O programa estava aparentemente estranho. Todos estavam muito sérios e bem organizados. Sasuke arqueou uma sobrancelha, sinal de quem tentava entender alguma coisa. Um homem bem vestido de terno preto entrou no lugar, o rosto polido e os cabelos organizados em gel de modo espetado atraíram suspiros apaixonados. O contraste era evidente: Sasuke usava jeans escuro, uma camisa de mangas arregaçadas vinho e um colete preto por cima, e estava de tênis. Olhou em volta. Estava no lugar certo?

O homem, muito adulto, organizou seus papéis e fitou seriamente o outro.

–Boa noite. – falou secamente.

–Boa... Noite... – Sasuke engoliu em seco e ajeitou sua postura. O programa de hoje seria bastante sério, então era melhor retomar seu comportamento de “poucos amigos”. Mas quem era esse cara?

–Eu me chamo Aburame Shino e serei seu apresentador essa noite. – falou rapidamente, as caras de espanto não foram mais vistas porque todas as câmeras focavam no rosto de galã de cinema que Shino tinha – Obrigado por nos acompanharem. – ele se voltou para o Uchiha – Como vai Uchiha Sasuke?

–Bem, obrigado pela gentileza. – falou mantendo-se sério.

–Disponha. O tema do programa de hoje será – ele observou os papéis e voltou a olhar as câmeras – “Descobertas”.

Esqueceu-se de colocar sal na receita desse cara, pensou Sasuke, nem eu sou tão insosso. Suspirou pesadamente. Vamos ver o que ele vai perguntar.

–Quando descobriu que Menma tinha um irmão gêmeo? – Shino iniciou com cerimônia.

Sasuke demorou a processar a pergunta. Viu no olhar do outro impaciência. Parecia estar ali a contragosto. Assentiu de leve, pois não iria irritar mais do que ele já estava.

–Quando ele se mudou para a casa ao lado da minha. – disse breve.

–E isso foi importante para você?

–Não diria importante, somente inusitado, afinal eu acreditava que eram gêmeos idênticos, coisa que não são, e porque levei alguns dias para entender que o menino era um menino e a menina era uma menina.

–Poderia explicar melhor?

–Certo. Naruto agia igual a um moleque, subindo em árvores, correndo feito louco por aí, escalando telhados, se sujando de terra e brigando com meninos maiores que ela, enquanto Menma era mais tranquilo, mais quieto e obediente, o oposto da irmã. Como eles tinham cortes de cabelo semelhante e se vestiam parecidos, diferenciando apenas por um colar com um M e outro com N, eu pensei que Menma era menina e Naruto era menino. Mas aí, numa festa de aniversário, eu soube da verdade e só.

Shino assentiu e ajeitou a gravata. Formal demais para a temática do programa.

–Eles são assim até hoje?

–Não. – Sasuke cruzou as pernas, ficando mais confortável – Depois dos 15 anos, e de outras coisas que aconteceram por esse tempo, Menma assumiu algumas características de Naruto e Naruto aquietou-se de vez, apesar de ainda fazer algumas de suas peças.

Houve um estranho momento de silêncio e tensão entre os dois.

–Shino.

–Sim, Sasuke?

–Você está bem? – um olhar sincero fora trocado. O rapaz negou. – O que foi?

Ele esfregou de leve os cabelos e deixou as fichas de lado por uns momentos.

–O que você disse no último programa... Sobre eu ter beijado a Tenten... Mexeu um pouco comigo. Eu não sabia que alguém ainda lembrava.

Sasuke sorriu, entendendo o desconforto que se instalara no ar. Suspirou. Iria fazer uma coisa que era extremamente rara para ele, Uchiha, fazer.

–Desculpe. – falou sinceramente – Eu não queria lhe ofender com os meus comentários, eu estava apenas sendo sincero... Eu sei que todo mundo tem seu jeito e cada pessoa deve ser respeitada pelo o que é, mas aquele fato me pareceu, no mínimo, inusitado. Não quis dizer com aquilo que você é esquisito, Shino, eu já disse aqui que você é um dos meus melhores amigos, porque a gente é parecido, esqueceu?

