You make me feel wrong escrita por Lyssia


Capítulo 19
Seasons die one after another


Notas iniciais do capítulo

Então, é o seguinte: essa música na verdade é em japonês XDDDD mas tem muitos covers em inglês, e o que eu estava pensando ao pôr ela como título era no do canal LittleJayneyCakes.
O título da música em japonês é Kisetsu wa Tsugitsugi Shindeiku e ela é da banda Amazarashi.
Foi mal -q eu sempre tive a sensação que ia acabar pondo essa música aqui -qq tentei resistir enquanto deu cofcof



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Santini sentia a perna direita balançar freneticamente debaixo da mesa, observando Sarosh, sentado na carteira à frente, mas virado de lado, passar os olhos pela bula de seu remédio. A sala de aula estava ainda vazia, e ele também já havia conferido todas as janelas, como sempre. Era já segunda-feira, uma semana depois de sua consulta, e só então tivera coragem de entregar a bula ao amigo, embora houvesse o visto todos os dias da semana anterior.

Ele mordiscou o lábio inferior, pondo uma mão sobre a perna para tentar fazê-la parar, e saltou na cadeira, tomando o papel da mão do amigo e enfiando-o às pressas na mochila, quando duas meninas entraram na sala aos cochichos, sem pôr um mínimo de sua atenção no mundo ao redor. Ele voltou-se ao outro, respirando fundo pela boca, com os olhos arregalados e os dentes ainda na carne macia dos lábios.

— Larga essa boca. — Sarosh resmungou, e Santini obedeceu, desviando o olhar, batendo na mesa com dois dedos e passando a outra mão pelo rosto. — O que foi?

— Como assim? — questionou, olhando-o com o cenho franzido, e Sarosh arqueou uma sobrancelha lentamente.

— Não aconteceu nada? — insistiu, diminuindo o tom quando o sinal para início da aula tocou.

— Hn, nada demais? Tipo, os problemas de sempre em casa. — Sarosh estalou a língua, e Santini lançou um olhar para a porta antes de se arrastar para mais perto da ponta da cadeira. — Na verdade, o meu pai tem se esforçado, eu acho? Ele sempre passa no meu quarto quando chega e a gente saiu para lanchar domingo. A minha mãe não quis ir junto, e foi meio estranho, mas a gente foi e tal. E ele tá perguntando se eu tô bem o tempo todo. — respirou fundo, quase em um ofego, sentindo o rosto queimar um pouco. — É. — Sarosh hesitou um momento, então abriu um sorriso, parecendo conter-se para não dizer nada.

— Legal. — replicou simplesmente.

— Mas por que a pergunta? — o ruivo entreabriu os lábios para responder, parando quando ouviram a voz de Daniel cumprimentando alguém, logo um segundo antes dele parar ao lado deles. — Danny! Bom dia! — exclamou empolgado, sorrindo para o recém-chegado, que apenas soltou um resmungo, esfregando os olhos com olheiras, parecendo completamente exausto. — Aconteceu alguma coisa? Você tá parecendo um zumbi.

— Dom Quixote tava muito foda. Aí eu fui dormir às quatro da manhã. — Santini riu, enquanto Sarosh soltava um som quase compreensivo.

— Tá em que parte?

— Acabei de terminar a épica batalha contra os gigantes, aka moinhos de vento. — negou com a cabeça, pressionando as pálpebras fechadas com os dedos. — Por favor, me diz que o Santie não tá se balançando assim porque hoje tem teste. — quase suplicou, em um tom fatigado, ao que Santini arregalou os olhos, estarrecido, pois não estava se balançando tanto assim, sinceramente.

— Relaxa, não tem teste nenhum. — Sarosh assegurou, ignorando o olhar atônito do melhor amigo.

— Ah, ok! — exclamou, por um segundo aliviado, então pôs uma mão no ombro de Santini, sorrindo com amabilidade. — Aconteceu alguma coisa?

