O Retorno dos Quatro. escrita por whitesparrow


Capítulo 5
Capitulo IV - Tentativa.


Notas iniciais do capítulo

Faz anos que não posto, então isso é mais uma tentativa pra ver se a coisa vai fluir, porque bateu a inspiração e escrevi um monte de capítulos. Gente, eu sou terrível.



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Leio a carta várias vezes, tentando absorver o máximo possível de suas palavras. O que ela quis dizer com “salvar as almas daqueles que foram sacrificados” ou em “um beijo salvará vidas”? Fecho os olhos e balanço a cabeça várias vezes, como se isso fosse permitir que alguma memória útil surgisse. Deus, eu estou completamente perdida. O que deveria fazer, afinal? Tem um lugar em San Diego me esperando, eu ainda estou com dois mortos na minha cama e estou usando roupas desgastadas demais para passar despercebida em um aeroporto.

Levanto do chão e levo minha caixa para a mesa. Guardo a chave, o dinheiro e o envelope, selo tudo novamente e parece que a caixa nunca foi aberta. Caminho até Dois e Três, faço uma averiguação completa em seus corpos. Dois foi morta com uma facada no peito, seu coração parecia intacto, mas muitas veias foram rompidas. Três foi estrangulado e levou uma facada no estomago, que havia atravessado o seu corpo. Suas peles estavam azuis, mas pereciam estar dormindo. O que quer que tenham usado neles, parecia estar mantendo os corpos muito bem preservados. Pelo menos o meu parecia tão bem quanto eu podia me lembrar.

A música ainda toca alta, já é madrugada. Preciso tentar algo. É apenas uma questão de tempo até verem que os corpos sumiram. Provavelmente, vão acreditar que foram roubados e começar uma caça aos outros membros da Garde pela redondeza. Não haverá ninguém, apenas eu e dois corpos. Sento no vão que há entre a maca e cama. Colo minhas mãos nas cabeças de Dois e Três, fecho os olhos e espero. Não sinto nada. Tento orar, e nem depois dela sinto algo. Peço e peço, cada vez mais insistente e desesperada. Clamo por Pittacus Lore como nunca fiz há anos. Não acontece nada. Levanto, brava, e chuto o baú de Seis. Ele desliza pela cabana e para próximo ao fogão. Mesmo sendo de metal lorieno revestido de encantamentos, não sinto nada, nem sequer dor. O que há comigo?

Um beijo salvará vidas, é o que ela disse. Enfrento um longo debate interior. As horas se arrastam, e quando a música para, sinto que não há opções, que preciso tentar tudo o que for possível. Volto a me sentar no vão, dessa vez, curvada sob Três, agarrada a maca. Tento permanecer calma e penso que não há nada mais louco que as coisas que já fiz ou me aconteceu. Desço meu rosto para o dele e deposito um beijo longo em sua testa. Não sinto nada quando me afasto. Solto um longo suspiro e deito no vão. O chão está quente, apesar da noite fria. Talvez eu esteja quente. Sinto o cansaço chegar rapidamente. Pela fresta da cortina, vejo o céu escuro como carvão, com pontos tão brilhantes que não quero piscar. Em algum momento, eu durmo.

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Acordo assustada, agarrada aos fragmentos de um sonho. Não, sonho não. Foi uma memória. Sento e abraço minhas pernas, colando minha cabeça aos joelhos e respiro com calma para não chorar. Consigo me lembrar daquele dia conforme me dedico a isso.

 Era uma tarde quente, com ondas quebrando na areia, o som dos pássaros, a praia quase deserta. Eu estava usando um biquíni azul marinho, porque essa era minha cor. Era o que Drake dizia. Ele estava ao meu lado, os olhos fechados, usava um calção verde e sua pele morena brilhava. O guarda-sol sob nossas cabeças, as pranchas fincadas na areia, o vento beijando meu rosto, nossas mãos entrelaçadas no encosto das nossas cadeiras reclináveis. Me lembro de me sentir em paz, lendo um livro sobre a história da Terra, me sentindo cada vez mais ligada a ela... A Drake.

— No que está pensando? – Drake perguntou, seus olhos me fitando, despreocupado. Amava aquele olhar.

Dei um sorriso pequeno. — Nada, só estou feliz. Parece um daqueles dias perfeitos. – Respirei profundamente.

— Tem razão. – Seus olhos voltam para o mar e depois para mim. — Vamos dar um mergulho? – ele se levantou, ainda com nossas mãos entrelaçadas. Fechei o livro e fui com ele.

A água estava quente, perfeita, na temperatura que sempre gostei.  Nadamos e jogamos agua um no outros, ficamos assim até nossas barrigas doerem de tanto rir. Senti sua mão pegando a minha e logo estávamos num abraço apertado. Estávamos repletos de energia. O calor entre nós era formidável.

— Dizem que há muita energia em beijos. – Nossos lábios se tocaram, e a energia era incrível. Eu me sentia forte e brilhante. Nos separamos um pouco. — Feliz 14 anos! – e voltamos a nos abraçar.

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O céu está começando a clarear, mas ainda não passa das 5 da manhã. Ando do lado de fora, a lama agora está seca e há alguns carros num canto isolado. O bar está fechado, não há som, apenas o barulho da minha respiração e dos meus passos. Respiro profundamente, clareando as ideias. Preciso tentar.

