Arranha-Céus Flutuantes escrita por Aphrodite Laclair


Capítulo 3
Parte III


Notas iniciais do capítulo

oi querides desculpe o atraso ): é que eu entrei de férias (ADEUS ENSINO MÉDIO VAI COM DEUS) e eu tô simplesmente desnorteada com essa história de tempo livre, tá sendo uma loucura, quero fazer mil coisas mas só durmo o dia inteiro. férias são uma mentira, gente
ah e quem quiser falar comigo por favor me procure no twitter @meliorismo que tô sempre respondendo por lá. cês são lindes



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Arranha-Céus Flutuantes

Ó Liberdade, quantos crimes cometem-se em teu nome!

Manon Roland

Parte III Marie

A mulher da vida de Francis, apesar de tudo, não foi Jeanne. Foi, muito provavelmente, Marie Antoinette — não que ele soubesse disso na época. Ele nem a conhecia. Francis só veio a tropeçar em Marie, e Marie só veio a tropeçar nele, mais ou menos na mesma época que Francis conheceu o seu outro grand amour, Arthur Kirkland.

Mas estou me adiantando.

Quando ele a vê pela primeira vez ela está usando um longo vestido cheio de fitas, laços e até mesmo — aquilo era um corpete, certo? Ela é loira, de cabelo enroladinho como uma criança pequena, e segura firmemente entre os dedos uma bolsinha cor de rosa e um pincel sujo de tinta azul. Perto dela, uma tela. Ela é linda e parece tão dolorosamente infeliz, seu coração quebrado mesmo, mais ou menos como Francis se sente, que ele decide ir até ela — se a incomodar, ela pode mandar ele ir embora, ou ele pode ir embora sem ela mandar mesmo, sem problemas, ele pensou enquanto ia até lá, e nesse meio tempo ela se ajoelhou e fez mais alguns riscos azuis na tela média que estava apoiada num tronco de árvore. Eles estão num parque.

Um parque reluzente, cheio de gente, famílias inteiras, bem diferente de onde ele conheceu Jeanne, porque parques como aquele estão riscados da sua vida recente.

— Olá. — Francis diz, muito quietamente, mas mesmo assim ela dá um pulo no lugar e o pincel escorrega da sua mão e faz um enorme linha no meio da tela. Ela não parece incomodada, porém. Não com o risco. Está muito ocupada olhando assustada na direção de Francis.

— Oi. — ela diz e sua voz é baixinha, assustadiça, como animal selvagem jogado subitamente num zoológico. — A gente se conhece?

— Não. É que você parecia triste. — Francis se explica, dando de ombros, e ela olha para o rosto dele por longos momentos, antes de abrir a bolsinha e pegar tinta vermelha. Enfia o pincel sujo mesmo na tinta e risca a tela.

— Está tudo bem. — ela diz, depois de uns cinco minutos. Você se sentou ao lado dela, quatro palmos de distância, mas ela ainda parece desconfortável com a situação toda. — Eu estou bem, então você pode ir embora.

— Eu não pretendo ir embora. Quer dizer, eu não preciso ir embora. Você se incomoda se eu ficar? — Francis pergunta, e ela suspira profundamente. A cor em seu pincel é amarelo, como o sol, não como seus cabelos. Francis se pergunta se existe uma cor para o cabelo dela, que é quase branco. Se pergunta, subitamente, então: seria branco de tristeza?

— Você que sabe. — ela diz, petulante, e Francis acha um pouco engraçado, porque ela é pequena e frágil como uma florzinha de jardim mas existe algo como força brilhando nos olhos grandes e azuis.

— Qual seu nome?

— Marie, Marie Antoinette. — ela diz, desinteressada. — O que pretende fazer com a informação?

— Nada! — Francis sorri, seus olhos se arregalando. — É um nome bonito. Como o da rainha.

— É por causa dela mesmo.

— O meu é Francis.

— Hm. — ela diz, esboçando um gesto disperso com a mão, mas para na metade. Ela, Francis percebeu, perde rapidamente o interesse nas coisas, como nas cores que joga na tela ou nele ou nas fitas em seu vestido, amassadas e desfeitas.

— Você é francesa?

— Sou. Você também é.

— Sou.

— Não vai me perguntar como sei? — os olhos dela são brilhantes, algo como diversão.

— Como sabe?

— Sotaque. É discreto, você está aqui há quanto tempo? Mas existe. O meu é bem mais forte. Estou aqui só há três anos.

— Gosta daqui?

— Nenhum pouco.

— Nem eu. — Francis sorri, e ela sorri, e eles tem algo como uma conexão cultural ali, que é fulgaz e não dá para pegar na mão, mas existe e Francis adora.

Ela gira, e gira, e gira, seu vestido cor de rosa neon esvoaçando ao seu redor, mesmo que esteja pesado da chuva que cai. Francis está seguro e seco debaixo de um letreiro de supermercado — falido —, segurando um guarda chuva fechado, mas Marie decidiu tomar um banho de chuva e foi. Nada no mundo é capaz de impedi-la em nada do que ela decide fazer, e Francis nunca tentou, de qualquer forma. Ela gira como um animado peão, e é noite de sábado. Ela está rindo, e sua risada chega até Francis. Ele imagina a água escorrendo pelo seu rosto feliz como lágrimas de felicidade e sente uma pesada, incrível onda de afeto.

Ela é frágil de um jeito meio totalmente novo, porque ela é absolutamente independente — quer dizer, ela saiu de casa e foi para Londres sem nem saber onde ia morar, com pouca coisa além da roupa no corpo, e tocou a própria vida sem nunca olhar para trás. O que é qualquer coisa depois disso? Mas mesmo assim, de vez em quando, Francis vê algo como uma espessa tristeza brilhando nos olhos azuis e percebe, subitamente, que há algo quebrando lentamente, irreversivelmente, dentro dela. Mas nesse momento, debaixo da chuva, rindo e girando, Francis quase pode acreditar que tudo vai ficar bem.

Ele abre o guarda chuva e vai até Marie.

Marie nasceu na França, nos arredores de Paris. Se formou em música e é uma violinista, mas não toca mais tem muito tempo. Desapegou, perdeu o gosto. Veio para Londres quando tinha vinte e dois anos, fugindo da família, e agora tem vinte e cinco, fez as pazes com a mãe mas não sabe mais o que fazer da vida. Não quer voltar. Não quer fazer nada. Apenas se ajoelha e reza, às vezes, mas nem sempre — quer dizer, ela nem é religiosa, mas faz isso. Gosta de como a palavra aleluia soa em inglês, é a sua palavra favorita. Na maioria do tempo pinta muito, também, ou faz alguma coisa para ganhar algum dinheiro. Ela fala muito pouco — se veste de silêncio, se cerca pela falta de palavras.

Francis coleciona as informações que sabe dela, as coisas que ela deixa escapar; é muito desconfiada, suas conversas pessoais são poucas e rápidas. Adora o modo extravagante como ela se veste, os vestidos brilhantes e cheios de coisas, as meias e os sapatos, e seu cabelo de criança-Rainha.

A verdade, que Francis nunca admite pra si mesmo, é que Marie é um pequeno raio de sol que se vê rapidamente entre folhas amarelas e quase mortas de uma árvore — um rápido vislumbre de esperança.


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