com ela.

— O café foi deixado para às nove no dia de hoje, o Rei e seus filhos estão em uma reunião importante. — Oda juntou rapidamente o vestido e deixou-o sobre a poltrona. — O Rei veio pela manhã, pediu para que lhe avisasse que sua assistente tentou contato cinco vezes hoje mais cedo.

— Katia deve estar doida — America bocejou. — Que horas você chegou aqui?

— Sete e meia. Seu banho está preparado. Se estiver com fome posso ir até a cozinha pegar algumas frutas...

— Você já comeu, mocinha?

Oda retesou, as bochechas corando. America fizera de novo.

— Desculpa, Oda. Você parece ter a idade da minha irmã... Enfim, posso tomar banho sozinha, eu prefiro na verdade. Obrigada pela roupa, e pelo banho.

— De nada, senhorita.

Oda deixou o quarto rapidamente com a cabeça baixa. O banho tinha cheiro doce e America enrugou o nariz, pois odiava perfumes doces, ainda assim era bom relaxar deste modo e se permitir mais tempo para pensar, seu celular tocando em algum lugar lembrou-a de seus compromissos. America tinha que admitir que agora um lado seu gostava de ter desculpas para usar vestidos deslumbrantes e podia imaginar o mesmo sentimento em suas meninas, que a ensinaram o gosto pela moda sofisticada. Usava um vestido de alças trançadas e amarelas, deixava-a amarelada demais para seu gosto, mas era simples e elegante o suficiente para aquele dia que prometia sol.

Havia dezenas de mensagens de Katia e no telefone ela parecia cada vez mais irritada pelo sumiço de America. Com poucas palavras America conseguiu acalmá-la, prometendo que até o fim do dia apresentaria a proposta do clipe completo.

♫ ♫ ♫

America respirou fundo enquanto se direcionava ao escritório de Maxon, seguindo as instruções dos guardas que encontrava pelo caminho. No final notou ser o antigo escritório de Rei Clarkson e lembrando-se do seu sonho prometeu a si pegar leva com o homem que encontrasse.

O guarda à porta apenas olhou-a.

— O Rei Maxon ainda não chegou — e falando isso abriu a porta para ela.

America apertou os olhos em confusão entrando vagarosamente. Optou por sentar-se quietinha e imóvel para não causar maiores problemas. Logo a voz de Maxon tornou-se audível junto com a de Esther, e entrando tanto John quanto a princesa assustaram-se com a ruiva, menos Maxon que apenas a deu um breve sorriso sem mostrar os dentes — como todos que havia entregado para Ames desde que se encontraram novamente.

Falava sem parar com John sobre negócios e número, enquanto Esther servia em quatro pequenos copos doses de água ardente. Esther deixou os copos para olhar para os muitos papéis espalhados na mesa.

— Pelo amor, como podem se achar no meio de tanta bagunça? — a princesa suspirou.

— Acredite, passei a noite organizando.

America fez uma careta segurando a risada enquanto Esther lançou-lhe um olhar exasperado sussurrando “esses homens?!”.

— Bom dia — John finalmente cumprimentou Ameirca, quando seu pai parou de enchê-lo de números para cuidar.

— Bom dia — Ames sorriu.

Maxon desviou o olhar, ela parecia brilhante no seu vestido amarelo com seus cabelos de cobre — o próprio sol em gente. O Rei então pegou um copo de álcool e virou rapidamente, recebendo outro olhar de sua filha mais nova.

— Bem, acho que eu estou dispensada, vou preparar o salão para as meninas essa tarde. Se America permitir, gostaria de deixar o início de nossas aulas para amanhã, após o desjejum.

— Como você quiser, Alteza — disse uma America que lembrou-se repentinamente que não havia feito reverências. Nenhum dos monarcas parecia ter notado.

— Ótimo, então essa é minha deixa. Rapazes, America — Esther abaixou a cabeça em um breve cumprimento antes de sair.

— Só mais um momento, Meri. Estou devendo um relatório antigo a John. Está aqui, deixei aqui ontem.

Maxon não olhara duas vezes para America e ela engoliu em seco enquanto observava todo o escritório. Era um caos, como o próprio homem desgrenhado e raivoso à sua frente. A tal reunião não parecia ter sido boa.

