Estações escrita por Emma


Capítulo 26
Butterfly Kisses


Notas iniciais do capítulo

Capítulo trás uma reconciliação importante, foco maior no drama da família Soriano, mas no próximo voltamos com o desenvolvimento desse momento delicado entre A&S. Espero que gostem, minhas clandestinas do ♥ obrigada pelo apoio e incentivo, como sempre é para vcs, espero que gostem :*



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Há duas coisas que eu sei com certeza, ela foi enviada do céu, ela é a menininha do papai.

Quando ajoelho ao lado da sua cama a noite, ela fala com Jesus e eu fecho meus olhos,

E agradeço a Deus por toda a alegria em minha vida, mas acima de tudo, pelos beijos de borboleta após a oração noturna.

Colocando pequenas flores brancas por todo seu cabelo. "não saia do meu lado papai, é a primeira vez que ando de pônei", "eu sei que o bolo ficou engraçado, papai, mas eu certamente tentei."

Oh, com tudo o que eu fiz de errado, eu devo ter feito algo certo para merecer um abraço toda manhã e beijos de borboleta à noite.

Butterfly kisses – Michael Bolton

 

Laura desceu as escadas ao encontro de seus pais na sala de estar, Louise não tinha sido tão exigente no seu ritual “pré-sono” dessa vez. Ambos sorriam e conversavam distraidamente, compartilhando um copo de vinho tinto, poderiam se passar quantos anos fossem, eles sempre agiriam como duas pessoas que acabaram de se apaixonar. Sorrindo ela se aproximou e beijou a têmpora do pai enquanto se sentava entre os dois, apoiando a cabeça no ombro dele e envolvendo o braço pelo ombro da mãe, puxando-a para si.

— Essa semana passou tão rápido, não acredito que amanhã vocês já estão de partida...

— Infelizmente sim querida... – Conrad prosseguiu, enquanto afagava os cabelos da filha – Louise não está mais dando trabalho para dormir?!

— Ela melhorou muito nesse último ano, acho que antes ela fazia de propósito porque sabia que eu tinha aulas, seminários, provas e afins para fazer logo pela manhã, agora que eu só trabalho ela dificilmente acordar de madrugada, mas de vez em quando eu sinto um corpo quentinho se aninhando no meu.

— Ela já está uma mocinha Laura... Me lembra muito você quando pequena – Rebecca sorriu e se lançou de leve sobre a filha e o marido os envolvendo em um abraço.

— Sua mãe tem razão, eu geralmente acordava pela manhã com um bracinho gorducho em volto do meu pescoço nos seus cinco primeiros anos.

— Eu tenho que contar algo para vocês... – Laura se afastou o suficiente para encarar os dois, um de cada vez, com os dentes fincados no lábio inferior, escondendo o sorriso.

— Diga meu bem – a mãe abriu um sorriso doce.

— Bem... eu recebi uma promoção! – orgulhando de si mesma Laura inclinou a cabeça e levantou os ombros simpaticamente.

— Filha que notícia maravilhosa! – Conrad a abraçou apertando, ambos os pais vibrando com a notícia.

— Sim Laura, meus parabéns querida, você tem se esforçado tanto ultimamente, mereceu essa promoção.

— Eu fui praticamente o braço direito do meu chefe com o último caso, um divórcio milionário. O grande porém era que o advogado da outra parte era excelente e antigo no ramo, meu chefe tentou inúmeros artifícios para que nosso cliente cedesse apenas o necessário e não a quantia exorbitante que a esposa queria. Ele já não sabia mais o que articular, foi quando eu lhe mostrei as brechas no processo e no pedido do nosso “rival”... E funcionou, ganhamos! Agora faço parte da equipe sênior de advogados, ele está apostando muito em mim e viu meu potencial, mesmo com minha pouca idade.

— Você é brilhante, eu nunca duvidei – se desvencilhando das mulheres que tanto amava ele foi até a mesa de centro e pegou a garrafa de vinho sobre ela, sobra do jantar, enchendo outra vez o copo dele e da esposa e adicionando um novo para a filha. Os três uniram suas taças, brindando a nova conquista de Laura.

