Beyond two Souls escrita por Arizona


Capítulo 23
Angústias


Notas iniciais do capítulo

Oi gente.
O capítulo tá meio dramático, mas foi minha inspiração para hoje (rsrsrs) Bom, espero que gostem. Então comentem, favoritem e recomendem Beyond



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P.O.V Gale

Por um momento eu pensei, foi só por um único mísero momento, eu achei que poderia entrar no coração dela. Nossas noites na arena, nosso beijo, a forma como ela me olhou depois daquilo, eu sentia arder dentro de mim a certeza de que seriamos além do que apenas amigos.

Mas...ele. Ele tinha que envenena-la, tinha que seduzir sua mente. Katniss, a Katniss. O maldito Mellark não poderia querer outra garota? Tinha que ser a minha? Tinha que ser...

Todos os dias eu corro para a floresta, tentado encontrá-la. Às vezes acho que ouvir ela me chamar, aí eu corro, e corre, e corro, até que no final eu encontro apenas o delírio da minha mente, e então eu choro. Choro de dor e rejeição.

Ela me salvou, eu sei. Foi graças a ela que hoje minha família tem um casa confortável e comida na mesa todos os dias. Se ela não tivesse tido aquela ideia, um de nós estaria morto agora – eu torcia para que fosse eu – porém na minha cabeça, isso deveria nos unir e não nos afastar.

Se o Peeta não estivesse entre nós dois, eu lutaria por ela até o fim. Mas, por que não estou lutando? Por que não estou lutado?

Porque eu passei semanas observando a Katniss, eu a vi com o Peeta, vi que ela se importa com ele como nunca vai se importar comigo. Como ela mesmo falou, era tudo encenação na arena para nós sobrevivermos. Ela fez o que tinha que ser feita, fui eu quem levai a sério demais nossa mentira.

As semanas foram passando, o outono acabou e a neve cobriu todo o Distrito. O frio está de congelar a alma esse ano, nunca houve um inverno tão rigoroso como estar sendo esse. Meu coração ainda se demora em se acostumar com a ausência dela, sabendo que eu realmente perdi. Mas estou vencendo cada dia, um por um.

Passo a maior parte do meu tempo na floresta, caçando ou não, as vezes só treinando minha mira mesmo. Não se tem muito o que fazer quando se é um vitorioso. Somos considerados celebridades, e a Capital nos dar um mesada milionária por termos vencido, por isso não é preciso trabalhar, ou algo do tipo.

Caminho devagar por entre as árvores de troncos grossos. Os bichos essa época do ano migram para outro lugar – pelo menos foi o que aprendi na escola – ou hibernam, então é raro encontrar algum animal se aventurando na neve.

Por mais que agora eu não necessite mais da caça para o sustento, eu lembro o quanto era difícil arranjar comida naquele tempo. Se não fosse por alguns perus selvagens, não sei como estaria hoje.

Depois de horas andando, eu paro para beber um pouco d’água. Sento-me na raiz de uma das maiores árvores que eu conheço aqui na floresta. É um lugar bem aconchegante.

O que mais gosto aqui durante o inverno é o silêncio. Os pássaros cantão apenas de manhã bem cedo, e se guardam pelo resto do dia, se aconchegando uns nos outros. Suspiro o ar gelado soprando em minhas mãos para aquece-la.

Solto um gemido de satisfação ao sentir relaxando minhas perna devido a caminhada, assim como os músculos das minhas costas encostando-a na árvore. Mas logo sou tirada das minhas distrações quando ouço um farfalha de galhos se quebrando a minha esquerda.

Levanto num pulo armando o arco em direção do barulho, olhando atentamente para os lados. Já estava aflito, só conseguia ouvir os passo do bicho, mas ele não rosna, ou emite qualquer outro som parecido.

– Droga! Está muito perto.

