Inconfidentes escrita por Leticia Cavaliera


Capítulo 12
Não se mente para uma mentirosa...


Notas iniciais do capítulo

Desculpem MESMO a demora, espero que gostem ♥



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A semana passou rápido, com Sol conquistando a confiança e admiração de cada um dos garotos do time. Todos os dias sentava com eles no intervalo, dava opiniões e se fazia tão presente quanto possível. Jonathan achou incrível a habilidade dela em conversar sobre qualquer coisa, fazer piadas, rir – e que beleza de sorriso –, ainda assim sentia uma intensa necessidade de pedir-lhe desculpas por ter tentado beija-la e, é claro, ainda tinha a aposta, certo? Ele tinha que lembrar da aposta. 

Naquela sexta-feira pretendia falar com ela na hora da saída.

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Ainda dentro da escola, Sol havia sido parada por Anna e Cristina, que tentavam entender como e por que a colega tinha parado de falar com elas do nada e agora apenas andava com os garotos que, até pouco tempo antes, demonstrava ter tanto asco.

— Quer dizer, eu até entendo que deva ser legal ter essa atenção e tal, mas você não é como eles, é como a gente. — Cristina falou e Sol se controlou para não revirar os olhos.

— Eles nem mesmo fazem seu estilo e não faz nem uma semana que falou um monte de coisas sobre eles, aí sai com o Nathan e agora some. — Anna suspirou e Sol também o fez, estava cansada daquilo.

— Olha, quando eu cheguei nessa escola eu me sentava sozinha, certo? Não era por que não conseguia fazer amigos, era por que eu não queria ter amigos. Vocês sentaram do meu lado e puxaram assunto, vocês me chamaram pra sentar com vocês no intervalo, sem eu pedir, vocês começaram a me considerar uma amiga. — O tom de Sol era educado e delicado, mas sem sentimentos, ela suspirou novamente. — Eu não acho que deva pedir desculpas ou dar explicações, porque eu não tenho culpa se vocês me idealizaram de uma forma diferente do que eu sou.

Cristina fechou a cara e saiu batendo o pé, sem dizer mais nada. Sol sentiu vontade de sentir algo naquele momento, alguma tristeza ou algo do tipo, mas não, ela não sentiu nada, notou por alto que o cabelo loiro e crespo da loira estava descuidado. Anna, que ainda estava ali, olhava Cristina sair com raiva e balançava a cabeça levemente.

— Eu não entendo. Eu... Nós... — A menina encarou os olhos escuros de Sol, procurando por algo ali.

— Anna, escuta, não era minha intenção magoar ninguém, mas vocês me pintaram como queriam que eu fosse, e vocês queriam que eu fosse como vocês, mas, olha, a gente gostar muito de ler, escutar músicas antigas e falar sobre coisas que a maioria das pessoas nem conhece não nos faz ter um vínculo especial. — Sol deu de ombros e suspirou. — E os meninos, o que eu disse sobre eles é verdade, mas eu sei lidar com isso. Aquilo não era um julgamento, era uma constatação. Vocês podem vir conversar comigo se quiserem, eu só não quero ser cobrada a assumir um papel que não me cabe só por que vocês achavam que eu era diferente. — Ela explicou e tocou no ombro de Anna. — Entenda, eu não me afastei de vocês, porque eu nunca estive presente de verdade, porque eu nunca vou estar presente de verdade aqui, nem com eles, nem com ninguém. Você consegue entender isso?

Ela demorou um tempo para falar, mas por fim anuiu com a cabeça. — Sim, eu... sim, na verdade eu te entendo. Eu... desculpe, você tem razão, não temos direito de cobrar nada de você, não sei se Cristina vai entender isso, mas eu entendo. — Anna sorriu e balançou a cabeça, ainda parecia um pouco magoada. — É só que a gente assumiu que, sabe, você era mais como a gente, já que nunca discordava. Ok, nunca concordava também... acho que a gente só quis se convencer que tinha mais gente como a gente.

