O homem corria em uma velocidade sobrenatural, os pés descalços se movendo com agilidade pelo solo irregular da floresta, os olhos dourados brilhando, as presas e garras expostas.
Ele pode ouvir com clareza quando a perseguição começou. Em um momento só tinha o barulho de seus pés contra as folhas e então, de repente, surgiu o som de passos rápidos atrás dele, alguém o seguia.
O loiro aumentou a sua corrida, rosnando como um aviso para que seu perseguidor parasse, mas em resposta uma flecha de prata passou raspando pelo seu braço direito.
- Malditos caçadores!- O lobisomem grunhiu sem diminuir a corrida, ele precisava chegar a Beacon Hills o mais rápido o possível.
O garoto resolveu deixar a postura de lado e apoiou as mãos no chão, recomeçando a sua corrida de quatro, como um verdadeiro animal furioso, aumentando assim a sua velocidade. Ele estava chegando na casa que era seu objetivo e não pararia até chegar lá.
O lobisomem percebeu que estava encrencado quando, de alguma forma inexplicável, um vulto loiro o ultrapassou e parou a sua frente, segurando uma besta apontada em sua direção.
Sem ter escolha, o homem parou de correr e se pôs em pé lentamente, analisando a caçadora a sua frente. Ela tinha cabelos longos e loiros, com as pontas pintadas de verde, e parecia ser bem jovem apesar da expressão dura e perigosa.

A mulher a sua frente era tão diferente da última caçadora que teve contato,mas mesmo assim uma pontada de saudade o atingiu ao encarar a besta.
- Me diz um único motivo para eu não te matar agora.- A mulher falou com firmeza, o olhando com desprezo.
-Eu não vim criar confusão, não vou me meter no seu caminho, só preciso ver Scott Mccal.- O homem disse lentamente, enquanto se preparava para atacar se fosse preciso. - Você o conhece?- Ele perguntou desconfiado ao ver como a expressão da garota mudou ao ouvir o nome do alfa.
- O que você quer com ele?-A caçadora devolveu outra pergunta, se aproximando mais do lobisomem que deu alguns passos para trás.- Quem é você?
- Sou Isaac Lahey, amigo do Scott.- O garoto falou erguendo uma sobrancelha loira, como um desafio silencioso para ver como a caçadora reagiria.
- É isso que nós vamos ver.- A mulher falou com tom superior e desconfiado.- É para você me seguir em silêncio e se tentar qualquer gracinha eu vou mata-lo!
- Você é quem manda!- Isaac falou sarcástico, levantando as mãos em sinal de rendição, recebendo um olhar de reprovação da caçadora.- Como devo chamar a senhorita?- Ele disse com o mesmo tom provocador.
- Callie.

‪#‎Abertura#

- Ele fez isso a si mesmo?
- Sim.- Scott preferiu dar a resposta mais curta o possível, não tinha uma maneira de amenizar a situação.- Ele estava delirando quando chegou aqui, achava que tinha feito algo com Lydia.
O xerife assentiu com a cabeça, tentando absorver o que Scott dizia enquanto analisava Stiles que estava deitado no sofá da casa dos Mccal, sem camisa, se lamentando baixinho de dor enquanto Melissa costurava suas feridas.

