Maquinaria escrita por Koehler


Capítulo 2
Culpa


Notas iniciais do capítulo

Olá! Se eu demorei, foi por culpa dos vestibulares, viram? Prometo que o próximo deva sair mais rápido, ou não. :D
Muito muito muito muito muito obrigada ao lindo Marvin e à linda Suy gata perfeita pelos reviews! Vocês são importantíssimos pra mim (e pra Maquinaria também hehehe)
Obrigada também a magnífica Koruja pela betagem sempre impecável e os comentários que me fazem rir muito ao fim de cada capítulo, você é mil!
Dedico esse capítulos a vocês, ok?
Boa leitura!



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Capítulo I

Culpa

— Vem,Tori! – A garotinha gritou, acenando os pequenos bracinhos para que a maior a seguisse. Os cabelos castanhos pendendo como cascatas sob o arco de margaridas de cetim perfeitamente costuradas por sua própria mãe. A mais nova corria, sorridente, pelo enorme campo, também de margaridas — as flores preferidas da menina —, que encontraram na mansão que se hospedariam naquelas férias. Vitoria não pôde deixar de sorrir e então, finalmente levantar para seguir a pequena.

À medida que andava, os campos de margaridas iam murchando. Quando olhou novamente para cima, a menina sorridente desaparecera. Em seu lugar, a mesma, moribunda, os olhos marejados e cobertos de melancolia. As roupas, outrora um vestido coral e brilhante, agora estavam rasgadas e sujas.

— É tudo culpa sua! — a pequena gritava, a voz carregada de ódio e desespero.

Vitoria levou as mãos à cabeça, desesperada, enquanto seus ouvidos latejavam com o grito angustiado que saía dos pequenos lábios da garota. O que havia feito? O que estava acontecendo?

A menina correu ao seu encontro, raivosa, vingativa, chegando cada vez mais perto.

E então ela sentiu as pequenas mãozinhas envolverem seus pulsos com uma força descomunal. Gritou, a dor excruciante, o barulho ressoando por todo o campo.

Vitoria acordou sobressaltada. Correu os olhos por todo o lugar em busca de saber onde estava. Soltou um suspiro de alívio ao descobrir que ainda se encontrava em seu quarto. Foi só um sonho. Em algum lugar do cômodo, seu celular tocava insistente. Levantou-se, tonta, e lentamente cambaleou até a escrivaninha bagunçada com inúmeros projetos, com os quais ficara trabalhando toda a noite anterior. Encontrou o aparelho e levou-o ao ouvido.

— Alô?

— Senhorita Vitoria Kohler? — disse uma familiar voz feminina.

Vitoria caminhou até sua cama e sentou-se novamente. Respirou fundo antes de responder.

— Sim, eu mesma. — respondeu, agora um pouco mais calma e rouca. Sentia que sua garganta implorava por um copo d’água.

— Desculpe ligá-la a essa hora, senhorita, mas eu juro, é um assunto de extrema importância. — A essa hora? Correu novamente os olhos pelo cômodo, agora em busca de encontrar em algum lugar seu relógio digital. Encontrou-o. Os números vermelhos mostravam 04:52h da madrugada. Inspirou, pesarosa.

— Desculpa, mas quem está falando?

— Aqui é Ana Darren, senhorita. — Vitoria reconheceu o nome de imediato. — Sou secretária particular de seu pai.

— Sim, sei, pode falar.

— Desculpe novamente, senhorita, mas é que... — Vitoria interrompeu a moça, em busca de encurtar o diálogo. De tudo que envolvia seu pai, ela preferia se manter longe. E, provavelmente, aquela era mais uma das vezes que ele mandara sua secretária contatá-la para uma reunião familiar ou algo do tipo. Ela não cederia novamente, em especial nesse horário.

— Olha, Ana, se for mais algum encontro de Lamar, diga-lhe que estou bastante ocupada, sim? — e do outro lado da linha, a mulher suspirou, cansada.

— Senhorita, deixe-me terminar, por favor, a senhorita não está entendendo. — a secretária parecia nervosa e se embaralhava nas palavras. Vitoria aquiesceu.

