Como uma velha amiga One-Shot escrita por queen bee


Capítulo 1
Como uma velha amiga - Capítulo único


Notas iniciais do capítulo

Heeeeey, meus gatos! Seguinte, eu já disse nas notas iniciais, mas vou reforçar: Comente e me faça feliz!
Bju bju da tia Jann



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– Mãe, como você e o pai começaram a namorar? Sei que se conheceram terminando o terceirão, mas como foi?– Pergunta Luiza.

Ela suspira.

– Ah, minha filha. Vocês, jovens, não gostam de novidades? Essa é uma daquelas histórias clichês que todo o mundo já sabe o final.

– Aham, mas deve ser bonitinho. Vocês dois eram um lindo casal, tão apaixonado...

Marcela limpa as lágrimas que começaram a correr, sem querer. Seu marido, seu lindo e atencioso marido. Aquele que todas as manhãs a acordava com um beijo. Aquele que a pediu em namoro na praça, em um sábado: 12 de setembro de 1993. Vinte e um anos atrás. E aquele que morreu em um acidente de carro quando estava voltando do trabalho. Ela limpa as lágrimas novamente e se vira para a filha, o único fruto do amor deles:

Está bem. Bom, você deve saber que eu e seu pai nos conhecemos há vinte e um anos. Fomos só amigos durante dois anos, até que ele começou a ficar estranho. Ficava nervoso, suava e quando eu perguntava o que ele tinha, desconversava. Comecei a ficar preocupada: se ele ficava assim, não queria ser mais meu amigo, certo? Ele me trocaria por outra pessoa melhor do que eu logo, logo. Então comecei a me afastar. É como dizem: Quanto mais você se importa, mais tem a perder. Logo, eu me afastava para esquecê-lo, nem que fosse um pouco. Falhei miseravelmente.

Uma hora, ele me barrou. Perguntou por que eu estava estranha, eu perguntei por que ele tinha mudado:

– Não tente mudar de assunto. Eu não mudei, você, sim.

– Ah, é? – Já estava começando a me irritar. Como assim, ele muda de uma hora pra outra e eu sou a estranha?! – Não sou eu que esqueço as pessoas que eu conheço. Saiba que eu tentei, Lucas, mas não deu certo.

– O quê? Do que está falando, Marcela?

Senti uma única lágrima quente escorrer do meu rosto e ele limpá-la. Seu toque me provocou um arrepio. Olhei para ele de outra maneira, enxerguei nele não o Lucas, meu melhor amigo. Mas sim o Lucas. Só o Lucas. Sem nenhum adjetivo a não ser: Lucas. Um cara lindo, atencioso, educado e legal. O mais legal nisso tudo é que você deve estar pensando: ‘Sem nenhum adjetivo, e essa mulher já falou quatro’, mas ele não se dava conta disso. Ele era assim, sem se esforçar.

– Está olhando o quê? – Ele riu. Senti meu rosto esquentar. Eu tinha ficado encarando ele esse tempo todo, só filosofando.

– Ah, eu... esquece – Disse. Como sua avó me dizia: homens são tão espertos num relacionamento quanto um cachorro numa piscina de azeitonas em conserva. Então eu me toquei do que tinha pensado e me censurei: ‘Marcela, do que está falando? Relacionamento?! Ele é Lucas, lembra? Seu melhor amigo’. Acontece que estava cada vez mais difícil vê-lo como tal.

E, convenhamos, a maneira como ele me olhava não ajudava em nada”

– Como ele te olhava, mamãe?

Marcela ergue o olhar para o teto e diz, com um toque nostálgico na voz:

– Como se eu fosse a melhor coisa que aconteceu na vida dele.

– Uau. E isso é bom, não é?

– Claro que sim.

– Mãe, – Marcela olhou para ela – pode definir o olhar dele com uma emoção?

Esse era o jogo das duas. Quando o pai morreu, Luiza ficou muito triste. Ela ficava só olhando para o teto do quarto. O tempo todo. Até que Marcela não aguentou mais o ar de aflição que havia naquela casa e inventou uma brincadeira: O olhar da emoção.

O olhar da emoção funcionava assim: a pessoa define o olhar, a maneira como se observa algo com uma emoção. Um exemplo: Ela olhou para o brigadeiro de colher na mesa como se fosse o seu aniversário.

– Como uma manhã de Natal.

Quando você acorda, vê aquela árvore maravilhosa e sente uma emoção que não pode ser definida como amor, alegria, euforia ou qualquer coisa do tipo. Aquele sentimento se chama uma manhã de Natal.

– Por que uma manhã de Natal?

A mãe suspira.

