Terceiro Membro

Nico abaixou os talheres repentinamente em um estrondo chamando a atenção do namorado Will. O rei dos fantasmas já não sentia fome, e a atmosfera do pequeno apartamento que ele mantinha com o filho de Apolo em Nova Roma não era mais acolhedora, a comida parecia sem gosto, Will não parecia o mesmo.

O loiro, antes tão extrovertido, agora quase não falava, vivia olhando pro nada distraído e sempre suspirando. Já queimara 3 comidas diferentes só pela manhã, confundira sal com pimenta derrubara vasos e copos. Nico percebera que tal fato começou a exatos 2 anos após a mudança para Roma onde o loiro passou a fazer faculdade de medicina.

O rei fantasma sentiu um aperto no seu coração, ele reconhecia aquele olhar vazio, os suspiros e a distração, ele próprio passara por aquilo, Will estava pensando em alguém. Uma terceira pessoa alguém que não era Nico, já que o mesmo estivera ali praticamente implorando para ser notado pelo filho de Apolo.

Uma terceira pessoa... Nico engolira em seco, mas o bolo invisível não descia pela garganta a água não ajudava e agora Will olhava curioso.

“Estou satisfeito” conseguiu dizer, Will ficou alerta o instinto medico apitando insistentemente em sua cabeça.

“Mas você mal comeu Nico. A comida está ruim?” o tom de voz não mudara, no entanto o loiro já se movia afobado experimentando o jantar, pondo o moreno sentado de frente para si medindo sua temperatura e estudando a garganta “Está sentindo algo? Algum incomodo talvez?”.

Nico permaneceu um bom tempo calado observando o olhar preocupado do amante em si tentando se convencer de que estava enganado “Você está longe e isso me incomoda” disse logo se arrependendo. Nico estava sempre viajando pelas sombras para o Acampamento Meio Sangue, às vezes ficando lá por dias seguidos reparando os ritos funerários dos heróis abatidos em missão e deixando Will completamente só em Nova Roma, como poderia culpa-lo por pensar em outro alguém? Provavelmente se tratava de um colega de faculdade atencioso e apaixonado que ansiava ter m lugar em seu coração.

E agora conseguira.

Will ficara em choque, Nico realmente o conhecia bem, quando o filho de Apolo passou a pensar em aprofundar seus conhecimentos curativos o moreno já lhe trazia panfletos sobre a faculdade em Nova Roma e a propaganda sobre o apartamento que agora dividiam e mesmo que seu trabalho fosse no acampamento grego Nico esforçava-se para manter-se no cotidiano corrido do aluno de medicina.

O loiro sorria docemente tocando a face do namorado.

“Você me conhece tão bem Nico...”

Um raio de angustia trespassou o corpo do filho de Hades, então ele estava certo, as coisas boas acabam rápido demais, se bem que sua vida com Will durou tanto tempo que lhe deu a impressão de ser eterna. Will aguentara todos os entraves que um garoto de 14 anos da década de 40 poderia impor em um relacionamento, Nico era inexperiente e extremamente inseguro, quando estavam juntos temia ser recriminado ate pela própria sombra, o loiro fora paciente e amável ao mesmo tempo que era exigente conseguindo assim destruir todos os medos do amante, inclusive o de ser abandonado e agora ali estavam eles, Will a um passo de dizer adeus e Nico a um passo da solidão novamente, o moreno se perguntava se teria tempo de fazer uma ultima oração a Afrodite pedindo o salvamento do relacionamento.

“ Eu... conheci alguém Nico” Will olhava para o outro com expectativa, ansiedade e um pouco de medo, dava pra perceber que ele vinha guardando esse assunto a muito tempo. “Você deveria vê-lo também iria adora-lo poderíamos ir até lá amanhã, você estará aqui amanhã né? Será rápido tenho certeza que ninguém vai morrer enquanto estivermos lá” o loiro disse sem entender porque a face de Nico aparentar tanto sofrimento.