Shino sorriu com acanhamento, o que provocou gritos histéricos e suspiros apaixonados. O rapaz assentiu e folgou a gravata, relaxando na poltrona, puxou de seu bolso seu característico óculos estilo “John Lennon” e fitou Sasuke.

–Obrigado.

Sasuke deu de ombros sorrindo, como se dissesse “tudo bem”.

–Posso falar algo fora da temática do programa? – o entrevistador indagou para Sasuke.

–Por mim... – ele fez sinal para que falasse.

Shino fitou a câmera que Kiba cuidava.

–Tenten eu gosto de você desde o dia em que te beijei. – falou secamente.

O moreno franziu o cenho.

–Isso é uma descoberta e tanto... Então tecnicamente não foge da temática do programa.

–É mesmo? – falou sem se surpreender – Tudo bem então. – continuou - Tenten eu gostaria que um dia você me desse uma chance para sairmos como um casal em um encontro, eu gostaria de lhe mostrar meus verdadeiros sentimentos, se você permitir.

Sasuke sorriu. Shino conseguia ser mais franco do que ele com os próprios sentimentos, apesar de ser mais fechado do que o Uchiha. Esse último gostava de pensar que Shino estava em um nível superior de realidade masculina, num nível de desinibimento somente alcançado pelos os homens mais seguros e confiantes de si e do que acreditavam. Sasuke iniciou levemente a onda de palmas direcionadas para o rapaz, que se seguiu por mais alguns minutos.

–Antes de continuarmos com as perguntas, vamos ao quadro “Perguntas dos fãs”. Temos bastantes perguntas hoje, Sasuke. – o Uchiha esfregou as mãos, ansioso – Não deu para gravar com todo mundo por causa de uma surpresa especial que teremos hoje, então será tudo lido. Vamos a primeira pergunta. Heydi, provavelmente sua maior fã e detentora do título de “A fã que mais fez perguntas até agora” – as pessoas riram da cara séria quando ele disse isso – Quer saber: qual a parte mais difícil de ser redator?

Sasuke parou e pensou um pouco.

–Acho que o fato de tomar decisões importantes. Quero dizer, nem tudo é colocado em um jornal ou uma revista e cabe ao redator fazer pesquisas atuais, selecionar e criar textos para todo tipo de coisa que você possa imaginar na área da publicidade... É bem complicado, mas muito importante, então o redator acaba por tomar decisões complicadas que envolvem tudo que vai para o popular, que vai para fora, porque fica basicamente sob os critérios e as responsabilidades dele o que vai ser ou não dito. Ser redator não se resume em somente escrever. – ele respirou fundo e sorriu – Espero ter respondido, Heydi. – falou para a câmera.

–Próxima pergunta – ele leu o cartão e fitou Sasuke, ajeitando os óculos – Linda, esse é o nome dela? – ele conferiu, provocando alguns risos – É sim. Linda quer saber: por que escondeu seu namoro com Naruto por tanto tempo? E por que seus pais tem tanto problema em aceitar o seu namoro? – ele suspirou – Acho que agora que você assumiu, já pode falar não é?

Sasuke assentiu. Não demoraria a perguntas como aquelas acontecerem. Era a hora. Olhou a plateia, os olhares ansiosos inundavam os rostos nervosos. Fitou a produção. Muito de seus colegas já lhe haviam feito perguntas parecidas com aquelas, mas não respondera. Parecia que Sasuke estava adivinhando que lhe fariam ao vivo.

–Bom... No começo eu não achava que ela era minha namorada, porque agíamos da mesma forma de antes... Tipo – ele encarou Shino – Eu pedi ela em namoro com o objetivo de saber se eu era gay ou não, então não mudou muita coisa, como eu esperava.

–Como é? – Shino fez uma surpreendente cara de surpresa – Gay? Como assim?