— A Laura e todas as suas futuras realizações – com um sorriso gratificante, levaram suas taças até a boca.

— O que você tem minha querida? – sua mãe questionou – Vejo que não parece tão feliz, mesmo com a grande notícia que nos deu.

— É que...

— É que...? – Conrad a estimulou com seu sorriso afável.

— Louise tem me perguntado muito pelo pai dela ultimamente... – Laura percebeu a respiração de seu pai começar a ofegar.

— E o que você quer fazer a respeito disso? – Rebecca perguntou também não aparentando satisfação, porém disfarçando muito mais que o esposo.

— Fazer a respeito?! – sua voz subiu alguns decibéis – Ela não vai fazer nada! – ele a encarou com o cenho franzido.

— Bom eu não sei – a ruiva aprumou a postura – Eu não sei como lidar com isso! Antes eu só dizia que ele morava longe, por isso não podia vim, mas minha filha é uma garotinha esperta e ela já começa a ter questionamentos que não é qualquer mera resposta que vai calar.

— Nós combinamos Laura! Você viria embora para o México justamente para que aquele homem permanecesse longe de vocês duas, ou melhor, vocês duas estivessem fora do alcance dele. Eu sei que nós não te sustentamos mais, entretanto, não vejo motivos para inserir aquele... aquele imbecil na vida da menina agora... Eu sou o pai que Louise precisa! – Conrad já havia se levantado e agora caminhava pela sala.

— Papai... veja bem, o que eu estou dizendo é que vou precisar contar para minha filha algum dia quem é o pai dela, mesmo que não seja para que eles mantenham contato. Essa é uma fase delicada, a maioria das outras coleguinhas tem um pai e ela não...

— Diga para ela dizer que eu sou o pai dela! – ele a cortou.

— Ela sabe a diferença entre pai e avô... Mesmo que não precisemos dele, eu preciso contar para ela, prefiro agora a quando Louise for uma adolescente e descobrir de alguma forma ruim e sair daqui atrás dele... Não estou dizendo que vou convidar Victor para nossas vidas, apenas que preciso ir conversando com minha filha sobre seu pai, por isso, algum tempo atrás eu dei uma foto dele para ela.

— E como ela reagiu? – a senhora perguntou, enquanto Conrad sentava-se outra vez e tentava se acalmar.

— Ela guarda a foto dentro de uma caixinha nomeada: “Os tesouros de Lou Lou” e me perguntou se poderíamos vê-lo algum dia.

— O que você disse?

— Que eu iria pensar no assunto...

Conrad puxou um longo e audível suspiro.

— Laura, você já é uma mulher adulta e resolvida, não posso mais mandar em você, mas vou te pedir um favor e deixar um conselho. Primeiro, reflita bastante sobre sua decisão, uma vez que você o trouxer para a vida de vocês, seja com memórias ou relatos, a presença dele só aumentará e provocará o desejo que Lou Lou tem de conhecê-lo. Segundo, eu realmente gostaria que Louise não tivesse nenhum tipo de relacionamento com o homem que a gerou. Ele não merece nem você, nem minha neta. Todavia, essa é uma decisão sua.

— Eu sei, eu sei... Estou confusa, por isso quis conversar com vocês, é complicado – ela jogou a cabeça para trás e suspirou, pressionando os olhos para afastar qualquer lágrima – Eu tive um pai tão maravilhoso – ela olhou para ele com um sorriso elusivo – será que é errado desejar que meu bebê também pudesse desfrutar dessa experiência que tive?!

— Não é não sweetheart— sua mãe acariciou sua coxa ternamente – Mas a nossa preocupação é justamente se Victor seria isso para Louise... Pense bem, porque como seu pai disse, uma vez que ele começar a fazer parte da vida dela, mesmo que apenas com fotos, memórias e histórias, não terá volta.

— Eu entendo mamãe, eu só não sei o que fazer...

— Posso te perguntar uma coisa?! – Laura assentiu enquanto fitava os olhos cor de âmbar que herdara – Você ainda tem sentimentos por aquele homem?

