Liberdade de uma Deusa escrita por Saibotris, Ana Katz, Laurah Winchester, Gabriel Teixeira, Larissa Almeida, Thais Cabout


Capítulo 8
Anastácia


Notas iniciais do capítulo

Aqui mais um!
Espero que gostem ;)



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–Espero que você saiba o que está fazendo. – Garret falou, ainda abraçando Safira.

–Também espero.

Eu escutava a conversa, sem fazer um movimento. Para eles, eu estava dormindo que nem todos os outros, mas eu tinha os instintos de uma assassina, e dormir não era uma opção no momento.

Garret estava de volta, meu mestre, Oberon, estava sumido. Eu não tinha nada que me fizesse conseguir dormir no momento, ainda mais agora que Safira iria embora.

–É melhor você dormir um pouco então. – disse Garret se levantando e tocando o ombro de Safira.

–É mesmo... – ela disse, se direcionando para uma pedra, deitando encostada a ela. - Boa noite

Fechei os olhos no momento em que Garret se virou para o local onde estava. Depois de alguns segundos, senti algo se deitando do meu lado. Era Garret, como pude confirmar nos segundos seguintes ao abrir de fininho um de meus olhos.

Ele já estava de olhos fechados, pretendendo que dormia, mas eu podia sentir que ainda estava bem acordado.

–O que aconteceu com você? – ele abriu os olhos.

–Anastácia, você está acordada?

–Sim, assim como você. – ele deu um sorrisinho.

–Me parece que você nunca vai mudar.

–No fundo ninguém muda.

–Tá certo...- ele disse se endireitando na pedra que havia atrás de nós, se sentando.

–O que vamos fazer? – disse, me sentando também.

–Temos que encontrar Úrsula.

–E Oberon também, assim como Callie e a quinta.

–O bom que eu já andei adiantando uma pesquisa sobre a atual posição de Úrsula. Antes de Oberon ser capturado eu e ele estávamos em contato, e ele me deu informações valiosas sobre como encontrar ela, isso sem contar as informações que Safira nos passou.

–Ele sabia que ela era a segunda?

–Sim, e se bobear deve saber sobre a quinta também. Afinal, foram os irmãos dele que as escolheram. E além disso, ele é um deus.

–Oberon, o deus do ar. – comentei.

–Não só do ar como do tempo, no caso de você não saber.

–Sério?

–Sim. Ele pode saber muita coisa de tempos futuros. Nunca te estranhou as cartas dele terem jeitos de matar pessoas com coisas que nem existem ainda?

–Como a do trem?

–Exatamente a do trem. – ele riu um pouco.

–Eu senti falta de você. Eu achava que você pensava que eu tinha morrido.

–Eu posso sentir a sua energia. E só algum tempo depois, Oberon veio falar comigo novamente. Eu nunca desistiria assim tão fácil de você. – eu sorri por alguns segundos.

–Mas então por que você não falou comigo antes?

–Eu não podia. Mas não pense nem por um segundo que eu me esqueci de você.

Nesse momento eu encostei a minha cabeça no ombro dele.

–Que bom.

E finalmente, eu consegui adormecer completamente.

***

Na manhã seguinte, eu acordei ao ouvir Scarlett chamando Safira até que sua voz ficasse rouca.

–Onde ela se meteu? – perguntou Azá.

–Ótimo, nós fomos até outro continente para ela simplesmente ir embora! – comentou Samuel.

–Ela foi tomar o seu próprio caminho. – disse Garret, fazendo com que todos se calassem. – E por isso não devemos segui-la, e sim tomar nossos caminhos. Safira sabe o que está fazendo, e por isso devemos deixar com que ela faça seja lá o que tem em mente. – todos se entreolhavam, menos eu. – Agora nosso objetivo é encontrar Úrsula, a quinta, Callie e Oberon. Nós não temos muito tempo, já que os demônios estão não só atrás de nós como atrás deles, isso sem contar que dois já foram capturados!

–Então, acho melhor começarmos logo, então. – disse, me levantando e Garret me olhou. – Mas primeiro temos que decidir quem vamos encontrar.

–Não devíamos procurar Úrsula?

