CAPÍTULO IV

Ao acordar, estava preso no chão por algemas de gelo saindo da neve, não conseguia me mexer, não importava o esforço que eu fazia. O círculo mágico voltara a brilhar e o demônio barbado estava ajoelhado ao meu lado com a mão em meu peito. Tentei abrir minhas asas para voar, mas elas não apareciam de maneira alguma. Estava ficando assustado e nervoso quando o demônio empurrou meu peito contra o chão, senti meu coração parar, minha visão voltou a escurecer e desmaiei outra vez. Acordei com tapas em meu rosto e alguém me chamando, sua voz era rouca como a de Allen, porém tinha certa maldade em suas palavras.

– Acorde. – chamou.

Abri meus olhos devagar, tentei mover meus braços para acertá-lo, mas ainda estava preso ao gelo. O Sol batia em meus olhos e as nuvens voavam bem próximas a nós.

– Tu, – ele disse apontando para um dos homens de manto preto. – leve-o ao segundo selo.

– S-sim, senhor. – gaguejou ele.

Senti minha barriga queimar, o gelo começou a derreter e fui puxado pelo feiticeiro. O demônio de orelhas pontudas se aproximou e levantou minha camisa, agora havia uma pequena tatuagem acima de meu umbigo em formato de raio, parecia ter sido feita com ferro de marcar gado, queimava, mas devido minha aura angelical cicatrizou rapidamente. Asas diabólicas nasceram das costas do feiticeiro que começara a levitar devagar devido ao meu peso.

– Senhor Azazel, – chamou o encapuzado que me segurava. – não vens conosco?

Ao falar “Azazel”, notei que se referia ao demônio que o ordenara me levar ao segundo selo. Lembrei-me de histórias que ouvira há anos, um anjo chamado Azazel que teria sido expulso por ajudar Lúcifer na antiga guerra. Após o aprisionamento de Lúcifer, esse anjo tornou-se um dos príncipes do inferno, o pecado capital da Ira.

– Os acompanharei assim que possível. – respondeu o demônio.

Ao olhar para seu rosto, percebi que as íris de seus olhos haviam mudado de cor, de um brilhante azul-celeste para um amedrontador vermelho rubi e a parte que outrora fora branca de seus olhos, agora possuía uma coloração de puro preto, suas íris se moviam como se tivessem pequenas nuvens rodeando o pequeno círculo vermelho. Segui com meus olhos até a cintura de Azazel, ali estava minha espada, perdera sua coloração azulada, agora era preta como os seus globos oculares, mas eu sabia que era a mesma devido ao cabo dourado com desenhos de pequenas cobras e uma cabeça de dragão em seu punho. Tentei me soltar dos braços do encapuzado, mas ele apertou meus pulsos e suas mãos começaram a queimar meu antebraço. Ele segurou-me com apenas uma das mãos e sacou uma pequena adaga prateada enfeitiçada e colocou-a em meu pescoço, ameaçando cortar minha garganta.

– Tu não vais conseguir escapar. – disse ele com sua voz aguda e chiada.

Azazel deu uma breve risada ao ouvir seu servo. Coloquei minha mão por cima do braço do feiticeiro e pus toda a força que eu tinha para fazer com que ele afrouxasse um pouco meu braço, ele apenas queimou mais ainda até que cedi. Pensei que poderia tirar a adaga de sua mão, então com meus pés livres, dei um impulso para frente fazendo com que ele desequilibrasse e tivesse que soltar a adaga, consegui pegá-la no ar e esfaqueá-lo no estômago. Abri minhas asas bem a tempo de me livrar de um grande impacto com o chão que agora estava sem neve, Azazel se espantou e deu um pequeno pulo para trás. Ouvi o barulho do corpo de seu servo colidindo com a terra e os outros três avançaram contra mim.

Eu ainda estava dolorido e sentia minhas asas tremerem devido a flechada que haviam me acertado, mas consegui impedir que minha garganta fosse cortada e que outra flecha fosse cravada em mim. Usei minhas pernas na pedra para impulsionar meu corpo até os feiticeiros que voavam por cima de mim, um atirava flechas com seu arco dourado; o segundo arremessou uma adaga, porém tinha uma péssima pontaria e passou a cerca de 1 metro de distância de mim. Já o terceiro, que vinha rapidamente em minha direção, conseguiu morder meu braço com suas presas, possuía caninos como os de um leão. A mordida fez meu braço adormecer, por sorte consegui perfurar seu crânio com a adaga fazendo-o queimar e explodir durante sua queda. Os dois restantes resolveram me atacar simultaneamente, como eu não poderia usar meu braço esquerdo, afastei o que segurava o arco com um chute em sua barriga e joguei a adaga certeiramente na garganta do outro.

Notei que o arco caíra ao chão quando chutei seu portador, desci rapidamente até ele e peguei-o, restava apenas uma flecha, eu só tinha uma mísera chance para derrotá-lo. Ele deixou cair seu manto preto, agora usava apenas uma toga de mesma cor. Olhei para Azazel e ele estava parado com uma expressão de espanto no rosto, mas logo se recompôs e tentou em vão criar uma outra onda de neve. Aproveitei a sua guarda baixa e parti em direção a ele para pegar de volta minha espada, o feiticeiro que agora estava desarmado avançou para tentar salvar seu mestre. Apontei a flecha para a cabeça de Azazel e atirei-a, mas o seu servo colidiu de cabeça com meu braço fazendo a flecha desviar e passar raspando pela barba do príncipe do inferno. Um filete de sangue preto escorreu de sua bochecha onde eu havia acertado a flechada. Com a adaga, perfurei o demônio de toga no peito e liberei um pouco do meu poder transformando-o em cinzas com minhas chamas azuis. Azazel veio até mim com a minha própria espada em punho, a mesma emanava uma aura negra, eu sentia uma sensação estranha vinda da lâmina negra. Azazel levantou a espada para o céu e bateu forte o seu pé no chão trazendo de volta a neve que sumira com o círculo do ritual. Gelo começou a se formar perto de mim e eu já não conseguia me mover, minhas pernas estavam congeladas. Com um movimento rápido, Azazel fez um fino corte em meu peitoral, rasgando a camiseta cinza de Allen e fazendo meu sangue braco escorrer pela barriga. Tentei interceptá-lo agarrando seu braço direito e apertando-o liberando minha aura de anjo, oque fez com que seu braço sofresse queimaduras devido a energia pura de meu poder. Ao olhar para seu rosto vi que, diferente dos outros demônios, ele não possuía presas, nem ao menos cheirava a enxofre como eles.

Será que ele está possuindo o corpo de um humano como fiz com Allen? Pensei.

A dormência em meu braço esquerdo passara, pensei que talvez pudesse tentar exorcizá-lo. Concentrei toda a minha energia nos cinco dedos de minha mão esquerda e então uma pequena chama de fogo azul brotou em cada um deles. Torci o braço de Azazel fazendo-o derrubar a espada no chão com um baque, imobilizei-o e toquei seu peito com meus dedos flamejantes e um grito abafado e grave saiu de sua boca, seus olhos mudaram para amarelo e então para um branco totalmente opaco, sem vida. Seu corpo todo começou a piscar com uma luz esverdeada. Peguei minha espada no chão ainda com fogo em meus dedos, oque fez com que ela voltasse a sua coloração prateada original com chamas azuis em volta. Cravei-a no crânio de Azazel, sua cabeça estourou em sangue preto espalhando-se pelo chão ao seu redor, ele não possuíra um corpo humano, afinal.