Senhor Sulivan fechou a porta do carro, segundos depois sumindo na estrada. Aquela família era simpática, e totalmente adorável – Claro, as crianças eram um pouco irritantes. Nada como uma língua para fora que não resolva- mas sempre era assim, famílias simpáticas e pessoas legais passavam pelo motel. Essa era a parte que aprecio no trabalho, conhecer pessoas. Semanas se passaram depois de minha quase demissão, fiquei frustrada e magoada por Norma realmente ter sucumbido a meu pedido e não ter esclarecido as perguntas que queria saber, sentia-me excluída, mas depois de saber toda a historia, pelo Norman, eu parecia ter sido indelicada. Aquilo era bem além do que imaginava, e a intensidade era doentia. A família Bates era como um copo de vidro rachado, cheio de historias e segredos.

– Ei, Decody! Viu a Norma? – A voz de Dylan me despertou, estava tão concentrada em meus pensamentos alheios, que mal o percebi entrar. Estava na minha frente bebendo alguma coisa, posso chutar ser algo alcoólico.

–Foi comprar toalhas com o Norman – Respondi ainda fitando a bebida que ele tomava. Pelo amor de Deus, qual é! Estávamos em uma terça, e nem anoiteceu ainda – Você...ainda vai dirigir?

Dylan franziu o cenho, dando um sorriso irônico.

– Por quê?- Ah! Eu não sei, são tantos motivos, deixe-me ver um. Apontei para a bebida e ele deu de ombros. Aquilo não era bom sinal.

Certo, não conheço Dylan da forma que conheço Norma e Norman. Mas sei que ele não sabe lidar com álcool tão bem. E ao lembrar-me da ultima vez, em que estava no carro apagado, e vomitado – com o forte cheiro de bebida- me fez ter receio, e se ele dirigir? Às vezes eu me preocupo demais com as pessoas.

– Você ainda vai dirigir? – Perguntei novamente. Sentia-me como aquelas mães super protetoras, com medo de o papel fazer um corte na mão do filho – É, serio Dylan!

– Relaxa Decody – Sua voz saiu aguda e alta. Acho que fiquei um pouco contrariada, senti meu corpo endurecendo e meus ombros ficarem firmes – Certo. Não vou dirigir.

Não pude deixar de sorrir, estou começando a achar que meus exercícios de persuasão estão dando resultados. Digo isso, por que, vamos lá! É o Dylan. Da ultima vez, que tentei dar um conselho isso não saiu muito bem... e acabou, que perdi o controle e acabei sendo um tanto quanto sarcástica. E, acredite poucas vezes uso o meu sarcasmo. Uma risada abafada e contrariada vindo de Dylan me fez franzir o cenho, qual era a graça? Ah, claro me preocupo. Processa-me Massett!

– Norman me contou que pediu demissão, por que voltou a trás? – Arregalei meus olhos, tentei disfarçar olhando para as paredes. Ah, bem voltei por que Norman me contou tudo! E, falando nisso como vai seu pai/tio? Dylan deve ter percebido, por que se curvou sobre o balcão de forma intimidadora. Não! Qual é não tenta tirar a resposta de mim!

– Então...Eu acho que fui precipitada em relação as coisas... e as coisas são...Quer dizer... Essas coisas não tem nada de tão importante. É, são coisas pessoas...Motivos! Isso, motivos pessoas. Mas, agora esta resolvido.

Foi a pior mentira que contei, até eu admiti isso. Mas, não seria mais constrangedor do que a verdade, ele poderia ter um surto ou desencadearia brigas alheias. Acho que não fui a única a admitir que foi uma mentira mal contada e interpretada, Dylan sorriu de forma sacana como “ Você faz melhor que isso” ou simplesmente “ te peguei”, mas ele não disse nada apenas voltou-se para a porta vendo Norma estacionar o carro. Sem ao menos se despedir ele saiu, tchau pra você também. Voltando a minha atenção para fora como o de costume, via Norma segurando algumas sacolas de toalhas, enquanto falava algo com Norman e Dylan, o que eles falavam tanto? Seria algo sobre o Motel? Ou familiar?