Laura sentiu um frio na espinha, todas as sinapses trabalhando rapidamente, seu coração batendo vigorosamente contra o peito. “Oh Céus... O que ela sentia por Victor?! Ela tinha dúvidas de que ainda o amava?! Porque se tinha, seu corpo respondendo nervosamente desse modo acabara de lhe afirmar que sim. Como ela poderia esquecê-lo quando Louise todas as manhãs a encarava com aqueles mesmos olhos azuis que capturavam os seus depois de cada beijo de bom dia?! Como? Como poderia se vez ou outra era surpreendida por traços tão fortes do caráter energético e descontraído dele na sua pequena?! Victor ainda ocupava um lugar em seu coração, mesmo que ela o expulsasse constantemente, o anel repousando há tantos anos em seu dedo, a promessa nunca cumprida, que outrora lhe trouxe alegria, agora um lembrete de dor, apenas confirmava-lhe isso.”  

— Sim mamãe, eu ainda sinto algo por ele. Mas eu não o quero de novo, não depois do que ele me fez. Isso não é uma hipótese viável.

— Minha menina, apenas tome cuidado e não se deixe levar por suas emoções – passando as costas das mãos pela bochecha da filha ela levantou-se.

— Isso mesmo – a voz de Conrad soou mais suave – sua mãe tem razão, cuidado com seus sentimentos, espero que consiga seguir em frente um dia e encontre alguém que seja digno de você e da minha Lou Lou – inclinando-se ele beijou a testa dela – estamos contigo em qualquer decisão que você tomar... Boa noite Darling.

— Boa noite.

Laura permaneceu mais um tempo no sofá, sorvendo o vinho restante na taça numa golada só, em seguida afundando-se entre as almofadas. “Droga Victor, seu maldito! Mesmo depois de tanto tempo você ainda vem complicar minha vida... Porque eu simplesmente não consigo te deixar ir?! Porque minha filha tinha que reviver esse maldito fantasma?! Eu odeio te amar!”.

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Soriano, Itália, muitos anos atrás...

Papá o senhor viu? Eu consegui pular os obstáculos com Vicenzo sem derrubar nenhum – a garotinha de 6 anos soltava da cela com um sorriso iluminado no rosto, pulando no colo do seu pai.

— Vi sim mia principessa bela, parabéns! – Inácio beijou os cabelos de ébano ondulados que chegavam ao meio das costas da menina, mas agora se mantinha preso num rabo de cavalo – Você será a mais bela de todas as amazonas.

— Será que um dia eu serei tão boa quanto o senhor? – Inácio enlaçou uma mão pelo ombro de Helena e com a outra ele puxava a rédea do puro sangue inglês enquanto caminhavam.

— Você é muito melhor do que eu quando tinha sua idade, levei tempos para pular obstáculos sem derrubar as barras.

Helena sorriu orgulhosa mais uma vez, Inácio olhava-a com admiração, a filha tinha seu espírito e amor pelo campo. Sorrindo, entregou o cavalo ao tratador e abriu a porteira para que pudessem passar.

Distraindo-se da preciosidade de olhos escuros como os do amor de sua vida, ele avistou a mulher por quem seu coração disparava. O ar fresco da manhã soprava as madeixas ondeadas como os de sua primogênita, o brilho do sol refletia as orbes escuras como a noite, trazendo o tom de castanho perfeito que lhe encantavam. Isabel vinha saltitando logo atrás com sua botinha de cowgirl rosa e cabelos loiros lisos como os seus, os olhinhos verdes brilhavam a inocência e doçura da bambina de 4 anos.

— Paizinho, Lelê – a menina chamou, acelerando os passos na direção deles. Pulando no colo do pai, ele beijou sua têmpora.

Fiorella do papá, quando você vai resolver montar seu cavalinho?

— Eu prefiro o unicórnio papá, quando mesmo que o meu vai chegar? – Inácio deu uma gargalhada gostosa. Isabel tinha uma imaginação inigual. Elizabeth chegou até eles e beijou a testa de Helena, ficando na ponta dos pés, se inclinou para selar seus lábios. “Te amo” ela sussurrou após um sorriso. Inácio sentiu-se derretendo por dentro, bastava um desses e ele lhe daria o mundo.