— Anna, pra falar a verdade, eu sou como vocês, a coisa aqui é que eu não sou como vocês, eu também sou outras coisas. — Sol sorriu e fez um gesto com a mão, para que elas começassem a andar para a saída, depois de alguns minutos resolveu dizer algo. — Ah, eu descobri que Jonathan, Nathan e Carlos gostam de ler.

— Sério?! — Os lindos olhos de Anna brilharam. — E gostam do que?

— De tudo, menos romance. — Sol sorriu e mexeu as sobrancelhas de forma sugestiva, a menina a seu lado riu.

— Qualquer dia me apresenta eles. — Pediu no mesmo tom.

— Ah, apresento sim. — Sol sorriu e, quando chegaram ao portão, se despediram. A casa de Anna ficava do lado oposto à casa de Sol.

A morena começou a andar, evitando pisar nas linhas da calçada. Ela estava leve naquele dia, não sabia o porquê, talvez falar aquelas coisas para Anna e Cristina tivesse lhe feito bem, ter que lidar com pessoas cansava Sol. Ainda assim sorria para todas as pessoas na rua, a maioria sorria de volta e isso a deixava contente, era algo bonito de se ver. Estava distraída e por isso não percebeu de primeira o carro de Jonathan a seguindo. Quando olhou para o lado viu que o loiro sorria para ela.

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Jonathan ia chamar Sol assim que a viu saindo da escola, porém, quando deu por si, estava seguindo a menina. Notou ela pular as linhas da calçada, vendo-a andar pensativa e sorrir para as pessoas na rua de uma forma tão gentil que notou que aquele era um sorriso de verdade dela, natural, sem nenhuma obrigação ou intuito, Sol estava apenas sorrindo e as pessoas sorriam de volta, e, sem perceber, ele estava sorrindo também. Sorrindo pelo sorriso dela, que nem mesmo era para ele. Bem, isso até ela o notar ali.

— Hm, Jonny, você percebe o quanto isso é estranho? — Ela perguntou, com as sobrancelhas arqueadas.

— Ah, eu... Hm. Desculpe, eu ia chamar assim que te vi sair, mas você tava tão distraída que me senti um intruso. — Explicou de forma que parecesse menos um stalker.

— Tudo bem. — A menina deu de ombros, juntando as mãos da frente do corpo. — O que queria falar comigo?

— Ah, bem, posso te dar carona? Por que aí conversamos enquanto dirijo. — O loiro falou e olhou para frente. Nem mesmo sabia como começar o assunto, só sabia que precisava falar.

— Ah, ok, sem problemas. Apesar de eu gostar de andar. — Sol abriu a porta do carro e passou o cinto de segurança. — Você ainda lembra onde eu moro?

— Lembro. — Jonny dirigia muito devagar.

Ele procurava uma forma de começar o assunto, de iniciar suas desculpas. Parecia gravado na parte interna de suas pálpebras a forma como Sol se afastou naquela noite, a expressão nos olhos da menina, que normalmente era espertinha, irônica ou pensativa, era de incredulidade, quase nojo, durou apenas alguns segundos antes de voltar ao seu normal, mas Jonathan notou. E aquela imagem dela o angustiava de formas que ele nem sabia explicar, mas também o deixava contente por descobrir que Sol tinha, no fundo, reações humanas.

— Acho que eu chegaria mais rápido se fosse a pé. — Sol brincou e o garoto relaxou um pouco.

— Queria pedir desculpas pela festa. Eu estava bêbado, mesmo que isso não seja desculpa, e eu sei que não é desculpa, ok? — Jonathan coçou a bochecha e tentou falar mais devagar. — Mas eu preciso pedir desculpas. Eu... sei lá, cara, me deixei levar pelo momento, achei que

— Eu estava dando mole. — A menina concluiu com o mesmo tom de quem diz que vai chover.