— Por que todo mundo tá me perguntando isso?! — questionou com exaltação, justo ao tempo em que o professor entrava na sala, cumprimentado a todos. Daniel deu algumas batidinhas amigáveis na cabeça do amigo, bastante relaxado, a despeito de sua aparência de quem cairia no sono a qualquer momento.

— Parece que te ligaram na tomada. Sei lá, você tá vibrando. — respondeu honestamente, sem deboche ou zombaria alguma, então ergueu o braço em uma saudação ao professor e saiu rumo a algum lugar longe da janela, deixando para Santini observá-lo se afastar com indignação como única forma de protesto. Ele virou para Sarosh sem alterar a expressão, e o ruivo sorriu inocentemente, piscando.

— Que foi? Você tá, mesmo. — foi tudo que ele disse antes de se voltar para frente, e Santini lhe acertou a cabeça, bem de leve, com uma mão, fazendo-o rir, antes de puxar um caderno e o estojo e se recostar confortavelmente na cadeira, começando a fazer o dever de casa de Filosofia, o qual devia entregar no dia seguinte.

Bem, ou ao menos ele tentou.

Acontece que a observação de Daniel não estava assim tão fora de lugar, e havia tanta energia em seu corpo que ele tinha de fazer algo, ou iria enlouquecer. Passou nervosamente a mão pelos cabelos, respirando fundo pelos lábios, a perna direita ainda balançando debaixo da mesa, e remexeu o corpo, procurando uma posição confortável até notar que era inútil.

Tentou pensar em algo que pudesse tê-lo deixado naquele estado, repassando a última semana, mas não havia nada, tinha certeza. Falara com Taras, com Sarosh, jogara videogame com Daniel, saíra com o pai, estava quase tomando coragem para começar Infinite Jest, e em um balanço geral fora uma semana bem ok. Não havia motivo, realmente.

Cravou os dentes no canto do lábio, virando para pegar a mochila em um movimento nervoso e brusco. Graças aos Céus, a menina atrás de si estava muito concentrada na aula para notar.

Retirou do bolso do meio a cartela com o comprimido sublingual, destacando um e pondo-o na boca, retornando a cartela para a caixa e puxando o zíper para fechar a mochila. Então olhou ao redor, esperando que ninguém houvesse visto, e algo gelado e horrível pairou em seu estômago quando notou Jaime, com os cabelos anil armados e despenteados, olhando diretamente em sua direção, uma sobrancelha arqueada e uma caneta entre os dedos, o caderno aberto, em uma simulação de aluno descente, justo como Santini.

Eles se encararam por alguns segundos, Santini sentindo o rosto se tornar mais e mais pálido, com os olhos arregalados, enquanto o outro adolescente apenas parecia bastante curioso, até que não pôde mais e virou a cabeça para frente, apoiando os cotovelos na mesa e fitando sem ver de fato os cabelos alaranjados de Sarosh, entrelaçando os dedos e tocando a boca com eles, mordiscando com o que julgava ser pouca força o nó de um dos polegares.

Jaime não podia saber.

Talvez ele achasse que era um remédio para qualquer outra coisa, mas a simples possibilidade era...

Ele não podia saber, não podia. Santini sequer tivera coragem de mostrar aqueles dois remédios para Sarosh, ainda. Não aguentaria caso o ex-ficante espalhasse para todos os seus amigos, ou para toda a escola.

Apenas quando o remédio fez efeito ele sentiu o gosto de sangue pairando pela boca e a dor no polegar se fez notar, obrigando-o a encarar o fato de que havia se mordido ao ponto de sangrar em plena sala de aula e que sequer notara isso. Obrigando-o a encarar o quão no limite estava seu auto-controle.