— Preparei um lanchinho para nós, quem aceita?

— Eu – Helena ergueu a mão e abraçou a cintura da mãe.

— Fiz seu bolo de cenoura minha bonequinha.

— Com cobertura de chocolate belga? – o olhar de mãe e filha se encontraram, sorrisos idênticos. Elizabeth acenou com a cabeça, um sorriso maroto nos lábios e Helena vibrou – grazie mamma.

— E meu unicórnio papá? – Isabel perguntou com um biquinho.

— Logo ele chega meu bem.

— Rosa?

— Rosa – Inácio deu um beijo no narizinho afilado, traço de sua mãe que ele herdara e a menina também.

— O senhor é o melhor papá do mundo, grazie.

Os quatro continuaram andando e sorrindo, os dois adultos se sentiam os pais mais felizes do mundo, as bambinas eram suas alegrias. Inácio nunca havia se sentido mais satisfeito, tudo o que um homem precisava ele conquistou. A paixão arrebatadora que só se sente quando se encontra o amor verdadeiro. E a doçura pura e singela, que quase fazia seu coração explodir de amor, que um homem só acha nos beijos de seus filhos. Sua fortuna era apenas um mero detalhe diante do amor das três mulheres que preenchiam seu coração.

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Cidade do México, 3 anos atrás...

Mio Dio, eu juro que você nunca mais vai encostar um dedo em mim Heitor! – Helena bradou, enquanto empurrava com força e o marido sorria – sua filha herdou sua teimosia! Está me fazendo passar por um trabalho de parto há mais de 10 horas e eu juro que quando ela for mais velha vai ter um castigo especial por i... Ahhh – ela deu outro grito.

— Minha teimosia? – ele riu e limpou o suor de sua testa com um pano.

— Empurre mais forte da próxima vez Helena – Bárbara orientou – Já vejo a cabeça...

— Eu disse para não tocar em mim infelice! Oh Dio, Bárbara eu não aguento mais, acho que não vou conseguir...

— Vamos lá bonitona, é claro que você consegue – Heitor incentivou – Você já fez isso outra vez.

— Henrique foi muito mais tranquilo e rápido... e não me diga o que fazer! A menos que queira – ela se contorceu – Oh merda! – queira trocar de lugar comigo...

— Eu adoraria, mas não posso – Helena o encarou, o sorriso habitual, simpático e sempre galante escancarado no rosto formoso.

— Estou com tanta vontade de dar uma bofetada nessa sua cara Heitor, não ria para mim! – ela vociferou entre os dentes – Barbara pelos céus, eu acho que vou me render a anestesia...

— Agora Helena, empurre! – Heitor se aproximou agora que ela se concentrava em empurrar e não em matá-lo, segurando a mão da esposa.

Alguns minutos depois Helena dava a luz a Gabriela, cujos pulmões eram bem sadios e a garotinha não se opôs em testá-los. Heitor cortou o cordão umbilical com a ajuda de Bárbara, enquanto uma enfermeira trouxe uma mantinha rosa e envolveu o bebê. Tomando-a nos braços, o engenheiro levou a filha até o colo de sua esposa bastante exausta.

— Oh Dio, como é linda! – ela se encostou melhor contra os travesseiros.

— Sim ela é linda, você fez um excelente trabalho – inclinou-se e beijou a testa das duas mulheres, uma por quem se apaixonara há 8 anos e outra por quem acabara de entregar seu mundo inteiro para fazê-la feliz.

— Seja bem vinda ao mundo Gabriela – Helena disse enquanto olhava para Heitor e sorria.

— Bem vinda ao lar princesinha.

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2 meses e meio depois...

— Se eu bem me lembro dona Helena, você disse que não queria que eu a tocasse nunca mais – Heitor segurava os braços de Helena estendidos acima de sua cabeça, prendendo-a contra o colchão.