— Não. — Jonny fez uma careta de descaso e olhou pra frente, aquilo nem mesmo tinha passado em sua cabeça. — Não, acho que eu achei que, ah, sei lá, nem eu sei o que achei, eu só sei que sei que foi errado. — Bufou. — E não tava me sentindo bem com isso. Sei lá, cara, tava me sentindo um idiota. — Ele explicou e se lamentou mentalmente por isso, parecia só ficar pior.

Sol ficou calada e, quando parou no sinal, o garoto olhou para ela, que olhava para ele, pensativa. Seus olhos pareciam tão escuros e fundos que podiam ser confundidos com o fundo de um poço, não se surpreenderia se Samara começasse a sair por ali. Mas não, não era tão simples, os olhos dela eram dois buracos negros surgindo ali, no rosto de Sol e, tais quais um buraco negro, sugavam toda matéria por perto e absorviam a luz sem refleti-la. Sugavam ele próprio para dentro da escuridão. Para dentro do desconhecido.

Uma buzina alta e irritante o tirou de seu transe. Jonathan, Jonathan, Jonathan, não seja idiota. O garoto olhou para frente e voltou a dirigir, ficando a cada segundo mais tenso pelo silêncio dela. De alguma forma ele sentiu que sorria, olhou para o lado apenas para constatar que estava certo.

— Você foi idiota, mas não precisa se sentir mal, eu também deveria ter deixado os limites mais claros, a culpa não é só sua e você nem chegou a forçar nada, só arriscou um beijo e não conseguiu, não precisa se martirizar. — Sol soltou uma risada de desprezo às desculpas dele.

O loiro soltou uma respiração e inspirou profundamente, se sentia tão melhor e mais leve que se achou estúpido. Sol não comentou mais nada e ele não sabia bem o que falar, então ligou o som. Assim que apertou o botão, Sol tapou os ouvidos e Jonathan diminuiu o volume com uma careta, um sertanejo universitário tinha sido colocado no máximo, provavelmente brincadeira de Matheus.

— Com raiva dos seus ouvidos pra colocar música nesse volume? — Sol brincou.

— Deve ter sido brincadeira do Matheus, sempre que ele entra no carro coloca um CD desses, não que eu não goste, na verdade escuto de tudo, só depende do momento, mas ele quase sempre escuta sertanejo, então... — Deu e ombros, olhando para a frente. — Se quiser escolhe um CD aí, tem um monte no porta-luvas.

— Ah, ok. — No mesmo instante Sol abriu o porta-luvas e Jonathan lembrou tarde demais que o livro da semana estava ali, como na semana anterior, Sol olhou o livro, Elogio À Loucura, e sorriu. — Trabalho de literatura? — Jonathan deu de ombros, mas a menina apenas pôs o livro de lado e tirou os CDs, até se decidir por um instrumental do Pink Floyd, mostrou a capa para o loiro, que sorriu.

— Esse é bom, tranquilizador, eu diria.

— Nunca escutei Pink Floyd. — A morena comentou, risonha.

—Sério?!

— Sério. — Ela deu de ombros. — Tipo, sei lá, sabe? Parece ser bom, mas eu nunca parei um dia e falei "ok, hoje vou escutar Pink Floyd". — Ela riu e colocou o CD no som. — Mas parece que esse dia é hoje.

— Você tem que escutar as letras, são muito boas.

— Posso procurar depois, se eu gostar do som.

— Você vai gostar. — Jonathan afirmou e a menina riu.

— E você não pode ter certeza disso.

A resposta dele foi rir, apontar para o CD player e colocar um dedo em frente aos lábios pedindo silêncio. Percebeu que Sol iria falar algo, mas desistiu e apenas escutou, Jonny colocou na música três, Another Brick In The Wall, explicando que aquela era uma de suas favoritas, Sol assentiu e fechou os olhos, concentrada.