Todos os ferimentos que recebeu na tortura de Kate, que antes estavam cicatrizados, haviam sido reabertos brutalmente.
- Por que ele faria isso? Por que iria se ferir dessa forma?- O pai disse inconsolável, ele não conseguia entender como tanta coisa ruim podia acontecer com seu filho.
- Não acho que estivesse consciente do que fez. Ele simplesmente esmurrou a porta, chorando e quando eu fui ver Stiles estava inteiramente ensanguentado pedindo para eu dizer que Lydia estava bem.- O alfa falou se recordando do que havia acontecido horas antes.- Quando eu o trouxe para dentro ele só falava sobre Lydia, dizendo algo sobre ter a matado e ele chorava tanto que eu demorei para perceber que todo aquele sangue estava vindo dele.
- Tem certeza que não é melhor o levar para o hospital?- O homem perguntou pela quinta vez naquela noite.
- Minha mãe vai cuidar bem dele.- Scott garantiu colocando uma mão sobre o ombro do homem.- Não temos como leva-lo assim para o hospital, pois quando perceberem que foi ele próprio que se feriu e verem que já passou por Echos House...- O garoto não precisou concluir a frase, a última coisa que o Stilinski queria era que seu filho voltasse para Echos House e acabasse preso lá.
- Eu vou lá ficar com ele.- Foi a única coisa que o pai falou, ele sabia que aquilo estava relacionado ao Nogtisune, mas naquele momento não tinha sanidade para pensar naquilo, o Xerife só queria ter certeza que o filho ficaria bem.
Scott continuou parado no corredor, apenas escorado na parede vendo o pai ir até o menino que ainda estava sendo costurado. O Xerife acariciou o cabelo suado de Stiles e depositou um beijo em sua testa antes de sentar em uma cadeira ao lado do sofá e ficar analisando Melissa enquanto cuidava de seu filho.
Aquilo estava ficando completamente fora de controle, havia se passado apenas duas semanas após o enterro de Malia, e Stiles já estava visivelmente mais magro, o rosto abatido, com olheiras profundas abaixo dos olhos, ele parecia uma pessoa completamente diferente do que era antes do dia desastroso do baile. Porém, a maior diferença no garoto não era sua aparência debilitada, mas sim o seu olhar, a sua expressão, ele não era mais o mesmo garoto brincalhão e inocente, depois do que havia feito com Kate ele perdeu a sua característica de ser apenas um menino, agora ele era um homem machucado, maltratado.

Alguém precisava urgente resgatar o antigo garoto sorridente que parecia ter ser perdido em meio aos desastres de sua vida.
O alfa suspirou e olhou a hora em seu celular, ainda eram quatro horas da manhã, mas ele não podia esperar mais, a sanidade de seu melhor amigo era o que estava em jogo. Sem hesitar ele discou o numero conhecido, sem se importar com o fato de acorda-la.
Após três toques, Lydia atendeu a ligação.