Sussurrei a mim mesmo e logo em seguida a criatura saltou na minha frente. Não hesitei em atirar a flecha, mas me arrependi no estante seguinte quando meu olhos decodificaram no que eu atirei, ou melhor, em quem.

Madge.

O choque em vê-la paralisa todo meu corpo. Madge permanece caída, sentada no chão. Seus olhos castanhos arregalados, o cabelo loiro manchado de sangue...

Sangue.

Sua mão estar pousada do lado direito do rosto, e o sangue escorre por entre ela, a flecha pegou bem ali, mas graças aos céus ela estar viva. Adrenalina se extravasa pelas minhas veias quando o grito de terror de Madge preenche meus ouvidos.

Largo o arco e corro para junto dela, pegando-a nos braços e correndo para fora da floresta. Madge apenas geme de dor e chora, eu só consigo balbuciar palavras de conforto a ela, mas por mais que eu diga que vai ficar tudo bem, ela continua apavorada.

Em poucos minutos chego ao tronco oco onde Katniss e eu guardamos as armas, sempre deixamos um bolsa com remédios e curativos lá. Sento Madge, e rapidamente tiro panos limpos da bolsa. Não tenho álcool aqui para ajudar a desinfectar a ferida, por isso uso água a minha garrafa e molho o pano.

Demora um pouco, mas Madge tira sua mão da ferida, me deixando ver o que eu fiz – mesmo sem intenção – Acabei acertando bem na sua orelha direita, deixando metade dela rasgada com um corte enorme. O sangue é muito denso, não dar para ver se o corte é maior, mas pelo menos a orelha ainda estar no lugar.

Começo a limpar o ferimento, tento ir o mais delicado o possível com Madge ainda chorando e reclamando de dor. Logo o paninho estar encharcado de sangue, a situação chega a um ponto que eu não tenho outra alternativa a buscar. Ela precisa de pontos nesse corte.

– Madge, eu vou te levar para a Sra. Everdeen. Ela vai saber o que fazer.

– Não, Gale – ela tenta rebater – O meu pai, ele...

– Eu sei, eu sei. Ele vai mandar me estrangular quando souber, mas você precisa de cuidados, e isso eu não posso fazer, seu corte tá feio. – eu a pego no colo carregando para fora da floresta – Vem, você vai ficar bem, eu prometo.

Faço com que ela continue pressionando a ferida para tentar fazer com que o sangramento se contenha. Atravesso a cerca com ela, e praticamente corro em direção a Vila dos Vitoriosos. Sigo ainda junto a cerca para que não nós vejam, é bem mais discreto que eu carregue a filha no prefeito nos braços contornando o Distrito, do que passando por meio dele.

O 12 não é muito grande, qualquer coisa vira novidade. As fofocas não seriam muito bem vidas no meu estado de espírito atual. Quando entramos na Vila, disparo direto para a porta da Katniss, pedindo mentalmente que ela não esteja em casa.

Mas como eu sou um cara extremamente sortudo, a própria Katniss Everdeen é quem atende a porta. Ela franze a testa ao me ver com Madge nos braços, como se buscasse entender o que estar acontecendo. Porém suas dúvidas logo se desfazem quando ela percebe o choro de Madge, e que ela estar machucada.

Ela mesma grita pela mãe, nós arrastando para dentro da sua casa. A Sra. Everdeen tira Madge de mim, e coloca sentada na cadeira da cozinha. Suas mão habilidosas iniciam o trabalho que só ela sabe fazer.

– Por Deus! Madge o que aconteceu? – a Sra. Everdeen pergunta.

– Na verdade, fui eu quem a acertei – digo com constrangimento antes de Madge responda – Eu não a vi, pensei que fosse algum animal e disparei a flecha, já era tarde demais quando reparei que era a Madge.

– Oh, céus! Querida, isso poderia ter sido fatal.

– Eu sei, mas a culpa foi realmente minha. – Mad diz fazendo uma careta de dor – Eu é quem fiquei na frente da mira de um caçador.

