Lágrima de Primavera - Hiatus escrita por Saibotris


Capítulo 2
Queridas Lembranças


Notas iniciais do capítulo

Bem, primeiramente quero agradecer à Aiyra e à Mayane Souza pelos lindos reviews.
Também não posso deixar de agradecer à Eruwen, que me fez ter mais pressa para postar a história por gostar tanto da sinopse.
Bem, este capítulo foi mais para contar um pouco da história de Melody e Ana, no próximo, provavelmente teremos alguns detalhes importantes que podem passar despercebidos por nossa atenção, e que provavelmente apenas compreenderemos no desenrolar da história.
Em breve, outro capítulo.



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São Paulo,

2 de novembro de 2014.

Querida Ana,



Não consigo não chorar, ou ao menos me abalar ao lembrar da gente. Demorei a dormir essa noite, pensando em quando te veria novamente, quando poderia te abraçar, te beijar, acabar com essa distância que me mata aos poucos. Ah, vida, por que você é tão injusta?

Hoje acordei às 07:00, motivos de: a) festas na rua, b) barulho em casa, c) caminhada. Sim, caminhada. Vou voltar a fazer as típicas caminhadas, ou corridas, tanto faz, sabe... Depende do meu humor e vontade no dia. Você sempre me disse que essas coisas me deixavam mais alegre, acho que é verdade.

Coloquei uma roupa e sapatos confortáveis, e já ia sair de casa, porém me lembrei de que não é legal desmaiar no meio da rua porque você simplesmente não tomou o café da manhã e teve a ideia genial de fazer uma corrida básica. Comi uma fatia de pão com manteiga, peguei uma maçã e uma garrafa com água e parti para o meu caminho.

Dei algumas voltas caminhando pelo quarteirão quando decidi ir novamente à praça de ontem, porém correndo, e assim o fiz. Observei mais atentamente o caminho, reparando em cada detalhe. Percebi que haviam algumas flores num tom de roxo quase azul na calçada, elas eram realmente um amor. Decidi que na volta as pegaria como uma forma de presente para minha mãe.

Quando cheguei na pracinha fiquei maravilhada, haviam várias crianças brincando, os balanços rangiam, enquanto ouvia algumas gargalhadas, o escorregador com uma fila, na qual todas esperavam pacientemente e ansiosamente por sua vez, a gangorra era a que mais fazia barulho, não o ranger do metal, mas sim, as crianças assustadas. Sabe aquela brincadeira de encostar no chão e deixar a pessoa do outro lado presa no alto? Então. Lembro que eu odiava quando faziam isso comigo, mas amava fazer com os outros.

A garotinha e o garotinho do dia anterior também estavam lá, brincando de esconde-esconde com outros amigos, que provavelmente fizeram naquele mesmo momento. Sinto saudades dessa época onde eu conseguia fazer amizades facilmente, não tinha vergonha, sorria por qualquer coisa, e também fazia outras pessoas sorrirem. Ah... Que saudade de ser o orgulho da mamãe.

Sentei-me num banco e comecei a analisar a cena, contar as crianças, os adultos, as principais características de todos. Isso me traz uma vontade de ter filhos. Imagina nossos filhos. Um garotinho primeiro, cabelo castanho e liso, olhos castanhos bem escuros, sorriso grande e lindo... Ah sim, não posso me esquecer da menina, ela vai vir depois porque assim nosso menino pode defendê-la, e quebrar a cara de quem partir seu coração.

Pensar nisso me faz sorrir, porém, logo meu sorriso desaparece ao me lembrar de como o futuro é incerto e traiçoeiro, por exemplo, alguns anos atrás nunca me imaginaria namorando com você, nunca imaginaria que meu pai criaria um ódio mortal por mim, e que minha mãe se tornaria uma de minhas melhores amigas. Nunca imaginei também que você se mudaria para longe de mim, pois, como você sempre morou ao meu lado, sempre tive a impressão de que você ficaria eternamente lá, que quando eu quisesse poderia ir no portão de sua casa, não importando o momento, e seria atendida por você.

Peguei o celular, coloquei meus fones e ouvi uma música, aliás, a música, nossa música. Uma lenta, romântica e melosa? Não. Eletrônica. Por que? Aquele maravilhoso evento de música que aconteceu quando fomos ao parque de diversões.

Ah... Quanto tempo que fomos naquele lindo local, parece que era ainda ontem que aguardávamos ansiosamente na fila, esperando que o parque abrisse.

Nosso primeiro brinquedo... Eu não me lembro ao certo o nome dele, apenas me lembro que ele era uma espécie de gira gira gigante, com diversas cadeiras, sendo suspendidas por correntes, ao girar, era como se as pessoas pudessem voar. Foi essa a nossa primeira escolha, não por ser o mais legal, e sim porque eu pedi, estava com medo, não sabia se aguentaria as emoções dos outros brinquedos. Você deu risada quando eu disse isso, confesso que ri mentalmente também.

Eu teria desistido se você não me arrastasse junto, e agradeço por isso, pois é uma sensação que todos deveriam sentir pelo menos uma vez na vida, a sensação de poder voar, poder explorar o infinito, conhecer cada canto do imenso céu azul.

Depois curtimos um pouco, fomos em diversos locais do parque, e em vários brinquedos, comemos, sorrimos, cantamos, por um momento nos esquecemos de que haviam vários olhares preconceituosos e cheios de ódio sobre nós – engraçado, não falamos que estamos juntas para os que nos conhecem, mas para os desconhecidos conseguimos ser completamente nós mesmas, apesar de nos chatearmos com suas reações, ou, nesse caso, simplesmente fingir que não viu – , porém não ligávamos.

