P.O.V May

Acordei com uma ponta de dor na cabeça. Chorei tanto a noite passada que nem me lembro de ter pegado no sono. A única ponta de esperança que eu tinha de ficar só eu e meu quarto evaporou por completo quando caiu a ficha que hoje era segunda - feira e eu teria que voltar a minha rotina de Stanford.

Não quero ir.

Alex vai estar lá e é capaz de eu desabar só de vê-lo. Prefiro ficar trancada no meu quarto e chorar o resto do dia.

Olhei no relógio e vi que estava atrasada. Tinha duas opções: Não ir e inventar alguma doença pro meu pai ou me arrumar o mais rápido possível.

Lembrei que teria que ensaiar pro recital de sexta - feira. Pulei da cama e peguei minha roupa para tomar banho. Lembrei que o meu par para o ensaio seria ele.

Quase desisti, mas resolvi deixar esse pensamento de lado. Eu posso ser ingênua, mas não sou de me rebaixar. Troquei a roupa preta que eu iria vestir pra um casual vestido azul Royal. Deixei de lado o meu cabelo liso e organizado para um mais rebelde, realçando as minhas pontas onduladas. Passei brilho nos lábios e calcei minha sandália nova que Julie me deu.

Desci correndo as escadas sem tomar café e entrei no meu Miata. Estacionei o carro na vaga que Eric havia guardado pra mim.

Ele me cumprimentou com um beijo e um abraço apertado como se não me visse a séculos.

– Precisamos entrar logo - Falei pegando em sua mão e o conduzindo para dentro - Não tenho tempo de ir ao meu quarto, o ensaio é na primeira aula.

– Relaxa, não estou a fim de ver você perto daquele Alexander cantando - Falou e eu senti meu estomago embrulhar e minha garganta dar um nó se de ouvir ele mencionar aquele nome.

– O recital é muito importante pra mim, vai ter muita gente - Respondi enquanto entramos as pressas na sala de ensaio.

Posicionei-me no meu local enquanto a professora olhava uns discos. Passaram- se minutos e nada de Alex chegar para o ensaio. Será que estaria como eu? Deprimido ou algo do tipo? Não, com certeza não, ele deve estar se sentindo vitorioso por ter me deixado pra baixo e estragado a minha vida.

– Posso substituir ele - Sugeriu Eric para a professora.

– Não vai ser necessário - Ouvi a voz de Alex ecoar atrás de mim e fazendo meu coração dar um pulo.

Mordi o lábio inferior para conter algum tipo de choro repentino. Sua voz parecia tão firme, confiante.

– Desculpe o atraso, não vai mais se repetir.

Olhei de lado para Eric que se contorceu de raiva ao ouvir a professora dispensa-lo e nós deixarmos a sós.

– Vamos começar? - Perguntou a professora assim que Eric fechou a porta "acidentalmente" forte demais - Mayane quero que você fique do lado direito, pois você vai entrar primeiro e do lado direito da cortina.

Assenti e fiquei na posição direita.

– Tenho vários discos aqui, mas preciso de uma musica que cantem vocês dois juntos e que nenhum de vocês precise tocar para poder se movimentar no palco.

– Posso te indicar uma - Falei enquanto procurava um dos discos que vi um tempo atrás e procurei por ele na internet.

Achei o disco em vi escrito o nome da musica em que poderíamos cantar juntos: All About Us.

– Ótima escolha - Elogiou a professora.

Fomos para trás da cortina enquanto a professora sentava em uma das cadeiras da plateia que estavam vazias e seriam preenchidas no dia do recital.

A professora colocou o disco em que só tocava Play Back.

Assim que ouvi a nota em que eu teria que entrar comecei a cantar, mas não deixei de reparar na tradução da musica. É como se falasse o que estou sentindo de verdade, ou o que eu realmente queria sentir.