Norman notou o meu olhar, e eu desviei. Não quero que ele me ache uma fofoqueira, por que eu não sou. Só um pouco curiosa, principalmente depois de tudo que passamos juntos, fingi anotar algo no papel ouvindo o sininho anunciar a entrada de alguém.

– Oi Emma – Norman mostrava aquele sorriso tímido e encantador, ele ainda segurava as sacolas de toalhas – Eu vou guardar as toalhas e trabalhar um pouco em um corvo.

Taxidermia não é lá um dos melhores hobbies, mas ao menos é algo criativo e ate bonito. Assenti além do mais eu sempre ficava sozinha a tarde, enquanto Norman empalhava os animais mortos no porão. Às vezes, Norma ficava comigo fazendo-me companhia e pelo jeito que voltou para o carro, esse dia não é hoje. Ótimo. Sozinha novamente, Norman voltou para casa e Norma para algum lugar. Sem muito que fazer, peguei a chave do quarto cinco arrastando atrás de mim o cilindro de oxigênio, as vezes os hospedes faziam uma bagunça infernal, como astros do rock, deixando lixo em cima da cama ou quebrado a Tv. Outros, esqueciam peças de roupa e até mesmo anéis e cordões, muitas das vezes ninguém voltava para pegar a não ser, que fosse realmente caro ou de recordação familiar. Girei a maçaneta e a porta estava aberta, guardei a chave no bolsinho do casaco entrando no quarto, de primeira não vi que tinha alguém guardando toalhas na cômoda, e só depois de acender a luz e de ter dado um grito alto e fino – e pulado pra trás- que Dylan revelou-se ali, senti meu coração pulsar forte demais. Poderia rir da situação, mas não consegui, pelo susto acabei ficando atordoada e comecei a tossir.

– O que você está fazendo aqui? – Perguntei me recompondo.

– Ajudando a Norma- Okay. Senti meu rosto queimar levemente, enquanto ele me olhava de forma intensa, com certeza iria fazer uma pergunta sobre algo...indelicado. Era sempre assim – Você tem que ir pra todo o lugar com isso?

Apontou para o cilindro atrás de mim.

Assenti. Vendo algo brilhante perto da Tv -parecia uma corrente- estiquei-me um pouco para pega-la, era bonita e tinha um pingente de uma borboleta azul. Resolvi guardar no bolsinho junto com chave, se o senhor Sulivan aparecer atrás eu poderia devolver e com sorte rever aquelas crianças irritantemente cativantes. Saímos juntos sem dizer nada. Por que não havia o que conversar, ao mesmo tempo em que xerife Romero sai do quarto, parando no exato lugar ao nos ver sair do quarto. Por favor! Não pense nada do que eu estou pensando, em que você poderia pensar então, me lembrei do grito. Que vergonha, desviei o meu olhar, e, por favor, não me venha perguntar nada e nem insinuar nada. Romero continuava no motel, ainda acertava algumas coisas sobre um imóvel na cidade na rua da minha casa, e fez rapidamente amizade com meu pai. As vezes ele me saudava cordialmente perguntando como eu estava, nada demais mas era bom ter atenção fracionaria durante o dia.

– Olá Emma – A voz soo atrás de mim, tanto eu quanto Dylan viramos para encarar o xerife que sorria com desdém- Ouvi um grito. Então vim verificar se esta tudo bem.

– Ah, claro! Eu apenas me assustei – Respondi, não poderia ser mais direta.

– Certo – Romero encarou Dylan com certa intensidade intimidadora, e depois para mim com seu habitual aceno de cabeça indicando que estava indo.

Ele fez as duas coisas que pedi mentalmente para não fazer. Indiretamente, claro, somente suas expressões denunciavam o que ele insinuava. Uma mulher fechou a porta depois de ouvir a conversa, será que gritei tão alto assim? Deus, qual é.

– Sim, você gritou alto – Dylan murmurou sentando no banco, tirando um cigarro acedendo e tragando aquilo.

– Você não pode fumar aqui – Advertir lembrando o que Norma havia falado sobre cigarros e maconha – A fumaça pode incomodar as outras pessoas.

– Eu não me incomodo – Já estava escuro, e as luzes iluminavam alguns pontos. Dylan as vezes era irritante e teimoso, bufei revirando os olhos e voltando pra recepção.