Tudo Novo de Novo escrita por BloodyMah


Capítulo 5
Capítulo 5 - Segredos


Notas iniciais do capítulo

Olá pessoas bonitas!!!!

Desculpem a ausência essa semana, tive alguns problemas de saúde na família, sem contar meu baile de formatura e alguns imprevistos que sempre ocorrem.
Para me redimir, esse cap ficou um tanto grandinho, então aproveitem!!

1 - Even My Dad Does Sometimes - Ed Sheeran
2 - Clockwise Witness - Devotchka
3 - I Cried Like a Silly Boy - Devotchka
4 - Somethin' Stupid - Devotchka
5 - You Love Me - Devotchka
6 - Dearly Departed - Devotchka
7 - Charlotte Mittnacht - Devotchka
8 - Exhaustible - Devotchka



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[Even My Dad Does Sometimes - Ed Sheeran]

Ela sentia o rosto ardendo pela força que fazia para segurar as lágrimas. Lágrimas que não eram de tristeza, mas de raiva por ter acreditado que ele ia cumprir a promessa que fizera. Gina cerrou as mãos, amassando a lista de compras. Ficou ali por mais alguns segundos, que mais pareceram horas. Não conseguia ver os rostos dos dois, somente as costas, mas ela sabia que deviam estar mais do que felizes por finalmente terem se reencontrado. Passou os dedos pelos olhos, enxugando algumas lágrimas que transbordaram. Não ia deixar que a vissem daquele jeito, vulnerável. Decidiu dar a volta e entrar na venda pela porta de trás.

Andou devagar para ter tempo de fazer o rosto voltar ao normal. Juliana estava errada. Sobre tudo. Eles não eram somente bons amigos, Nando não estava apaixonado por ela. Gina parou, de súbito. E se a amiga estivesse certa? E se o engenheiro estivesse, de fato, apaixonado, e ela o afugentara? Ele prometeu que não ia desistir dela... Ela balançou a cabeça e continuou andando a passos duros. Não seria a primeira vez que ele quebraria uma promessa. Seja como for, ele estava com Aisha agora, a advogada da capital. Afinal, os dois se mereciam.

Já estava próxima da venda. Respirou fundo. Esperava que os olhos e o rosto já não estivessem vermelhos. Tirou todos aqueles pensamentos da cabeça e entrou.

– Isdia, seu Giácomo.
– Buongiorno, Gina!
– Bom dia, Gina - cumprimentou o doutor Renato, que estava saindo.
– Dia - disse, com um aceno de cabeça.
– Bom, vou indo para o posto. Obrigado mais uma vez, seu Giácomo - agradeceu, e saiu da venda.
– De nada! E que cosa posso fazer per te? - perguntou o italiano, se dirigindo à ruiva.
– A mãe pediu pra comprar essas coisa aqui - disse, tentando desamassar a lista de compras antes de entregar ao dono da venda.
– Creo que io tenho tutto - disse, passando os olhos pela lista, e voltando a encarar a garota - Há algum problema? - perguntou, ao perceber os olhos e nariz vermelhos dela.
– Não, não. Foi só a terra da estrada - disse ela, dando de ombros, agindo naturalmente.
– Certo, então. Io vou pegar as cosas aqui da lista, va bene?

Ela consentiu com a cabeça. Enquanto Giácomo se afastava, a passos curtos, Gina observava a loja buscando algo para se distrair. Ela não podia voltar a ter aqueles pensamentos, pelo menos, não agora.

