Ao decair do último floco de neve... escrita por Cameron Fracktallya Scare


Capítulo 2
❄ Capitúlo 2 - Noites mundanas ❄


Notas iniciais do capítulo

Continuação do capítulo anterior.

Trilha Sonora:

Bang Bang - Will.I.Am
Skinny Love - Birdy



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/559433/chapter/2

Não era nada pessoal, mas ela estava ali de toda a forma e nada à impedia de explorar aquele mundo mortal que os deuses tanto gostavam. Quione sempre se comportou como um princesa em questões de postura, delicadeza, e desde sempre foi considerada a queridinha de Bóreas, o poderoso anemói que controlava os ventos do norte e também seu pai. Apesar se tudo isso, ela era um ser um pouco curioso e se aproveitava do fato de Bóreas estar muito preocupado com rastrear e vigiar sua esposa e mãe dela, Orítia.

O sol havia se posto há uma hora e agora era o momento de deixar o velho vestido de lado e explorar a área de uma forma mais normal aos olhos do mundo mortal. Nada que fosse muito drástico porém uma boa mudança. As roupas agora eram uma calça jeans negra como seus cabelos, que agora estavam soltos ondulando nas costas, uma regata branca bem simples e sapatos de salto alto que aparentavam serem feitos de cristal. Ela vestiu a jaqueta e fixou os olhos cor de café no espelho de corpo inteiro que flutuava no ar, desferiu um pequeno sorriso ao próprio reflexo e, com um movimento de mãos, desfez o espelho em suaves flocos de neve.

O hotel onde ela estava hospedada era luxuoso e de certo requinte, afinal não se esperava que uma deusa como ela se encostasse em qualquer pulgueiro para descansar um pouco. Quione não podia dizer que estava plenamente confortável com toda aquela situação e principalmente com as novas roupas mas já era hora de um pouco de entretenimento e, se algo ou alguém à irritasse, o jardim de seu pai poderia ganhar novas estátuas de gelo para a coleção... Simples assim. Tal pensamento fez com que mais um dos raros sorrisos lhe percorressem a face enquanto o elevador descia do décimo andar até o saguão principal, a jaqueta de couro na cor azul marinho se ajustava perfeitamente ao seu corpo esguio e contrastava com a pele pálida.

Para um simples mortal, a noite poderia parecer um tanto quanto fria com ventos gélidos, mas para ela o clima estava tão agradável e reconfortante que talvez aquela jaqueta nem lhe fosse necessária. O porte altivo se mantinha em seu caminhar pelas ruas de West Kelowna mostrando que, mesmo em roupas de seres humanos, ela jamais deixaria de ser uma deidade. As calçadas não estavam lotadas mas ainda sim havia muitas pessoas por ali procurando um bom lugar para se divertir ou apenas para sair de suas casas, coisa que ela entendia bem como era. Não queria ser levada a mal, porém uma folga era necessária de tempos em tempos e como o Olimpo à via com maus olhos, só lhe restava aqueles lugares mundanos para visitar nunca se mantendo muito longe de seu lar. Ela acabara optando por um bar, que era como um PUB europeu e no qual uma banda tocava, não estava muito lotado e foi exatamente o que a fez ficar, detestava muito contato com aqueles seres inferiores.

— Eai moça, qual à pedida?

Disse-lhe um jovem de cabelos castanhos ao se aproximar, ele trajava um avental verde com listras brancas e deveria ser um serviçal daquele lugar. Quione já se encontrava sentada em silêncio no bar havia um bom tempo apenas em observação do local. A banda já havia parado de tocar e agora uma música qualquer ecoava pelo local. Ela voltou seu olhar ao rapaz que sorria e manteve a expressão dura, quando estava prestes a responder uma voz tomou conta da resposta ao seu lado.

— Dois Appletinis, por favor.

Aquela voz... Possuía conhecimento aquele timbre. Suas suspeitas se confirmaram quando o olhar do homem cruzou o seu ao se sentar ao seu lado no banco giratório do bar. Os cabelos loiros estavam levemente bagunçados e os olhos azuis claros se destacavam na face, era o mesmo homem que a seguiu a dois dias atrás. Ele agora trajava uma camiseta de manga longa em um tom de verde água com calças jeans clara e sapatênis brancos, um casaco cinza claro de botões pendia em seu braço direito. Quione havia destruído o papel que ele lhe dera e não se importava nem um pouco com aquilo mas lá estava ele, novamente sendo invasivo e enxerido. Ele parecia feliz mas ela não fazia ideia do por quê de um sorriso tão largo e continuava a fita-lo sem nenhuma emoção além do desprezo na face.


— Legal reencontrar você por aqui... Quione, né? Eu te dei meu número mas acho que você perdeu.

— Não. Na verdade eu destrui o papel por que achava o fato de ter aquilo inútil. Poderia nunca mais ver sua face que não me importaria nem um pouco.