Jonathan, enquanto dirigia, aproveitava aquele momento para poder olha-la de esguelha. Isso era preocupante, ele sabia, havia passado muito tempo dos últimos dias apenas a observando, o modo como falava, andava, como ria, a forma que arrumava os cabelos e como ficava quando escutava algo que lhe interessava, ou mesmo a olhava apenas para imaginar o que ela estaria pensando, Jonny sabia o quanto essa atenção toda era perigosa e, mesmo assim, não queria parar de olha-la.

Ele se irritou com a própria burrice e olhou para frente. A aposta, Jonathan, não seja idiota, é ela quem tem que se apaixonar por você, não você por ela, sua mente lhe lembrou, Eu sei, não esqueci, mas é... complicado, respondeu. Se concentrou no transito, na música, qualquer coisa era melhor do que ficar pensando em Sol.

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Jonny havia sido sincero em suas desculpas, realmente sincero, o que deixou a menina intrigada, afinal, para alguém que estava no meio de uma aposta de "vamos ver quem consegue fazer a Sol se apaixonar primeiro, ipi, ipi, uha!" se desculpar por causa de um quase beijo "forçado" era contraditório, ainda mais pelo fato de ele ter parado na hora quando Sol se afastou, não é como se ele tivesse abusado dela ou qualquer coisa assim.

Apesar de tudo, foi uma atitude legal da parte dele, saber também que ele não estava a culpando com frases do tipo "se você não tivesse dançado comigo isso não teria acontecido", ou "ah, mas você também estava pedindo", mostrava que, mesmo com a aposta – que era ridícula e infantil – o loiro não era um total imbecil, apenas meio.

Naquele momento Sol sentiu uma pequena e incômoda vontade de contar para Jonny que sabia da aposta e que, realmente, não ligava, ela só não queria ser enganada, só não queria que mentissem. Sol odiava mentiras, apesar de ser uma mentirosa por omissão – hipocrisia de sua parte, ela sabia –, isso não mudava o fato de que odiava mentiras.

Continuar com aquele jogo, com a contra aposta que tinha sido feita com Nathan, não faria bem a ela em vários níveis. Sol sabia que ficaria viciada no jogo até vencer, assim como os gamers que passavam madrugadas jogando quando um jogo novo é lançado até zera-lo, pior, a contra aposta a igualava a eles e trazia de volta a Sol de antes, o que era o objetivo oposto do motivo pelo qual a menina se mudou. A desviava do papel tão bem estruturado que tinha construído para si mesma.

Você só precisa se controlar, não extrapole, não passe da barreira, sua consciência aconselhou.

Eu sei, só preciso dar uma pequena lição de empatia, só, nada mais, Sol relembrou a si mesma.

Isso, apenas uma lição, mostre pra eles que eles não são os donos do mundo, mas não jogue.

Ah, não seja ridícula, você já está jogando e é o mínimo que eles merecem por serem otários, outra parte de sua mente reclamou.

Não vou, não faço mais essas coisas, Sol rebateu.

Até parece.

Maluca, maluca, maluca, maluca.

Sol riu de si mesma e voltou a se concentrar na música, que já estava quase no fim. A melodia era muito boa, apesar dela ter a impressão que estava suavizada, porque para uma banda de rock estava calma demais. Sim, com certeza ela procuraria as letras depois, Jonathan tinha razão.

Estava na metade de outra música quando ela sentiu o carro parar, tinha esquecido da presença de Jonathan e que estava num carro indo para cara. Bufou uma risada para si mesma e abriu os olhos, vendo que Jonny tinha um sorriso engraçado no rosto enquanto a olhava, Sol baixou o olhar para as mãos e depois para sua casa. Ela estava com fome e não estava nem aí se fosse comer o almoço gelado, já era quase uma da tarde.

— Obrigada e, sério, esquece aquela história de sábado. — Falou, voltando a olhar nos olhos dele.

