Política da Boa Vizinhança escrita por BlackLady


Capítulo 5
Mais de Sete Palavras!


Notas iniciais do capítulo

Mais uma loucura da inexperiente, porém esperta, Laís.
Vamos ler?



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Sinto dizer que, mesmo eu tendo começado aquele dia revendo um vizinho que resolveu virar vinho – quanto mais velho, melhor – e quase pirando quando ele se deu ao trabalho de perguntar sobre mim, eu me lembrei de que não sabia onde estava minha tão prezada e bêbada amiga.

– Mãe, você sabe onde está a Jade? – perguntei, entrando em casa.

– A última vez que eu a vi, ela estava dormindo no colchão no seu quarto. Deve ter caído para debaixo da sua cama – brincou ela, sorrindo.

Com um estalo, eu percebi que aquela não era uma opção remotamente impossível. Caminhei até o meu quarto, ajoelhando-me no colchão junto a minha cama e abaixando a cabeça. O movimento a fez pesar mil vezes mais, mas eu ignorei. Notei apenas um relance de cabelo preto bagunçado.

– Jade – chamei baixo – Jade – ela nem se mexeu. Cutuquei-a e nada, suspirei e esperei, então perdi a paciência – Jade!

Ela se assustou, levantando de repente, batendo a testa no estrado da cama – Deus, você pirou? Me assustar de jeito... – ela olhou ao redor, esfregando a cabeça – O que eu estou fazendo debaixo da cama?

– Isso, sou eu quem pergunta.

Ajudei-a a sair de lá. Ela ainda vestia a mesma roupa da noite passada, mas tinha tido consciência de tirar o sapato. Que ótimo. Seu cabelo negro, poucos centímetros depois dos ombros, estava um ninho bagunçado sobre a cabeça, como se tivesse amarrado de qualquer forma. O rímel e o lápis preto que ela sempre usava, estando numa festa ou em casa, escorria ao redor dos olhos.

– Cara, parece que eu tomei uma surra.

– Eu sei. Trouxe isso – ergui a sacola com remédios – Para dor de cabeça.

– Obrigado. Que horas são?

– Não sei, mas não é cedo. Vem tomar café. Ajuda com a ressaca.

– Não sei se consigo engolir alguma coisa.

– Vamos ao menos tentar.

Nunca imaginei a palavra ressaca saindo assim, naturalmente, da minha boca. A noite de garotas da Renata foi uma das noites mais divertidas da minha vida, mas o dia seguinte foi um total desastre.

Isso se você não contar com o Sr. Chocolate.

Levei Jade até a cozinha, agradecendo a qualquer força superior por minha mãe não estar lá. Depositei duas xícaras na mesa e servi-me de café. Ela olhou para a minha bebida fumegante com uma cara de nojo que eu não compreendi, se arrastando para a geladeira e tirando uma caixa de suco artificial.

Eu só nunca conseguia entender como existem pessoas que não gostam de café.

– E então, o que aconteceu ontem? – questionou ela. Fitei-a, descrente – O quê? Eu não me lembro de muita coisa, só que eu bebi algo verde, conheci um garoto loiro que eu não lembro o nome e depois, só de correr da polícia e pular um muro – ela terminou como se estivesse em dúvida sobre a última parte. Ou incrédula.

– O que aconteceu foi que nós fomos para a casa da Renata, você bebeu muito, conheceu um carinha, foi com ele para um motel, só que, como você é menor de idade, a polícia apareceu e tentou prender ele. Você deu um soco no policial para defender o seu amante, correu e fugiu, pulando o muro do motel.

Os olhos dela se arregalaram e sua boca se abriu em choque – O quê?

– E eu sinto dizer que te encontrei seminua, o que significa que alguma coisa aconteceu.

Ela desabou na cadeira ao meu lado – Ai. Meu. Deus. – ela segurou a cabeça com ambas as mãos, de um jeito dramático – Isso é sério?

– Não. Nós só corremos da polícia porque tinha menores de idade bebendo na festa.

Ela me olhou furiosa, mas rindo – Quer me matar de susto?

– Bem, basicamente, é tudo verdade. Só não a parte do motel e de dar um murro num policial.

– Então, eu conheci alguém?

– Sim, e ele se chama Matheus.

– Matheus – ela procurou gravar o nome, se levantando para ir ao banheiro – Ele era muito bonito. Queria que tivesse me dado seu número de telefone.

Ela se virou e caminhou tristonha, enquanto eu me esforçava para guardar a gargalhada que ameaçava sair pela minha boca. O nome e, provavelmente, o número de Matheus estavam escritos de batom na costa branca da blusa de Jade.

No final, minha amiga teve seu desejo realizado.

– O que achou? – perguntou Renata a mim.

– Do quê?

– Da festa – respondeu como se eu fosse uma idiota.

– Legal.

– Só isso. Legal?

– O que quer que eu diga?

– Que você adorou dançar tanto, beber tanto e beijar tanto o gato do Santinni.

– Quem?

– Arthur Santinni. Ou acha que eu não notei vocês no corredor do barril?

Senti o sangue subir para minhas bochechas morenas – Bem, eu não dancei uma só música, a bebida só me fez ter dor de cabeça e eu não beijei Arthur Santinni – declarei a última parte frustrada.

