Simples Conversa

“Hécate? Hécate? Só pode ser brincadeira!” pensei, enquanto minha mais nova “mãe” me levava pelo meio da floresta até algum lugar. Eu andava fitando o chão e o esvoaçante vestido preto, que parecia mudar de cor com a lua, da deusa. Ela parou em frente a uma clareira com um amontoado de pedras no centro, o antigo Punho de Zeus. Fazendo uns movimentos com a mão, Hécate fez surgir um banco de mármore preto ao lado de Punho de Zeus, ela se sentou e eu me sentei em seguida.

– Bem- disse Hécate- Vejo que você tem muitas perguntas a me fazer- apenas assenti com a cabeça- Então faça- disse ela gentilmente

Fui direto ao ponto- Por que a senhora mandou me matar?- encarei a deusa e me espantei com o quanto ela era parecida comigo. O cabelo preto até o meio das costas com uma tiara invertida simples, acho que se chama diadema, e olhos azuis escuros e ao mesmo tempo claros, simplesmente linda.

– Sabe que eu não mandaria te matar.

– Eu não sei de mais nada- resmunguei- Mas então se a senhora não mandou me matar, suas empousai vieram atrás de mim por conta própria?

– Bem, sim- disse dando de ombros- Me diga, quais eram os nomes das empousai que tentaram te matar?

– E o que isso importa?- disse secamente, ela me fitou, curiosa e eu acabei cedendo- Uma eu não sei, mas a outra se chamava Julie

– Hum, Julie, você não tinha uma colega de escola com esse nome?- ela perguntou e eu olhei para ela, incrédula- S-sim, como sabe?

– Eu sempre te observei, mas voltando, lembra-se do que fez com ela na quinta série?

– Aquilo não foi minha culpa!- gritei, quase chorando. Sempre me culparam por coisas que eu não havia feito e essa foi a pior.

Flashback on

Eu estava na quinta série e essa Julie era a patricinha clássica: loira, corpo bonito, líder de torcida, queridinha dos professores, a única coisa que a estragava eram os seus olhos vermelhos como o sangue. Depois da aula de artes, ela começou a me importunar no meio do pátio de novo, mas dessa vez foi pior.

– Hey, é a Maria estranha- disse me chutando no chão- Anda idiota, me dá o dinheiro do lanche

– Cai fora, sua burra, não tenho dinheiro- disse indo embora

– Ah, quer dizer que o papai desempregado parou de pagar a esmola da filhinha, foi?- disse rindo

– O que você falou sobre meu pai, sua vadia?- perguntei irritada

– Ah, ficou irritadinha, é?- disse me empurrando e me batendo. Todos assistiam sem fazer nada- Anda estúpida, faça alguma coisa!Use seus poderes!- gritou, mas com uma voz diferente, quase demoníaca e então eu vi os olhos e as presas. Tampei meus olhos com minhas mãos e só ouvi um grito. Tirei as mãos dos olhos e vi que uma lata de tinta que estava na janela do prédio da escola caiu em cima de Julie, mas o prédio fica a uns três metros de distancia e mesmo com o vento seria impossível a lata de tinta cair bem em cima dela...

– Sua vadia!- gritou Julie saindo correndo. Depois disso nunca mais a vi.

Flashback off

Eu continuei a chorar, ela veio mais para perto de mim e limpou uma lágrima minha, mas eu me desvencilhei dela e acho que ela ficou um pouco trite.

– Eu sei que você não fez isso, querida, não propositalmente

– Hã? Mas o que a Julie tem a ver com isso?

– Oh, sim! Bem , Julie, a menina que te importunava e Julie a empousa são a mesma pessoa.

– O que?

– E eu enviei Julie como uma menina normal para sua antiga escola.

– O QUE?

– Empousai podem ser bem temperamentais. Depois de você ter feito Julie passar, hã, vergonha, ela ficou com raiva e veio se vingar

– Espera, quer dizer que foi você quem mandou Julie, aquela criatura maligna que me irritava na escola que é a empousa Julie que quase me matou porque a três anos atrás eu joguei um balde de tinta na cabeça dela?! Tudo por sua culpa?!

– Sim, resumidamente

– Por que você mandou um demônio para minha escola para me importunar?

– Além de deusa da magia e das fases da lua, também sou a deusa das encruzilhadas, e sempre faço testes a meus filhos para que eu saiba se estão prontos para serem reclamados...

– E Julie era meu teste

– Sim

– E eu passei?- perguntei e ela apenas assentiu com a cabeça - E porque você não me reconheceu como sua filha naquela época?

– Seu pai.

– Como assim?

– Quando conheci seu pai, ele não acreditava em magia e depois que eu o abandonei ele tornou a não acreditar.

– Mas ele não via através da Névoa?

– Não

– Então como ele...- ela me interrompeu - Anne. Ela podia ver através da Névoa, não seu pai. Quando soube que ele iria se casar, não posso dizer que fiquei feliz, mas também não fiquei triste. Fui ao casamento deles e expliquei sobre tudo e ela disse que cuidaria de você, e vejo que cumpriu o que disse.

– Você foi ao casamento deles?

– Sim e devo dizer que foi uma festa maravilhosa

Assenti com a cabeça- Por isso ele não me deixava sair à noite, porque é quando, hã.....

– Como filha minha, você fica mais poderosa sob a Lua- assenti com a cabeça, ainda meio confusa.

– Hã, Hécat...quer dizer a senhora, hã, só veio aqui para me falar isso?- perguntei meio triste, ela poderia não ter sido presente, mas ainda sim era minha mãe

– Não- fiquei feliz com a resposta- Como sua mãe, tenho que lhe avisar sobre os perigos que estão por vir. Você terá que fazer escolhas que podem mudar muitas coisas.

– Hum hum- disse meio decepcionada

– Bem, tenho que ir agora, mas antes quero lhe pedir algo

– O que?

– Mesmo que me doa não me preocupo se não gosta de mim, mas é preciso que você aceite suas origens e seus poderes, principalmente seus poderes. Você é muito poderosa, acredite filha- disse desaparecendo como névoa- Até breve, filha

– Até...mãe

Ela desapareceu e eu atravessei a floresta. Ao chegar à fogueira, todos pararam de conversar.

– Hum, quer dizer que essa carrapatinha é filha de Hécate?

– Sr. D!- disse Quíron, em tom de reprovação- Venha criança- ele me levou ao centro da fogueira e sorriu de modo acolhedor

– Salve, Maria, a Filha da Magia!