**

[Clockwise Witness - Devotchka]

– Desculpa Nando. Eu não queria te entristecer com as minhas bobagens - desculpava-se Aisha, agora com os olhos secos.
– Que bobagens? Ocê sabe que pode confiar em mim pra tudo, não é?
– É claro que sim - ela sorria abertamente - Bom, deixa eu ir que tenho que começar as entrevistas! - disse, se levantando e desamassando o vestido.
– Nando! - chamava Renato, que saía da venda.
– Renato! - cumprimentou, levantando-se também.
– Não o esperava tão cedo por aqui, meu amigo.
– Eu tinha alguns assuntos para tratar. Essa é Aisha, uma grande amiga - disse, lembrando-se da garota.
– Olá - disse ela, sorrindo, estendendo a mão para um cumprimento.
– Muito prazer - ele pegou a mão dela, e beijou-a, o que deixou a garota levemente enrubescida.
– Este é o doutor Renato, trabalha no posto de saúde aqui da vila - Nando continuou as apresentações - Vocês não se conheceram na república?
– Não - os dois responderam ao mesmo tempo.
– Eu entrei no meu terceiro ano de faculdade - lembrou Renato.
– E eu saí no final do primeiro...

Renato estava encantado pela menina. O vestido quadriculado em tons de vermelho faziam seus olhos verdes ficarem mais vivos, os quais prenderam a atenção do doutor desde o primeiro instante. Agora, reparando nela toda, finalmente notara os cabelos azuis ( e ficou se perguntando como não reparou antes). Então ela era a garota que Giácomo havia visto com Nando no dia anterior.

– Então... Eu já vou indo.
– Ei, já que eu não vou poder te acompanhar, porque você não pede pro Renato? - sugeriu Ferdinando, que notou o olhar do amigo.
– Não, não é necessário! - disse ela, em vão.
– Acompanhar? E eu poderia saber aonde?
– A Aisha precisa entrevistar alguns moradores da região, para um trabalho da faculdade - explicava o engenheiro - Infelizmente, não vou poder levá-la, mas se ocê não estiver muito ocupado, meu amigo, e se não for incômodo, poderia acompanhá-la para ela não se perder?

Nando sabia que, se pudesse, Aisha o mataria naquele instante. Ela não se sentia bem em ficar sozinha com quem não conhecia. E ela sabia o que ele estava fazendo.

– Ora essa, não será incômodo algum! - respondeu o médico, agradecido ao amigo.
– Eu... Eu não quero atrapalhar em nada. E tem o seu posto, os pacientes... - disse ela, tentando se esquivar.
– É raro aparecer alguém por lá, e depois, eu tenho uma assistente agora.
– Ara, minha cara, até parece que ocê não quer a companhia do meu amigo - disse Nando, cínico.
– É claro que eu aceito... Ferdinando - ela fuzilava-o com o olhar - Agradeço, doutor Renato, por me acompanhar - dizia, fixando os olhos verdes nos castanhos do médico.
– Pode me chamar só de Renato - ele estendeu o braço a ela.

Aisha deu uma última olhada ao amigo antes de entrelaçar o braço no de Renato.

Nando observou, rindo internamente, enquanto os dois se afastavam em direção às casas da vila. Com certeza, quando voltassem, Aisha o estrangularia. Já era hora de aprender a dormir de olhos abertos.

**

[I Cried Like a Silly Boy - Devotchka]

Gina estava sentada em frente ao balcão, de costas para a porta, brincando monotonamente com uma bolinha de gude. Rolava ela pra frente e para trás com os dedos de uma das mãos, e com a outra apoiava a cabeça, esperando seu Giácomo vir com as compras.

Ouviu alguém entrar na venda e sentia-o parado atrás de si. Ela sabia quem era sem nem mesmo olhar. Conhecia aquele perfume, aquele jeito de se aproximar por detrás dela a passos lentos, aquela sensação que ela tinha quando ele estava presente.

Nando não esperava ver a amada aquela hora na venda. Imaginava que estivesse na roça, como sempre. Não pode deixar de sorrir. Aproximou-se dela da forma que mais gostava.

– Bom dia, Gina - disse, com a voz rouca, atrás do ouvido direito dela.

Ela não respondeu. Continuou girando a bolinha no balcão. Aquilo era novidade. Nando já estava preparado para revidar qualquer ofensa e, se fosse preciso, iria beijá-la como no dia anterior. Mas ela não disse nada, parecia não ter notado a presença dele.

– Eu disse bom dia, Gina - ele repetiu, mais alto, sentando-se ao lado dela, esperando que ela não tivesse escutado da primeira vez.