A mãe da Katniss termina de limpar o corte, e prepara linha com a agulha para os pontos.

– Isso vai doer um pouco. – ela avisa antes de começar.

Madge apenas murmura um “tudo bem”, se aguentado firme na cadeira. Vejo Katniss sentar ao seu lado, segurando sua mão, confortando Madge enquanto sua mãe dar os pontos na orelha dela. Eu quase me esquecera do quanto as duas são amigas, a única que uma a outra tem. Também me lembro de quando fui ferido na arena, e Katniss teve que fazer os pontos em mim. Ela me confortou da mesma maneira.

– O que estava fazendo na floresta, Madge? – Katniss pergunta para distrai-la.

– Bom, quando os meus dois fornecedores de morangos silvestres deixaram de me atender, eu tive que ir pessoalmente colhe-los – ela responde rindo e nós também – Demorei alguns dias, mas achei o de morango, aí acabei pegando o costume de caminhar pela floresta. Eu ia mais longe a cada dia que entrava lá. Agora entendo vocês dois.

– Desculpe Mad... – Katniss não consegue parar de rir – Nós deveríamos levar seus morangos sempre.

Nesse momento ela me olha, o sorriso ainda estendido nos lábios, tão sincera, e tão ela mesma, com a sua gargalhada gostosa, que a muito tempo eu não ouvia.E mais uma vez estou eu perdido nas águas profundas do seu rosto.

– Pronto, terminei vou só fazer o curativo. – a Sra. Everdeen suspira e Madge também – Katniss, meu bem, pode emprestar um casaco seu a Mad?

Ela aponta para a roupa suja de Madge, e Katniss rapidamente acena, indo até o armário em baixo da escada para buscar o casaco. Eu sei que errei das últimas vezes que nós vimos, sei também que devo estar a magoando muito com minhas atitudes, e principalmente com minhas palavras. Eu falei muita besteira a ela.

É melhor eu aproveitar a chance, e pedir desculpas enquanto posso.

Vou atrás dela que retira uma jaqueta do armário, e fecha a porta, dando de cara comigo ao dar meia volta. Só reparei o quando estou próximo dela quando quase esbarramos.

– Oi. – é tudo o que consigo pensar em dizer.

– Sim, Gale?

Eu esperava ser atacado com quatro pedras nas mãos, mas ela não fez isso, olhou para mim indiferente, seu tom de voz não é nem um pouco raivosa, pelo contrário é paciente.

– Eu...eu queria pedir desculpas. Sabe? Eu estava fora de mim quando te disse aquelas coisas, e depois quando briguei com o Peeta. É que...Katniss, eu enlouquece quando vi vocês dois, ele é um cara muito provocativo, você não pode me culpar por...

– Gale. – ela me interrompe – Você estar se desculpando, ou tentado dizer que o Peeta também é responsável pelos seu erros?

– Bom, eu diria de indiretamente ele é sim responsável por eu ter cometido os meus erros com você.

– Então faça a sua parte. Pare de se importar tanto com o Peeta.

Ela tenta passar por mim, mas eu a seguro pelo braço. Definitivamente eu a perdi. Eu deveria saber que ela o defenderia se o seu nome fosse tocado, eu sei que ela gosta dele, e isso me quebra por dentro.

Não saberá de verdade se não perguntar

– Você...você o ama?

Katniss não responde nada, apenas me olha fixamente sem reação, é como se ela não esperasse por isso, mas nada no seu rosto denuncia surpresa.

– Como eu disse: faça a sua parte.

Sim, ela o ama.

Desde do momento em que ela o viu naquele trem, do momento em que os olhos dele ficaram sobre ela, Peeta causou sobre a Katniss um efeito devastador, por mais que ela não admita, ele causou.

E os temerosos olhos de Katniss Everdeen se transformaram em chuva. Ela estar apaixonada, agora eu sei que sim. Em quanto a mim, eu deveria estar abalado, porém só o que tenho são receios, e talvez ainda esperança, bem lá no fundo, esperança de que ela é minha, mesmo não sendo.