–Sério! Eu pensava que era gay por causa da minha amizade com o Menma. – Sasuke exibia um semblante de “Nem eu sabia” – Então Naruto concordou em me ajudar, namorando comigo por seis meses, porque se fosse verdade, que eu era gay, ela disse que me ajudaria com o Menma, mas...

–Mas? – incitou Shino, sorrindo.

–Já estamos com quatro anos de namoro.

A plateia gritou um “Ohh!” que se transformou em palmas e gestos animados.

–Certo. Então por que escondeu por quatro anos?

–Como eu ia dizendo – Sasuke fez uma cara de quem se lembra de algo – A gente começou a namorar, mas nós, e aqui vai uma confissão – ele arregalou os olhos. Uma música de revelação tocou – Nós praticávamos Le Pakour pela cidade e tipo tinha uma gangue do mal que fazia a mesma coisa e se encrencou de vez com Naruto depois de uma aposta que ela ganhou e levou uma bolada do cacete para casa. Meus pais souberam que a vizinha era envolvida com gente “ruim” – ele fez aspas com os dedos – E disse que não queria nenhum de seus filhos envolvidos com eles... Meu pai me proibiu de sair com o Menma e de ver Naruto.

–Namoro vida louca? – Shino riu. Sasuke riu concordando.

–Então eu fingi estar fazendo cursos atrás de cursos só para poder estar com ela. Naruto morava com o padrinho tarado dela, o Jiraya, então nem tinha tanto empecilhos para ela, porque o velho estava sempre viajando. Menma nem ligava, ele adorava ver a irmã tão feliz com um namoro, porque nenhum cara nunca se interessou por ela – Sasuke se levantou repentinamente e correu para uma câmera – O que é mentira! Eu bati em muito cara que queria te pegar, Naruto! Esses punhos – ele mostrou-os – Esmagaram muitos narizes!!!

Shino e a plateia caíram na risada. Sasuke sentou-se tentando segurar o próprio riso e manter a postura de namorado ciumento.

–Por causa disso você escondeu tanto tempo? – perguntou Shino, recobrando o fôlego.

–É.

–Isso me cheira a gente que gosta de aprontar. – Sasuke soltou uma gargalhada gostosa – Algo me diz que vocês tiveram a parcela de culpa de vocês.

–A gente nunca foi um casal santo. – falou com um olhar cheio de segundas intenções – Nosso currículo de problemas é tão longo quanto à torre Eiffel. Para vocês terem uma ideia – ele caminhou até a plateia e sentou-se ao lado de uma garota de cabelo loiro – Uma vez Naruto mentiu para Jiraya, Menma malandro sabe que é verdade, dizendo que ia para um acampamento, quando na verdade a gente foi passar uma semana em Nova York. – os próximos a ele ficaram admirados.

–Mentira?! – a loira perguntou.

–Falando sério! A gente conseguiu identidades falsas, passaporte, a porra toda para viajar... – Sasuke se levantou batendo as mãos – Eu estourei o cartão do meu pai, que ficou pensando que tinha sido minha mãe, que culpou Itachi, que culpou meu Tio Madara, porque eu estava numa floresta supostamente fazendo ecoturismo com a turma da escola. – ele piscou um olho para a câmera.

–Deixe-me adivinhar: Itachi descobriu a verdade e passou a odiar Naruto, achando que era culpa dela que o adorável irmão fazia coisas erradas e por isso nunca aceitou o namoro?

–Exato. – Sasuke sentou-se – Ele descobriu e me fez arrumar um emprego para pagar o cartão, do contrário ele me deduraria para os meus pais... Naruto me ajudou a pagar a conta enorme e tentou fazer amizade com Itachi, mas ele a achava muito “ralé” para se envolver com os Uchihas. – ele baixou o rosto, apertando os punhos – Isso me deixa fervendo de raiva.

–Imagino.