— Tudo bem, continue.

A mulher suspirou, novamente.

— Eu preciso que a senhorita venha até o Instituto e, por favor, não chame mais ninguém. — disse, rapidamente, e Vitoria teve que se esforçar para entender alguma coisa, visto que além de gaguejar, a mulher também sussurrava.

— Tudo bem, mas, primeiro, pode me explicar exatamente o que está acontecendo?

— Apenas venha. — Ana disse, agora a voz num tom impaciente. — A senhorita vai entender tudo quando estiver aqui. Mas eu preciso que venha rápido, por favor. — insistiu. Vitoria suspirou.

— Se for mais alguma daquelas reuniões do meu pai...

— Não haverá mais reuniões, senhorita. — afirmou, e a linha ficou muda.

Vitoria levou algum tempo para absorver a informação, afinal, seu cérebro ainda estava desconcentrado devido o horário da ligação. Como assim não haveria mais reuniões? Seu pai insistia em tentar marcá-las mensalmente, mesmo que a filha sempre recusasse e alegasse estar ocupada demais com coisas mais importantes que os assuntos familiares de Lamar.

Fazia tempo que eles não eram uma família propriamente dita. Tinham o mesmo sobrenome, partilhavam o mesmo Instituto e Vitoria até aceitara o presente que o pai lhe dera de natal: um laboratório totalmente equipado, bem seguro debaixo das instalações do imponente prédio do Instituto Kohler. Mas aquele fora o único presente que a cientista resolvera aceitar. Primeiro, porque tinha finalmente decidido dar uma segunda chance ao pai, e segundo, porque realmente estava empolgada com os pequenos frutos que sua pesquisa havia dado, e sabia que não poderia continuá-la em um local tão pequeno e despreparado como o que ela estava acostumada a utilizar. Uma ajuda desse porte não se nega, e havia feito Lamar prometer que não havia nenhum vínculo ou tentativa de juntar novamente a família que eles um dia foram. Era apenas para o benefício e avanço da ciência. Tudo pela ciência.


Levantou-se preguiçosamente da cama, caminhando até o simplório closet que ficava no canto esquerdo do aposento. Retirou de lá uma calça jeans de lavagem escura e uma camisa branca de abotoar. Calçou uma sapatilha preta qualquer e, ao pegar as chaves do carro e sua bolsa, que ficavam numa cômoda próxima à janela, notou que chovia. Retornou ao closet e pegou seu quase inseparável blazer azul marinho e um guarda-chuva, se apressando para sair do quarto.

Saiu sem comer nada. Geralmente não tinha apetite pela madrugada. Apertou o botão em sua chave, ouvindo na garagem o bipe duplo de seu carro sendo destravado. Caminhou até lá em passos rápidos, entrando de qualquer jeito na Mercedes prateada e pondo a chave na ignição, em seguida engatando a ré e saindo à medida que a porta da garagem abria.

Não tardou a chegar no Instituto. Preferiu entrar pela porta dos fundos, visto que o caminho pelo estacionamento era mais curto. Apertou o passo assim que chegou ao hall, que dava entrada ao extenso corredor central do prédio, parando em frente ao elevador e apertando o botão equivalente ao último andar, para a sala de seu pai.

Assim que a porta se abriu, pôde ouvir Ana gritando e correndo em sua direção, sendo seguida por três homens, que Vitoria não soube identificar quem eram. Um deles, espadaúdo e alto, vestia um uniforme que parecia ser da segurança. Quando chegaram mais perto, ela pôde comprovar que sim, se tratava do vigia noturno do prédio. Os outros dois eram menores, mas não tanto quanto Ana. Tinham quase a mesma altura, mas um deles era loiro e o outro tinha os cabelos negros.

Quando Ana finalmente a alcançou, sua respiração estava descompassada devido à corrida. Os outros dois vinham logo atrás, caminhando normalmente, visivelmente preocupados e também tentando recuperar o fôlego. A mulher mal continha-se nos pequenos saltos, os olhos vermelhos indicavam que tinha chorado, a face se contorcia de desespero.