“ Você quer que eu vá com vê-o?” sua voz parecia confusa e triste, seus olhos diziam ‘como pode ser tão cruel?’ numa intensidade tão grande que impedia o filho de Apolo encara-lo por muito tempo.

“Sim! Valentim está louco para vê-lo, vive perguntando por você há quase um mês”, Will sentiu o rosto iluminar e as bochechas esquentarem, “ Ele sabe tudo sobre os filhos de Hades e o submundo, apesar de ser um filho de cupido”.

Ouch. Agora Nico parecia ter levado um soco na cara.

Apesar da dor Nico obrigou-se a aceitar a proposta do futuro ex. Tanto para ter certeza que Valentim não era tão mau elemento quanto o pai quanto para encontrar incontáveis defeitos nele, fuzila-lo e ameaça-lo de tantas formas que ele jamais voltaria a olhar para Will. Foi a noite mais bizarra que Nico passara com Will, até mais que a vez em que eles estavam nus embrenhados nos lençóis e Jason invadira sua casa pulando em cima de ambos falando qualquer coisa sobre a captura da bandeira e sendo seguidos por Percy e Frank.

No dia seguinte Nico estava um caco e arrumava-se como se estivesse indo a um funeral (o seu) e Will parecia ir a sua festa surpresa que ele não deveria saber da existência. Os dois saíram juntos pelas ruas de Nova Roma, o loiro sorria para tudo e todos despejando bons dias para qualquer coisa viva por onde passava. Nico por outro lado fazia as pessoas correrem e os animais se esconderem em pânico até chegarem ao centro de treinamento das coortes, aparentemente o filho de Apolo tinha que pegar alguns papéis com Frank, Nico não o seguira para o salão dos pretores ele não aguentaria ver o amante (ou ex.) assinando os papeis do divorcio com aquela cara sorridente, portanto seguiu para o templo do pai onde pretendia pegar algumas informações como a expectativa de vida desse tal Valentim, infelizmente Reyna o interceptou no meio do caminho.

“Vi Will entrar com Frank, parece que ele veio pegar os papeis em fim! Ele vem namorando o Valentim desde que ele chegou, e o garoto por sua vez não tira os olhos dele e fica incrivelmente irritado quando Will não vem vê-lo, se bem que ele também morre de vontade de conhecer você sabe?” a pretora ainda sorria mas Nico não via graça alguma na situação seu namorado estava pegando os papéis do divorcio para ficar com o amante filho do cupido. Diziam que comedia era uma tragédia que acontecia com outra pessoa, e vendo o sorriso de Reyna Nico não pode contestar essa afirmação.

Não muito tempo depois o rei fantasma finalmente conseguira ir ao templo do pai atrás de conselhos, Nico vivera anos com Will e já não sabia como viver só, mas até a estatua parecia rir de sua sina. Pouco tempo depois de suas infrutíferas orações começarem outra pessoa entrou, um garoto com não mais que 9 anos, cabelos castanho avermelhado cortado no estilo militar, olhos amendoados de cor negra, lábios cheios e vermelhos assim como as bochechas, a pele bronzeada pelo sol dos treinos.

Nico quase não percebera esses detalhes, o garoto estava chorando quando entrou provavelmente achava que por ser o templo do deus dos mortos e da riqueza não haveria ninguém e ele poderia chorar em paz. No entanto Nico estava lá.

O garoto tinha os olhos arregalados de surpresa ao se deparar com aquele homem pálido, esguio com cabelos e olhos negros como a própria escuridão, os trajes escuros só o faziam parecer ainda em frente a um legitimo filho de Plutão ele queria se mexer mais o corpo não obedecia.

Nico tentou sorrir e rezou internamente para não parecer um monstro aos olhos da criança, arriscou um passo, o garoto não recuou. Deu mais um passo e a criança continuou imóvel, o rei fantasma então ganhou confiança e começou a falar.