Atravessei a cortina enquanto Alex continuava atrás da cortina no lado esquerdo. Andei lentamente até o centro como Tracy minha professora e coreografa havia pedido enquanto cantava a primeira estrofe.

– Take my hand, I'll teach you to dance * Pegue a minha mão, eu vou te ensinar a dançar*

I'll spin you around, won't let you fall down * Eu vou te fazer girar, não vou deixar você cair *

Would you let me lead, you can step on my feet * Quer me deixar guiar? Você pode subir nos meus pés*

Give it a try, it'll be alright * Tente, vai ficar tudo bem*

Nessa mesma hora Alex entra tocando e sua voz junta com a minha fazendo que cantássemos juntos. Mas nesse momento a professora manda a gente parar.

– Vocês não estão tendo a conexão necessária - Fala enquanto sobe no palco para demostrar - Acho que vocês terão que entrar juntos, por que se vocês repararem na tradução diz que ela está convidando para dançar - Ela respira um instante enquanto pensa - Mayane eu quero que você entre calmamente enquanto ele vem logo atrás de você. Quando você vir que é a hora de cantar a primeira estrofe, eu quero que vocês já estejam no meio do palco um ao lado do outro, entenderão?

Assentimos.

– Depois você olha pra ele como se estivesse conversando, ou seja, é a parte em que você canta a primeira estrofe. Vocês precisam ter conexão, então pegue na mão dele quando for o convidar como diz a musica e preciso que vocês troquem o olhar, mas tem que ser um olhar sincero, como se fosse o casal apaixonado da musica. Ele vai segurar a sua mão como se estivesse te dando confiança no que faz.

Respirei fundo sabendo que manter contato com Alex seria difícil de suportar.

Voltamos para a mesma posição na cortina, só que dessa vez estamos os dois no lado direito até que entramos com o Play Back da musica tocando. Quando estamos ao meio do palco hesito um pouco ao dar a mão para Alex, mas acabo cedendo. Fico cabisbaixa e lembro que tenho que olhar em seus olhos. Na mesma hora lembro que seria a primeira vez hoje que olharia diretamente em seus olhos.

Quando ele toca na minha mão sinto um formigamento, ficando totalmente incomodada. E quando preciso olhar nos seus olhos azuis começo a me aprofundar neles de verdade. Como se quisesse voltar no tempo e reviver tudo de novo. Queria não ter o conhecido para não tornar tudo mais difícil como está agora. Por não ter que sofrer quando tive que vim pra cá e nem quando descobri sobre o beijo dele com a Nayara.

Suspiro despertando daquele transe em que me encontrava para começar a cantar a primeira estrofe. Logo chega a segunda estrofe em que temos que cantar juntos. Ao ouvir a voz de Alex sinto uma dor confusa, como se quisesse guardar ela, mas ao mesmo tempo querer manter distância. Presto atenção na segunda estrofe e na terceira e o que significa a sua tradução, me envolvendo cada vez mais nela.

– The room's hush, hush * O ambiente está em silêncio *

And now's our moment * E agora é o nosso momento *

Take it in feel it all and hold it * Entre no clima, sinta e fique firme*

Eyes on you, eyes on me * Olhos em você, olhos em mim *

We're doing this right * Estamos indo certo*

Cause lovers dance when they're feeling in love * Pois amantes dançam quando estão apaixonados*

Spotlight shinning, it's all about us * Holofote brilhando, somos só nós*

It's oh, oh, oh, oh, all about uh, uh, uh, uh, us * Somos oh, oh, oh, oh, só nós uh, uh, uh, uh, nós*

And every heart in the room will melt *E todo coração no lugar vai derreter*

This is a feeling I've never felt but *Essa é uma sensação que eu nunca tive, mas*

It's oh, oh, all about us * Somos oh, oh, oh, oh, só nós*

Dessa vez foi apenas a vez de Alex cantar sozinho e foi ai que prestei toda a minha atenção no que ele diria na tradução. Envolvi a sua voz em minha mente como se quisesse prende-la pra sempre por mais errado que seja.