Fiquei pardo no meio daquela sala por minutos que mais parecem eternidade, só me movo novamente quando Madge me chama. Ela já estar com a jaqueta que Katniss a emprestou. A Sra. Everdeen diz que deu a ela um pouco de xarope do sono para que ela possa descansar e não sentir tantas dores por causa dos pontes que levou.

– Eu vou leva-la em casa. Obrigado Sra. Everdeen.

– Não a de quer filho. Madge, lembre-se de tomar os anti-inflamatórios em casa.

– Pode deixar Sra. Everdeen.

Passo um dos braços dela ao redor do meu pescoço, e seguro-a pela cintura. Ela já estar meio lenta, o remédio estar fazendo efeito rápido.

– Você e a Kat estão bem? – Madge pergunta meio sonolenta

– Por que pergunta? – eu pigarreio

– Porque eu quase nunca vejo vocês dois juntos. Vocês estão bem?

Pensa em uma desculpa Gale, pensa logo em uma desculpa.

– É que nós não queremos ficar expostos entende? – Mad olha para mim com os olhos miúdo, suspeitando das minhas palavras – nós dois achamos melhor não andarmos no Distrito tão intimamente...nós preferimos nós resguardar.

– Ahh...

Ela não questiona mais nada, deve ser o remédio – o que eu agradeço – Em alguns minutos de caminhada, já chegamos em sua casa. A rua onde ela mora é uma das mais bonitas no Distrito, na verdade, tirando as mansões da Vila, essa é a rua mais rica da cidade, onde moram as pessoas mais importantes daqui, o prefeito, os diretores das minas que vieram da Capital e não podiam deixar o luxo de lá, e alguns secretários de Governo que passam temporada no Distrito.

As casas tem três andares, e todas elas são de cores vividas distintas, diferentes da palidez do resto do 12. Deve ser por causa cores que a rua é chamada de Paradise; a rua paraíso.

A casa de Madge é a de cor azul turquesa, que mais parece cintilar ao olhos quando o sol bate nela. Ela estar sem a menor condição de andar sozinha, jogo-a sobre meus ombros para facilitar entramos na casa. Mad reclama, mas ela quase não tem mais o controle da própria língua para falar.

Por precaução – não quero encontrar o pai dela – entro pela porta dos fundos, como sempre fiz ao deixar seus morangos. Entro torcendo para não encontrar nem uma empregada no caminho, podem achar que estou invadindo a casa do prefeito, ou pior, raptando a filha dele. Ela não tem irmãos, e o Sr. Undersee não tem hora de estar ou não em casa, então só a mãe dela deve estar aqui.

Subo as escada com cautela, suavemente para que as madeiras dos degraus não ranjam debaixo dos meus pés. Paro na entrada do corredor, há uma dezenas de portas a frente, não posso abrir uma por uma.

Desço Madge dos ombros, mas tenho que continuar segurando-a. Ela mal se segura em pé – ela estar quase dormindo – e me abraça para manter o equilíbrio, encostando a cabeça no meu peito. Eu a abraço de volto, só que no meu caso estou tentado segurar o peso do seu corpo.

– Madge? Madge, qual é o seu quarto? – levanto seu queixo.

Tenho que repetir a pergunta por mais duas vez até que ela finalmente raciocina e indica a última porta do corredor. Pelo menos o quarto ela não erra. Deito Mad devagar sobre sua cama, afastando os cobertores, tiro os seu sapatos, e a jaqueta para que ela fique mais confortável, e a cubro.

Seus olhos ainda estão abertos, me ajoelho ao lado da cama segurando a mão dela que sorrir em torpe.

– Me perdoe. Eu não sabia que era você. – peço com um tom mais baixo na voz.

– Eu é quem me aventurei demais hoje.