— Beleza. — Jonathan sorriu, Sol tirou o cinto e se virou para sair, Jonny tocou no braço dela ao mesmo tempo em que ela abriu a porta, o calor do lado de fora colidiu com o frio de dentro e fez com que a garota se arrepiasse, ela olhou para a mão de Jonny ali e o encarou com as sobrancelhas erguidas. — Ah, você quer, hm, você já fez trilha?

— Nunca tive a oportunidade. — Sol deixou a expressão neutra, os olhos cor de mel dele tinham mudado, estavam sedutores, aquele não era mais Jonathan, O Arrependido, agora era Jonathan, O Apostador. A menina suspirou mentalmente, pensando que, se ele não estivesse sendo otário, eles poderiam chegar a ser amigos.

— Domingo vai ter trilha com escalada, se quiser ir... — Jonathan deixou o convite no ar e Sol fingiu pensar, ela estava com raiva, mas gostava, era melhor que o vazio. O vazio a fazia dizer "foda-se" para tudo, raiva a deixava pronta para fazer as coisas que seu lado sensato não gostava.

— Quem vai?

— Que você conhece acho que só eu, o resto do pessoal é do grupo de trilha, tem mais umas pessoas da escola, mas ninguém do nosso ano. — Ele deu de ombros e sorriu novamente, encostando a cabeça no banco e olhando para ela de lado.

— Ah, acho que seria divertido, gosto de tentar coisas novas. — Sol deu um doce sorriso de canto, Jonathan ainda não sabia, mas Sol, A Jogadora, estava colocando suas fichas na mesa, e essa Sol fez uma careta leve e olhou para baixo, antes de encara-lo de novo, jogando toda a atenção de seu olhar escuro nele. — O problema é que infelizmente estarei ocupada esse fim de semana, mas, sério, quando tiver de novo, me avisa.

O sorriso de Jonny caiu de forma quase imperceptível e seu olhar se tornou menos prepotente, o que fez o humor de Sol se acalmar um pouco. Ele assentiu e a menina sorriu. Quando ela já estava do lado de fora, Jonathan acenou, dando partida no carro, mas Sol voltou e bateu no vidro, pedindo que ele baixasse.

— Vai ter RPG hoje, se quiser ir, pode jogar dessa vez. É divertido — A morena sorriu.

— De noite que nem da outra vez? — Sol anuiu. — Ok, se quiser passo aqui pra te pegar.

— Não precisa, os meninos vêm me pegar. — Jonathan assentiu e Sol se afastou, mas voltou de novo. — À propósito, eu adorei as músicas, vou procurar as letras.

— Eu disse. — Jonny sorriu e ela revirou os olhos rindo.

— Tchau, Jonathan. — A garota se afastou e observou ele indo embora, pensando que, se não fosse aquela situação ridícula, eles poderiam realmente ser bons amigos.

.

Sol entrou em casa chutando os sapatos para longe, esticou os dedos sobre o piso gelado e sentiu um alívio momentâneo. Andou pela casa vazia até a cozinha, encontrou um prato com sua comida na geladeira, tirou o papel e colocou no micro-ondas, sentou-se enquanto esperava e começou a pensar.

O ano anterior ainda não tinha saído de sua mente, partes dele meio nubladas, partes muito nítidas. Não era arrependimento, mas algumas vezes ela parava para pensar no que teria acontecido se as coisas não tivessem sido daquele jeito, como teria sido? Provavelmente nesse horário ela estaria na casa de David ou Elena, talvez estivessem passeando de carro ou algo assim, rindo e sendo apenas adolescentes idiotas. Era bom ser idiota às vezes.