A ruiva o olhou de canto, mas continuou quieta. Se tinha uma coisa que ela aprendera era que a indiferença podia ser pior do que qualquer xingamento. Ela estava ferida. Provavelmente se falasse alguma coisa iria voltar às lágrimas. Por enquanto, aquele era o plano.

– Gina, eu tô falando com você! - ele estava começando a se aborrecer.

Silencio.

– Menininha, se ocê tá assim comigo por causa do beijo que eu lhe dei ontem - ele provocou, se aproximando. Ia fazê-la falar, por bem ou por mal - Eu peço desculpas. É que ieu não consigo me controlar quando eu to perto d'ocê...

Antes que ele pudesse continuar, e ela responder, o italiano chegou com duas sacolas de papel nas mãos.

– Pronto. Tá tutto qui. Só falto a canela, má vai chegar amanhã.
– Agradecida, seu Giácomo - disse ela, tirando o dinheiro da bolsinha, colocando no balcão e pegando as sacolas - Inté.
– Gina, espera! - disse o engenheiro, seguindo a garota, que saia porta a fora a passos duros.

Ele a alcançou, puxou seu ombro e virou-a para ele. Ela estava sem expressão, apenas o encarava com descaso.

– Porque ocê tá assim comigo? - ele estava realmente desesperado.

Ela percebeu a ansiedade na voz dele. Aparentemente ele não sabia que ela havia visto. Não ia dizer. Gina revirou os olhos e suspirou.

– Se tem uma coisa que ieu odeio nessa vida, é arguém prometer uma coisa e não cumprir - disse, muito séria.

Ele estava paralisado, com a boca semi-aberta. A garota se virou e continuou seu caminho, com a raiva transbordando pelos olhos, mas sem deixar o outro notar.

– Do que ocê tá falando, Gina?! - ele perguntou, num tom alto, para ela escutar.

Ela parou. Não podia acreditar que esquecera a promessa que havia feito logo um dia antes. Pois bem então, se era pra ser assim... Gina apenas disse sobre o ombro:

– Se ocê nem mermo lembra o que prometeu, como ieu posso achar que ocê vai cumprir?
– Gina, volta aqui! - ele suplicava, enquanto a ruiva andava para casa.

Ferdinando estava desconcertado. Não entendia de que tipo de promessa ela estava falando. Tentou se lembrar do que podia ser enquanto voltava para a venda. Será que ela se referia à promessa de fazê-la primeira dama? Não, ela não era tão superficial.

– Seu Giácomo, por favor, me vê uma... - ele pediu, entrando.
– Ma que cosa se sucedeu com ela?
– Eu não faço ideia - disse ele, honesto e perdido.

**

[Somethin' Stupid - Devotchka]

Cada minuto parecia uma eternidade. Zelão esperava a professora do lado de fora da escola. Ele não precisaria se esconder entre os arbustos, como um lobo mau. Hoje não. Ela pedia ele ali, para acompanhá-la.

Mas aquilo, a espera, era milenar. Mesmo com os protestos da mãe que teimava em afirmar para ele esquecer a professora, ele saiu de casa com antecedência para acompanhar a amada. E qual era o problema afinal? Porque todos diziam e insistiam, que eles não podiam ficar juntos? Ela ser uma professora formada e ele um semi-analfabeto (quase já alfabetizado) não significava nada... Eles podiam muito bem ser felizes.

Ele marchava de um lado a outro nos arredores da escola. Podia ouvir ao longe a voz doce de Juliana, dando sua aula, do modo mais carinhoso. Zelão estava tentando pensar nos possíveis assuntos que poderiam conversar. Ele sabia que não podia pressioná-la, teria que ser paciente.

Passados 10 minutos de espera (psicologicamente 10 dias) risos de crianças e gritos estridentes enchiam o ar, marcando o fim da aula. Ele respirou fundo, escondeu o nervosismo e se aproximou da escola a tempo de ver a professora saindo.