– Mesmo assim, quase arranquei sua orelha.

– Mas ela ainda estar aqui, não estar? – me diz já fechando os olhos.

– Não.

Ela suspira cansada, eu ainda seguro sua mão. Nós estudamos juntos a anos, e eu nunca tinha reparado como ela é bonita. Uma garoto de traços suaves e calmos, extremamente linda, que agora eu descobri que ama tanto a floresta do 12 quanto eu.

– Mad, quer ir passear na floresta comigo amanhã?

– Claro Gale, amanhã vamos passear na floresta.

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P.O.V Katniss

Remexi a minha sopa de legumes mais uma vez, sem colocar um colher dela na boca. Eu contava as horas como quem conta a vida, e nesse momento se completavam 48H que eu não via Peeta.

Eu o procurei em todos os lugares, na sua casa, na casa dos seus pais, no Haymitch, que fez questão de perturbar minha ansiedade de encontra-lo. Procurei no Prego, nas ruas, na estação de trem, procurei até mesmo na floresta, ele podia ter ido ao lago talvez.

Mas não, Peeta parece ter desaparecido como fumaça. Não quis alarmar o Gabriel, nem os irmãos dele por uma coisa que pode ser banal, mas são dois dias sem ele, dois dias e eu já estou desesperada. Meu maior medo é de que ele tenha voltado a usar o morfináceo, e caiu em algum lugar por aí, porque foi isso o que aconteceu da última vez.

Katniss?

– O que? – levanto a cabeça assustada sem entender o que houve.

– Você ouviu o que eu te disse? – Prim pergunta sorridente e nego – Eu disse que logo vai ser a Turnê da Vitória, e você vai ganhar um monte de vestidos novos.

Ah, mais essa! Minha patinha em sua inocência acaba me lembrando da Turnê, onde vou ser enfiada num trem durante duas semanas, sendo obrigada a visitar onze Distritos mais a Capital, sorrir e acenar olhando para os rostos das famílias dos tributos que eu matei. E mais, voltar a fingir o meu romance com Gale.

A Turnê será uma semana após o ano novo, no entanto, a angústia já me domina, minha carne se corrói por dentro. As pessoas acreditam que tudo o que fiz na arena foi por amor, e na arena tentei mostrar perfeição nesse amor.

Porém, agora nossas vidas não estão sendo ameaçadas, nem um de nós estar a ponto de morre de infecção, ou de fome, ou de frio, estamos à salvos, não estamos?

Estamos?

O medo é maior do que parece. Haymitch se sentia à salvo, e derrotaram seu orgulho, Peeta também se sentia à salvo, e macularam seu corpo, eu me sentia à salva, e feriram minha mente.

Estamos só, no escuro. Nunca estaremos salvos.

– Filha, você estar bem? – mamãe me faz voltar a realidade – Você estar chorando querida?

Há uma lágrima escorrendo pela minha face, solitária como minha alma, fria e julgável, como os dias de inverno que se sopram sobre meu peito.

– Desculpe, eu só...só preciso dormir um pouco. – digo me levantando – Com licença.

– Katniss, meu bem...

– Não mãe, estar tudo bem, eu vou subir.

Dou um beijo em minha mãe, e um abraço em Prim. Elas duas não dizem nada, me deixa ir em paz para o meu quarto. Lavo meu pés, e troco minhas roupas ainda no banheiro, escovo os cabelos e apago as luzes. Estendo os cobertores sobre minha cama, deitando minha cabeça nos travesseiros ricos de pena de ganso da Capital. Minha vida é rodeada de coisas da Capital mais do que nunca.

Meus olhos não querem fechar, não se entregam e resistem em continuar vigiando o silêncio da noite. Minha mente é um tempestade que se agira a cada segundo mais. Eu não me entrego, não posso me entregar, preciso continuar vigiando o silêncio.

Deixo o abajur acesso, sua luz fraca me inebria, é um êxtase ao meu corpo. Me relaxa por um estante, leva-me ao delírio.