– Quer saber? Eu nem sei por que estou te contando isso. Vá fazer a tarefa da escola.

– Eu já fiz – Luiza cruza os braços – E a senhora, dona Marcela , está me contando isso porque eu pedi e você é uma mãe querida e atenciosa, certo? Pode continuar a história, por favor?

Marcela apenas suspira novamente e continua:

Bom, então ele me olhava como a uma manhã de Natal. E eu gostava. Ficamos assim durante uns dez minutos, quando o meu celular tocou. Atendi irritada. Era só a sua avó, me ligando para perguntar o que eu queria de almoço. Estrogonofe, é claro. Se ela me dava escolha, seria estrogonofe. Mas isso não vem à história. Me virei para ele, mas ele só tinha saído. Assim, sumiu. PUF! E como mágica, meu celular vibrou.

Fui ler a mensagem, ela dizia assim: Marcela, a nossa conversa ainda não acabou. Poderia me encontrar no bar da sua casa? Ass. Lucas

Pensei: ‘Meu Deus, um bar?! Ele não deve querer nada mesmo, estou sendo tola’

Logo, meu celular vibrou novamente: Pensando bem, talvez não seja uma boa ideia. Pode ser na praça em frente à sua casa? Hoje à tarde? Ass. Lucas

‘Agora, sim! ’pensei. ”

– Mas mãe, qual o problema de se encontrar num bar? – Exclamou Luiza.

– Filha, na época, se encontrar num bar significava o mesmo que beber. Beber bastante, eu quis dizer.

– Mas hoje em dia também!

– Sabe qual é a diferença?

– Diga-me porque eu ainda não entendi.

– Antigamente, as mulheres não bebiam com os homens.

– Ah, Meu Deus! Quer dizer que vocês ficavam em casa, esperando o marido chegar, na frente do fogão? Com a janta pronta, ainda por cima!

– Olha filha, estou te contando a história porque você quer. Se vai ficar criticando a maneira como o seu pai me paquerava, é melhor subir. Vá fazer a tarefa da escola.

– Mas eu já fiz, mãe! E eu não estou criticando eu estou... – Marcela levanta uma sobrancelha, como quem diz: Tem certeza? – Tá legal. Eu estou criticando. Um pouco. Mas é que não me conformo com a maneira como as mulheres eram tratadas. Como mero objeto. Apenas para satisfazer as vontades do marido e fazer o serviço doméstico. Vocês eram quase como empregadas dentro da própria casa!

– Querida, nem todos eram assim. Sua avó era e eu fui criada assim, pois nós éramos muito tradicionais.

Luiza imaginou a avó falecida fazendo um escândalo por causa da maneira como falou da época de 90. Quase podia ouvir sua voz novamente. Nostalgia. A voz da mãe a trouxe de volta à realidade:

– Filha? Está me ouvindo?

– Oi, o quê?

– Eu estava falando que você precisava ter mais respeito com a época em que a sua mãe conheceu o homem da vida dela.

– Ai, mãe – Luiza revira os olhos – Eu ainda quero ouvir o resto da história.

“Tem que parar de me interromper, menina! Mas tudo bem. Então eu pensei em responder, mas estava quase chegando em casa, então deixei para lá. Entrei em casa e fiquei um pouco na cozinha, ajudando minha mãe a cortar o frango. Meu dia passou bem normal, na verdade. Fiquei esperando a mensagem de que seu pai estava me esperando em frente à casa, mas ela não veio. Em vez disso, ouvi uma campainha soar. A minha campainha. Esperei minha mãe anunciar que temos algum convidado importante e que é para eu me vestir e me arrumar, mas isso também não veio.

A cabeça de dona Marília apareceu na porta do quarto.

– Filha, o Lucas está aqui.

– Tá legal, mamãe. Fala que eu já estou descendo.

Sua avó apenas assentiu e desapareceu atrás da porta.

Coloquei um vestido que vinha até um pouco acima do joelho. Sabia que minha mãe acharia ruim, mas na época eu pensava como você, filha: ‘Por que as mulheres não podem usar o que querem?’ Porém, isso não se chamava feminismo. E nem existia o machismo. As pessoas apenas pensavam igual, e havia algumas poucas que pensavam diferente. Mas isso era apenas esquecido, como tudo o que não fosse relevante.

Pus uma sapatilha básica, pois a praça era aqui pertinhos, e um blazer jeans. Essas peças nunca me deixaram na mão. Saí do quarto e encontrei Lucas arrumando o cabelo na frente da tela da televisão. Dei uma risadinha pelo nariz. Ele se virou rapidamente, envergonhado:

– Ah... Desculpe. Bem, ahn – Ele deu uma longa pausa – Vocês têm uma bela televisão.