–Sim, mas na minha opinião a prioridade agora é encontrar Oberon. Com ele do nosso lado temos muito mais chances de acharmos as outras. E sabe-se lá o que os demônios estão fazendo com ele. E, além disso tudo, já que Callie também foi capturada por eles, talvez encontremos os dois no mesmo lugar. – todos me olharam desconfiados. – É basicamente que nem matar dois coelhos com um tiro só.

–Você quer que a gente vá diretamente para o covil de nosso inimigo? – perguntou Azá.

–E que escolha temos?

–Isso não está cheirando bem. – comentou Samuel.

–O que quer dizer?

–Você tem um feitiço feito por demônios em você e quer que a gente simplesmente vá direto para o lugar que eles estão?

–Você está tentando insinuar que eu sou um deles?

–Quem sabe?

Rapidamente saquei a rapieira e a apontei para Samuel, dizendo:

–Tente desconfiar de mim novamente e vamos ver no que vai dar.

–Calma aí! – interviu Scarlett.

–Controlem-se! – exclamou Azá.

–Anastácia, guarde a espada. – comentou Garret.

Guardei a arma branca, sem tirar um segundo meus olhos de Samuel. Quem era ele para suspeitar de mim?

–A ideia de Anastácia tem fundamento. – disse Garret. - Mas mesmo assim ainda deveríamos ir atrás da segunda e da quinta. E ir direto no covil deles seria muito arriscado.

–Não temos ideia de onde ele esteja. Eu ainda acho que devemos encontrar Úrsula, antes que os demônios a encontrem. - falou Azá.

–Estamos ficando sem tempo. - comentei. - E mal sabemos por onde começar.

–Mesmo que eu queira encontrar Oberon, eu acho que as chances são maiores para encontrar Úrsula. – comentou Garret. - E eu posso pensar em algumas coisas para começar.

–Tipo?

–Safira me disse que a não via há muito tempo, mas, como encontrei nas minhas pesquisas e também das coisas que eu sei, Úrsula gostava muito de ir à um templo, onde passava horas e as vezes até dias refletindo.

–E onde fica esse...templo? – perguntou Scarlett.

–Fica em uma floresta em Portugal. Temos que partir para lá imediatamente. Mas primeiramente eu preciso passar em Florença para ajeitar algumas coisas. Podemos nos encontrar lá? - explicou Garret.

***

Seguimos imediatamente para Portugal. Ao chegar na floresta que Safira tinha indicado quando conversávamos na viajem para Roma, começamos a nossa procura pelo templo.

Nos separamos e combinamos que assim que a noite caísse, caso ninguém encontrasse o templo, iríamos nos reencontrar na entrada da floresta.

Era uma floresta curiosa, que eu desconhecia de todos os meus estudos. Mas isso não queria dizer que me perderia facilmente. Mas para evitar isso, cada um de nós marcava nossos caminhos com marcas nas árvores e no terreno.

Depois de muito procurar, encontrei uma construção de pedra. Já estava escurecendo, mas não importava. Se aquilo fosse o templo, não podia perder a chance de descobrir.

Gritei para os outros, mas não recebi resposta alguma. Eu teria que entrar sozinha.

Entrei, vagarosamente, olhando para todos os lados e com a espada sacada. Sabe-se lá o que encontraria uma vez que entrasse lá.

Para a minha sorte, não havia nada absurdo lá dentro. Assim que entrei em um salão com chão de mármore, vi uma figura ajoelhada no chão. Uma mulher de um vestido alaranjado e um véu branco, quase transparente.

Me aproximei lentamente, com a espada ainda erguida. Antes que pudesse encostá-la nas costas da moça, está se virou, me olhando. Seu rosto estava coberto por um pano branco, que só deixavam seus olhos de fora.

Ao olhar para o par de olhos que me encaravam, notei que estes eram de um amarelo bem claro, e possuíam pequenos pigmentos de laranja e vermelho.

Assim que notou que eu levantava a arma branca na sua direção, a mulher recuou. Ao perceber a situação, guardei a espada esperançosa, levantando as mãos em sinal de paz.

–Eu não vou atacar você. Você deve ser Úrsula, se não me engano.

–Sim. - ela disse, tirando o pano do rosto e dando um sorriso.

