O Domador de Ursos escrita por botogordo


Capítulo 3
Capítulo II - Apresenta Ele


Notas iniciais do capítulo

Ouça esta música enquanto lê!
Música: https://www.youtube.com/watch?v=YO2AbxQnsdI



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Através da pequena fresta na janela da casa de Norberto, uma fumaça fina e acinzentada se saía e rapidamente se esvaía em meio ao forte e gélido vento que soprava do lado de fora. A fumaça não vinha da lareira, naquela sombria noite aquele homem nem pensara em acender a mesma, e a casa permaneceu fria e escura, assim como o clima que tomara seu coração. Em meio a fumaça proveniente de seu enorme cachimbo, Norberto vagava por sua memória, tentando se lembrar de todos os mitos e histórias que teria ouvido sobre bestas e feras selvagens ao longo de seus 53 invernos.

Após algumas horas pensando, apenas um mito lhe vinha à cabeça, era a canção sobre o menino que domou o grande urso feroz. E Norberto logo fez um questionamento a si próprio:
— Será possível que a fera que cometera tal atrocidade ao pequeno Husky é um urso?
Norberto havia visto um temido urso apenas uma vez em sua vida e há muito tempo, quando era apenas uma pequena criança. Naquela ocasião, a fera selvagem era enorme (mas para crianças tudo costuma ser enorme, não é mesmo?), tinha grandes e quentes pelos brancos, que pareciam ser muito macios, como se fosse alguma almofada gigante. É claro que se tratava de um urso polar e apesar de ser um animal capaz de amedrontar quase todas as criaturas, ou ao menos todas que Norberto tomara conhecimento, o enorme urso tinha um olhar e um rosto dócil. O homem (no momento ainda criança) tinha avistado o feroz animal de longe, e por um breve momento, quando o urso sumiu por entre as árvores da floresta de Alawar, sendo assim não teve a chance ou talvez o azar de testar a personalidade da fera.
Instantes depois, o fumo de Norberto acabou. Então ele colocou o cachimbo em cima do criado-mudo logo ao lado da poltrona em que estava sentado, e ali mesmo caiu no sono. Ele estava bem cansado, e ali era suficientemente confortável para ele poder recuperar suas forças, apesar de sua cama estar apenas a três passos da poltrona, logo ao outro lado do pequeno criado-mudo de carvalho. Mas provavelmente tal conforto era enorme comparado ao que ele viria a ter nos próximos dias.

— Pow, Pow, Pow! — O barulho de um bater violento na porta da casa fez o homem que dormia profundamente e boquiaberto (chegava até a roncar), despertar num só pulo. Naquele momento, um fino e brilhante raio de sol, aqueles que só existem em belas manhãs de verão, entrava por entre a pequena fresta aberta da janela. Norberto logo imaginou que quem batia a porta, seria Baltazar e perguntou com uma voz alta, de quem acabara de levar um susto:
— Quem bate a minha porta a esse horário do dia?
— Quem você pensa meu nobre homem?
Foi a resposta obtida em tom irônico que vinha do lado de fora. Norberto, é claro, não tinha nada de nobre, apenas a bondade em seu coração e a única pessoa que possuía tal senso de humor naquele pequeno vilarejo era o jovem Baltazar. Nesse momento, o homem abriu rapidamente a porta e ali estava, parado e com um enorme sorriso no rosto, o pequeno e parrudo menino. Munido de uma grande mochila marrom, provavelmente carregada de suprimentos, como água, castanhas e pão (Em Senja as pessoas não tinham o habito de comer carne), e algumas roupas mais pesadas, como um enorme casaco para se proteger de uma provável nevasca, pois naquele momento, Baltazar trajava uma camisa de linho cor bege, calças marrons de mesmo tecido, e botas pretas de couro, uma roupa relativamente leve para o clima ártico, mas confortável para um dia ensolarado. Mas o que surpreendera Norberto, não era a grande mochila marrom, as roupas leves ou o enorme sorriso no rosto do jovem e sim o que estava em suas costas, junto com a mala.

Era uma bainha enorme, que guardava uma espada longa de duas mãos, que segundo algumas lendas, aquelas espadas, que jamais cegavam, foram forjadas por senhores dos ossos, conhecidos também como “os observadores", num lugar popularmente chamado de Portão do Inferno, localizado nas catacumbas mais profundas de Ab’dendriel, a cidade élfica. Segundo o mito, poucos homens que ousaram ir até lá conseguiram retornar, e os que retornavam não eram mais capazes de se comunicar com homem algum, ao que parece, ficavam possuídos ou coisa do tipo, e falavam apenas em uma linguagem estranha e desconhecida. É claro que Norberto não acreditava nesse mito, nem em cidade élfica, muito menos e homens possuídos, era algo incrível demais para se crer.