Shino suspirou e fez sinal para que a surpresa fosse mostrada no telão. Lembrar daquilo parecia ser bastante doloroso para o Uchiha, então era chegada a hora de ele relaxar um pouco. Uma música começou a tocar, uma música irlandesa. Sasuke levantou o olhar exibindo seu semblante de “O que é isso?” mais engraçado que já fizera. Olhou o telão e quase desmaiou tamanha fora a surpresa que sentira ao ver um vídeo de Naruto dançando aos risos a tal música irlandesa que ele ouvia.

Estavam nas ruas de Nova York e encontraram uma dupla de senhores tocando violinos e com um chapéu nos pés para receber a ajuda. Naruto, louca como sempre foi, adiantou-se e começou a dançar para a câmera que Sasuke usava para filmar o trajeto. Um amigo acompanhava os dois e fazia o favor de tudo filmar.

Sua namorada saltava e tocava os pés, movia-se rodopiando e sacudindo a cabeça, fazendo os enormes cabelos voarem ao seu redor. As pernas pareciam ainda mais longas de tanto que ela erguia as pernas, fazendo o vestido formar arcos no ar. Ela usava um lindo vestido verde e parecia um anjo de tão leve que dançava. Às vezes, notando a câmera que lhe filmava, ela fazia um coração e mandava um beijo, sorrindo largamente. Do nada surgiu Sasuke saltando e tomando o braço de Naruto para a dança, fazendo um conhecido passo de quadrilha caipira.

O ritmo acelerou e ambos ficaram mais rápidos nos giros e nos passos, dançando com alegria e carinho. Os velhos sorriram ao ver a velocidade que ambos dançavam e aceleram os arcos nos violinos, fazendo tudo ficar ainda mais animado. O casal gritava e uivava de satisfação, de mãos dadas e rodando sem parar, atraindo a atenção de uma legião de espectadores que batiam palmas e assobiavam.

Sasuke não se aguentou e se levantou da poltrona, chamando Shino para lhe acompanhar nos passos. Meio sem jeito, observando os pés ligeiros do Uchiha, Shino entrou na dança e conseguiu acompanhar. A plateia aplaudia e gritava, batendo os pés no ritmo da música.

O vídeo acabou, a música se encerrou, os “dançarinos” se sentaram aos risos e plateia continuou aplaudindo fervorosamente.

–Então... – Shino ofegava, dançar nunca fora seu forte – O que... você diz... sobre... esse vídeo?! – ele inspirou e ajeitou os óculos – Nunca mais eu danço na minha vida!

Sasuke riu.

–Aquela foi uma das viagens mais perfeitas que eu já fiz na vida... – sua respiração pesada contrastava com suas bochechas coradas – Eu descobri o quanto a vida podia ser boa!

–Agora vejo o quanto ela é irreverente... – Shino ainda recobrava o fôlego.

–Você não sabe é de nada... – Sasuke abriu o casaco que usava, pois sentia calor – Isso não é nada comparado ao que ela já fez nessas andanças da vida.

Shino fitou o outro, tirando os óculos do rosto.

–Quando você descobriu isso, descobriu que ela era desse “jeito”, afoita, irreverente, louca por assim dizer, o que achou? Não pensou em pular fora, tipo, “essa garota vai me meter na maior de todas as roubadas da minha vida”. Muita gente por aqui evita se envolver com Naruto, em qualquer coisa que seja, justamente por causa da personalidade dela.

Sasuke assentiu.

–Não. Em nenhum pensei em “pular fora” porque esse lado dela me garantiu momentos de descanso do mundo. Ela era meu repelente de gente chata e insuportável.

Shino olhou para o seu relógio. Era hora de encerrar. Mas ainda tinha uma última proposta.

–Sasuke.

–Sim?

–Que tal o próximo programa ser gravado no “Manicômio”? – o olhar irônico do apresentador dizia tudo e ao mesmo tempo nada. Sasuke sorriu sadicamente. Existia uma lenda rodando a universidade que somente os fortes iam ao Manicômio e sobreviviam. Nem todos podiam entrar lá e os que entravam, não eram os mesmos ao sair.

–Feito. Só um aviso: é por conta e risco de vocês.

–E com esse aviso, encerramos hoje.