Logo em seguida, ela abaixou também o véu. Era uma moça de feições bonitas. Seus cabelos dourados e encaracolados caíam sobre seus ombros que ostentavam marcas estranhas. Ela era mais ou menos da minha altura, só um pouco mais baixa, como pude notar depois.

–Como me encontrou?

–Eu tive um pouco de ajuda...você confia em mim?

–Claro. Porque não confiaria?

–Porque não nos conhecemos, talvez?

–Não nos conhecemos? Pelos deuses... - ela parecia preocupada.

–O que houve?

–Não é nada. - ela sorriu, me olhando novamente. - Você está sozinha?

–Não, eu estou com alguns amigos. Temos que nos reencontrar com eles.

–Safira, ela está com você?

–Não exatamente. Eu a vi um tempo atrás, mas ela se separou do nosso grupo. Mas na certa vamos nos reencontrar com ela em breve também. Agora precisamos ir. A propósito, meu nome é Anastácia.

***

Ao me ver, Scarlett, Samuel e Azaléia, agora reunidos com Garret, não sabia se queriam me xingar por ter me atrasado ou se queriam me abraçar por saber que estava viva.

–Pelos cabelos brancos de Oberon! - exclamou Garret. - Já estava começando a pensar o pior.

–Calma. - falei. - Eu estou bem.

–Porque você demorou tanto? - perguntou Scarlett.

–Se perdeu? - perguntou Samuel.

–Não. Eu encontrei algo. - seus olhos se encheram de esperança. - Não algo, alguém. Eu trouxe alguém.

Nesse momento, Úrsula saiu do meio das árvores, para a surpresa de todos.

–Eu estaria certo em afirmar que essa é a tal Úrsula que estávamos procurando? - perguntou Azá.

–Garret! - exclamou a moça, correndo na direção do velho amigo.

–Quanto tempo. - disse ele, abraçando-a. - E você não mudou nada.

–Já você parece ainda mais alto do que da última vez.

Última vez? Eles se conheciam pelo visto. Mas como? Isso com certeza estava relacionado ao fato de que Safira também parecia bem “íntima” dele. Mas como os três estavam relacionados? E porque será que Úrsula falava comigo como se soubesse quem eu fosse?

–Eu agradeceria se me apresentasse aos seus amigos. - ela falou.

–Claro. Essa é Scarlett. Samuel. Azaléia. - disse, apontando para cada um.

–Mas me chame de Azá, por favor. - ele comentou.

–E a moça que te encontrou é Anastácia. - ela me olhou.

–Eu sei, ela me disse.

–Agora, vamos que cuidar dos assuntos importantes. - cortou Azá.

–É verdade. Mas antes tem um favor a lhe pedir. - completou Garret. - você poderia por favor tirar o feitiço que fizeram em Anastácia?

–É claro - ela se virou para mim. - Bem que eu notei que havi algo estranho.

Ela foi na minha direção, me analisou por um tempo e disse algumas palavras com a mão levantada para mim.

Depois de um tempo, perguntei, esperançosa:

–Funcionou?

–Não. - ela respondeu, desapontada.

E nesse momento, senti mais uma de minhas mechas ficando branca.

– Eu não consigo desfazer. - ela dizia, tentando várias vezes a mesma coisa. - Parece que há algum tipo de feitiço de bloqueamento. Quem o fez é muito poderoso e também muito sábio. Temo que não conseguirei desfazê-lo.

–Então como desfazemos?

–Ou arranjamos o exato feitiço e o código de bloqueamento, ou precisaremos daquele que lançou o feitiço para desfazê-lo.

–Isso não é bom. - comentou Garret. - Quando nos encontrarmos com Oberon vamos ver se ele consegue dar um jeito nisso...

–Safira nos disse que você sabe a identidade da quinta escolhida. É verdade? - interrompeu Azaléia.

–É sim. Mas temo que ela será um problema.

–Por que?

–Porque ela está com o inimigo. Seu nome é Cassandra.

De repente, ao ouvir tal nome, pequenos fragmentos de memórias apareceram em minha mente.