“Você está bem?” a voz estava fria como o ferro de sua espada mais era melhor que nada.

“S-sim... o... o senhor é... é” o menino tinha uma voz fina e doce apesar de soar incrédula.

“Sou Nico di Angelo, filho de Plutão” falou o mais velho, enquanto assistia espantado o garoto gritar.

‘Pronto agora já era’. Nico fechara os olhos achando deprimente um guri de 9 anos fugir aterrorizado por ele ser um filho de Hades. Com certeza ele achava aquele estava ali para envia-lo ao submundo ou castiga-lo por invadir o templo de seu pai.

O garoto não fugira, na verdade pegara as mãos do mais velho em êxtase, os olhos brilhando e um sorriso nos lábios, Nico ficou confuso pela reação inesperada.

“Eu sei quem é você, o semideus filho de Hades que impediu a batalha entre gregos e romanos na guerra contra Gaia trazendo a estatua de Atenas para o Acampamento Meio Sangue! Você é um herói!” Nico corou pelo amor que o garoto punha nas palavras.

“Isso é muito lisonjeiro mais eu não fiz nada só, se não fosse à pretora e o treinador nada disso teria acontecido com certeza lhe disseram isso nas aulas não?”

“Aprendi isso com Will senhor! Só poderei ir à escola ano que vem.”

“Will” Nico estava interessado e curioso, não ouvira nada sobre o pequeno pelo amante.

“Sim eu quebrei meu braço em três partes há uns dias atrás e Will cuidou de mim. Ele disse como vocês juntos sabotaram Octavian e a legião romana, foi tão legal!” o garoto delirava ainda segurando firme as mãos do rei fantasma como se ele fosse evaporar mas Nico ria feliz com a atenção recebida. ‘Ainda não é o fim, eu sobrevivi a duas guerras, ao Tártaro e a tantas outras perdas, vou sofrer e posso ficar anos amargurado mas vou sobreviver, ou então morro e vou para o Elysium, passo pelo Lete e reencarno sem lembrar dessas dores!’ o filho de Hades então agradeceu ao pai por apaziguar lhe através da criança empolgada e juntos, Nico e o garoto seguiram em direção ao prédio dos pretores.

Nico identificou Will a distancia. Sua cabeleira loira, o maço de papeis e um sorriso contagiante nos lábios que refletiam nos olhos, o coração do moreno parou para logo depois voltar a bater duas vezes mais rápido, o garoto enfim largara sua mão para correr até o loiro.

“Will!” o filho de Apolo abaixou-se, um joelho servindo de apoio, os braços abertos para receber a criança.

“Valentin!” gritou num folego de alegria e Nico travou, o sorriso sumiu e os olhos confusos vagavam ao redor não querendo acreditar que o menino tinha aquele nome.

A partir dai por um bom tempo tudo pareia um sonho para Nico. Reyna e Frank vieram até ele batendo em seus ombros e lhes parabenizando sobre algo, Will parecia o próprio sol irradiando alegria e Nico em choque apenas escancarava a boca lentamente entendendo a situação, as pernas perdera suas forças, os ossos pareciam gelatina e o rei dos fantasmas teria caído se não fosse o sustento dos pretores, Will não entendeu a reação do namorado, mas pôs Valentin no chão.

“Nico? O que houve? Foi o mal estar de ontem novamente?”

“ Eu... eu pensei você eu pensei que...” Nico balbuciava incoerências assustando a todos principalmente a Valentin que se afastara dos adultos “Eu pensei que você tinha outro alguém” enfim saíra e a reação não foi das melhores.

Os pretores se afastaram do casal se pondo ao lado da criança a uma distancia considerável esperando a bomba de fúria que Will iria lançar contra o consorte, o loiro estava vermelho pela cólera e Nico temeu pela própria vida.

