Diário de um Anjo Negro escrita por Jenny BiPuPiJiCo


Capítulo 1
Iniciação


Notas iniciais do capítulo

Os religiosos dizem que sempre há uma luz no final do túnel. Antes eu não acreditava, até que um dia a minha luz resolveu aparecer em minha janela, de um ângulo diferente. O sol.Ele sempre esteve ali, mas eu nunca o notei. Isso porque eu estava cega de dor e fui louca o bastante para querer apagar minha existência. Mas ele apareceu e me mostrou que sua luz era pra mim, lá no final do túnel. Sua luz aparece todas as manhãs em minha janela dizendo: Acorde Carolyn! Te trouxe mais um novo dia. Vamos, levante sua preguicinha! Isso era o que eu queria que meus pais dissessem, há muito tempo. Agora não importa mais.Levanto-me e pego um agasalho da cabeceira de minha cama e coloco por cima de minha camisola de seda preta. Vou até a poltrona e sento. Ela é de veludo, vermelho-vinho, que foi colocada ao lado da janela a meu pedido, pois eu poderia ver o sol e também todo o meu quarto. Ele é enorme. Também vermelho-vinho. Mas ainda não está confortavelmente adequado. Só mesmo minha cama, dois criados-mudos, meu closet e o banheiro. Nada de fotos, pôsteres, estante de CDs e nem mesmo de livros. Estão tudo no closet dentro de caixas. Meu verão foi bem corrido e não sei se quero essas coisas. Talvez eu fique com os livros, CDs e pôsteres, mas as roupas colocarei fogo. Não quero nada que me ligue á meus pais. Não mais.Lá vem sua luz queimar minha pele, branca feita à neve. Iluminar meus olhos verdes como uma folha em plena primavera. Iluminar meu cabelo grande e dourado que se esparrama pela poltrona. Secar minhas lágrimas que sempre me visitam todas as manhãs. Recuperar minha sanidade quando já não mais tenho esperanças.



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Eu estou atrasada. Tenho certeza porque meu motorista não para de buzinar lá fora. É o Many, o irmão gêmeo do James Bond, só que com 55 anos, 1,75 de altura e bem mais carismático e engomadinho. Olhos azuis e cabelo branquinho, mas nada de alguma parte sem cabelo. Ele é lindo aos meus olhos e das empregadas, principalmente de Myrna, minha favorita.

Ok. Dou uma última olhada no espelho e vejo se falta alguma coisa. Só passei um batom vermelho que mesmo se eu comesse 24 horas, ele não sairia de minha boca. Presente de minha querida Amberly, vovó. Aliás, tudo aqui foi ela que me deu. Ela teve a sorte de casar com um cara milionário de nascença e que a amava como uma flor precisa de água. Sr. Halzer. Sim, meu avô e este é seu nome. A única coisa que tenho dele de lembrança mesmo, só pra mim, é meu colar de ouro com asas de anjo em volta do meu nome. Quando eu era bebê, minha avó disse que ele achava que eu era um anjo, mesmo que tenha me visto apenas uma vez.

Certo. Toda equipada pro frio. Toca, cachecol, luvas, coturno, duas meias, duas blusas, dois agasalhos. Estou me sentindo sufocada com isso. Mas a Alemanha não é piedosa quando o assunto é frio, mesmo não estando no inverno. Eu gosto do frio, mas minha avó disse que tenho que usar essas coisas, então, não vou discutir. Melhor eu descer.

_ Oh, minha querida Rapunzel! Que carinha é essa? Está tão abatida... Aconteceu alguma coisa minha querida? Teve os mesmo pesadelos?

Minha avó sempre se preocupou comigo. Por isso não pensou duas vezes em me buscar da Filadélfia quando meus pais resolveram se separar e esqueceram que eu estava tentando pular da janela. Essa senhora baixinha e gorducha, vestida com uma madame, toda de preto, com grandes olhinhos verdes e um sorriso tão tranquilo. Me sinto tão bem com ela... Dou um suspiro, sorrio e digo, me sentando na mesa, para despreocupá-la:

_ Não vovó. Não tive pesadelos essa noite. Na verdade, nem consegui dormir muito. Estou muito ansiosa pra esse primeiro dia de aula. Ainda não sei se estou realmente com meu alemão muito bom. E como será que eles vão reagir a minha presença?

_ Ohhh, pare de bobagem Carol! Eles vão te adorar! E não se preocupe com seu alemão. Nós estamos aqui para tirar suas dúvidas e eu conversei com a diretora da sua escola. Ela vai te ajudar em qualquer coisa. E não tenha medo de perguntar aos outros. As pessoas daqui são bem diferentes da Filadélfia, ok? Bem, é normal estar nervosa mas você tem que lembrar... -cortei-a, completando a frase.