Aquilo seria só mais um contrato. Rotina, como sempre. Dessa vez, o mestre Odilon tinha mandado Garret ir comigo, afinal, o contrato seria fora da Itália, e sim na França, e, por alguma razão, sempre que os contratos eram fora da terra italiana, o mentor mandava Garret para ir comigo.

Não que aquilo fosse um problema. Afinal, era Garret. Se fosse outra pessoa com certeza aquilo se tornaria um empecilho, um incômodo, o que foi no começo. Garret era uma pessoa estranha no início, e eu sempre perguntava para o mestre por que ele tinha que vir comigo.

Mas as coisas mudaram, mudaram para melhor. Garret se tornou muito mais do que um amigo para mim, ele me dava conforto, segurança. Ele era a melhor companhia que eu podia arranjar.

Tínhamos que assassinar um lorde que vivia em algum palácio. Nada muito difícil, se você parasse para pensar em todas as coisas que já tínhamos feito.

Matamos ele sem mais nem menos, mas fomos surpreendidos por guardas que nos cercaram, impedindo nossa saída.

Estávamos prontos para atacar quando todos eles caíram no chão mortos.

Minha vida mudou completamente depois daquele momento.

Uma mulher de cabelos escuros e pele bronzeada entrou no local. Homens encapuzados surgiram atrás de nós e nos prenderam. Tentamos reagir, mas rapidamente perdemos os sentidos, com um golpe recebido na nuca.

Quando acordei estava presa e ao meu lado estava Garret. A cabeça de Garret sangrava um pouco, ele estava ferido.

–Garret! Garret! - gritei, tentando acordá-lo.

–Anastácia. - ele abriu um dos olhos.

–O que aconteceu?

–Eu não sei.

–Onde estamos? - eu sentia um terror que mal sabia que estava ali.

–Calma, tudo vai ficar bem.

–Não, não vai. - a mulher apareceu, nos encarando. Leve a garota para o mestre.

–O que vão fazer com essa daqui. - homens estranhos abriram a porta da cela e me puxavam para longe de Garret.

–Não sei. Mas com certeza terei a chance de provar o seu sangue quando ela sucumbir ao sono profundo. - ela riu.

–Cassandra, sempre ficando com a melhor parte, não é?

–Óbvio. Carrascos como você não merecem tais privilégios. Agora, ao trabalho!

Eu olhava para trás, encarando Garret. Eu me sentia como naquela noite de incêndio. Eu sentia medo. Eu sentia que a esperança fugiria e eu iria morrer. Lágrimas saíram de meus olhos e, vendo isso, Garret dizia repetidamente:

–Vai ficar tudo bem!

–Não...- Garret disse. - Você quer dizer aquela Cassandra?

–Sim.

–Não pode ser. Isso quer dizer que ela deve estar no mesmo lugar que Oberon e Callie estão. No esconderijo dos demônios.

–Exatamente. Mas já era de se esperar que ela fosse corrompida. Afinal, foi o quinto que a escolheu, e ele também foi levado ao lado negro.

–Quinto?

–Sim, o quinto deus. São cinzo deuses. Mas eu não ouso pronunciar o nome dele aqui. Não é seguro.

–Agora temos que encontrá-los, então. - todos me olharam surpresos. - As duas que nos faltam estão com eles: Callie e Cassandra. Isso sem contar que Oberon deve estar lá também. Temos que salvar quem pudermos e temos que arranjar um jeito de arrancar Cassandra deles!

–Mas por onde começamos?

–Poderíamos tentar ver no Santuário. - comentei.

–O que? – perguntou Azá.

–O Santuário onde Oberon me treinou. Um local escondido que uma vez serviu de veneração aos deuses. Talvez tenha algo lá. Não sei, alguma pista ou algo do tipo.

–E onde fica esse...Santuário? – perguntou Scarlett.

–Fica na cidade que eu vivi a maior parte da minha vida. Fica em Florença.

***

Uma vez que chegamos na cidade florentina, passamos a noite em uma hospedaria que encontramos no caminho, para que, no dia seguinte, fossemos direto ao Santuário.

Já que éramos seis, tivemos que nos dividir em dois quartos. Samuel, Azaléia e Garret ficaram em um e eu, Úrsula e Scarlett ficamos no outro.