– Zelão! Você veio! - ela disse, radiante ao vê-lo.
– Mas é craro per... Juliana. Ocê pediu pra lhe acompanhar, e ieu num podia negar um pedido desse.

Ela sorriu, acanhada. Desceu alguns degraus e ficou de frente para o homem que sentia tamanho fascínio. Ele, com seus olhos profundos, prendia ela num transe inexplicável, quase hipnótico.

Zelão, encantado, ofereceu à Juliana uma linda flor que havia pego no caminho. Era uma dália rosada, que se assemelhava aos cabelos da garota.

– Ela é linda! - disse ela, admirada.
– Ieu lembrei d'ocê quando ieu vi. Não pela cor - os dois riram - Mai porque é uma das frô mais bonita que ieu já vi. É delicada, formosa... Tem um cheiro doce... Encanta quarqué um só de oiá pra ela.
– Zelão... - ela disse, com os olhos baixos. Estava lisonjeada pelas palavras dele.
– Ieu já sei... Se ieu continuar com isso, ieu não vou lhe acompanhar.
– Isso! - ela riu. Mesmo tentando evitar, não podia negar que gostava de ser cortejada, especialmente do modo que ele fazia.
– Ieu prometo ficar quieto - disse ele, oferecendo o braço, cavalheiresco.
– Não precisa ficar quieto - ela disse, passando a mão por dentro do braço dele - Só não falaremos sobre esse assunto.
– Tá certo - ele sorriu.
– Eu conversei com o Lepe hoje. Ele me disse que você está indo muito bem.
– O menino tem jeito pra perfessor... Ieu já to sabendo lê e escrivinhá ma o meno.
– Fico muito feliz em ouvir isso Zelão! Ele disse que te deu uma prova final...
– Ele pediu pra menina Pituca um livro p'reu lê - tirou o livro do colete e entregou à Juliana - Disse que quando ieu terminar vô tá escrivinhando e lendo de carreirinha.
– Peter Pan! Eu adorava esse livro... Ainda adoro!
– Ocê conhece?
– Claro! Minha mãe lia pra mim antes de dormir - ela disse, devolvendo o livro.
– E fala do quê?
– Eu não posso contar - ela riu - Vai perder a graça! Em que parte você está?
– Bão... Ieu ainda não comecei... Não tive tempo, por causa do trabáio... E tem tanta palavrinha que ieu nem sei se vou conseguir lê tudo aquilo!
– Eu posso te ajudar - ela viu a ocasião perfeita.
– Me ajudar? - ele perguntou, para ter certeza do que havia acabado de escutar.
– Sim. De tarde eu não dou aula. Você pode ler pra mim e eu corrijo o que estiver errado.
– Ocê tem certeza? - parecia um sonho.
– Tenho - ela sorriu.
– Má ieu não posso - ele se lembrou, triste - Ieu tenho que trabaiá na fazenda.
– É mesmo... E no sábado? - ela queria muito ficar com ele cada vez mais.
– Sábado! - consentiu ele, empolgado.

Já estavam quase chegando na fazenda. Era incrível como o tempo passava rápido para eles quando estavam juntos. A conversa fluía de modo natural.

– Mas comece a ler antes - ela sugeriu - Quanto mais cedo começar, mais cedo vai acabar, e mais cedo estará pronto para escrever as cartas que você deseja.
– Se ieu pudesse, ieu escrivinhava agora mermo. As coisa que ieu sinto, Juliana, aqui, nas caixa do meu peito, tão presa por muito tempo. Num tem palavra nesse mundo pra descrever isso... Mai ieu vou tentar, porque ieu já não guento mais. É mió ieu pará por aqui antes que fale por demais - ele olhou para baixo, sorrindo - Inté, perfessora - e beijou a mão dela, como já havia feito antes.
– Até - ela respondeu, mais baixo, ao virar-se para entrar na casa, agora admirando a flor que ganhara.

Juliana subiu para o quarto, sorrindo debilmente, lembrando de cada palavra que Zelão havia lhe dito.