_ Que tenho que confiar em mim mesma e que sou eu quem decido o que sou. Sim vó, eu lembro. - olho pra ela e sorrio e ele me retribui.

Ops! Última businada. Pego um pedaço de torta de chocolate e enfio na boca, minha caneca de chocolate quente, meu lanche que Myrna sempre prepara pra mim, enfio na mochila, dou um beijo na minha avó, me despeço e disparo pelo corredor até as escada, onde Many está me esperando com Gerund, a BMW que ele deu o nome. Ótimo. Agora vou com esse carro para todos os lugares aonde vou e ainda por cima com um motorista.

_ Bom dia Carol! Como foi sua noite? Estamos atrasados 10 minutos, mas com essa belezinha aqui, não precisa se preocupar, chegaremos bem a tempo.

_ Bom dia Many! Não dormi muito. Ansiosa demais. Ah, tudo bem. Desculpe-me, mas é que a água da banheira estava muito boa. E a propósito, como está meu alemão? E como foi sua noite?

_ Eu te entendo! Está ótimo. Parece que você nasceu aqui mesmo. Não precisa se desculpar e minha noite foi ótima. Obrigado por perguntar. - disse ele, abrindo a porta traseira para mim. Tudo bem, isso eu não ligo. Sou um desastre para entrar em carros ou sair. Já perdi a conta de quantas vezes cai fazendo isso.

Many sempre agradece. Minha psicóloga disse a minha avó que era para ignorar sutileza comigo, como: senhorita, madame, etc. Como meus pais nunca me ensinaram etiqueta, eu não era acostumada com aquilo. Isso era essencial ao meu desenvolvimento psicológico. Então, minha avó alertou todos os empregados que cortassem essas coisas em minha presença. Me senti em casa sim, mas desconfortável por fazer alguém mudar hábitos por causa de mim. Mas eu não podia fazer nada além de evoluir no tratamento.

Percebi que Many estava concentrado ao volante. Estávamos saindo do portão quando decidi pegar meu livro que minha avó me deu. O Diário de Anne Frank. Quando disse que sempre quis esse livro, ela tratou de comprar a edição mais cara, com capa aveludada e tudo. Sim, eu estou feliz aqui. A mansão fica no meio de um bosque, uma reserva natural decretada pelo governo como patrimônio social. Por tanto, minha avó não podia mexer me nada, apenas morar. Mas ela nem queria, como eu também não iria deixar. Eu sentia a natureza vibrando em minha pele. Isso é maravilhoso!

Exatamente 45 páginas e 20 minutos depois, graças a Gerund e um ótimo trânsito, como Many havia dito, cheguei á porta da Escola Estadual Jacques Cousteau. Homenagem ao oceanógrafo francês que fez suas pesquisas a bordo do Calypso. Pelas pesquisas que eu fiz sobre essa escola, tem um laboratório que conta toda a história dele. Ela deve ser linda mesmo.

_ Bem Carol, chegamos. Preparada?

_ Preparadíssima. - eu disse, arrumando as últimas coisas dentro da mochila. E claro, eu estava mentindo. O friozinho na barriga só aumentava.

_ Ótimo! Boa aula e boa sorte! Lembre-se que qualquer dúvida é só perguntar. Não tenha medo.

Eu sempre fui a melhor aluna da sala. Por isso as pessoas pisavam em mim. Só me chamavam para ajudar nos deveres e quando eu dizia não, eu tinha certeza que haveria alguém do lado de fora da escola no final da aula, me esperando para me dar uma surra.

_ Tudo bem. Obrigada e até as 17:30! - eu disse acenando e disparando pelo gramado. O sinal tocou, ou seja, eu tinha exatamente cinco minutos para encontrar meu armário. Droga.

Eu continuei correndo pelo corredor da escola quando alguém me chamou e eu olhei para trás para ver quem era. E foi ai que aconteceu. Eu trombei em alguém. Eu cai sentada. Em cima do meu cabelo, puxando meu couro cabeludo. Isso doeu tanto que só consegui dizer:

_ Aiiiiiii!!

_ Mas que droga! Garota estupida! Não sabe que não pode correr aqui não é? E porque demônios você não olha pra frente?! Levanta dai!!

Disse uma voz muito grave. Era um garoto, tenho certeza. Eu estava com os olhos fechados ainda, não sabia quem era. Só senti ele me puxando pra cima, me ajudando ou querendo arrancar algum membro meu, porque sinceramente, ele estava me segurando forte demais. Suas mãos estavam em cada braço meu. Abri os olhos para ver quem era e queria perguntar porque me tratava assim. Mas logo me arrependi de abrir. Dei de cara com grandes olhos azuis feito o céu, e estavam me encarando seriamente.