A hospedaria contava com uma taverna, onde eu passei uma parte da noite, já que ainda não conseguia dormir direito.

Estava tomando uma caneca pequena de cerveja quando notei que Garret se sentou na minha frente.

–Você vai ficar me perseguindo?

–Eu sou seu protetor, é a minha função. Você não devia estar dormindo?

–Ainda está cedo e eu não tenho sono agora.

–Pode ser cedo, mas todos os outros já estão indo dormir.

–Eu não consigo.

–É por causa de Oberon, não é?

–Eu temo que não iremos conseguir encontrá-lo. E também temo que ele não esteja bem.

–São só demônios, ele é um deus.

–Se demônios conseguiram capturar um deus eles realmente devem ser encarados como uma ameaça. E não é só Oberon. Tudo o que anda acontecendo...parece que é um pesadelo e eu só quero acordar dele.

–Calma, tudo vai ficar bem.

–Essas foram as mesmas palavras que você disse naquela noite. E olha tudo o que aconteceu...pode ter certeza, essas são as últimas palavras que me trariam conforto.

–Você precisa se acalmar.

–Não tem como eu me acalmar. Na minha vida, sempre algo dá errado.

–Você teve seus momentos felizes, todos tem.

–Não tenha tanta certeza disso...

Sem pensar tinha falado aquilo. Ao olhar para os olhos de Garret percebi que ele se sentia um tanto ofendido. Parecia que eu não ligava para nada do que tinha acontecido na época que ele ainda estava na irmandade.

–É claro que teve alguns... - ele parecia mais relaxado agora. - Mas é tanta coisa acontecendo. Eu só queria que tudo voltasse a ser como era naquela época.

–Que época?

–Você sabe. Já faz mais de dez anos, mas eu ainda me lembro. Nós fazíamos contratos para a irmandade. Tudo era tão simples e fácil. A vida era uma aventura, mas era uma aventura boa. - ele sorriu ao ouvir minhas palavras.

–Aquela época era boa. - ele tocou em uma das minhas mãos, que estava em cima da mesa. - Mas temos que seguir em frente e aceitar os obstáculos que se colocam no nosso caminho. Lembra o que o mestre dizia? O caminho só se torna melhor no final...

–...e só chegamos no final se seguirmos em frente.

Nesse momento, uma moça recolheu a minha caneca já vazia.

–Traga uma para mim, por favor. – pediu Garret. – Mas é sério. Você precisa descansar, é sério...Desse jeito-

Nesse momento, o ambiente pareceu perder todos os seus sons. A voz de Garret sumiu, assim como todas as outras que infestavam o ambiente. De repente, uma voz clara veio a minha mente.

–Vá para a biblioteca de Serpentário. – disse a voz.

–Anastácia? – perguntou Garret, me tirando do transe. – Está tudo bem?

–Sim, sim. Você está certo. Eu tenho que descansar. – disse, me levantando. – E você deveria ir também.

Ele tomou a caneca de cerveja o mais rápido que pode, lutando para que isso não congelasse seus neurônios de tão gelada que estava.

Subimos as escadas e uma vez que estava na porta do meu quarto, dei um beijo na bochecha de Garret, dizendo em seguida:

–Boa noite.

–Para você também.

Entrei no quarto. Scarlett já dormia. Rapidamente fui na direção das minhas coisas. Troquei de roupa, colocando um vestido vermelho e longo. Fiz uma trança e coloquei uma tiara. Por baixo do vestido escondi duas adagas, caso fosse necessário. Coloquei um sobretudo escuro de veludo e luvas e saí do quarto de fininho.

A voz na minha mente. Era definitivamente de Oberon. Eu tinha que ir para a biblioteca de Serpentário.

Serpentário era o apelido de um homem que vivia em Florença. Ele tinha um esconderijo onde se podiam encontrar todo o tipo de coisas (quando eu digo todo o tipo de coisas, eu realmente quero dizer TODO o tipo de coisas). Mas, mesmo que fosse um trapaceiro e muito traiçoeiro, ele tinha dívidas com Oberon, digamos que ele lhe devia até a vida.