Sento nos degraus do bar, limpando com a mão a lama seca deles. Observo a mudança de cor do céu, as estrelas sendo ofuscadas pelo brilho do sol, o vento gelado varrendo meu rosto. Eu poderia ficar aqui se não fosse tão arriscado. Toni me contrataria, eu guardaria aqueles corpos até começarem a se decompor e teria uma vida humana. Eles nem sequer sabiam se eu realmente ia acordar.

— Oh, desculpe! Não queria incomodar! – olho para o lado e vejo um garoto ruivo parado, os olhos arregalados. Ele segura uma chave, o número 2 em forma de madeira balançando entre seus dedos. — Me chamo Gael.

— Eu me chamo Hanna. Não tem problema, eu só queria agradecer ao Toni pelas roupas e pela comida. – eu me levanto rapidamente, batendo na calça e tirando o pó que ficou. Gael é uma cabeça mais alto do que eu.

— Ah, bem, ele só abre aqui ao 12:00, mas posso dizer a ele, se quiser. – ele parece constrangido, suas bochechas estão rosadas. Seus olhos desviam dos meus e ele sussurra algo.

— O quê? – questiono, me aproximando dele, o cenho franzido.

Ele dá um passo pra trás. — Eu disse que você é linda. Ontem a noite você parecia mais jovem. Deve ter sido impressão minha. – ele está mais vermelho ainda.

Fico surpresa e lisonjeada ao mesmo tempo. — Obrigada! – mudo de assunto. — Sabe exatamente em que cidade estamos?

Ele me olha, grato. — Lakeside, Califórnia.

— Quando tempo daqui até San Diego? – coloco minha mão em seu braço e sinto seus pelos se arrepiarem.

— 30 minutos de carro ou menos. – ele parece confuso, mas não tira os olhos da minha mão incrivelmente pálida.

Percebo que minhas unhas estão muito compridas, nada parecidas com os tocos ruídos de ontem a noite. Levo minha mão até o rosto, parando alguns centímetros. Elas parecem perfeitas, meus dedos parecem mais longos e minha mão mais magra.

O garoto me observa. — Obrigada! – dou um sorriso e saio em direção a minha cabana. Tranco a porta e sento na cadeira.

Ainda confusa, estico meus braços e vejo que estão mais magros. Meus pés também e minhas pernas parecem mais esguias. Passo a mão pelo corpo, sinto coisas que não estavam ali ontem: coxas mais grossas e definidas, um quadril mais largo, uma barriga reta com os músculos se projetando delicadamente, uma cintura fina demais para uma adolescente, peitos grandes demais, uma clavícula muito marcada e ombros magros. Solto o cabelo do coque apertado e ele deixou de estar na altura dos ombros e estava quase no quadril. Corro para o banheiro e dou de cara comigo mesma no espelho. Eu cresci, literalmente. Meu rosto está magro, mas ainda tenho uma sombra de bochechas. Meus olhos parecem mais claros ainda, meu cabelo se tornou mais dourado, meus lábios estão cheios e tenho olheiras profundas. Tenho 18 anos. Continuo me olhando por alguns minutos, apesar de não ter crescido em altura, meu corpo deixou de ser de uma adolescente e ganhou forma. Isso é normal?

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Estou tendo algo parecido com um ataque de ansiedade. Choro, encolhida, confusa com essa mudança, mas entendendo-a. Eu tenho 18 anos, obviamente meu corpo voltaria a crescer, mas não esperava que tão rápido. A ideia do crescimento me faz acreditar na possibilidade de um poder maior. O sonho, meu corpo... Tudo me faz acreditar que preciso continuar tentando... Tenho que trazer Dois e Três de volta. Preciso chegar até o abrigo em San Diego.

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Pego uma maça da cesta que Gael deixou na minha porta na noite anterior. Fico surpresa ao perceber que estou faminta. Sento no vão, rezo para Pittacus, e tento manter a calma. Já se passarem 3 dias desde que cheguei aqui. Continuo recebendo cestas com comida, mas não sei por quanto tempo mais posso ficar aqui. Receosa, me curvo sobre Três, apertando as barras da maca, e aperto seus lábios contra os meus. Sinto um calor se espalhar pelo meu peito e um choque repentino. Me afasto, surpresa, porque não era isso que esperava. Que porra foi essa? Fico de joelhos e me viro para Dois. Ajeito seu cabelo avermelhado. Ela parece tão... Inocente. A ansiedade me preenche novamente quando nossos lábios se tocam, e percebo que estou chorando de tristeza e medo. As mesmas sensações se repetem, mas me surpreendo mesmo assim. Sento novamente no vão, segurando suas mãos. Formamos uma corrente loriena, nunca houve tanta esperança e sofrimento num mesmo lugar.

Continuo deitada aqui, alisando suas mãos. O cansaço chega no fim da noite enquanto escuto a música country sendo desligada e as vozes cessando do lado de fora. Sinto que corri vários quilômetros sem pausa. Estou tremendo um pouco, apesar do vento quente. Me cubro com minha toalha, já que os cobertores que me foram presenteados uso em Três e Dois. Quando meus olhos se fecham, nossas mãos ainda estão entrelaçadas.


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