– Gina? - ela se surpreendeu, ao abrir a porta - Pensei que ainda estivesse na roça.
– Ocê tava errada - disse ela, deitada olhando para o chão.
– Errada? Sobre...?
– Sobre tudo! - e a ruiva começou a contar tudo o que acontecera na vila.

**

[You Love Me - Devotchka]

*TOC TOC TOC* Batia Aisha em mais uma porta, que logo se abriu e uma mulher, que aparentava ter em torno de 30 anos, apareceu.

– Pois não?
– Bom dia - ela cumprimentou, sorrindo - Me chamo Aisha e cheguei recentemente na vila. Estou fazendo uma pesquisa e gostaria de saber se a senhora poderia me ajudar respondendo algumas perguntas - ela disse, de forma automática, o texto já decorado.
– Craro. Sem problema - respondeu a mulher, prestativa.
– Bom, primeiramente, eu gostaria de saber seu nome.
– É Luana, dona.
– Não precisa me chamar de dona - ela disse, amigável - É um belo nome. E quantas pessoas moram aqui, Luana?
– Mora ieu, meu marido e minha fia.
– E seu marido trabalha?
– Trabaia sim, senhora, lá na fazenda do coroné Epaminondas.
– Com carteira assinada?
– Com o que?
– Carteira de trabalho - ela não foi a primeira a fazer essa pergunta.
– Acho que não... Ieu num lembro dele ter isso...
– E mais uma pergunta, Luana, vocês são alfabetizados? Sabem ler e escrever? - ela anotava tudo na caderneta.
– Não, senhora. Só a minha menina, que ieu fiz questão de botar logo na escola.
– E ela gosta de lá? - Aisha era bastante simpática com qualquer um.
– Ela adora! Chega em casa e corre pra fazer a lição.
– E você, Luana, gostaria de aprender a ler e escrever?
– Ah, isso eu queria. A perfessora tentou faze uma crasse de adurto, mai num deu certo.
– Porque vocês chegavam cansados, não é?
– É isso mermo.
– E se as aulas fossem num outro dia? No sábado, por exemplo?
– Ia ser ainda pior. Esse é o dia que nóis vai pras Anta e resorve tudo os problema...
– Entendo. E vocês tem título de eleitor?
– Temo sim, ieu e meu marido.
– Uma última pergunta, você gosta de morar aqui?
– Gosto por demais! Cuidar dos bixo, das pranta... Os amigo tá tudo por essas banda tamém...
– Que bom que está feliz por aqui. Bom, é só isso. Muito obrigada por seu tempo, Luana.
– Num tem de quê, dona. Bom dia.
– Bom dia pra você também!

Ela já tinha entrevistado cerca de 20 pessoas. Renato a acompanhava e esperava pacientemente. Ele estava encantado pela organização e independência dela. Admirava, de longe, enquanto ela batia de porta em porta, sempre negando a ajuda dele quando lhe era oferecida.

– E então? - ele perguntou, ao vê-la se aproximar.
– Essa foi a última! Bom, pelo menos por enquanto - ela respondeu, olhando as anotações - A tarde eu volto e falo com mais algumas pessoas.
– Por que não agora?
– Renato, você viu o horário? - ela riu - Já é hora do almoço! Esse é o momento que o povo vai pra casa descansar. Não vou ficar enchendo eles de perguntas!
– Você tem razão - ele também riu - Vem, vou levar você até em casa.
– Eu consigo ir, não se preocupe - ela já se sentia um pouco mais a vontade com o médico, mas ainda preferia fazer tudo sozinha.
– Nada disso. Eu prometi ao Nando que ia te acompanhar, e é o que eu vou fazer.
– Está bem - ela se rendeu.

[Dearly Departed - Devotchka]

– E afinal, o que você vai fazer com tudo isso?
– Bom, primeiro eu vou fazer uma planilha pra cada caso: carteira de trabalho, analfabetismo e título de eleitor. A partir daí, vou ver qual deles é prioridade, quais eu consigo resolver mais rapidamente e com menos burocracia.
– Uau, você pensou em tudo mesmo! - disse ele, atônito.