Nesse esconderijo, havia um cofre secreto que levava a uma biblioteca gigante, cheia de livros perdidos e raros, o que incluía coisas sobre o próprio Oberon.

No meio das ruas, já vazias naquela hora, encontrei várias tábuas de madeira e uma cortina de veludo rosada por cima, passando pela cortina, e depois atravessando a pequena passagem que tinha embaixo das tábuas presas junto à parede.

Ao entrar no local, notei pessoas jogadas no chão (bêbados, muito provavelmente), gente gritando, gente bebendo, pessoas rindo, pessoas dançando.

Atravessei o local, desviando de qualquer um que tentasse tocar em mim, desde ladrões a mendigos.

Ao chegar do outro lado, dei em um local com uma grande cortina vermelha. Na frente dela, havia um homem de feições um pouco estranhas (de acordo com Oberon, ele tinha síndrome de Down) e de estatura baixa, que usava roupas mais arrumadas do que as da maioria das pessoas de lá.

Me agachei um pouco e lhe perguntei:

–Você poderia chamar o seu mestre, por favor?

Ele só assentiu e passou a cortina, sumindo. Alguns minutos depois, um homem alto, com músculos, mas do tipo mais magro, cabelos claros ajeitados em um coque para trás, um sobre – tudo negro e com vários anéis nos dedos e com uma tiara na cabeça saiu de trás das cortinas.

–A quem devo o prazer?

–Pierre, meu mestre comanda que me dê acesso ao cofre.

–Entre. Não se pode falar sobre tais coisas aqui.

Passei as cortinas, entrando em um ambiente totalmente diferente. Um chão limpo e liso. O ar não era tão carregado e podia até sentir um aroma gostoso no ar. No fundo, uma cadeira gigante e luzes em volta dela. Na esquerda, várias mesas e outras coisas...os “estudos” de Serpentário. Na direita, mais cortinas e vários enfeites.

–Pode repetir o que disse?

–Eu disse que meu mestre quer que você me dê acesso ao cofre.

–Eu não deixo ninguém entrar no meu cofre. - ele dizia, me rondando e me analisando.

–Eu sou da irmandade branca, você tem que me deixar entrar. Você deve ao mestre.

–É, mas ele que pode entrar, não subordinados.

–Eu não sou uma mera subordinada.

Nesse momento, saquei uma das adagas e o empurrei contra a parede, ameaçando-o.

–Eu posso te provar, se você quiser.

–Tá. Tá. - ele repetia, quase sem fôlego. - Não há necessidade de violência.

–Agora. O cofre!

–Sim, o cofre. - ele dizia, indo na direção das cortinas.

Puxou uma corda, e as cortinas subiram, revelando uma porta grande e dourada com uma grande espiral no centro.

Pierre, o Serpentário, tirou uma chave escondida em m colar por baixo da camisa e destrancou a porta, girando a abertura por um bom tempo.

Uma vez que a porta se abriu, eu entrei, mas Pierre segurou meu braço, antes que pudesse seguir meu caminho.

–Uma vez que sair, me avise para que eu possa trancar a porta.

Eu assenti, continuando o meu caminho. E assim, ele fechou a porta.

Ao entrar vi a grande biblioteca em que Oberon me levou tantas vezes.

Comecei a procurar que nem uma doida algo. Alguma pista. Deveria ter alguma razão para Oberon ter falado comigo na minha mente.

Depois de muito procurar, estava desistindo. Nada parecia aparecer. Porém, andando de lá para cá, pensando, notei um único livro que não estava nas estantes. Pierre podia ser meio mal cuidado, mas se tinha algo com que ele tinha muito cuidado era aquele lugar. Não seria descaso dele. Se aquele livro tivesse caído, Pierre teria visto. A não ser que ele não deveria ser visto. Poderia ter sido um livro qualquer que eu tivesse deixado cair, mas não era. Ele estava embaixo de uma mesa.

Peguei o livro e vi que uma página estava marcada e, nela estava, circulado, o número da página: dez.

Não parecia ser nada. Então tentei ver se o livro tinha alguma outra coisa. Descendo os degraus que se colocavam na minha frente para guardá-lo no devido lugar (cada livro tinha uma marcação indicando o local onde devia ser guardado), ouvi a voz de Oberon novamente.

