As palavras começaram a surgir, aleatoriamente, parecendo apenas um bando de palavras perdidas prontas para confundi-la. A voz grossa de Jacob podia ser ouvida, ele falava calmamente, mas estava sério, porque ele falava sobre algum assunto sério.
- Há anos atrás...
E cenas de uma mulher, e outros homens, tudo parecia confuso, tudo se misturava como uma miscelânea e, ela estava perdida.
Havia sangue, muito sangue espalhado pelo lugar... Uma floresta. As folhas verdes possuíam pingos densos e vermelhos, bem escuro e forte, e o cheiro de ferrugem característico do sangue podia ser sentido há alguns metros.
E, curiosamente, ela não se sentia enjoada. Seu estômago não estava mais revolto como sempre ficava ao se deparar com sangue, e seu rosto não estava mais pálido do que de costume por imaginar o que causara tanto sangue. Ela estava apenas... Normal.
Isso era estranho.
Seus pés tocaram o chão da floresta e um galho se partiu, um dos mais finos, mas não importava, dava para ouvir o barulho mesmo assim. Suas mãos passavam por sobre as folhas e galhos de árvores, mas todos seguiram intactos, e seus olhos se estreitaram para se acostumar com o lugar escuro, ficava difícil enxergar em certas partes.
Primeiro o que ouviu foi um grito, e logo muitos outros, alguém havia morrido e outros gritavam por isso, por ser errado, por não ser justo, mas ela não conseguia entender o que estava acontecendo. Havia um homem, jogado no chão, seu rosto estava mais pálido que de costume e seus olhos brilhavam num vermelho intenso. Seus músculos ainda se mexiam, mas ele não precisava exatamente respirar, ele podia virar-se sem isso, porque todo seu interior estava morto.
Uma mulher gritou horrorizada ao abraçar uma criança, e muitas outras choravam.
A lâmina do machado brilhou contra o sol e o corpo do homem começou a refletir, de maneira diferente, como se houvesse um cristal emanando de seu corpo para lhe dar tão característico brilho. Isso fazia com que outros gritassem, porque só tornava mais real o que ele havia se tornado.
Homens, em sua maioria morenos – assim como Jacob, mas Isabella não entendia porque associar Jacob a eles – abaixaram a cabeça para o outro que segurava o machado, outros quatro seguravam o homem que ainda brilhava e um quinto se aproximou para segurar sua cabeça.
- Está na hora – o homem que sustentava o machado gritou e os outros concordaram.
- Você e sua espécie não causaram mais dano a nossa reserva – um homem, mais velho e meio corcunda, de cabelo grisalho e comprido e vestindo uma roupa que lhe cobria todo o corpo, exceto os braços, disse ao tocar o rosto do homem que brilhava.
O machado o acertou no pescoço, mas não houve sangue sendo jorrado, mesmo que sua cabeça tenha sido arrancada fora, havia sido como cortar a cabeça de um boneco, não houve gritos, não houve lágrimas nem arrependimento. Nada de sentimentos.
- Queimem – o homem mais velho gritou apontando para uma fogueira que já havia sido montada estrategicamente.
- Cortem o resto – o homem moreno que segurava a cabeça gritou antes de jogá-la nas chamas.
E assim foi indo, um braço, depois outro... Uma perna, a outra.
Era preciso força porque o corpo do homem era duro de mais, parecendo um pedaço de granito – reluzia e era resistente.
Quando acabou já não havia muitas das pessoas presentes ali, umas ainda gritavam e choravam, mas a maioria havia preferido não assistir tão odiosa cena.
- E aqui está – o homem mais velho disse encarando as partes do corpo, daquilo que um dia havia sido um homem, serem queimadas. – Esse é seu castigo por ter se sujeitado a tão odiosa vida... Ele matou nossos irmãos – e os homens gritaram irritados por isso, mas agora menos desesperados por saberem que o castigo havia sido dado. – Ele pegou nossas crianças... – por isso mulheres choravam, elas eram mães. – Mas agora ele não machucará mais ninguém... Nem ele, nem ninguém de sua raça está permitido a cruzar os limites de nossa aldeia...
Então só havia motivos para festejarem.