— Aqui! — Um entusiasmo passou pela voz de Maxon, que limpou a garganta. — Aqui está o relatório do ano passado, filho. Peço que revise isso e passe as devidas orientações a Benjamin e Itiel.

— Como o senhor desejar, só falta encontrar aquele bêbado desvairado antes que Itiel o encontre.

— Esther não deveria dispensar tão fácil Benjamin — Maxon balançava a cabeça. Sabia que ambos tinham idade o suficiente para lidar com suas próprias escolhas, e sentia-se impotente com o fato de que não podiam ais andar por seus filhos. — Agora, quanto à Midston?

— Eu estive focando em Sota — John franziu os lábios esperando uma reprimenda. — Vou cuidar de Midston agora.

— Você precisa cuidar das trinta e quatro e ver se consegue entrar em contato com o informante outra vez.

— Esther ficou com o norte — John lembrou-o.

America prendia a respiração. Devia estar ali?

— Isso era antes das ameaças de White e Clermont.

Muitas províncias com que se preocupar.

— Hm, eu volto depois — America sorri amarelo, levantando-se e congelando ao ver Maxon erguer a mão e murmurar um “espere.” que foi prontamente obedecido por ela.

— Deixe para Esther o lidar com o povo, com as pessoas que estão perdendo as casas. Precisamos dela como o rosto disso mais do que nunca, ela tem a graça de sua mãe.

America segurou-se para não inclinar a cabeça. Quem era a mãe de Esther afinal?

— Não temos como ajudar tantas pessoas, o custo é elevado e os ministros não estariam dispostos.

— Ainda bem que nós temos a coroa — Maxon suspirou. — Não é uma benção? Riu para America. — Itiel pode te ajudar com isso, filho.

John entendera a deixa então concordou, bebendo de um dos pequenos copos antes de pedir licença e se retirar.

— Desculpe por isso — Maxon pede, tomando então de outro copo e entregando o último a America. — Essa manhã parece ter durado cerca de três dias.

Deixou-se afundar na poltrona de couro que o abraçou, como a um soberano. A barba por fazer parecia irritar sua pele e seus olhos estavam avermelhados.

— Foi dormir cedo ontem? — Ela questinou.

— Eu obedeci às bem dadas orientações — ele sorriu, não parecia azedo, tão pouco simpático. — Ainda assim acordei mais cedo do que gostaria. Desculpe atrasar nosso café.

— Eu acabei de acordar — America dá de ombros.

— Sorte a sua, mulher.

— Príncipe John parece você — America se viu comentar. — Jovem, confuso, sem dormir direito e agitado.

— Isso foi pior que uma maldição — Maxon concordou. — Mas antes que pense que eu sou como meu pai, John escolheu esconder-se atrás de números e relatórios a ter que enfrentar sua noiva.

— Parece uma história de bar — Ames desdenhou. — Ele foi uma moeda de troca?

— Na verdade a princesa foi. Eles nunca se viram e eu sou um péssimo pai, com certeza.

— Mas um ótimo rei.

Maxon sorriu.

— Essas coisas não andam sempre juntas? — Maxon serviu-se de mais um copo da bebida. — Escócia.

— E você me conta por...?

O Rei retesou, ajeitando sua postura e limpando a garganta.

— Os conselhos de uma mulher fazem falta por aqui. Ando questionando tudo o que faço desde... bem, você sabe.

E o peso caiu. O luto. Espesso, sufocante e real. Maxon havia perdido sua companheira e seus filhos perderam única mãe que conheceram, ele mal teve tempo para se permitir sentir saudades de sua companheira até agora. Ainda assim os gostos de Kriss estavam em todos os lados. No perfume doce que todos usam, nas cortinas novas que ela havia acabado de escolher, na dança em seu quarto de todas as noites que Maxon não tinha mais. As lembranças em todos os cantos quebravam ele em pedacinhos e ele continuava aos arrastos, como algum miserável fugindo da guerra.

—  Eu sinto muito — America sussurrou. E era verdade, ele pode ver.

O rei limpou a garganta, tirando a coroa da cabeça e deixando-a sobre alguns papéis.

— Katia colocou o inferno atrás de você essa manhã. Gostaria que mantivesse mais seu celular consigo, mas de qualquer forma eu lidei com a fera. Outra coisa que gostaria de saber é de que circo você resgatou aquela mulherzinha adorável.