Dei uma risada um pouco mais alta do que o esperado. Ele riu. Minha mãe me censurou com o olhar.”

– Como estava o olhar dela, mãe? Na emoção?

Marcela pensa um pouco. Como quando você olha para alguma coisa quebrada que sabe quem quebrou? Não. Quando você olha para o controle de TV que deixa de funcionar por falta de pilhas? Não. Quando você deixa o brigadeiro queimar porque ficou trocando mensagens com aquele garoto, o seu vizinho? Pode ser.

– Sabe quando você deixa o brigadeiro queimar? Daí você vai se olhar no espelho, e está aquela cara de que sabe que fez errado, mas vai ter que comer mesmo assim, porque acabou o leite condensado. Esse olhar mesmo. Tenta imaginar.

– Continua.

“Dei de ombros e seu pai estendeu o braço, como um perfeito cavalheiro. Mas eu recusei e abri a porta. Saímos de casa, fomos caminhando até a pracinha. Sentamos num banco e eu finalmente perguntei:

– Vai me contar o que aconteceu agora? – Eu disse, com a voz baixa. Ele só assentiu, sério. Comecei a ficar com medo. Se, por acaso, ele me trocasse por outra melhor amiga, eu teria que socializar com outras pessoas. Completos desconhecidos, eu quero dizer. Eu era muito tímida, filha, por mais difícil que isso possa parecer. E, sem o seu pai, eu ficaria sozinha. Quero dizer, tinha algumas meninas que queriam fazer amizade comigo, mas eu nunca dei uma brecha. Se eu já tinha o Lucas, não precisava de mais ninguém, certo? Certo!

– Eu vou, mas... se não quiser, não precisa aceitar, nem nada. E vamos continuar amigos, tá?

– Tá legal.

Ele respirou fundo, como se esperasse que eu levantasse e saísse dali a qualquer minuto. Dei um sorriso encorajador a ele, que prosseguiu:

– Marcela, eu... bom, eu... eu sinto alguma coisa por você.

Dei um sorriso. Tão bom ouvir aquilo. Tão bom saber que eu não era a única. Quando se apaixonar, filha, sempre encoraje a conversa, pode ser?

– O que foi? Por que está sorrindo? Você também?

– Sim, eu também. – Lucas me deu um abraço. Levantamos e ele puxou uma caixinha do bolso.

– Não sou bom com palavras, você bem sabe. Mas vou falar, para você. Só para você. Quero que sinta, que saiba o quanto é especial pra mim, Marcela. Quero que eu possa demonstrar tudo o que sinto. Quero acordar e lembrar de você e do seu beijo. Quero poder ter um apoio em você, e quero que se apoie em mim. Quero que continuemos amigos, apesar do que vou pedir agora. E o que vou pedir, querida, é que namore comigo. E você, quer tudo isso?

Eu já tinha lágrimas nos olhos. Fiz a única coisa que conseguiria fazer naquele estado. Somente assenti.

– O que foi? Não gostou do pedido?

– Gostei, é só que... Meu primeiro namorado é meu melhor amigo – Eu ri e ele me acompanhou

– Isso interfere em algo?

– Não. – Ele me puxou para um abraço e afagou meu cabelo. Sorri sobre o ombro dele e beijei sua bochecha.

Ele virou para mim e disse:

– Quando estiver pronta, vou beijar a sua boca. Só um aviso, mesmo.

Ri e seu pai me acompanhou. Sussurrei em seu ouvido:

– Me avise que você estiver pronto, querido.

Ele sussurrou de volta:

– Isso foi muito sexy.

– Eu sempre fui.

Ouvi ele murmurar um: ‘Sempre mesmo’”

– Ui, mamãe sexy!

– Ah, fica quieta.

Uma coisa que as duas adoravam nesse relacionamento mãe e filha é que elas se tratavam como melhores amigas. Com respeito, é claro.

– Mas é, né mãe. Pra pegar um gato que nem meu pai, meu Deus...

Marcela jogou uma almofada na filha:

– Fica quieta, Luiza.

– Nossa, a senhora deve ter sido um pitelzinho mesmo, hein!

– Por quê? Não sou mais?

Marcela, com seus trinta e oito anos, esbanjava saúde e boa forma. Apesar, é claro, dos efeitos da idade, ela ainda arrancava alguns suspiros quando voltava do hospital de jaleco. Médica que era, comentários não faltavam sobre sua beleza e inteligência.

– Claro que sim, mãe. Continua, vai...

– Ah, não. Só amanhã.

– Ahh, por quê?

