O fim da tarde chegara com uma breve chuva, que refrescou um pouco o ar, abafado desde cedo.
Estava parado na frente da porta de entrada, pensativo. Muito acontecera naqueles dias. Muito para se fazer. Muito para se pensar. Muito para se sentir.
...
Mas eu estava feliz. De repente, apesar da fadiga, percebi que... Estar ocupado era um sinal de que precisavam de mim. De que eu era importante. De que eu tinha o meu lugar.
Não fora exatamente o que desejei.
...
Mas era o suficiente.
...
Porque...
Havia encontrado alguém, afinal.
E estava tudo bem, quando ela estava por perto... Apesar de que ela não estaria mais comigo, estava tudo bem. Tinha que estar. E se não estivesse, ao menos poderia fingir.
Por fim, sorri e abri a porta.
...
Algo estava diferente.
...
Havia uma luz.
...
Não consegui notar exatamente o que era. Era brilhante, porém branda, parecendo esquecida em cima da mesa.
Uma vela.
E, ao seu lado, um bilhete.
"Se pudesse pedir algo que fora muito importante para você e você perdeu... O que pediria?"
Seria egoísta da minha parte? Seria egoísta não pensar nela, e sim naquele balão?
Por Deus, era um balão. Somente um balão. Simplesmente um balão.
...
Um balão que tinha, dentro de si, o melhor de mim.
Quase como era com ela.
Quase.
...
Pensei nele.
Ninguém saberia, afinal, certo?
...
Soprei a vela.
Dobrei o bilhete.
Fui para o meu quarto.
...
...
...
...
...
...
Em minha cama...
Um balão.
Um balão vermelho.
Um balão vermelho sangue.
...
Não haviam palavras.
Fazia pouco mais que 20 anos, talvez mais.
...
Continuei olhando para ele, sem piscar, sem respirar.
A situação parecia tão frágil que... A qualquer momento, ao mero movimento, tudo se desfaria. Quebraria em milhares de pedaços de dor. E novamente.
E as pessoas dizem que algo que se quebra, quando consertado, nunca volta a ser o mesmo.
É, de fato.
Mas se esquecem que... Mesmo "consertado", as coisas podem quebrar novamente.
Foi o que senti.
Novamente.
O medo de perdê-lo.
...
Dane-se o medo.
Corri para o balão e agarrei sua corda. Afundei meu rosto o máximo que pude naquela borracha vermelha, como se não soubesse que poderia estourar se fizesse aquilo.
Estava tudo certo, mais uma vez. Só que sem medo. Sem aquilo que me faria perdê-lo.
E...
Percebo um bilhete, no canto, que eu não havia notado antes pelo êxtase do reencontro.
"Foi a coisa mais linda que já ouvira. Um menino e um balão. Tão inocente. Tão sensível. Tão precioso. Tão você.
Foi por esse alguém que eu me apaixonei. Esse alguém, que é incrível. Esse incrível, que é você.
Não desejava roubar-lhe o que esse balão significa para você. Entendo a minha posição. Mas confesso, tomarei emprestado, porque palavras inteiramente minhas nunca expressariam o que sinto, afinal.
Você. Esse você que você é. Eu estou perdidamente apaixonada por esse você.
E agora... Desejo me apaixonar por esse você que eu não conheço.
Esse você quando estava com este balão vermelho.
Se você não era o melhor de você... E eu me apaixonei... Quero conhecer o seu melhor. O seu auge. O seu máximo. O seu você verdadeiro.
Meu amor. Minha estrela. Meu balão. Meu você." ...

Já desejaram tanto algo... Com toda a sua existência... E de repente aquilo já não vale mais?

Já desejaram tanto algo... Com toda a sua força... E então parece já tê-la alcançado há tempos, mas não tinha se dado conta?

Já desejaram tanto algo... Com toda a sua esperança... E nunca notou que ela estava bem na sua frente?

Não.

Não era o balão que me trouxe tudo aquilo.

Foi ela.

O balão é o que ele sempre foi. Borracha vermelha e gás.

E ela... Ela também é o que sempre foi. Ela é a minha musa. O meu máximo. Ela é incrível.

Ela... Ela possuía o meu melhor eu.