Fechou os olhos, tentando pensar no que fazer, a mente bem mais clara e deixando-o com a sensação de que estava sob algum controle, e então abriu-os novamente, fitando Jaime com o canto dos olhos, tendo quase certeza de que era observado. Cobriu a ferida com a cabeça do outro polegar, abaixando as mãos e usando a mão intacta para devolver a mochila ao seu lugar, tendo o cuidado de não virar o machucado na direção do outro garoto em nenhum momento. Recuperou o caderno, então, para tentar seguir com o exercício de Filosofia e poder ficar sem nada para fazer em casa.

Ele achou, quando tocou o sinal para o fim da terceira aula, que indicava também uma pausa, que o assunto estava esquecido para o outro, embora decididamente não estivesse para ele, mas fora uma ilusão boba, no fim das contas, e devia ter se dado conta desde o início que não era assim que as coisas seguiriam. Jaime se levantou logo que o professor deixou a sala, indo em sua direção, e Santini tinha certeza que Sarosh se voltara para ele e que devia olhá-lo e iniciar algum assunto, perguntar sobre bula, talvez, mas não conseguiu desviar o olhar do ex-ficante até que ele parasse ao lado da mesa, parecendo divertido.

— A gente pode conversar? — Jaime pediu, relaxado, e Santini respirou lentamente pelo nariz, forçando um sorriso simpático e olhando o outro nos olhos.

— Isso seria adorável, mas, tipo, eu tenho que terminar os exercícios de Filosofia, então não rola.

— Sério? Você que sabe, a gente pode falar aqui mesmo, sei lá. — sugeriu, com uma sombra de sorriso nos lábios.

— Por que você não vai cuidar da sua vida?

— Eu tava cuidando, mas aí você tava dando pulinhos na cadeira e eu parei pra olhar porque tava meio engraçado, mas agora já tá tudo bem, né? Porque você— ele levantou de chofre, fazendo Jamie hesitar no discurso, e o agarrou pelo pulso, arrastando-o para fora da sala a força, ouvindo-o rir de leve às suas costas. Que Sarosh o desculpasse, mas não havia tempo para explicações agora.

— Você não me odiava, seu merda? — resmungou enquanto guiava o outro pelos corredores, querendo acabar com ao menos um pouco daquele ânimo irritante.

— Meio que odeio. Tô achando meio engraçado isso de que você usa drogas. — Santini sentiu o sangue gelar, algo fazendo pressão em seu ouvido de um jeito que minava a paciência, e empurrou Jaime para dentro do banheiro, seguindo-o e fechando a porta.

Cala boca! — exclamou, mais alto que o planejado. — Eu não uso drogas!

— Sério? — o outro questionou enquanto Santini ia até as cabines do banheiro, abrindo-as com empurrões uma por uma até terminar e encostar-se na porta de entrada, temendo que alguém entrasse. — Tava todo nervosinho, aí engoliu uma pílula e pouco depois já tinha parado de se balançar todo. Isso tem cara de droga pra mim. O que houve? Seu fornecedor tinha faltado os outros dias?

— Dá pra parar de falar merda? — murmurou, estreitando os olhos. — Eu não uso drogas, já disse. E você por acaso acha que eu vendi o meu cérebro, ou qualquer merda assim? Porque é a única explicações pra acreditar que caso eu usasse, fosse fazer isso na escola. — Jaime deu de ombros, tirando importância.

— Sempre ouvi dizer que o abuso de drogas fode com os neurônios. — sorriu de novo, arqueando as sobrancelhas. — Mas tá ok, você não se droga. Então é o que? Você é algum tipo de doente mental?

Cala boca!

— Wow, sério?! — ele exclamou, encarando Santini de forma quase fascinada. Não devia haver muita coisa melhor que descobrir algo ruim de alguém de quem guarda rancor, para pessoas como Jaime. — Ainda bem que você me recusou, então. Imagina se eu tivesse de lidar com a porra de um namorado doente que precisa ficar se enchendo de calmantes?

Ele fitou Jaime, completamente indignado e... perdido, na verdade, pois tirara-o da sala antes que Sarosh ou qualquer outro acabasse ouvindo o que não devia, mas e agora? Não sabia o que fazer.