Ela baixou os olhos, corando.

– Eu sempre soube o que queria fazer: levar a justiça pra todos os lugares, especialmente na área do trabalho. Infelizmente, algumas pessoas não entendem que tem gente que precisa de ajuda com isso - ela não pode evitar de pensar no pai.
– Como assim?
– Meu pai nunca quis que eu fizesse direito - ela revelou. Não sabia porque estava dizendo aquilo a ele, mas ela sentia que podia se abrir com o rapaz - Aliás, se ele te conhecesse iria aprová-lo, com certeza. Digo, ele ficaria satisfeito, por você ser médico. Era isso o que ele queria pra mim.
– Não consigo te imaginar num consultório - ele apoiou.
– Aparentemente só ele consegue. Mas me fale sobre o senhor, doutor. Também veio começar a carreira neste fim de mundo?
– A princípio não - ele sorriu - O Nando me chamou um dia para ver a irmã dele, que estava com sarampo. Comecei a me interessar pelas crianças da região e fui ficando.
– E você não sente saudade da capital?
– Pra lhe ser sincero, não muito. Me sinto muito bem por aqui. Você vai perceber também que esse lugar tem algo de especial. Por falar nisso, quanto tempo pretende ficar?
– Cerca de cinco meses. Talvez mais, talvez menos, tudo depende do andamento da pesquisa.
– E porque você veio pra cá? - parecia que todos lhe faziam as mesmas perguntas.
– O Nando vivia falando daqui. Comecei a ficar curiosa e pensei que podia ser um lugar bom pra começar. Vi que estava certa.
– Sabe, eu não consigo me lembrar de você na faculdade - e de fato, não lembrava-se de tamanha beleza.
– Eu não andava muito com o Nando. Apesar de ele ser um dos meu melhores amigos, meu prédio ficava do outro lado do campus.
– Sim, disso eu me lembro. Achei que, por vocês serem tão próximos, andassem mais juntos. E como vocês ficaram tão amigos, afinal?

As bochechas de Aisha ficaram rubras. Ela não podia responder. Por sorte, já estavam na frente da fazenda.

– Bom, então, até mais - despediu-se, desviando do assunto e virando-se para entrar.
– Que horas você vai recomeçar? - ele perguntou, com uma leve esperança de resposta.
– Por volta das duas. Porque a pergunta? - ela deu meia volta, voltando a encará-lo.
– Oras, para lhe acompanhar.
– Eu já sei o caminho - ela sorriu - E depois, tenho que fazer algumas coisas antes.
– Porque você é assim? - disse ele, começando a se irritar com o jeito dela.
– Assim como?
– Assim! Dizendo que não precisa de ninguém, que sabe se virar sozinha.
– Eu não suporto depender dos outros. A única vez que isso aconteceu as coisas não acabaram bem - ela estava séria - Se você quiser me acompanhar porque não tem nada melhor pra fazer, ótimo. Mas não pense que eu vou ficar lhe esperando, meu caro.

**

[Charlotte Mittnacht - Devotchka]

Viramundo dedilhava uma melodia qualquer, sentado na parte de baixo da escada, olhando para o teto. Pensava em sua Milita. Sentia sua falta. Muito. Sentia falta até das brigas com o pai da moça.

– Eu vou chutar, e dizer que você está com dor de barriga.

Ele riu.

– Discurpa, Aisha. Não vi que ocê tava aí. Vai subir? - perguntou, tirando as pernas do caminho.
– Eu acabei de chegar. Vi você aí todo sonhador e pensei que talvez você quisesse conversar... Ela é daqui? - ela se sentou ao seu lado, na outra ponta do degrau.
– Como ocê...? - perguntou, espantado com a perspicácia dela.
– Ora, só porque eu nunca me apaixonei não significa que eu não conheço esse olhar - ela respondeu, sorrindo.
– Ela é daqui sim. A filha do dono da venda, Milita.
– E o que você está fazendo aqui que não está lá?
– Ieu... Terminei tudo. O pai dela num gosta d'eu. E ieu quero sair dessa vila, tocar por aí. Não podia fazê ela escolher entre o pai e ieu. Daí falei que não queria mais nada com ela, pra ela esquecer d'eu.
– Pois eu acho que você não devia ter feito isso, devia ter contado a verdade, se aberto com ela. Ela pode estar pensando que você não a ama mais, ou ainda, que está interessado em outra pessoa.
–Mai é isso mermo que eu quero que ela pense.
– É o que você realmente quer, ou é o que você quer acreditar?