O que lhe lembrou dos garotos do time de futebol. Como você ousa julga-los se fazia a mesma coisa, Sol?, a menina refletiu sobre aquilo e suspirou, apesar de nunca ter tentado fazer alguém se apaixonar, haviam outras brincadeiras talvez tão perigosas quanto. Hipócrita. Suspirou novamente e, ao olhar para o micro-ondas, reparou que só faltava três segundos para sua comida ficar pronta. A menina arregalou os olhos e correu até lá, apertando para cancelar no último segundo. Respirou aliviada, era um desafio pessoal nunca deixar o micro-ondas chegar no zero.

Sentou-se para comer, mas parou por três segundos, o silêncio comprimia seus ouvidos, sua cabeça, seu cérebro, parecia tão alto que lhe dava agonia. Pegou seu celular e colocou em sua playlist favorita, mas, pensando melhor, ela sorriu e colocou no CD do Pink Floyd que havia escutado no carro, dessa vez com as letras. Sentou-se de novo, balançando a cabeça no ritmo da música e começou a comer.

— Onde você estava? — Elena perguntou quando Sol voltou para a mesa depois de dizer a Tales que precisava dar sinal de vida, a morena notou que sua amiga já tinha começado a beber.

— Andando, pensando na vida, aproveitando a festa. — Sol deu de ombros e sorriu.

Sei. — David falou com ironia, mas, apesar de seu estado alcoolizado, logo ficou sério. — Com a cara que o Pedro voltou despois de ir te procurar, tenho certeza que colhendo flores pra vovozinha você não tava. — Algo no rosto de David demonstrava certo incômodo, o que Sol não entendeu, ele nunca tinha sido do tipo que ligava para o que ela fazia ou com quem ficava, era certo que nos últimos tempos Júpiter se mostrava mais presente na vida dela, mas ainda assim.

— Eu nunca disse pra ele que era monogâmica com meus ficantes, se ele ficou chateado o problema não é meu, eu avisei desde o começo como sou. — A menina deu de ombros de novo, sentando-se ao lado de Elena e na frente de David. — Onde está o resto do pessoal?

— Dançando. — Então Sol notou que eles estavam suados e corados, provavelmente estavam dançando também. — Querem que eu pegue algo pra vocês? Tô morrendo de sede, então vou lá pegar, aproveitem enquanto estou sendo legal. — Júpiter ofereceu e Sol sorriu para ele, tanto ela quando a loira pediram água.

— Então, ficou com quem? — Elena perguntou sem entusiasmo, olhando para a "pista de dança".

— Não sei o nome, é de outra escola. — A morena mentiu sem nem planejar, as palavras saíram com tanta naturalidade quanto se fossem verdades.

— Ah, essa é minha garota, sua pegadora. — As duas começaram a rir, mas Sol parou abruptamente ao ver quem chegava na festa deles, ficando séria de imediato.

— Ninguém me disse que ela vinha.

— Ah, droga! — Vênus esfregou as mãos nas coxas com nervosismo. — Droga, Sol, eu não sabia que ela vinha.

— Não, não... Tudo bem, já faz um ano e meio, né? — A morena ficou nervosa e olhou para a loira ao seu lado com uma confiança que não tinha por dentro. — Eu já passei a página da minha amizade, ou ex amizade, com a Natália, é só... Estranho encontrar com ela depois de tanto silêncio, dor e decepção.

— É claro que é. — Elena concordou, hesitante.

Sol não conseguiu impedir que um mal-estar lhe subisse ao peito. Natália era sua melhor amiga, se conheceram com três anos de idade no maternal, foram treze anos de amizade antes de tudo acabar como se não tivesse mais importância que perder a novela. E tudo por total e exclusiva culpa de Sol, ela sabia, tinha a mais plena consciência de sua culpa, mas nem isso fazia com que aceitasse melhor a situação em que se encontravam. Nem isso taparia a falta que Natália lhe fazia às vezes e as boas intenções de Sol nunca seriam o suficiente para fazer com que Natália a perdoasse por ser uma idiota.

— Você nunca me contou porque pararam de se falar. — Vênus usou o tom de quem não quer nada, mas a morena viu o brilho de curiosidade nos olhos castanho-esverdeados da amiga.

