Política da Boa Vizinhança escrita por BlackLady


Capítulo 1
Confissão de Início


Notas iniciais do capítulo

Só para você não se perder, vou te explicar tudo o que você precisa saber: as partes normais são a história em fatos e acontecimentos; As partes em itálico são interlúdios, como se a Laís invadisse a história e contasse o seu ponto de vista.
Se imagine como uma amiga da Laís. Você estão assistindo um filme da história dela e, de vez em quando, ela vai parar o filme e explicar ou reforçar certos pontos. Ok?
Vamos lá?



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Eu sei, eu sei que é errado. Eu sou só uma adolescente com os hormônios em fúria e ele, além de ser bem mais velho que eu, é comprometido. Minha mãe me mataria, a mãe dele o mataria e a noiva dele mataria a nós dois.

Sim, noiva. Não esposa. Noiva.

Na verdade, não era o que eu esperava de um primeiro namorado. Claro, ele é lindo e forte e simpático e tem aquela moto maneira... Mas o que podia fazer? Ele ficou longe por tanto tem e voltou assim: gato.

E, bem, eu não sou de se jogar fora.

- Você poderia sair do mundo da lua por um instante? – disse Jade, que parecia estar falando comigo há bastante tempo.

- Nossa, amiga. Desculpa, eu não estava prestando muita atenção.

- Mesmo?

Eu ri, empurrando de leve seu braço. Estávamos no meu quarto, com um prato de brigadeiro entre nós, cumprindo nosso famoso ritual: a noite da depressão. Reclamávamos tanto dos garotos que surgiam em nossas vidas que sempre nos reuníamos e comíamos doces até nossa felicidade se elevar. Depois de um tempo, passou a ser sagrado, mesmo que não tivéssemos nada para falar. O que nunca era o caso.

- Talvez, você devesse me contar o que se passa debaixo dessa selva de cachos – comentou, deitando-se na minha cama – Sabe que eu jamais julgaria qualquer atitude sua. Já fiz coisa errada demais para te dizer o que é certo ou errado.

- Eu sei – me levantei, pegando minha caneta piloto preta e escrevendo na parede salmão uma passagem de um livro que eu gostava:

“Depois, sinto os lábios dele no meu ombro, delicado e flamejante e terno, tão gentil que quase poderia acreditar ser o beijo de uma brisa e não de um garoto”.

- E eu quero contar, mas...

- Mas ainda não criou coragem. Já sei, você vem falando isso há semanas.

A parte complicada de se ter a mesma melhor amiga a mais de oito anos é que ela é capaz de ler até seu mais profundo pensamento. Se eu precisasse de alguma coisa, não era necessário nem falar, ela já sabia e providenciava antes de eu sequer pensar em pedir. Mas nem sempre ter sua mente aberta para alguém é uma boa coisa.

- Eu vou contar, eu prometo, mas eu preciso...

- De tempo – completou.

Suspirei, largando a caneta e lendo mais um trecho compondo a parede do meu quarto, expondo minha mente através de palavras alheias.

- Eu também venho falando isso há semanas? – lamentei notar que ela acenou positivamente.

Sei que eu estou confundindo você, jogando essas informações assim, sem explicações, então vamos para o início da agitação que se tornou minha vida.

Eu tinha oito anos quando me mudei para minha atual habitação. Quando fiz sete, meu pai foi embora de casa para viver com outra mulher e, como nós morávamos numa casa grande demais para minha mãe bancar sozinha, tivemos que procurar outro lugar menor para viver. Passamos quase um ano indo de uma casa para outra até virmos parar nesta casa.

Não é grande, mas me dá espaço suficiente para eu ter meu próprio quarto.

A vizinhança da minha idade naquele bairro era composta basicamente de meninos, de modo que, para eu ter o que fazer, acabei aprendendo a gostar de futebol. Não que futebol seja um esporte unicamente masculino, mas, geralmente, quando se tem oito anos e é uma garota, você prefere a Barbie a uma bola suja de lama.

Apenas lembrem-se do geralmente.

Assim, você pode compreender o milagre que foi a Jade na minha vida.

