Acordes Perdidos escrita por Gabriel Galvão


Capítulo 13
Taças de corações quebrados em promoção


Notas iniciais do capítulo

Acorde encontrado em Genebra, Suíça:



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O cheiro da cidade me enoja, enquanto também é balsâmico. Alivia minha tensão com uma massagem aromática enquanto me mantém atrelado ao ódio por uma relação de culpa. Tenho ojeriza à perfeição que reflete nos espelhos de cristal dos grandes condomínios, mas os observo de um dele. Tudo fede à mentira, à insólita sensação de realização. Até a taça carregando todo aquele vinho seco, parece ser mais valiosa que as vidas pisoteadas e famintas nos canteiros no mundo. Mais cara certamente é. O fascínio causado pelo seu formato escultural, a transparência elusiva com que se mostra são os resultados de incontáveis mãos rasgadas pelo próprio osso do ofício. Sentado, na cadeira desse bar, nem interesse em ter companhia eu possuo mais. Nem desejo mais jogar dardos, o alvo me parece insignificantemente medíocre agora. É tudo limitado a uma quantidade vulgar de mecanismos de entretenimento que se repetem na nossa confortável alienação.

Adianta de alguma coisa viver segurando um copo na mão, bebendo e sorrindo, mas somente enquanto dura o comercial? Caminharei o resto dos meus dias vivendo desnecessariamente, não podendo respirar extensamente pois algum dos meus contratos me revoga esse direito. Afinal, já não alcançaram a perfeição? Já não há mais disputas para lutar, duelos a travar - pelo menos não nós. Já nem há mais do que reclamar, nem existe o porquê de evoluir. É o fim, e não estamos vivendo-o. Estamos morrendo o final. Quantas taças já estão ali deitadas na bancada, consumidas? Não consigo contar. Não consigo enxergar, assim como não consigo ver quais são as pessoas ali, rindo nas outras mesas com vinho descendo a garganta, que já foram consumidas, mas parcamente degustadas. Nossas vidas vão perdendo o valor, afinal não damos função para elas. Nada mais precisa ser feito. Então é isso! Somos como bebida estragada, álcool azedo... Não, somos equivalentes à cerveja sem álcool, simplórios e vazios. O vinho tem requintes dos quais não dispomos. Em nada diferenciamos de bebida em promoção, cujo fruto fora desvalorizado. Essa maldita perfeita nos põe fatalmente em liquidação.


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Notas finais do capítulo

Antes do acorde acabar, se ouve um som tilintante de vidro se quebrando continuamente e um berro.



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