Mais um dia naquele lugar. Mais um dia naquele lugar onde ninguém me entende. Mais um dia naquele lugar onde as pessoas julgam as outras como se fosse um desfile de moda, ou um concurso de beleza. Mais um dia naquele zoológico chamado escola.

Desço as escadas após ir ao banheiro para tomar meu café. Encontro com minha mãe montando a mesa.

– Bom dia Tina! Dormiu bem? – Pergunta ela.

– Sim mãe! Melhor impossível. – Respondo sorrindo, apesar de a minha noite não ter sido nada boa. Por que não foi? Apenas não consegui dormir, porém o real motivo faço a menor ideia, mas enfim, menti para evitar conversas intimas demais pra mim a essa hora. Ela iria querer saber o motivo, a circunstância e a causa com o que isso ocorreu. Por ela ser psicóloga fica tentando me analisar e eu odeio isso.

– E essa cara de desânimo Tina? Tá acontecendo alguma coisa?

– Não mãe. Apenas dormi um pouco mais tarde, estava fazendo a tarefa do colégio. E o Gabriel? – Perguntei tentando mudar o assunto da conversa.

– Ah, seu irmão ainda tá dormindo. Você conhece ele Tina, é o bicho preguiça em pessoa.

– Verdade. – Respondi sorrindo enquanto passava geleia na torrada.

Tomei meu café e subi novamente pra trocar a roupa e assim sair. Coloquei uma camisa cinza, minha calça preta de sempre e uma jaqueta por cima. Calcei meu Vans, coloquei minha touca e saí me esquecendo do ipod em cima da cama. Peguei-o e desci rapidamente as escadas. Despedi de minha mãe, dei um beijo na testa de Gabriel e saí.

Peguei meu ipod e coloquei minha playlist tocar, e a primeira música era Demons do Imagine Dragons. Fui andando tranquilamente até a esquina, porém distraída quase fui atropelada por uma bicicleta. Eu fui desviar e caí, e o garoto que a controlava também caiu. Eu comecei a rir e o garoto que estava na bicicleta me perguntou sorrindo:

– Machucou?

– Não, não – Disse olhando pra ele – e você?

– Não – Disse ele sorrindo, e estendendo a mão para me ajudar a levantar.

– Prazer, Guilherme.

– Valentina.

– Bom Valentina, indo pra escola?

– Sim. Você também? – Perguntei ajeitando minha bolsa.

– Sim, primeiro dia... o que me aconselha? – Disse ele num tom meio desanimado.

Não deixei de o reparar... Ele é branco, tem os olhos castanho esverdeados, o cabelo num tom castanho claro e deve ser uns 15 centímetros maior que eu.

– Nada a dizer.

Olhei pra ele e sorri. Ele sorriu de volta e perguntou:

– Tem algum problema se eu te acompanhar?

– Por mim tudo bem. – E sorri.

Fomos andando, só que ele não estava em cima da bicicleta, ele estava empurrando ela.

– Então... você mora aqui a quanto tempo?

– Humm... Acho que a minha vida toda. – Respondo e olho pra ele.

– Nossa – ele sorri – então você conhece praticamente tudo daqui.

– As vezes mais do que eu queria. – Digo olhando pra frente, e continuo – Mas então, por que se mudou pra cá?

– Bom, à pouco mais de um mês minha mãe faleceu, e meu pai decidiu se mudar pra cá.

– Nossa... meus sentimentos – digo meio sem graça.

– Tudo bem, você não sabia. – disse ele olhando pra frente.

Seguimos uns dois minutos sem falar nada, então ele perguntou:

– Então... pelo visto você gosta de música. Alguma banda em especial?

– Eu curto demais Imagine Dragons. E você? Alguma banda em especial?

– Eu honestamente escuto qualquer tipo de rock. Eu tinha uma banda antes de mudar pra cá.

– Nossa que legal! Qual era o nome?

– Rules.

– Rules, nome bacana... eu sempre tive vontade de ter uma banda, mas não toco nada muito bem... sou meio desastrada.

– Eu notei – ele riu.

Eu sorri de volta, estávamos chegando no colégio, ele pediu pra eu esperar ele prender a bicicleta para entrarmos, pois ele não conhecia o colégio e tinha de ir na diretoria pegar o horário e a autorização.

E ao seguirmos pelo corredor, olhares o seguiam. O povo é realmente idiota, parece que ele é de outro planeta, de outro mundo, mas ele é apenas um novato, não tem motivo toda essa curiosidade. Então eu notei. Estavam olhando pra mim também. Talvez fosse a primeira vez que me notavam naquele lugar. Eles nos olhavam e cochichavam, aquilo me incomodava.

Chegamos á diretoria e ele entrou. Ele pediu pra eu o esperar do lado de fora, e passou-se uns três minutos ele saiu de lá com dois papeis na mão.

– Pronto, agora é ir pra sala.

– Qual sala que é? – perguntei.

– Sala... 205.

– Mesma sala que eu.

– Ah que bacana. Já tenho uma parceira pra fazer trabalhos. – ele sorriu.

– E eu, um parceiro pra fazer trabalhos. – Sorri também. Então fomos para a sala de aula.

Primeiro horário era de português, professora Mônica. Aquela mulher era meio louca da cabeça. Ela passou um texto no quadro e mandou que todos nós lêssemos em voz alta como um coral, só que ela meio que esqueceu que estamos no segundo ano do ensino médio, não na segunda série aprendendo a ler. O segundo horário era de História, e o professor Idalmo, ele viaja um pouquinho na maionese e quase dorme em horário de aula. O terceiro horário seria física, mas a professora faltou por problemas pessoais então nos deixaram ficar no pátio, desde que não fizéssemos desordem e atrapalhasse as demais aulas.

Estava saindo da sala e o Guilherme perguntou:

– Vai me esperar não?

– Ah, desculpa. É que geralmente fico sozinha.

– Mas eu não vou te deixar sozinha. Você foi legal comigo... tem algum problema em eu querer ser seu amigo?

– Não, nenhum. É que, ninguém desse lugar conversa muito comigo... eu não passo de uma esquisita.

– Valentina, ninguém pode julgar sem antes conhecer. Você não é esquisita.

Sorri pra ele e disse:

– Mas eu não me importo em ser uma esquisita. Eu prefiro ser assim do que essas garotas fúteis que passam o dia pensando em roupas, bolsas e sapatos. Eu nunca fui assim, e sei que nunca serei.

Ele assentiu o que eu disse e se sentou ao meu lado e ficou olhando pelo vidro da janela comigo.

– A vida é complicada. – ele disse.

– Sim, eu sei. – Eu disse.