– Eu queria você Peeta.

Onde ele estará agora quando eu mais preciso? Foi ele quem me ensinou a ficar de pé, a ser forte. Eu não posso ser forte sem ele. Deus! Quando foi que fiquei tão dependente do Peeta? Ele ainda é um bom motivo para respirar.

Não sei quanto tempo se passa, mas permaneci ali, deitada sob as cobertas, olhando para luz calma do abajur, imaginando os olhos azuis de Peeta, e o sorriso casto da minha irmã caçula. Eu continuo vigiando a noite, então silencio é quebrado.

Batiam da minha janela de forma sutil, pequena bicadas no vidro vibrando no meu quarto. Eu levantei com medo procurando no escuro, sem saber o que fazer, temendo serem os meus pesadelos que ganharam formas e vieram me engolir.

Cheguei mais perto da janela, tentado enxergar o que tinha lá fora, e lá não tinham bestantes, mas sim o menino de olhos d’água, sentado na minha sacada, com a mão espatifada no vidro.Ponho minha mão sobre a sua, recebendo não o calor de seus dedos, mas a frieza do vidro. O choque me faz ter certeza de que não estou enlouquecendo.

Ele está realmente aqui.

Destranco a fechadura em meio segundo, puxando Peeta para mim e o abraço . Abraço que ele retribui. Ele está gelado, as bochechas coradas do frio. Levo-o para a cama, deitando ele lá, jogando os cobertores em cima do seu corpo.

Fecha a janela novamente, e corro para ele. Agora posso segurar suas mãos verdadeiramente. Esfrego-as entre as minhas e bafejo para aquece-las. Peeta continua calado, seus olhos cheios de lágrimas, ele emagreceu nesse dois dias, nem parece o meu Peeta.

– Onde você esteve Peeta?

– Eu...estava por aí. – me diz num fio de voz – Eu tive um pesadelo ruim, fiquei com medo, e estava por aí.

– Por que não veio ficar comigo?

Peeta está receoso, apavorado em me dizer o que houve. Seguro seu rosto, fazendo com que me olhe, mostrando a confiança de que pode confiar em mim, e finalmente ele diz.

– Porque eu te vi queimar.

Ele chora, se encolhe sobre o próprio corpo, tremulo de dor. Vê-lo assim me parte o coração, me faz sentir culpada. Ele teve pesadelos comigo, teve medo por mim, e ainda tem medo de me perder. O que ele sente por mim eu não mereço, nem que eu vivesse cem vidas eu o mereceria.

– Eu estou bem, estou aqui com você. – agarro sua camisa colando ele a mim – Sente o calor do meu corpo? sente as batidas do meu coração? Eu não vou te deixar, eu estou aqui.

Peeta não se guarda em chorar, se mostrando frágil, se quebrou em meus braços, enfiando a cabeça entre meus seios, abafando os gritos de aflição que esvai de sua boca.

– O Distrito inteiro queimou Katniss, eu vi queimar – ele soluçava desesperadamente – Você me chamou, gritou por mim, mas eu não te achei, só havia fogo a minha frente, e fogo subia pelos meus braços, eu não sentia nada, só te ouvia gritando meu nome. Quando te encontrei você queimava, queimava. Eu não fiz nada para impedir, eu te vir morrer, eu perdi você...

Forço com que ele para de falar, seguro sua cabeça contra meu peito, permitindo com que ele chore o quanto queira.

– Estou aqui, estou aqui.

Eu sussurro acariciando seus cabelos, beijo sua testa e continuo dizendo que “estou aqui”, e continuo, continuo. Mesmo depois dele parar de chora, eu continuo dizendo “estou aqui”. Eu continuo afagando seus cabelos, beijando sua testa. Cantando a música do Vale para que ele dormisse. E mesmo depois que ele dormiu eu continuei dizendo:

“Estou aqui meu amor”.


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