O homem havia ficado curioso sobre como Baltazar teria conseguido tal espada, mas logo se lembrou do pouco que sabia sobre a história do menino e de seus pais. O pai dele era um jovem e promissor cavaleiro do exercito do general Chester Kahs, de Thais, A grande cidade dos homens. Porém no auge de sua carreira como cavaleiro, ele havia sido considerado traidor do rei, sem motivo aparente, e fora assassinado pelos guardas reais. Com isso, a mãe de Baltazar, se exilou em Carlin, a única cidade humana que aceitaria um viúva de um traidor como refugiada, já que era a cidade que lutava pelo direito e força das mulheres. Mas com medo de pegarem seu pequeno filho, ela o levou para Nielson, um balseiro e bom homem, que morava em Porto do Norte, um pequeno vilarejo pesqueiro ao norte de Carlin. Então o bondoso homem, a pedido da mãe de Baltazar, trouxera o menino de apenas cinco anos ao pequeno vilarejo de Senja para que ele pudesse crescer em paz. O balseiro tinha uma pequena residência no vilarejo ártico, cuja, agora, pertence a Baltazar, e desde então, o menino crescera sozinho e ajudado por alguns habitantes de Senja, entre eles Norberto. Ao lembrar-se disso, ele ligou a espada ao pai do menino, e nem sequer tocou nesse ponto, porque sabia que o menino tornaria a ficar triste ou abalado com tal assunto.

Norberto abriu um sorriso (havia algo naquela bela manhã parecia animar os dois aventureiros, talvez o fato de serem raros os dias ensolarados naquela região do mundo ou o fato de estarem a começar uma aventura de verdade), e disse em um tom cativante:
— Muito bem jovem guardião de Senja! Entre e sente-se na poltrona enquanto me preparo para nossa pequena jornada.
Baltazar entrou na pequena casa, e rapidamente dirigiu-se a poltrona de Norberto, sentou-se e esperou.
O homem pegou uma enorme e velha mochila de cor roxa (bem maior que a do jovem menino), retirou seu grande casaco azul escuro de seu corpo e o colocou na mala, e a encheu com dois imensos galões de água, muitas castanhas, sementes e um grande pedaço de pão. Após encher a mochila, Norberto começou a escrever um breve bilhete (em lugares tranquilos como Senja, a grande maioria dos habitantes sabia ler e escrever a língua comum), cujo era para sua vizinha, Vera, a comerciante de moveis da região, que mais parecia um homem do que uma mulher, por conta de seu tamanho e força física, mas isso não vem ao caso agora. O bilhete dizia:

“Bom dia Vera,

Preciso te pedir um pequeno favor, você e a única pessoa que posso confiar à vida de minhas lindas flores-da-lua. Eu vou me ausentar por algum tempo, provavelmente poucos dias, mas preciso pedir-lhe para que na minha ausência você regue minhas plantas uma vez ao dia, por volta do fim da tarde. Eu sei que você fara isso por mim e pelas flores também, já que assim como eu, você as adora!

Atenciosamente,
Norberto.”

Então o homem apanhou um mediano bastão de madeira, que provavelmente serviria de bengala, e disse:
— Vamos Baltazar!
— Vamos! Vamos! — Respondeu o menino empolgado.
Os dois logo saíram da pequena casa, o homem fechou a porta calmamente, e seguido pelo jovem, dirigiu-se a casa logo à frente, colocou o bilhete por baixo da porta, que com certeza seria da casa de Vera, virou-se e foi em direção ao portão norte do vilarejo.

Não eram muitos passos que separavam os dois aventureiros da frente da casa de Vera do portão norte do vilarejo, se é que se pode chamar aquilo de portão, na verdade, o que havia ali não passava de um largo vão entre as duas extremidades do muro de pedras, que tinha a altura de uns três homens medianos. Durante a curta caminhada, era possível notar um brilho no olhar de nossos aventureiros, nunca visto antes por qualquer habitante de Senja, e esse brilho não era proveniente do sol, que naquele momento brilhava forte, ao menos para um lugar tão frio como aquele. Esse brilho era de uma felicidade imensa, de dois corações aventureiros que partiram, finalmente, para uma aventura de verdade.

Ao chegar ao vão norte entre os muros, vulgo portão norte, Norberto parou de caminhar, e logo em seguida o jovem Baltazar também, nesse momento o menino parrudo logo perguntou de maneira preocupada:
— O que houve Norberto?
O homem olhou para trás, em direção a sua casa, e rapidamente desviou o olhar para o jovem menino e disse:
— Não é nada meu jovem...
Na verdade, tinha sim alguma coisa, o fato é que aquele homem, acomodado a muitos invernos, não passava por aquele vão desde que tinha aproximadamente a idade de seu companheiro de aventura. E naquele momento ele pensou consigo mesmo:
— Será que vai valer a pena?
Ele tinha dois motivos para esse questionamento: primeiro, que ele já havia se decepcionado muito ao buscar emoções e aventuras e nunca ter as achado, e o segundo, era que ele, um sábio homem, tinha o conhecimento necessário para admitir que essas jornadas, por menores que fossem, nunca eram tão bonitas na prática quanto nas histórias lidas. Mas ao olhar para o menino, que parecia tão empolgado, logo ele tratou de esquecer esses pensamentos, voltou a caminhar calmamente, e sorridente, falou:
— Você não vem Baltazar?
O jovem menino fez uma expressão de que fora surpreendido com tal reação, e logo tratou de começar a caminhar.

Poucos passos após passarem pelo portão norte, eles chegaram ao ponto onde a pequena estrada de terra já era completamente tomada pela macia e brilhante neve, que naquela região nunca se derretia por completo. E mais alguns passos à frente eles atravessariam o primeiro pinheiro da floresta, e assim, por conseguinte, adentrariam a floresta de Alawar. Aquela floresta, já havia sido esquecida há muito tempo atrás, assim como o dono do nome da mesma.


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