— Você não pode contar pra ninguém. — resmungou, com a voz saindo mais confusa que qualquer coisa.

— Ah, saquei. Por isso que você me arrastou, né? — ele deu de ombros, displicente. — Sei lá, por que eu manteria um segredo seu? — Santini ofegou, quase em pânico, dando alguns passos na direção do outro.

— Não conta! Você não pode contar! Jaime, você não pode! Eu nunca contaria, se fosse com você! Eu nunca contei das suas brigas, nem que você tem medo de insetos, nem que você — nem que você, eu não sei, eu nunca contei nada! Você não pode contar!

— O que me impede, na boa? — Santini sentiu a respiração descompassar um pouco, arregalando os olhos.

— Eu vou... eu vou espalhar todas as suas histórias como vingança, se você fizer isso. Eu vou mesmo. Não é um blefe. — o outro estreitou os olhos, cruzando a distância que os separava e puxando-o pelo colarinho.

Ele não tinha ar. Não havia como respirar.

— Se você contar qualquer coisa, eu vou te dar uma surra. Vou acabar com a sua cara. Você tá entendendo? — Santini o empurrou pelo peito, fazendo-o soltá-lo, e o encarou em um misto de exaltação e receio.

— Você não faria isso. — murmurou ofegante, em um tom incerto, e o garoto arqueou uma sobrancelha. Infelizmente, porém, não havia muito tempo para discussão. Ele precisa respirar. Era como se Jaime estivesse consumindo todo o ar. — Sai daqui.

— Uh, então ok. — o outro sorriu, pondo uma mão no bolso e começando a caminhar em direção à saída. — Quer que eu traga uma das duas drogas? — questionou, com uma risada presa na voz. Santini chiou, com os pelos do braço se arrepiando, e enfiou-se na cabine mais próxima, girando a tranca e subindo no vaso sanitário fechado, atraindo os pés para cima e tampando os ouvidos, cerrando os olhos com força quando notou o som da porta fechando, esperando que Jaime não tivesse voltado para dentro.

Cravou os dentes no lábio com força, sentindo a respiração se controlar um pouco assim que houve a primeira pontada de dor e o gosto de sangue dominou a língua, as mãos tremendo de forma bem mais leve. Retirou uma do ouvido, colocando-a em frente à boca, para impedir o sangue de escorrer muito, e continuou, os olhos bem fechados, até parecer o suficiente e sentir-se um pouco mais no controle da situação, com a respiração compassada e a mente limpa.

Tomou fôlego e coragem e saiu cautelosamente da cabine, correndo para a pia para lavar os lábios ensanguentados, retirando o vermelho com a água o máximo que pôde e então fitando seu reflexo no espelho, focando-se no estrago perceptível. Eram bastante visíveis, marcas rubras óbvias, que Sarosh saberia de que vinham assim que visse. Passou um dos dedos sobre as feridas com delicadeza, soltando um resmungo desgostoso antes de abaixar a mão.

Ele tentou, em um esforço real, enquanto encarava seu reflexo com insistência, lembrar da última vez que os lábios estiveram realmente limpos: nenhum mínimo arranhão em processo de cicatrização, nenhuma marca fraca de mordida quase curada, nenhuma área magoada na qual caso passasse os dentes de leve doeria mais. Simplesmente não havia um espaço de tempo entre seus doze anos e a idade atual que houvesse de fato parado com aquilo. Não havia um momento em que estava intacto.

Ele soube, por mais que fosse difícil de admitir e por mais que não quisesse, que aquilo estava fora de controle, e que cabia apenas a ele fazer parar.

~o~

Santini pegou o celular do bolso assim que o sinal para o horário de almoço tocou, dizendo a Sarosh que se adiantasse e ficando para trás na sala enquanto todos saíam. Ele ergueu o polegar para Daniel quando o amigo hesitou à porta e voltou-se para lhe mandar um olhar preocupado, fazendo-o ver que estava tudo bem e sair também.