**

- Scott?- A menina falou arfante ao telefone, sem precisar olhar o identificador de chamada para saber que era o Alfa que estava ligando.
- Lydia.- A voz do garoto estava séria e firme, tão diferente da habitual descontração do adolescente.- Stiles piorou, de alguma forma ele se auto mutilou e veio parar na frente da minha casa, batendo na porta e gritando.- O alfa parou de falar por poucos instantes, para que Lydia conseguisse absorver as informações.- Ele achava que tinha te matado, Lydia. Parecia estar preso em uma espécie de transe, não tenho duvidas de que foi o Nogtisune que fez ele fazer isso, o demônio está tentando o enlouquecer.
-Se auto mutilou?- A menina perguntou incerta, ainda arfando, olhando fixamente para sua cama.
- Ele abriu todas as cicatrizes.- O garoto falava tudo sem tentar amenizar a situação, Lydia precisava saber a cruel realidade do que estava acontecendo enquanto deixava o menino sozinho.- Minha mãe está cuidando dele agora, mas a anestesia novamente não fez efeito, ele está sentindo tudo, está sofrendo, Lydia.
- Por favor, Scott, não comece a falar isso de novo.- A menina pediu em um fio de voz ao perceber o que o garoto iria começar a dizer.- Eu sei o que estou fazendo e como ele está...
- Não, Lydia, você não sabe como ele está! Sou eu que estou sozinho com ele todos esses dias, eu que estou dormindo na sua casa porque ele tem pesadelos todas as noites e acorda gritando de madrugada, chamando por Malia, gritando sem parar e você não está lá para ajudá-lo.- A voz do garoto se tornou irritada e ele teve que se controlar para não gritar, com medo de que Stiles ouvisse a conversa.-Ele não está nada bem, Lydia e mesmo assim me pergunta todos os dias como você está, ele se preocupa com você e não consegue se distrair, não consegue pensar em outra coisa. Eu estou fazendo o meu melhor, estou o mantendo com um mínimo de sanidade, mas ele precisa de você!
- Scott, você não entende, eu simplesmente não posso...
- Não tente explicar nada para mim!- O adolescente falou a interrompendo brutalmente.- Por que não vem aqui e explica para o Stiles o motivo de ter o abandonado quando ele mais precisa de você? Tente explicar o porquê não está se importando com ele e não é capaz de sequer perguntar como ele está!
- Scott...- A ligação foi encerrada e Lydia permaneceu com o celular contra a orelha, escutando o tu-tu-tu irritante.
Sua mão suada e trêmula deixou o celular cair na cama e a menina continuou encarando o seu colchão, confusa, tentando controlar sua respiração arfante.
Sua colcha, seus lençóis, travesseiros, toda sua cama, estava repleta de sangue.
- Ele achava que tinha te matado.- Lydia repetiu lentamente as palavras que Scott havia dito ao telefone.- Preso em uma espécie de transe.- Ela repetiu novamente as palavras do alfa, enquanto a conclusão assustadora atingia a sua mente.- Eu tive o mesmo pesadelo Stiles, eu o vi me matando, se alimentando da minha dor, sorrindo enquanto me sufocava.- A garota proferiu aquelas palavras como se o humano fosse capaz de ouvi-la, colocando as mãos automaticamente em seu pescoço ao lembrar da sensação de ser estrangulada.
Lydia havia acordado de seu pesadelo antes de Scott a ligar, pelo menos ela achava que era um pesadelo até encarar sua cama repleta de sangue e ficar paralisada, arfando, sem conseguir ter nenhuma reação, se movendo somente quando o celular tocou.
A garota mexeu o corpo com receio, se levantando com lentidão da cama, temendo estar com algum ferimento, mas havia apenas um leve torpor em seus membros, misturado com uma dor sutil, que não parecia de fato ser preocupante.
Lydia foi até o banheiro com passos inseguros e ficou de frente ao espelho, se assustando ao se deparar com marcas roxas de dedos em volta do seu pescoço. A Banshee encostou a mão com cuidado nos hematomas, sentindo dor como se aquilo fosse recente, como se tivesse sido estrangulada recentemente.
- O que está acontecendo?- A garota falou sem conseguir controlar o choro.- Como a gente pode ter os mesmos pesadelos e voltar machucados?
A menina sentou no chão ao sentir suas pernas falharem e continuou chorando em frente ao espelho, sentindo seu peito se estrangular de saudade e medo.
- Me perdoe, Stiles, eu só quero entender o que está acontecendo com a gente.- A menina soluçou em meio as lágrimas que aumentavam, tentando expulsá-las inutilmente de seus olhos.- Você não é o único que está sendo atormentado, eu não sei como, mas escuto todos os seus gritos. Eu vejo os seus pesadelos, sinto a sua dor mesmo de longe.
A garota se contorceu no chão, incomodada com a sensação de agulhas invisíveis costurando o seu tronco. Era a mesma dor de Stiles que a invadia.
- Você também consegue me ouvir quando te chamo? Você ouve o que essas vozes falam comigo?- Lydia fechou os olhos, se concentrando na lembrança dos olhos cor de ouro que tanto amava.- Eu te amo Stiles, também sinto a sua falta, eu só estou apavorada, ainda não consigo me aproximar de você. Tenho tanto medo.
" A morte está aqui, Lydia.Ela não foi embora", vozes roucas e conhecidas sussurravam repetidas vezes na cabeça da garota. "Não será apenas um herói caído”.
- Me deixem em paz, por favor, me deixem em paz!
" A morte está ao seu lado"
- Parem! Parem com isso!- A garota se desesperou quando os sussurros aumentaram.
As vozes se tornaram mais alarmantes, começaram a falar cada vez mais rápido, uma frase atropelando a outra, tornando as falas confusas, indecifráveis.
Um grito foi derramado da boca da menina, ela não conseguiu impedir que o som escapasse de seus lábios e logo o silêncio da madrugada foi rompido pela urgência de sua voz berrante, aguda e poderosa.
No instante que o grito de uma Banshee atingia a atmosfera, uma vida era condenada a morte.