– Suddenly, I'm feeling brave * De repente, eu me sinto corajoso*

I don't know what's got into me * Não sei o que deu em mim*

Why I feel this way * Por que me sinto assim*

Can we dance, real slow? * Podemos dançar devagar?*

Can I hold you * Posso te segurar*

Can I hold you close? * Posso te segurar pertinho de mim?*

Quando ele faz essa pergunta preciso me entregar e deixar que nossos corpos se entrelacem, como se dançassem assim como dia musica. Só de sentir seu toque e seu corpo ao meu eu sinto toda minha pele arrepiar e aquecer logo em seguida. Nossas testas se tocam enquanto nossos hálitos se confundem enquanto cantamos.

Nossos rostos estão próximos e trocamos olhares confusos e por um momento fecho os olhos ante que sinto vontade do chorar e deixar minha voz em meio a soluços. Percebo que eu tenho que fazer uma pergunta na musica:

– Do you hear that, love? * Você está ouvindo, amor?*

They're playing our song * Estão tocando a nossa música*

Então ele responde cantando:

– Do you think we're ready? * Você acha que estamos prontos?*

Oh I'm really feeling it * Oh estou sentindo*

Continuamos cantar até que no final da musica percebi que estávamos ambos entrelaçados com a testa uma unida na outra, com a respiração ofegante e percebi que os seus lábios estavam próximos do meu, mas tudo voltou ao normal quando a professora saltou no palco e começou a fica eufórica com que acabou de ter ouvido.

– AI MEU DEUS! - Gritou ela fazendo que eu e Alex nos separássemos e olhássemos assustados pra ela e sua empolgação - Vocês foram ótimos, pensei que ficaríamos horas ensaiando, mas foi tudo como planejei.

Não contive o sorriso com sua empolgação, ela estava me deixando praticamente ansiosa para o dia do recital.

– Por um momento pensei que estivessem realmente apaixonados pelo jeito que se comunicavam na musica, e pra falar a verdade vocês com certeza teriam chance para teatro depois de toda a cena que fizeram.

Fiquei totalmente envergonhada pela maneira em que ela falou em relação a mim e a Alex. Na verdade eu senti certa conexão durante a musica, principalmente quando ele me tocava. Mas sei que é por que eu ainda o amo. Por mais que não quero isso, mas preciso me focar apenas no profissional e não faço questão de admitir que sentisse algo durante toda essa troca de olhares e toques.

Durante toda a musica senti vontade de ser aquela menina da musica, apesar de saber que ela não existe e quem canta na verdade, ou seja, eu mesma que sou ela. Mas queria que fosse outra de mim, não oque sou agora. Queria ser ela, por que ela tinha conexão com o seu parceiro da musica e todo o amor. Ela o amava e ele também. Ele tinha a musica deles. Ele não a enganava. Ele não beijava outra. Ele nunca a magoou.

Diferente de mim.

Diferente de Alex.

Diferente de tudo.

Suspirei aliviada ao ouvir a professora nos dispensar para o horario do almoço.

Sentei na minha mesa dos fundos de sempre sem ao menos comprar o meu almoço.

Senti a presença de Eric atrás de mim enquanto sua mão colocavam um cupcake em minha frente.

– Comprei pra você - Falou sentando ao meu lado enquanto desembrulhava o seu cupcake.

– Estou sem fome - Falei enquanto arrastava o cupcake para lado o devolvendo.

– Poxa, vai fazer desfeita? Só queria agradar a minha namorada um pouco.

Namorada.

Aquilo chegava a soar estranho, mas era a verdade. Eric era meu namorado e nada mudaria isso. Fiquei até me sentindo mal de lembrar que eu o deixaria por alguém que não vale nada.