– É que eu preciso dormir um pouco, tá?

– Quando acordar, eu quero o final...

– Posso resumir?

– Não! Eu quero tudo tim-tim por tim-tim.

– Já que pediu...

“Claro que depois daquele comentário, eu não aguentei. Pulei em seu pescoço e o beijei. Ele sorriu durante o beijo. Foi tipo, o melhor primeiro beijo que alguém poderia ter. Ah, e esqueci de te falar que estávamos a caminho da minha casa. Me despedi dele com um beijo em seu rosto e entrei.

Minha mãe me observava com um sorrisinho no rosto. Nunca esqueci daquela conversa, filha, pois foi a primeira vez que conversei ‘abertamente’ com minha mãe.

– Vocês estão namorando?

Estranhei a princípio. Dona Marília nunca falaria assim comigo, principalmente sobre garotos. Ela, que viveu em outra época, achava um absurdo eu não ter casado ainda, com meus dezessete anos. Mas enfim, respondi:

– Estamos.

– Que bom. Tomara que seja feliz com ele.

Minha boca se abriu num ‘O’ pequenininho. Ela soltou uma risadinha.

– Senta, que eu vou te explicar o motivo da mudança.

Sentei e observei bem minha mãe. Ela parecia bem mais feliz. Com os ombros mais retos, um sorrisinho que até agora, eu só me lembrava de ter visto em seu álbum de casamento. Então eu pensei: ‘Tomara que eu seja feliz assim com o Lucas’. E logo depois pensei: ‘No quê está pensando, Marcela? Vocês não têm nem um dia de namoro direito e já chegou na parte do casamento?!’

– Então... a sua tia veio aqui hoje, sabe? E ela viu vocês indo para a praça. Me disse que você estava com um sorriso enorme. E que estava com um garoto. Aquele Lucas, certo?

– Aham.

– Daí eu pensei em ligar para o seu pai para contar que você estava... como é que os jovens de hoje em dia falam?

– Ficando com ele.

– Isso. Para contar que você estava ‘ficando com ele’. Mas daí eu lembrei da educação que meus pais me deram: Nunca atrapalhe seu marido. – Nessa hora eu revirei os olhos. Mamãe riu.

– Calma, deixa eu terminar de contar – Ela continuou – Mas depois eu pensei: Mas ela é minha filha. Eu ensino o que eu quiser para ela. Daí eu liguei para o seu pai.

– E...? O que ele disse, mãe?

– Ele disse que era pra falar para ele que, se ele te machucar, vai ser atropelado. – Ri com o pensamento de um pai como o meu (ou seja, ausente) com ciúmes.

– Tá legal, mãe. Obrigada – Dei um sorriso sincero. Sua avó era a melhor mesmo. – O recado será dado.

Ela sorriu e eu fui para o meu quarto dormir um pouco, já que era sábado. Só acordei quando minha mãe me chamou para o jantar.

– Querida, vai querer batatas?

– Quero, por favor. Me passe os brócolis, também, por favor.

– Ora, o quê é isso?!

– Isso o quê, querido? – Minha mãe perguntou, assustada com a possibilidade de seu marido reprovar a comida.

– Chega desses ‘por favor, por favor’ – Seu avô disse, fazendo uma péssima imitação da minha voz.

– Mas pai, é educação e...

– Não quero que deixe de ser educada comigo. – Ele me cortou – Mas não quero que me trate como um estranho, uma visita, na minha própria casa.

– Tem razão. Corta uma carne pra mim, fazendo o favor, pai.

– Agora está melhor – Meu pai deu um sorriso de aprovação. O jantar se resumiu a isso. Pois é, parece que um namoro pode mudar sua vida até dentro de casa.”

– Foi assim, filha. Depois disso, namoramos por dois anos, casamos dois anos depois e, após um ano, você nasceu. Sou apaixonada pelo seu pai há vinte e um anos. E hoje, faríamos vinte e dois anos de “conhecidos”.

– Uau. Uma história e tanto, hein mãe. E vocês se amam ainda?

– Seu pai, eu não tenho certeza mais, não tenho mais contato com ele. Eu teria que morrer e nascer de novo para encontrar um homem tão perfeito como ele.

Acidente de carro, dois anos depois. Antes de dar o último suspiro, Marcela me perguntou:

– Ele está lá?

Eu apenas assenti. Então a levei. Ela me acolheu, acolheu a Morte como uma velha amiga.


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Notas finais do capítulo

E aí? Gostaram? Não? Talvez? Deixariam uma MP me xingando por ter postado uma coisa dessas? Tomara que tenham gostado, essa é a minha primeira One-Shot.
Bju bju da tia Jann



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