Oh não... Não, não, não, não, não... NÃO!

Eu estava me apaixonando de novo. Droga! Toda vez que isso acontece eu saio com o coração sangrando. Mas ele é irresistível. Cabelos compridos e negros, até um pouco abaixo dos ombros, alto, muito alto, forte para sua estrutura, porque ele é magro, realmente magro pra ter aquela força toda. Ah, mas que boca linda e tem um piercing bem ali no lado esquerdo, lábio inferior. Ele estava me analisando assim como eu fazia.

Ele me soltou e mais uma vez, me xingou:

_ Que foi? Não tem língua? Quer que eu te sacudo pra falar alguma coisa? Responde caralho!

_ Andrew, chega! Esta é Carolyn. Ela é nossa veterana e não sabe das regras. Não devia xingá-la, peça desculpas! Você está bem Carolyn?

_ Ha! Nem morto! Tchau Kate, vou pra minha aulinha. Graças a ela, tomarei mais uma ocorrência.

_ Se pedir desculpas á ela, conversarei com o seu professor.

_ Tchau! - disse ele se virando e andando em direção a sala, assim que tocou o sinal.

_ Eiii, me desculpe... Alguém tinha me cha... - fui interrompida por ele. Ele se virou e mostrou o dedo médio da mão direita. Que maravilha. Isso mesmo. Assim eu não vou gostar de você.

Errado Carol. Você já está apaixonada por ele.

_ Não ligue querida. O Andy é o nosso rebelde mais bem sucedido e inteligente também. Ele é estranho as vezes, mas a gente acostuma com isso. Aliás, meu nome é Katherine, a diretora. Seja bem-vinda!

Andy. Um apelido fofo para um garoto mal-humorado, marrento, mal-educado... E acima de tudo, lindo.

_ Obrigada. Me desculpe, eu estava atrasada e não sabia...

_ Oras, não ligue! Venha comigo. Vou te mostrar a escola, seu horário, as regras, - ela olhou e sorriu para mim quando disse isso - você vai escolher a senha do seu armário e você precisa ver como é o... - parei de ouvi-la quando me agachei pra pegar minha mochila. Me lembrei dele, de todas aquelas roupas pretas, de seu coturno e de seus olhos. Ah, aqueles olhos...

É Carol, você não tem jeito mesmo. Sempre consegue se machucar de uma forma ou de outra.

Voltei os olhos para a diretora. Ele é mais loira que eu, quase um loiro branco, estava de saia preta, camisa social branca, blazer preto , meia-calça da cor da pele, scarpin preto, e claro, um agasalho bem grosso bege. Olhos azuis também, mas não como os dele.

Espera ai. Lembrei de uma coisa. Eu notei isso rapidamente. Quando ele saiu, tinha lágrimas em suas bochechas. Estava chorando...

Mas por quê?

...


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Notas finais do capítulo

Quando Kate terminou de me mostrar toda a escola, me dar o horário, me levar até a sala dos professores para me apresentar á eles dizendo que sou muito inteligente e que vão me adorar, já era hora do almoço. Ainda bem. Minha barriga e meu cérebro não aguentavam mais._ Oh! Já está na hora do almoço. Bem, terminamos mesmo. Você se lembra onde é o refeitório, não é mesmo?_ Sim, posso ir sozinha._ Ótimo, já vou indo. Afinal, saco vazio, não para em pé. Beijos e qualquer coisa é só falar comigo ou o com o Klaus. _ Klaus é o disciplinário da escola. Um senhor meio ranzinza, mas educado até._ Obrigada. Até logo.Fomos em direções opostas. Cheguei no refeitório. Ótimo. Agora que notei que a maioria das pessoas estavam me olhando. Afinal, não é todo dia que vemos uma novata com cabelo tão comprido e loiro e com mochila num refeitório. Fingi que não estava notando. Peguei meu saquinho de lanche. Myrna sempre coloca algo doce e dessa vez era torta, de morango. Sanduíche, suco de uva e torta. Senti alguém se aproximando do meu lado esquerdo. A sombra se projetou sobre mim e de repente uma barra de chocolate apareceu em cima da mesa. Ela foi jogada ali, tanto que parou perto da minha mão. Foi incrível como não se partiu. Uma voz familiar disse:_ Espero que goste. Isso é meu pedido de desculpas. Carolyn não é?Era ele. Andy. Ele disse isso e sentou-se do meu lado me encarando. ...