Ele não respondeu. Não sabia a resposta.

Dona Tê anunciava que o almoço estava pronto. Os dois se levantaram. Vira colocou a viola do outro lado da sala, e juntou-se a Aisha para lavar as mãos.

Do andar de cima desceram as garotas e seu Pedro Falcão. Todos se sentaram a mesa. O clima ficou pesado quando Gina avistou Aisha, mas só Juliana percebeu o que estava acontecendo.

– Intão Aisha, como foi com o povo aqui da vila? - perguntou Pedro, antes que qualquer um falasse alguma coisa.
– Foi ótimo. Todos foram muito simpáticos, responderam as perguntas sem problemas...
– E teve as resposta que ocê esperava?
– Não posso dizer que fiquei surpresa, mas não imaginava que iria encontrar mais títulos de eleitor do que carteiras de trabalho.
– Mai isso é coisa do coroné Epa, porque os trabaiadô daqui, eu fiz questão de ter carteira assinada - orgulhou-se Pedro.
– Fico muito contente! Também falei sobre a escola, Juliana. Tentei arranjar algum meio de fazê-los voltar a estudar, mas não consegui nada ainda.
– Eu já tentei fazer uma classe para adultos, mas não deu certo - lembrou-se, tristonha - De qualquer forma, agradeço a tentativa.

Gina continuava calada. Não olhava para Aisha de tão irritada que estava. Juliana notou a inquietude da amiga.

– Que mal lhe pergunte, Aisha, mas o que o Ferdinando queria falar com você? Parecia tão urgente - ela forçou um tom de preocupação.
– Ah... Não era nada demais - começou ela, desconfortável - Ele só queria desabafar algumas coisas. Nós sempre contamos tudo um pro outro - Gina levantou os olhos para ela - É muito bom poder ficar perto do Nando de novo.

O almoço seguiu em poucas conversas e uma troca de olhares inseguros entre Gina e Juliana.

**

[Exhaustible - Devotchka]

– Mas ela não disse nada?
– Já disse que não! Nem de você, nem dele.
– E você fez o que eu disse?
– Sim. Olha... Eu acho que isso não vai dar certo...
– Claro que vai! Ocê mesma acabou de dizer que ela não falou nele... Já é um começo.
– Mas eu não sei se quero continuar fazendo isso. Ela parece ser uma garota legal... Não merece. Sem contar que, do jeito que ela olha pra mim, parece que ela vai cortar minha cabeça fora...
– E eu mereço? Só quero mostrar pra ela como eu me sinto.
– Mas você nem sabe se ela gosta de você!
– Ela gosta... Eu sei que sim.
– ... Tá bom. Eu vou continuar com o plano - ela disse, por fim, derrotada.


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Notas finais do capítulo

~TAN TAN TAN~

Hahahha... Quem serão esses dois aii??

Pois bem, hoje agradei a todos os gostos eiin?? Sem reclamações!
Eu sei que a Gina pode parecer um pouco frágil demais, mas isso foi pra demonstrar que ela tem um coração, e pra explicar o porquê de tanta braveza!!

* Não sei se deixei claro, mas a promessa que a Gina estava falando, foi sobre o Nando dizer "Eu nunca vou desistir de você"... E ai depois ela ve ele e a Aisha.. Enfim!

Por favor, deixem comentários, dicas, críticas, sugestões, marchinhas de carnaval, cantadas de pedreiro... Enfim! Esse espaço aí em baixo é pra ser preenchido!!

Beijos, e até o próximo!!



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