O vento gelado da noite batia no rosto de Thomas e agitava seus cabelos castanhos que já estavam um pouco compridos. Seu coração batia forte e rápido em seu peito, em partes devido a recente volta de tirolesa e também por estar seguindo uma figura vestida de preto com cabelos loiros. Para a sua sorte, com a iniciação da Audácia, aprendeu a ser mais silencioso ao andar, mas isso não quer disser que ele não tropeçava nas rachaduras das ruas ou esbarrava em alguma coisa e provocava algum tipo de ruído, que no silêncio da noite parecia mais um estrondo de uma bomba explodindo. Claro que isso fazia com que a loira, que andava na sua frente, virasse para trás para ver o que estava acontecendo.

Na maioria das vezes, Thomas era mais rápido e se escondia nas sombras dos edifícios iluminados pela lua. A medida que Kate se aproximava de seu destino mais a paisagem ficava mais familiar para Thomas mesmo com a pouca iluminação causada pela luz da lua.

Quando Kate chegou ao seu destino, uma praça perto do setor residencial da Erudição, viu uma figura parada vestido com o azul da Erudição. Kate começou se aproximar da figura com passadas confiantes, Thomas decidiu ficar mais afastado dos dois para não levantar suspeitas. Os dois trocaram algumas palavras, de onde Thomas estava, dava para perceber que a figura era ninguém mais que Caleb Prior e o mesmo carregava um semblante surpreso.

Thomas conhecia Caleb, quantas vezes ele foi jantar na casa de sua família para discutir coisas sobre o conselho da Erudição. Mas o que ele queria com Kate naquele momento? Lembrou da conversa que ele teve entre Nicholas e Charlotte antes de entrar na sala de simulação que alguns membros da Audácia estavam especulando que Norton e Kate eram parentes. Thomas já aprendeu que as notícias correm rápido na Audácia, sendo verdadeiras ou não. Naquela hora que ouviu aquela história, achou que tivesse ouvido a maior mentira de sua vida mas talvez aquela história não seja tão mentira assim.

Caleb começou a andar para fora da praça sendo seguido por Kate e assim Thomas também os seguiu. Andaram alguns quarteirões e pararam em frente de uma casa com a faixada idêntica as outras do setor residencial. Thomas não tinha dúvidas que aquela casa era de Caleb e também aquela rua ficava a sua antiga residência onde morou por 16 anos. Os dois entraram na casa de Caleb e Thomas foi para a lateral da casa onde havia uma janela que dava para a sala de estar.

Thomas ficou ali, espionando a líder de sua Facção e o membro do conselho de sua antiga Facção. Ele não conseguia ouvir os dois lá dentro pois as casas da Erudição tinham um ótimo isolamento acústico. Então ele ficou lá por um tempo, mas cansou de vê-los conversar.

A rua estava escura, apesar de ter algumas casas com as luzes ainda acessas. Assim como a vida na Audácia, a da Erudição nunca para também. Entre as casas estava a sua antiga residência. Thomas começou se aproximar da casa, por esse simples ato, estava quebrando inúmeras regras de sua sociedade. As luzes da sala estavam acessas, isso indicava que seus pais estavam ainda na sala.

Thomas, assim como fez na casa de Caleb, ele foi para a lateral da casa onde tinha uma janela que dava para sala. Seus pais deviam estar no cômodo. Isso o fez lembrar da época que ainda era um membro da Erudição, essa hora em sua antiga rotina, deveria estar fazendo algum relatório sobre algum experimento que fez na aula de Química ou simplesmente amaldiçoando mentalmente todos os seus professores de cálculo por manda-lo fazer aquelas lições quilométricas e tão desnecessárias para ele. Thomas tinha um amor dela química mas um ódio profundo pelo cálculo.

A sala estava vazia mas o cômodo não está como era quando ele ainda morava na casa. Os móveis estavam arrastados e havia uma espécie de uma bancada no centro da sala e nela havia vários Becker, tubos de ensaios, provetas entre outras coisas que podiam ser encontradas em qualquer laboratório da Erudição. Nos tubos de ensaios haviam amostras de vários soros, os quais Thomas conhecia muito bem. Mas um deles chamou a sua atenção, sua coloração era preta e parecia ser mais denso que os outros. Em toda sua vida na Erudição, ele nunca tinha visto esse soro, o soro da Morte. Geralmente esse soro ficava quadrado em um cofre em algum lugar bem vigiado do complexo. O que os seus pais estavam fazendo com aqueles soros?

Veio uma lembrança em sua mente. Thomas devia ter seus 14 anos, estava em seu quarto pesquisando sobre a combustão de alguns elementos quando sua mãe entrou. Ela estava com uma feição feliz no rosto, então ela senta ao seu lado na cama. Sua mãe quando não estava nas reuniões do conselho ela era chefe do laboratório de desenvolvimento dos soros. Thomas aprendeu gostar de química com ela e assim também a gostar de pesquisar sobre os soros.