O ápice foi a montanha-russa, o brinquedo com mais fila do local inteiro, porém com uma espera digna. Nessa, nós duas quase desistimos ao chegar na nossa vez, mas não queríamos desperdiçar tanto tempo da nossa vida para nada. Quando entramos no brinquedo estávamos extasiadas, ansiosas, uma mistura de medo e felicidade, era como se o coração fosse sair pela boca, ou até mesmo a sensação de dar o seu primeiro beijo. O carrinho começou a se movimentar, nós demos as mãos numa tentativa de nos acalmarmos, gritamos, nos emocionamos... Simplesmente a melhor sensação de todos os tempos.

BUM! Era como se todo o nosso medo tivesse sido transformado em uma sensação ótima, indescritível. No momento temos pânico, um frio na barriga, mas é um frio na barriga gostoso, que depois queremos sentir novamente, quantas vezes for possível. É como se nossa vida apenas tivesse sido criada para sentir isso, apenas. A sensação de concluir uma missão. Você se lembra? Se lembra da gente dançando na balada? Vivendo como se não houvesse amanhã? Fingindo que sabemos dançar? Fingindo que não olhavam torto para a nossa dança e para as duas lésbicas? Você se lembra de quando eu achava que era normal? Ah... Doces lembranças. Quem diria que ontem estaríamos nos divertindo juntas, e hoje nosso único meio de comunicação seriam as cartas?

Com toda essa chuva de memórias – na verdade o melhor seria tempestade, tornado ou furacão – sorri, apesar de querer muito chorar. Eu vou acabar com a distância, juro. Como, quando e onde são ótimas perguntas, para as quais em breve conseguirei respostas. Eu não sei se você é minha, mas gostaria que soubesse que eu sou sua, Ana, completamente sua, de todas as maneiras, em todos os sentidos.

Me levantei do banco de cimento, dei um adeus mental para as crianças e fui para casa, de longe ainda ouvindo suas risadas. Mordisquei a maçã, apenas para enganar meu estômago, e provavelmente minha mente, queria fingir que tudo estava certo.Na caminhada parei e peguei as flores, por um momento me perguntei se não seria muito infantil pegar flores na rua para dar à alguém da família que ainda está vivo, mas bem... Que se dane, eu gosto de flores, minha mãe gosta de flores, tudo bem.

Cheguei em casa 08:41 – maldita mania –, ela estava já de pé, arrumando a casa, enquanto meu pai dormia – aliás, acho que começarei a chamá-lo pelo seu nome, Fernando, já que o mesmo diz que não é meu pai, então eu não sou sua filha. Entreguei as flores para mamãe – às vezes é gostoso dizer essa palavra, é meio que... nostálgico – e pedi para que fosse fazer outra coisa, que fosse ao shopping, um restaurante, visitar algum parente, qualquer coisa, desde que estivesse relaxada, já que eu arrumaria o local todo com prazer, na troca de apenas um sorriso. Queria que por um momento aquela mulher se esquecesse de que tem uma filha doente.

Às vezes me sinto chateada... Não seria essa a palavra, mas vou usá-la mesmo assim. Às vezes me sinto chateada comigo mesma por sempre falar dessa merda de esquizofrenia, é como se eu dissesse “Tenham dó de mim, seus podres”, mas não é essa a impressão que quero passar, não quero a pena de ninguém, a pena não irá me curar, a única coisa que quero é a cura.

Arrumei a casa, desde a sala, até os quartos. Não gosto muito de mexer no quarto dos meus pais, meu p... Fernando diz que eu bagunço tudo, e não sirvo nem para estender uma cama, então lá o serviço foi bem leve, digamos... externo.

Eles chegaram e já era quase a noite, fim de tarde, digamos. Foram ao shopping, aliás, lá agora tem uma livraria, na qual minha mãe comprou um livro que eu queria há muito tempo, me senti uma criança realizada.

Vim para o quarto e estou aqui, relembrando nossos momentos, enquanto escrevo essa carta. Lembra que quando éramos menores nos odiávamos? Tudo isso porque uma vez quebrei uma boneca sua. Te juro que foi sem querer, e que, um dia ainda vou recompensá-la.

Uma coisa que não me recordo plenamente é como começamos a nos dar bem, a primeira lembrança que tenho da gente conversando civilizadamente sem nenhuma tentativa de homicídio foi em um churrasco que toda a vizinhança foi convidada, mas, por algum motivo, sinto que aconteceu algo antes disso.

Uma coisa que eu lembro claramente é que nossa amizade começou a criar laços mais fortes quando você passou a estudar na mesma escola que eu, foi como se o destino tivesse nos dito “A hora é agora, vocês são feitas uma para a outra”, foi como se eu conseguisse ver suas asas, porque algo em mim dizia que eu tinha que acolhê-la.

Acabei de ligar a TV e está passando um programa sobre moda, eu lembro o quanto ríamos com coisas assim, ver as modelos, sempre mudando, mudando e mudando, tudo isso para apenas satisfazer as opiniões alheias. Elas nunca conseguiriam ser a gente, elas nunca conseguiriam levar para frente um romance insano e lindo como o nosso, e é isso que nos faz especiais, o fato de sermos únicas, de conseguirmos suportar e passar por coisas que outras pessoas não conseguiriam, quem sabe um dia os outros também sejam assim. É a evolução.

Minhas sinceras e longas despedidas, eu te amo.

Beijos, com amor,

Sua Melody.


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