— É verdade. — Sol concordou, sem vontade de contar toda a história. — Você viu a Luana? — Mudou de assunto enquanto tirava as botas de cano baixo.

— Na verdade não, ela já deveria ter chegado, deve estar com a chata da Patrícia. Sabe, eu não entendo como alguém pode andar com a gente e com a Patrícia ao mesmo tempo. — A loira riu e Sol acompanhou.

— Bem, tem gosto pra tudo, né? — Sol preferia não dizer, mas achava Patrícia nojenta, com todas aquelas bolinhas na pele. Tirou as meias, enfiou dentro da bota e a deixou de lado.

— Sol, ficar descalça aqui é loucura, o chão é de terra vermelha, seu pé vai ficar todo sujo. — Elena avisou e a morena apenas riu de novo.

— Tudo bem, não vou calçar os sapatos de novo mesmo...

A morena olhou uma vez mais na direção de onde estava sua ex melhor amiga, suspirou e passou os olhos pelo local, decidindo que era melhor ignorar a presença de Natália. Vendo Tales não muito distante, no mesmo local que estava antes de ela ir buscar bebida com ele, uma curiosidade se assomou em sua mente.

— Porque você não ficou com o Tales? Ele me falou que te chamou pra sair, mas você recusou. — Elena pareceu incomodada, mas não de todo surpresa, com a informação.

— Ele te contou, foi? — Sol apenas assentiu. — É, bem, sei lá, sabe? Eu só fico nervosa perto dele, e eu quero, quero muito dizer sim, mas não consigo. — Sol olhou para as nuvens, sem saber ao certo o que dizer. — Ah, eu gosto tanto do Tales.

— Ele gosta de você também. — A morena falou e fez uma anotação mental de nunca mais ficar com a Tales, não se sentia culpada e nem achava isso nada demais, mas sabia como Elena era e preferia evitar conflitos. — Devia falar com ele, tipo, agora.

— Você acha?

— Tenho certeza, agora vai logo. — Sol falava enquanto dava leves empurrões em sua amiga. — Vai, vai, vai, vai...

— OK, ok. — Elena respirou fundo, levantou e começou a andar em direção ao garoto.

Dois ou três minutos depois David apareceu com as águas, entregando uma para Sol e se sentando ao seu lado. Ele parecia ainda mais bêbado do que quando tinha saído e os dois ficaram algum tempo calados, apenas olhando as pessoas se divertindo.

— Onde tá a Vênus? — David quebrou o silêncio depois de algum tempo.

— Foi atrás do Tales, depois de recusar ele mais de três vezes. — A menina sorriu.

— Mentira. Quem conseguiu fazer ela criar coragem?

— Uma poderosa força da natureza, dotada da habilidade de fazer as pessoas fazerem justamente aquilo que não conseguem fazer sem ela. — David olhou para Sol e ergueu as sobrancelhas. — O álcool.

Júpiter riu entre goles. — Eu achava que ia falar que era você.

— Ah, eu também, mas o álcool teve mais influência nesse caso. — Os dois riram, mas David ficou sério.

— Sol, eu... — O garoto começou, mas hesitou em continuar.

— Você... — Sol incentivou, ficando tensa com o tom e a expressão corporal do moreno.

— Eu queria te falar algo e perguntar algo que pode mudar bastante coisa na nossa amizade. — O estômago de sol apertou, mas nada ela deixou transparecer em seu rosto e David olhava para o outro lado.

— Fala logo. — Mandou a menina, David respirou fundo e a olhou nos olhos antes de continuar. 

...

 


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Notas finais do capítulo

Bem, gente, espero que tenham gostado, estou sentindo que o próximo capítulo vai sair rapidinho, só um pressentimento hahaha

Alguma teoria já está se formando? Me contem tudo ♥

Beijos de Luz



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