Valentin olhava para os pais sem entender bem a situação, para ele toda a confusão se resumia ao fato do rei fantasma achar que ele fosse outra pessoa e isso irritou (muito) Will, mas não deveria ser tão ruim assim, enganos aconteciam o tempo todo e com certeza depois de uns dias Nico o adoraria ter por perto e logo esqueceria esse outro. O menino viu o loiro tomar ar e abrir a boca como quem grita mas o som não chegava direito aos seus ouvidos, o pretor Frank lhe tapou as orelhas com patas fofas que abafavam o som, Valentin tinha que se contentar com o que via.

Ele viu o cascudo que Will tentou acertar em Nico e o abraço que o rei fantasma deu no loiro a discussão ao pé do ouvido e por fim o beijo longo que ele não viu o fim pois Reyna lhe tapou os olhos.

O que Valentin não ouviu ou viu.

“Eu pensei que tinha te perdido” Nico dissera abraçado ao consorte Will ficou rapidamente calmo.

“Eu jamais te abandonarei, já disse” o loiro sussurrou de volta no ouvido do outro agora já retribuindo o abraço.

“Mas...” Nico continuava incrédulo, Will só conseguia sorrir.

“ Meu pai Apollo uma vez foi rejeitado por uma princesa mortal, ele era um Deus belo, forte, viril e cheio de bons talentos mas ela ainda preferiu um príncipe igualmente mortal e cheio de defeitos porque ela o amava assim como eu te amo. Mesmo que tenha um deus atrás de mim é apenas você quem eu desejo ao meu lado”. Nico sorria, já não conseguia conter o coração alegre que galopava no interior de seu peito “eu te amo” pensou e os lábios se encarregaram de demonstrar.

Valentin voltou a ver e ouvir quando os novos pais estavam bem novamente, Nico foi até ele sorrindo com um Will igualmente radiante ao seu lado, quando estavam próximos o suficiente Frank lhe disse para se apresentar corretamente ao filho de Hades, o menino se pôs reto e orgulhosamente recitou a frase que treinara desde que soubera sobre a visita do menino morte.

“Filho de Cupido, soldado da 3a coorte. Me chamo Valentin Solance di Angelo, e é um prazer conhece-lo.”

A partir dai o menino já não se calara até chegarem ao apartamento do casal, já havia contado toda sua história, logo no inicio do despertar de Gaia sua mãe fora morta, Tanathos se distraíra e acabara por levar o garoto vivo junto com a alma da mãe para o submundo, por um tempo os dois ficaram juntos na sala do julgamento mas após a sentença ser declarada mãe e filho se separaram. Por um tempo o garoto simplesmente vagara sem rumo entre os campos de punição e Asfodelos e então Hades sentiu sua presença e exigiu vê-lo, as fúrias se encarregaram de lhe levar a presença do senhor do submundo que mais por diversão que necessidade deu a ele uma missão: encontrar um presente para acalmar a ira de Perséfone. Valentin não fazia ideia do que procurar quando retornou ao mundo dos vivos e possuía apenas o prazo de 7 dias para retornar com um presente adequado por sorte seu pai lhe dera uns bons conselhos e o menino conseguira cumprir sua missão com êxito, Hades lhe concedeu então uma boa carta de recomendação para entrar no acampamento Júpiter após o exaustivo treinamento que tivera com Lupa.

O treinamento das coortes era muitas vezes exaustivo e por descuido em uma noite de competição o garoto acabara por cair da muralha e quebrar o braço em três partes iguais, conheceu Will na enfermaria e por ele se afeiçoou tão fortemente que não quis separar-se, como o sentimento era reciproco foi inicializada a adoção.

Na porta de casa com um Valentin bocejando, Nico refletia sobre os últimos dias, estava feliz por tudo ter dado certo e prometia a si mesmo dar um bom tributo ao seu pai em agradecimento por ter encaminhado essa criança para si, parecia que o deus realmente queria sua felicidade. Agora com o menino na cama, em seu quarto novo, e seu loiro de bom humor ele decidira terminar o dia de forma um pouco mais prazerosa.