Então desbloqueou o celular, indo até o número do pai na lista de contatos e apertando para ligar para ele. A chamada foi recusada após alguns poucos toques, e ele respirou fundo, cerrando os olhos, e levantou, passando a mochila para frente para pegar a marmita, pondo-a em cima da mesa e passando a mão pelos cabelos, tentando manter a calma e se convencer que Sarosh não tentaria falar sobre as mordidas naquele momento.

Para sua surpresa, o celular tocou pouco mais de cinco minutos após sua tentativa, e ele observou o número do pai no visor por um segundo antes de atender e levar o aparelho à orelha.

— Alô. — respondeu, fazendo o melhor que podia para a voz soar descontraída, embora achasse que era possível captar um pouco de cansaço.

Oi. Aconteceu alguma coisa? — o pai questionou, do outro lado da linha, em um tom preocupado.

— Hn, não exatamente. — mentiu, sem apegar-se muito ao fato. — É que... ah, espera, tá tudo bem pra você falar agora?

Tá, tá sim. Só não posso demorar muito. O que foi? — Santini respirou fundo pelo nariz, tomando coragem.

— É que eu tava pensando na aula vaga, que foi, tipo, agora pouco, e dá pra antecipar a minha consulta?

Hã... acho que sim...? Mas tem certeza que não aconteceu nada? Quero dizer...

— Não, não. Tá tudo bem. Eu só... queria falar com o médico sobre um negócio. Eu tinha esquecido, e acho que é meio urgente. Então, tipo, se não der tá ok, também. Juro.

— Eu vou ligar pra lá hoje mesmo, ok? Te falo no que deu quando chegar em casa.

— Ok. Valeu, pai. Desculpa ligar em horário de serviço.

— Ah, tudo bem. Eu só preciso voltar, agora. Boa aula, sim?

Ok. Bom dia de trabalho.

Tchau. — despediu-se, e Santini tirou o celular do ouvido quando a ligação foi encerrada, bloqueando-o e pondo-o na mesa em movimentos quase automáticos.

Ele puxou os headphones da mochila, então fechando o zíper e colocando os auriculares, conectando-o ao celular e selecionando The Grey da Icons for Hire antes de sair da sala com a marmita na mão. Ele lançou um olhar na direção da sala de Shey, negando com a cabeça e soltando um suspiro cansado antes de seguir seu caminho para almoçar com os amigos.

~o~

Não conseguira, por mais que houvesse tentado, deixar os ferimentos nos lábios menos óbvios que quando estava na escola, assim como não pudera fazer Sarosh deixar o assunto para lá na hora da saída. Mas conseguira ao menos tratar das feridas, para evitar que inflamassem, e manter a calma apenas assistindo Amazing Phil até o horário que o pai chegava em casa, o que era alguma coisa, em sua opinião.

O coração disparou, mesmo assim, quando ele bateu à porta, e Santini exclamou sua permissão para que ele entrasse, fechando o laptop e abaixando a cabeça, nervosamente batendo dois dedos na superfície do aparelho. Assim que ouviu o som da porta se abrindo e o cumprimento do pai, seu corpo estremeceu fortemente e ele olhou na direção do homem com hesitação, tentando resistir ao impulso de tampar a boca.

— Desculpa. Desculpa, eu não tava pensando, eu... — respirou tremulamente, vendo o homem olhá-lo com surpresa, parecendo sem saber o que fazer, então entrando no quarto com hesitação, sentando na beira da cama com desconforto.

— O que aconteceu?

— Nada, nada demais. Desculpa, eu nem notei, eu juro. Quando eu reparei já tinha machucado e— desculpa, desculpa.

— Santini. — chamou, batendo em seu ombro para chamar atenção. — Calma. Tá tudo bem. — ele torceu os lábios por um segundo, desviando o olhar. — Eu não gosto, mas não vou fazer aquilo de novo.