Apesar de ela não fazer parte exatamente da minha vizinhança, já que ela morava na rua ao lado, passávamos o tempo todo juntas. Conhecemo-nos numa festa infantil que aconteceu em uma igreja próxima as nossas casas. Foi amizade à primeira vista. Ela é um ano mais nova do que eu, mas como eu faço aniversário no início do ano e ela no fim, passa a vida sendo dois anos mais nova.

Voltando aos meus vizinhos. Não costumo sair muito de casa. Quero dizer, não como a minha mãe faz: pegar uma cadeira e sentar na porta de casa para pôr o papo em dia com quem mora ao nosso redor; então me relaciono com poucos vizinhos. Na casa a esquerda à minha, mora a Dona Morgana. Eu sei: nome de bruxa e jeito de bruxa também, devo dizer. Ela sempre implicou comigo por eu jogar bola na frente de casa que, infelizmente, não tinha um muro separando da frente da dela. O que acontecia: eu sempre matava as plantas dela. Ainda bem que ela tem uma filha: Patrícia; que, de chato, só tem a mania de ouvir música alta ao meio-dia.

A minha direita, mora a Dona Helena, que tem três filhos: Otávio, Carlos e Karina, respectivamente. Todos já eram adultos quando cheguei. Karina, a filha mais nova, tinha um filho, Leandro, que era amigo do meu irmão, Gabriel, e nós três quase todos os dias íamos brincar na casa de Dona Helena, que, ao contrário da Dona Morgana, era bem divertida.

Sua casa era bem grande. Tinha dois andares: embaixo morava Karina com o marido e o filho e em cima morava Dona Helena com Otávio e Carlos, que não eram casados, apesar de serem mais velhos que Karina. Eu lembro que jogávamos futebol de botão. Os filhos de Helena nunca ligaram muito para mim ou para o meu irmão e eu também não costumava pensar muito neles. A prova disso é que eu nem sequer lembrava que eles existiam até algumas semanas atrás.

Fato é: Otávio sumiu, pelo menos para mim, já que eu não sabia onde ele tinha ido parar; e Carlos também. Eles compraram suas casas e foram embora, já não tão dependentes da mãe, que sustentava a família com uma quitanda altamente lucrativa.

E agora, nove anos depois, Otávio resolveu voltar. Mas se ele tivesse voltado gordo e careca e casado, minha vida seria muito mais fácil. Mas não, ele quis implicar com a minha libido vindo moreno, sarado, alto, charmoso e montado numa enorme moto vermelha. Dado a minha tendência à masculinidade forçada por uma infância sem amigas mulheres – exceto a Jade – devo dizer que aquela moto mexeu mais comigo do que deveria.

E dado a minha tendência à feminilidade devido a minha escolha sexual, devo dizer que ele mexeu mais comigo do que eu quero admitir.

O que não é boa coisa.

- Vamos combinar o seguinte – sugeriu Jade, segurando uma colher recheada de brigadeiro – Você finge que está escrevendo na parede, mas diz as palavras em voz alta.

- Você quer que eu fale com a parede?

- Você parece estar mais confortável com ela do que comigo – disse, sem parecer enciumada, apenas declarando um fato.

- Certo – eu me concentrei em por aquelas malditas palavras para fora, mas eu nunca fui boa em me expressar usando a voz, mesmo olhando para a parede, então não funcionou. Bufei, chateada – Eu não consigo!

- Eu percebi – ela se levantou, largando a colher no prato e vindo segurar a minha mão que largara a caneta. Ela pegou o objeto do chão e pôs de volta na minha mão – Converse comigo assim.

Olhei a caneta piloto e olhei a parede, que quase não tinha mais espaço sem um texto ou um desenho feito da tinta preta. Procurei e achei um trecho pequeno e sem riscados. Destampei a caneta e a apoiei na superfície lisa de tom alaranjado. E confessei.

“Eu me apaixonei por Otávio”.


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Notas finais do capítulo

Então, o que acharam? Me ajudem e me deem a sua opinião.
Beijos.
BL.