Parecia que a mulher havia visto um fantasma.

Vitoria virou-se para eles, a porta do elevador ao seu lado se fechando.

— Senhorita Kohler, eu preciso que venha conosco. — disse o vigia.

Ela não disse nada, apenas acenou com a cabeça e o seguiu. Atrás deles, Ana e os outros dois homens andavam, cautelosamente, temendo pelo que viria a seguir.

Cruzaram mais da metade da extensão do corredor, até chegar a porta da sala de controle do prédio. Não estava trancada, como de costume. O homem adentrou o cômodo, com cuidado. Olhou de relance para Vitoria, buscando alguma reação diferente da mulher. Apenas confusão.

Como Ana se recusou a entrar, apenas um dos outros dois homens os seguiram sala adentro. No meio da caminhada, o vigia parou, e então ela pôde ver.

Vitoria parou abruptamente.

No chão, Lamar Kohler, segurando uma arma em sua mão direita, rodeado por uma enorme poça de sangue.

— Meu Deus! — gritou.

O homem estava jogado no chão, de forma desleixada. Na posição em que suas pernas estavam, fazia parecer que estava ajoelhado antes de cair. Em sua mão, a arma do crime. Na lateral da cabeça, um único furo.

— Tudo indica que foi suicídio. — disse o loiro, que entrou na sala com eles.

Vitoria levou as mãos à boca, aterrorizada. Não acreditava no que estava vendo. Simplesmente não podia acreditar. De repente, todo o telefonema de Ana fazia sentido. Não haveriam mais reuniões. Uma onda de náusea percorreu seu corpo. Vitoria foi se distanciando devagar, sem conseguir respirar, seu cérebro tomando notas da cena a sua frente. Acordou do transe e, desesperada, correu em direção ao oposto da sala, em direção à porta, sendo interceptada pelo casal que ficou esperando pelo lado de fora.


Ana tomou a liberdade de abraçar Vitoria. Sabia que os laços da família não eram fortes, mas para a secretária, Lamar era tudo que tentava ser para a filha. Ele a tratava como se fosse um pai, e mesmo ela insistindo em continuar a ser sua secretária, o homem insistia em lhe dar auxílio para que ela terminasse sua especialização em partículas físicas. Ana sonhava com ciência, e Lamar a ajudara com isso. Tomara o posto do pai que ela nunca teve. Era uma perda inestimável.

E aquilo não podia estar acontecendo.

Vitoria se lembrava, o pai a havia ligado na noite anterior, sugerindo que ninguém fosse trabalhar no outro dia, uma segunda; ordenou que a filha desse folga a todos os contribuintes de sua pesquisa, alegando que o Instituto não receberia muito movimento, e que seria bom que eles aproveitassem e tirassem o dia para fazer algo recreativo. A mulher acatou tudo sem refutar nada. Deu folga a todos os seus funcionários e a si mesma sem nem pensar duas vezes.

Mas agora, vendo seu pai, morto, na sua frente, com uma arma em mãos, era tudo muito surreal. Ela devia ter refutado, devia ter gritado ao telefone como sempre fazia quando ele lhe ligava. Devia ter dito ao homem que ele simplesmente não a diria o que fazer, mas ela apenas concordou e desligou o aparelho. E agora, ele estava morto. E apesar de todos os pesares, era seu pai. Era o homem que, mesmo ela fazendo o possível para manter longe, se esforçava o dobro da mulher para se manter perto. Fechou violentamente os olhos, as lágrimas saindo apertadas, afogando-se no abraço interminável de Ana, sentindo as mãos trêmulas da secretária afagarem seus cabelos, sem saber direito o que fazer.

Ela não podia se sentir mais culpada.


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Notas finais do capítulo

Ai, meu deus :c
Nunca sei o que dizer nas notas finais, já perceberam? Não? Pois percebam!
Enfim, eu espero que tenham gostado (mesmo) desse capítulo. Recebi-o hoje ainda da Koruja e já decidi postar, não gosto de esperar!
Deixem, por favor, suas singelas opiniões nas reviews, vou respondê-las todas com muito carinho e felicidade!
Abraços,
L.