— O celular descarregou e esqueci totalmente que ela estava envolvida no projeto do clipe. Já a acalmei, há apenas uma dama agora, posso prometer.

Riram como amigos.

— Os ministros, como planejado, mal podem esperar para saberem seus lugares e papéis — como os gordos e ricos adoradores da ostentação que eram.

— Tive algumas ideias para o clipe, gostaria de discutir com a princesa.

— Por que não comigo?

— Porque você é homem, Majestade.

— Maxon.

— Maxon — America concordou. Ele ainda não a olhava direito, mas sorriu pela primeira vez e Meri prendeu o fôlego.

Queria desviar para terrenos seguros, pois talvez este trato de cordialidades tivesse sido a pior ideia que America já tivera, e talvez perdoar Maxon tenha sido o pior conselho que ela já recebera, pois agora haviam poucas barreiras e luzes de alerta soando em relação a Maxon. Agora ele era um cara boa pinta, na idade adequada, com corpo em forma e responsabilidades o suficiente para não ser um completo imbecil. Sem aquela coroa e com cabelos bagunçados era um homem absurdamente sexy que deixava America com um calor irritante.

— Está tudo bem? — America perguntou, sua voz saindo abafada demais para seu gosto. Após limpar a garganta, continuou: — Você parece exausto, a cada piscada tenho a impressão de que você não vai voltar a abrir os olhos.

— Pesadelos — ele encerra.

— Regulares?

— É minha psicóloga que está perguntando?

— Ela deveria? Você tem uma?

Maxon riu, olhando-a pela segunda vez em todo o diálogo.

— Você está deslumbrante hoje, America.

— E você devia dormir, Maxon. Há bons chás para impedir pesadelos, sabia? É difícil sonhar quando você está desmaiado. — Ela sabia que estava sendo hipócrita e que deveria seguir seu próprio conselho.

— Talvez eu durma um pouco após o desjejum.

— Eu tenho certeza que todos sobrevivem se o café for em seus aposentos e o almoço jogado para a tarde.

America queria parecer como uma amiga que aconselhava e não uma mãe mandona, mas não conseguia medir muito bem as palavras enquanto Maxon continuava olhando-a daquele modo: como se ela não fosse real.

— Quero ajudar você com o seu clipe, Meri.

— Então tire essa cara exausta dele.

Maxon suspirou, concordando.

— O orfanato Ambers tem me tirado o sono — ele murmurou. — Ela o erguera, o sustentara e agora sinto que estou sempre prestes a enchê-lo de mais crianças outra vez.

America mordeu sua curiosidade e juntou as mãos em uma palma forte que despertou Maxon. 

Vamos homem — ela levantou, dando a volta na mesa e puxando-o por um dos braços. — Você está me dando pena.

— Vou obedecê-la, por amor aos meus belos dentes — Maxon murmurou, deixando-se ficar em pé. Entretanto com uma facilidade assustadora girou America até tê-la contra si, seu hálito na nuca da ruiva cheirando a álcool e promessas proibidas: — mas antes um beijo para dormir bem — e antes que America entendesse qualquer coisa Maxon a virava de frente, beijando-lhe o topo da cabeça. Agora a ruiva sentia-se pelada de um jeito completamente novo. — Obrigado.

Ele sorriu como um gato preguiçoso, piscou e saiu porta fora deixando-a só em seu escritório outra vez. Será que qualquer um tinha tão fácil acesso a este lugar? O que ocorrera na reunião para deixar os monarcas tão abalados? E o que haveria de ser o Orfanato Ambers e o que Maxon disse a seu respeito? E a quem deveria culpar pelo seu estado deplorável de alguém que não tinha um bom sexo há muito tempo? E entre tantas outras coisas: quem era a mãe de Esther? E de John? E das crianças que vira no dia anterior?

Tudo poderia estar ali dentro, ainda assim America sentia-se enjoada só de pensar em futricar e vendo o sino prateado sobre a mesa lembrou que precisava avisar das mudanças do café da manhã.


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Notas finais do capítulo

Até o próximo capitulo e perdoem meus erros, não tive tempo arrumá-los.


— Capítulo Betado Dia 26/01/2022.