— Ah. — o adolescente respirou fundo, ainda com os olhos arregalados. — Ah. — mordiscou brevemente o interior do lábio. — Desculpa, mesmo assim. Eu não... eu meio que não faço por querer. Eu juro. — o homem o encarou atentamente, parecendo pensar no próximo passo.

— Me explica por que você faz isso. — pediu em um tom que quase soava como uma ordem, fazendo Santini soltar um ofego nervoso.

Não. Quero dizer, a gente não pode deixar isso pra outro dia? Eu não quero falar sobre isso. Eu nem sei... eu nem sei explicar, tá? Por favor, eu não quero. Nem foi por querer.

— Será que você não pode tentar entender o meu lado? Eu não faço ideia do que está acontecendo, e a única pessoa que pode me explicar é você.

— Eu... eu fiquei nervoso. Eu só fiquei nervoso, e aí perdi a noção. — Lionel abriu a boca para dizer algo, e Santini quase se encolheu, esperando mais insistência. O homem pareceu notar, suspirando pesadamente.

— Eu adiantei a sua consulta pra essa sexta, mas acho que não vou poder te levar, dessa vez.

— Tá tudo bem, eu vou sozinho. Obrigado. Desculpa.

— Você não pode tentar parar com essas coisas?

— Posso. Eu vou. Juro. Desculpa. — o homem negou com a cabeça, levantando da cama.

— O remédio não tá ajudando?

— Tá. Hã... tipo, o pras crises tá. O outro ainda não. Mas acho que isso é normal...?

— Pergunta pro médico quanto tempo isso demora pra fazer efeito, ok?

— Ok. Claro. Eu vou me esforçar. — ele assentiu com a cabeça, então lançou um olhar demorado em sua direção, que Santini devolveu, sem saber o que fazer.

— Eu vou tomar um banho, agora. Você vai jantar, né?

— Vou. — ele começou a observar o pai saindo, então afastou o laptop, ofegando baixinho. — Pai.

— O que foi?

— Você tá com muita raiva? — o homem hesitou, virando para ele com o cenho franzido.

— Não. Você não faz de propósito, faz?

— Não. Tipo, meio que não. É sem perceber mesmo.

— Então pronto.

— Hm... pai...

— O que foi, Santini?

— Desculpa sair te causando um monte de problemas, ok? Eu não tô fazendo por querer. — o homem o encarou com uma expressão estranha, algo entre surpresa e fastígio.

— Eu sei. Eu já te disse isso, não?

— Ok... — o homem balançou a cabeça, abrindo a porta. Todavia, ainda com a mão na maçaneta, ele virou-se no lugar de deixar o cômodo, olhando o filho com preocupação.

— Isso é culpa minha?

Não. — respondeu imediatamente, com os olhos arregalados. — Não. Isso é culpa minha. Tipo, porque eu fico nervoso por nada. É só isso. Eu ficando nervoso por pouca coisa.

Lionel assentiu lentamente, incerto, antes de finalmente sair, fechando a porta novamente. Santini afastou o laptop, deitando na cama e apoiando os pés no colchão, mantendo os joelhos flexionados. Ele arrastou os dentes pelo lábio, sentindo os choques de dor nas feridas, deixando a sensação acalmá-lo, mas fazendo o máximo que podia para não ampliá-las. Então fechou os olhos, respirando fundo e aos poucos obrigando-se a parar, antes que acabasse se machucando mais.

Ele ainda tinha, pelo menos por enquanto, pessoas para não decepcionar.


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Notas finais do capítulo

Hn... acho que tenho algumas coisas a dizer e.e
Primeiro, "Infinite Jest" é um livro de David Foster Wallace, que foi traduzido pro português, mas eu não me lembro o título dele aqui =3 (yay). Desculpem-me. O significado seria algo como "Piada Infinita".
Amazing Phil é um canal no youtube, de um cara britânico contando coisas do dia a dia e... no geral sendo uma criatura muito adorável :33
Era isso. É. Então, espero que tenham gostado =D
Até o próximo.