Senti o olhar de alguém em mim e vi que não era de Eric, por que o mesmo mordia um pedaço de seu cupcake. Passei os olhos por todo o refeitório e foi ai que vi seus olhos fixos em mim enquanto conversava com alguns meninos.

Os meninos falavam com ele, mas ele não prestava atenção. Estava fixo em mim.

Tirei os olhos imediatamente e olhei para Eric. Eu não tenho nada a perder, afinal Eric é meu namorado, não é mesmo.

– Obrigada pelo cupcake - Sussurro no ouvido de Eric enquanto me aproximo mais sentindo o olhar de Alex pesar sobre nós.

Eric olha para os lados pra conferir se ninguém está olhando e me dá um beijo.

**

Fui para o meu quarto e parei minha mão na maçaneta assim que senti aquele toque em meu braço que faz sentir um formigamento.

– Podemos conversar?

Respirei fundo antes de virar devagar sabendo que se eu der mais incentivo para essa conversa vou acabar chorando de novo.

– Acho que já estamos não acha? - Falei secamente.

– Você entendeu - Respondeu sem demostrar nenhuma reação com a minha ironia - Sei que você ainda me ama, sei disso por que eu vi que você sentiu algo a mais enquanto cantávamos. Não adianta beijar Eric na minha frente.

– Isso mesmo, você acertou, eu ainda te amo - Falei mais calma do que nunca - Afinal a gente não deixa de amar uma pessoa de um dia pro outro não é mesmo?

Vi que as minhas palavras surgiram efeito só de ver seus olhos vagos e sem brilho algum.

Puro fingimento.

Sei que ele quer me magoar novamente.

– Sabia que você me fez um grande favor? - Perguntei vendo que ele perdia a fala com cada palavra minha - Existem duas May: Uma é a de antes e a outra é a de depois. A de depois foi você que criou, ela acredita em “Felizes para Sempre", mas a partir do dia em que eu descobri que você me traiu essa May se desfez, por que quem cria é quem tira, ou seja, você a tirou. E agora a May de antes volta, então eu sou ela, eu estou de volta!

Virei novamente e apertei a maçaneta, a ultima coisa que vi dele naquele dia foi quando eu fechei a porta na sua cara.

P.O.V Alex

Faltam apenas quatro dias pro recital e admito que sinto uma ponta de ansiedade.

Algo que tem me deixado realmente pra baixo é a May, não queria que as coisas estivessem assim entre a gente.

Preciso recuperar a confiança que ela tinha em mim, mas não sei como.

Só fico magoado por ela não ter confiado em mim. Se a gente ama, a gente também confia.

Paro no mesmo instante em que vejo Eric. Os professores nos deram o nosso tempo livre e estou vagando pela escola.

Só que Eric não está sozinho.

Ele está com Anne Benson, à garota que a May não gosta.

Fico os observando de longe até que eu vejo ela o levar até a parede e beijar a sua mandíbula.

– E ai cara? Oque tá fazendo? - Pergunta Ryler e mais alguns amigos meus se aproximarem.

Não respondo e olho novamente para Eric e Anne. Agora ela está beijando ele.

Na boca.

E ele não recuou.

Ele devolveu o beijo.

E agora está passando a mão no corpo da Anne na maior indecência possível.

– Qual é cara, você não acha estranho ficar olhando? - Pergunta Ryler rindo junto com os outros vendo a mesma cena que eu.

Corro até lá e vejo meus amigos me perseguirem.

– Seu estupido - Falei enquanto afasto Anne e pego Eric pela gola da camisa - Você é louco ou oque? A May não merece isso.

O empurro com força na parede com os punhos cerrados.

É agora que ele vai ter o que merece.

Na hora que preparo o soco, Ryle me puxa.

– Você ta maluco? Aqui é o internato, e se pega você socando ele?

Paro no mesmo instante. Pelo jeito não é eu que estou traindo a May.

Mas isso não vai ficar assim.