–Olhe para baixo.

Olhei para baixo e só vi os degraus cobertos de tapete vermelho. Olhei para o livro novamente. Degraus. O número dez circulado. Percebendo o sentido daquilo, fui correndo ao décimo degrau e tirei o tapete de cima. Vi que o degrau tinha uma espécie de tampa, a qual tirei e achei um livro com o nome “França”. Ao abri-lo, a página marcada estava totalmente riscada, exceto por uma palavra: Bastilha.

Era isso. Oberon estava na Bastilha.

–Seu velho bastardo. - comentei, aliviada e sorrindo. - Isso é ótimo, tenho que informar os outros. - disse, já me levantando.

–Você não vai a lugar algum. - disse uma voz.

Me virei e vi aquela forma novamente. Um homem alto de cabelos negros e pele azulada. Olhos vermelhos e dentes desafiadores. Ao lado dele estavam vários outros, e um deles levava Pierre pelo pescoço.

Eu estava em estado de alarme, rapidamente saquei as adagas, pronta para quem atacasse.

–Não ouse.

–Ah, sim. Eu ouso sim.

Nesse segundo, Uma faca atravessou o corpo de Pierre, causando sua morte. Eu recuei, com medo do que poderia acontecer.

Levei um golpe pelas costas e caí no chão.

–Não tente resistir. Isolamos essa área com um feitiço, então seus feitiços de fuga serão inúteis. Prendam-na.

De repente, senti correntes de ferro prenderem meus punhos e pernas. Vários deles pularam em cima de mim e começaram a me rasgar com suas garras. Então, alguma coisa me fez ficar tonta. Aos poucos ia perdendo os sentidos.

–Calma, ela ainda não pode morrer. - e assim os demônios pararam.

A última coisa que pude ouvir foi o líder falando com um de seus demônios:

–Mande chamar minha escolhida. Ela será necessária. Prepare todos. As outras com certeza virão ao nosso encontro.

***

Ao acordar estava acorrentada, meu vestido, ou melhor, o que sobrara dele, estava em pedaços e todo sujo. Eu sentia vários cortes arderem na minha pele, me causando uma dor intensa. Eu estava presa dentro de uma pequena cela acompanhada de várias outras.

–Onde estou? - gritei. - Ajuda!

Nesse momento, ouvi o barulho de correntes se mexendo, mas não era eu. Me virei para a cela do lado e tentei me aproximar.

Já que estava escuro era difícil de enxergar, mas pude ver um homem, mais machucado do que eu. Com barba bem grossa, porém de cabelo curto. Ele tossia e pelos seus machucados ele deveria sentir uma dor alucinante, mas ele parecia já ter se acostumado. Tentei falar com ele, mas este não respondia.

Olhei para frente e vi mais celas. Forcei os olhos para enxergar cada um que se encontrava nelas. Uma delas tinha uma mulher que, se não fossem os machucados, seria uma das mais bonitas que já vi na vida. Tinha heterocromia, me lembrando de Garret, e seu cabelo era de um belo loiro dourado. Ao seu lado, um homem ruivo, também barbudo que, por alguma razão, me lembrava de alguém, só não sabia dizer de quem.

Então, ouvi o barulho de correntes novamente. Olhei para a cela do meu outro lado, vendo uma garota de cabelos curtos e negros e com um vestido ainda mais vermelho que o meu.

Me aproximei, colocando as mãos na grade e tentei fazer contato com ela também.

–Olá, você sabe onde estamos?

Ao ouvir minha voz, a garota que estava de cabeça baixa e olhava para um ponto fixo da cela, recuou um pouco, se encolhendo.

–Não tem problema, eu não sou nenhuma deles.

–Seu cabelo...

Foi nesse momento que reparei que meu cabelo agora parecia que era branco com mechas ruivas, e não o contrário. Eram tantas mechas que quase não vinha o vermelho que reinava antes.

–Não tem problema. Foram eles que fizeram isso.

–Os demônios...

–Sim. Eu sou Anastácia. Qual é o seu nome?

E nesse momento, a garota levantou a cabeça, revelando um par de belos olhos violetas.

–Meu nome é Callie.


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