Dessa vez, ela optara por olhar diretamente para ele, fazendo questão de mostra-lo que sua presença ali e no mundo era completamente desprezível e que ele era apenas mais um humano, mesmo assim ele não deixava de sorrir para ela. Matthew era um tipo diferente de pessoa, ele tinha sim em seu coração todos os pesares da vida assim como as dificuldades que ela proporcionava mas preferia vê-la por outros olhos... Olhos mais divertidos e brilhantes com os quais ele conseguia enxergar o lado bom da vida. O silêncio se estendia enquanto a frieza da deusa se chocava com a felicidade inexplicável do mortal, na verdade Matthew pensava nela todos os dias desde que se encontraram, ela havia despertado nele uma grande curiosidade com aquele jeito de que não ligava para nada, o mundo podia estar desabando na frente dela que ela continuaria ali sentada como se qualquer problema não pudesse nem ao menos chegar a tocar nela. Ele sentia naquela garota uma força imensa e uma atitude muito forte, como uma muralha de pedra impenetrável. Não era pretensão dele arrumar um rapel para escalar aquela muralha que era Quione mas a cada minuto que se passava mais aquela sensação curiosa dele aumentava mais e mais.

— Claro, isso explica tudo.

Como esperado ele continuava ali. O garçom voltou apenas para depositar as taças do repletas do líquido verde claro no balcão do bar, uma cereja bem vermelha se encontrava no fundo da taça e uma fatia de maçã verde adornava e lateral pendendo da borda. Quione examinou o líquido e Matthew pegou a taça e a ergueu no ar, por mais que ela não gostasse de companhia e mantivesse as pessoas longe jamais passaria por mal educada. Ela segurou firmemente a taça e então a encostou na dele deixando que o som agudo do vidro batendo ecoasse pelo ar.

— Um brinde... Ao reencontro e à você que esta muito bonita esta noite.

— Muito obrigada.

Ela não poderia dizer o mesmo, apesar de que ele sem dúvidas estava mais alinhado do que antes, as roupas pareciam mais limpas e o cheiro também. Não sabia por que ainda não tinha matado aquele mortal insolente ou então feito algo para afasta-lo mas seu interesse nela também mostrava algo ao qual não estava acostumada. Mesmo sendo a "garotinha do papai" Quione não tinha alguém que lhe dava total atenção já que dividia a morada com seus irmãos, sua gêmea Aura e os garotos Zetes e Calais. Ela jamais se sentia inferior à eles mas aquilo não mudava o fato de ser a única da família, além de sua mãe, que não possuía asas pelo nascimento e genética. Aquilo não era nada demais, ela ainda poderia criar asas para si mesma ou simplesmente planar pelo ar com seu corpo desfragmentado em flocos de neve mas seria enganoso dizer que não sentia-se no mínimo diferente de seus irmãos, até mesmo de Zetes que era mais frio e rigoroso como ela. O homem, tomou um pouco da bebida e ela espelhou seus movimentos, poderia beber o quanto quisesse já que aquilo não a afetava ou saciava.

— Se lembra de mim, não é? - Disse ele.

— Sim, Matthew. Eu sei quem é você. -Ela manteve o contato visual e apoiou a taça no balcão.

— Ótimo. Isso é muito bom mesmo...

Por mais incrível que pudesse parecer, a conversa se seguiu até a segunda taça dos martínis de maçã, Matthew era o que mais falava e se movimentava, sempre passando a mão para alinhar mais os cabelos e falando de algumas de suas viagens enquanto Quione continuava calada e ouvindo até que com certo interesse leve, ele parecia muito diferente agora, mais eloquente e menos desprezível do que antes e o assunto atual era a aventura dele pela cidade do México. Ele gesticulava para dizer como estava sendo sua jornada desde a terra natal até o extremo sul das Américas e subindo até aquele ponto de Vancouver. Ele vinha de Veneza, na Itália e tinha começado sua jornada aos dezessete anos quando fugiu de casa e desbravou a Europa até conseguir chegar ao próximo continente. Foi durante a conversa que ela notou um traço muito leve de sotaque assim como o brilho nos olhos dele e o modo como suas mãos não parava quietas em momento algum.

O que ela não sabia era que ele também á admirava ao passo que a história progredia, e quanto mais ele contava mas podia ficar ao lado dela, por isso acabava por ir falando e falando das viagens em busca de coisas novas... Culturas, religiões, artes, tudo. Ele percebeu como ela tinha uma beleza natural, daquelas que não precisava de maquiagem, e como era uma boa ouvinte além da força que ela possuía. Apesar de parecer que conversava com uma estátua ele realmente havia gostado dela, da presença que ela proporcionava e do charme que ela exercia sem nem saber.

— Essa música! Eu adoro ela... Você quer dançar?

Ela até poderia recusar aquilo, odiava contatos próximos mas seria muito rude de sua parte e ainda gostaria de ouvir mais sobre o que o homem, Matthew, tinha para lhe contar. Ela suspirou, e estendeu a mão para ele, que já se encontrava de pé. A música era lenta e a pista parecia nem muito cheia e nem muito vazia, ele apoiou as mãos dela sobre os ombros e colocou as mãos em sua cintura. Assim se iniciou um leve balançar.

— Foi muito bom te ver de novo, Quione. E, desculpa por ser tão tagarela, isso foge do meu controle.

— Fora histórias intrigantes, gostaria de ouvir mais sobre elas.

— Isso significa que quer me ver de novo?

— Talvez.

Um sorriso mais leve se espalhou pelo seu rosto e fez com que o coração de Matthew acelerasse um pouco, não entendi o por quê de ela não viver sorrindo com um sorriso tão bonito como aquele e foi então que percebeu que ela tinha algo de especial. Muito especial...


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Neste capítulo, você pode ver que "água mole em pedra dura tanto bate até que fura", mas a questão real é... O que será que vai acontecer á seguir?...