"- Tom, tenho uma novidade para você! - Fala ela com uma entonação alegre

"- E qual seria? - Pergunta ele

"- Eu sei que você gosta de estudar química e entre outras matérias relacionadas ao estudos dos soros, então hoje, conversando com Norton, ele disse que gostaria que você me auxiliasse no laboratório! - Fala ela

"- Eu adoraria! Mas achava que sua equipe já estava saturada - Fala o garoto

"- Sim! Mas abrimos algumas vagas para podermos iniciarmos um novo projeto - Fala a mãe

"- E o que seria esse projeto? - Fala o garoto

"- Existem algumas pessoas que são 'imunes' aos soros, então precisamos incrementa los para que elas não sejam mais imunes! E também para podermos indentifica las mais rápido - Explica a mãe

Depois dessa conversa, Thomas se lembra de ter ido algumas vezes ao laboratório especial do desenvolvimento dos soros. As pesquisas estavam indo bem, bem até de mais, Norton estava satisfeito com os resultados. Então alguns meses antes de Thomas completar 16 anos, Norton o chamou para conversar. Ele disse para Thomas que se ele continuasse a pertencer a Erudição, ele seria o novo chefe do laboratório. Thomas, na época, não tinha feito seu Teste de Aptidão mas havia um certo desejo de deixar a Facção mas com a proposta de Norton esse desejo quase desapareceu.

Nos meses que se passaram até a chegada do dia do Teste, Thomas estava sendo o "chefe" do laboratório mas é claro, sua mãe ainda não tinha abandonado o posto. Ela só abandonaria ele daqui a muito tempo, não se tornava chefe de um laboratório tão importante como aquele do dia para noite. Thomas estava mais para um estagiário.

Uma semana antes do Teste, o desejo antigo de Thomas de se transferir era quase nulo. Foi nesse dia que o desejo se extinguiu mas também foi o que o fez acender novamente. Algumas semanas antes, Thomas tinha sido informado sobre a existência de cinco indivíduos "especiais" e eles estavam marcados com um código. Norton não tinha nenhum conhecimento sobre eles, então para ajudar o líder, Thomas tentou fazer um soro que ajudasse a achar esses indivíduos. Desde então ele vinha trabalhando naquele soro.

Se ele conseguiu? Pode se disser que sim! Mas o soro inventado por ele quando aplicado na pessoa certa iria mandar um sinal para a Erudição por meio de ondas de rádio e no estante iria matar esse indivíduo. Afinal, Norton queria ver esses cinco mortos. Mas se fosse aplicado em uma pessoa "normal" não teria efeito nenhum. O problema estava se fosse aplicado em um Divergente, não em um DVs como esses cinco eram chamados, a pessoa iria entrar em um estado de extrema loucura e momentos mais tarde perderia a sua "liberdade humana". Ela não seria mais um ser livre que não precisa de outros para falar o que precisa ser feito mas um ser totalmente subordinado. Thomas havia feito a arma que a Erudição precisava.

Naquele dia, após testar seu soro em um Divergente, percebeu o que havia feito. Destruiu tudo, literalmente. Desde os mais simples esboços até os mais complexos. Queimou todos. As tentativas falhas também foram destruídas e junto com tudo isso o produto final bem sucedido. Só faltava queimar todo o laboratório. Thomas não queria que ninguém fizesse aquele soro nem o incrementasse.

Após seu Teste de Aptidão, ele sabia o que queria. Deixar a Erudição e começar do zero em outra Facção. Audácia, para ele, sempre foi um sonho. Cresceu praticamente vendo as crianças vestidas de preto correndo e sendo livres, e sempre tinha vontade de ser como elas. Thomas não pode ter feito escolha melhor do que ter se transferido na Audácia. Nela ele sabia que tinha amigos verdadeiros e seu rolo com a sua líder, Kate. De certa forma entrar para a Audácia, ajudou ele esquecer da arma que ele fez.

Decidiu sair da frente da janela logo antes que alguém dentro da casa o visse. Com passos rápidos, saiu da lateral da casa e foi caminhando do mesmo modo pela rua. Passando pela casa de Caleb Prior, nem se deu o luxo de olhar para ver se Kate ainda estivesse lá dentro.

Chegando ao Complexo da Audácia, Thomas não quis ir para o dormitório. Daqui poucas horas teria que acordar para ir para a iniciação. Então decidiu ficar no Fosso mesmo, que por uma vez na vida, estava vazio. Alguns momentos depois, a líder da Audácia, que tem o estranho hábito de sair pelas ruas de Chicago de madrugada, chegou. Seus olhos azuis escuros foram direto para Thomas, que era o único no Fosso.

– Por que me seguiu até o Complexo da Erudição? - Pergunta a loira com um olhar acusatório

– Eu não te segui - Mente o moreno mesmo sabendo que era péssimo em contar mentiras, especialmente para a líder da Audácia

– Eu já disse que você é um péssimo mentiroso? - Pergunta ela

– Não exatamente com essas palavras mas sim! - responde o garoto com um tom de brincadeira e assim conseguiu tirar um sorriso da loira

– O que você viu lá? - Pergunta ela

– Não muita coisa e nem ouvi nada! Mas de onde conhece Caleb Prior?

– É uma longa história - Fala ela

– Tenho tempo para longas histórias! - Fala ele

– Você não deveria ir dormir? - Pergunta ela

– Não e presumo que dormir não estava em seus planos! - Fala ele

– Não mesmo! Vêm comigo - Fala ela entrelaçando as suas mãos com as dele

Por mais que a cabeça de Thomas estivesse cheia, o simples fato de suas mãos estarem entrelaçadas com as de Kate, isso o deixava com uma sensação de paz. O mesmo para a garota. Eles foram até o apartamento da Líder e ficaram no quarto dela conversando. Os dois sabiam que uma hora o sono ia bater mas não ligaram quando isso aconteceu.