Achei que ela me lançaria um olhar de desconfiança, mas ela apenas pareceu surpresa – Você falou mais de sete palavras de uma só vez! – ela me abraçou apertado, me olhando de baixo – Eu sabia que era diversão que faltava para você se soltar.

Ultimamente, todos querem me soltar.

Não foi isso o que eu falei.

– Eu preciso de ar, isso, sim – afirmei. Ela me largou, sorrindo genuinamente. Passou o braço ao redor do meu cotovelo, me puxando para a cantina da escola.

Os muitos amigos de Renata já tinham se acostumado ao meu jeito quieto e eu já tinha me acostumado ao seu jeito barulhento, de modo que eu conseguia me prender a minha leitura sem me incomodar com seus gritos desnecessários e suas risadas escandalosas.

Mas isso ainda incomodava Renata. O fato de eu prestar mais atenção a palavras que eu já decorara tempos atrás do que no que Renata dizia no momento a deixava irritada.

– Então, Laís – chamou-me ela – o que acha de darmos outra festa no próximo fim de semana?

– Acho ótimo – respondi, distraída, sem notar suas palavras.

– Que bom! Então, você vai?

– Para onde?

– Mas que coisa, Laís! Me dá esse livro – ela puxou meu exemplar de Crepúsculo, justo quando eu lia uma das minhas frases preferidas de Edward:

“Se eu pudesse sonhar, seria com você. Não me envergonharia disso”.

Eu tenho certeza de que esta frase está escrita na minha parede.

– Cuidado! – guinchei.

– É só um livro. Voltando ao nosso assunto: festa no próximo fim de semana.

– Não sei se aguento mais uma das suas festas.

– Vamos lá! Você sabe que gosta... – ela exclamou arrastadamente.

– Isso foi... estranho.

Ela riu – E Arthur vai estar lá.

Quis não me prender nessa hipótese, mas minha mente já me traía com a ideia perfeita de encontra-lo novamente. A cena dele me segurando junto ao seu corpo veio a minha cabeça e eu fiquei um tanto absorta, até notar que Renata ainda esperava uma resposta.

– Não.

– Laís, por favor! Você tem que ir. Pensa só como o Santinni vai ficar chateado de não te ver lá.

– Você prometeu não me perturbar mais se eu fosse a uma das suas festas. E eu fui.

– Não, eu disse que se você fosse e não gostasse, eu não perturbaria mais você. Mas você pareceu se divertir bem sexta passada.

– Bem... não foi tão ruim.

– Então? – ela me olhou com expectativa. Bufei, coçando a testa.

– Já reparou que eu não consigo dizer não para você?

– Ótimo. Termina de comer que eu te dou uma carona para casa. Não vai mais ter aula mesmo.

Ela esperou pacientemente tomando seu terrível suco de clorofila. Nesse intervalo ouvi mais convites feitos por outros organizadores. A festa seria na praia das rochas, no fim da cidade e começaria assim que o sol se pusesse. Roupas de tons claros e leves era o pedido de look e nada de salto alto.

– Tudo o que nós não queremos que alguém quebre o pé e nos dê trabalho – disse alguém. Fui convocada a avisar Jade da nova reunião, já que ela foi bem divertida na última vez.

– E Matheus está com muitas saudades – comentou Renata, arrancando risinhos de todos. Ela virou para mim - Vamos?

– Vamos – ergui meu corpo e segui-a rumo seu carro. Entrei timidamente, me acomodando no banco da frente. Ela pôs o volume do som bem alto e acelerou rumo a minha casa. Chegamos lá em menos de cinco minutos.

– Não sabia que a sua casa era tão perto da escola – nem eu, quis dizer, mas o susto de estar dentro de um carro com uma louca no volante não deixou – Você respondeu as perguntas de sociologia que o professor passou? É que eu não tenho a matéria e... – ela abriu a boca em surpresa, olhando para cima através do para-brisa, em choque – Minha Nossa Senhora, mãe de Deus. Rogai por nós, pecadores – ela assobiou se abanando com a mãos de unhas grandes e bem-feitas, me preocupando sobre ela se arranhar sem querer – O que é isso?

Voltei meus olhos para a mesma direção para a qual ela olhava e quase derreti marrom no banco de couro preto.

Era ele, Otávio, o Sr. Chocolate.

Só que mil vezes mais apetitoso do que eu o vira pela primeira vez. Nada era comparado ao tronco musculoso desnudo e molhado que se curvava no parapeito da varanda da casa da Dona Helena, nem ao osso do quadril a mostra que carregava a toalha branca e sortuda que envolvia seu corpo apenas da parte baixa da cintura até abaixo dos joelhos. Ele falava ao telefone, pensativo.

Seria estranho eu dizer que fiquei com medo de sair do carro e ele me vê?

– Como você não diz que tinha um vizinho tão gostoso como esse?

– Ele chegou a menos de dois dias. E eu só falei com você hoje.

– Você sabe o que é telefone? – ela se sacudiu de forma engraçada e respirou fundo – Enfim, acho que eu vou almoçar na sua casa hoje.


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Notas finais do capítulo

Aysha, minha flor, de toalha branca para você!
Quero comentários!
Críticas, opiniões, sugestões, tudo é bem-vindo.
Beijos.
BL.



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