— Eu juro Heitor, que se você não cuidar em fazer o que você TEM que fazer eu vou te punir! – ela forçou contra o corpo dele tentando se soltar, o que foi em vão. Muito mais forte, ele a aprisionou com apenas uma de suas mãos.

Uou, gostei disso! Acho que vou deixá-la me punir então – se encararam com olhares sedentos e maliciosos, um perfeito e compatível par.

— Você talvez não goste da punição que estou cogitando em minha mente...

— Se a punição envolver nós dois, independente de quem esteja amarrado, eu vou gostar!

— Você é impossível! – ele pressionou mais o corpo contra o dela, a respiração ficando rarefeita, ambos podiam sentir toda extensão de seus corpos nus, exceto pelo sutiã que a amazona ainda usava – agora... cale a boca e me beije de uma vez! Ou vou ter que usar algum artifício?!

— Seu desejo é uma ordem minha senhora! – liberando-a, Helena aproveitou o momento de distração e inverteu suas posições, Heitor não podia reclamar, com a recente liberdade, tirou a última peça de roupa em seu corpo e deslizou as mãos pela pele suave e delicada das costas da esposa – Você é minha perdição Helena! Não consigo resistir as suas vontades – Heitor ergueu-se beijando sua boca – e você ainda queria que eu não a tocasse mais... Sorry baby, mas esse seria o único desejo seu que eu não respeitaria...

— Não leve em consideração o que eu falar no próximo parto, Gabriela não nega os genes que tem, provou isso com seu nascimento – eles sorriram ofegantes, os lábios de ambos percorrendo caminhos saudosos pelos corpos.

Minutos depois ambos estavam deitados sem fôlego contra o colchão, a atmosfera sensual ainda pairava sobre eles, Helena já até mentalizava uma segunda vez quando a babá eletrônica ressoou um choro agudo.

— Bem parece que o dever me chama – Helena abriu os olhos.

— Pelo menos ela nos deixou terminar dessa vez – ambos sorriram. Sentando-se, Helena tentou encontrar seu robe pelo chão.

— Logo eu volto – inclinando-se sobre ele, ela deu um beijo rápido (cuja língua não deixou de participar) e virou-se na direção de onde tinha avistado o que procurava.

— Fique bonitona, eu vou até ela e a trago aqui.

— Me casei com o melhor marido de todos, se ela adormecer logo, vou lhe dar um bônus por isso ainda hoje – Heitor se apressou e saiu do quarto com um sorriso jubiloso nos lábios.

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Cidade do México, dias atuais...

Helena sentiu como se estivesse emergindo de um mergulho profundo, em um oceano de águas extremamente densas. Chegar à superfície era difícil, uma briga constante com o movimento enérgico e impetuoso. Perdida, confusa e assustada com o enorme vazio, agitava-se desejando se libertar de sua prisão sem fim. Depois do que pareceram dias de batalha, volvidos em sonhos ou lembranças de sua vida, ela conseguiu respirar o ar fresco. Abrindo os olhos, se assustou ao perceber que diferente do mar (com o qual sonhara?!), estava na verdade deitada na cama de um hospital, a iluminação do quarto estava baixa e ela aparentava estar sozinha.

Como num flash, lembranças voltaram a sua mente. A ligação do pai, sua casa, a escada, a queda, a batida na cabeça, seus bebês. Os olhos arregalaram-se tamanho o susto, as mãos estavam pesadas, mas ela conseguiu movimentá-las até sua barriga, olhando a viu baixa, sem a habitual elevação da gravidez... “Onde estão meus bebês?”

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Heitor estava no banheiro, quando ouviu o grito desesperado, mais parecido com um gemido abafado, não pensando duas vezes, saiu em disparada para dentro do quarto, encontrando sua mulher chorando com as mãos enlaçados no abdômen.

— Hey bonitona, acalme-se... – se aproximando do leito, Heitor se inclinou e beijou a testa da mulher.

— Heitor? – Helena abriu os olhos e se surpreendeu ao ver o marido – Onde estão meus bebês? Não me diga que os perdi na queda – os olhos aflitos derramaram mais lágrimas.

— Graças a Deus você acordou – sorrindo ele moveu os lábios de sua testa e os encostou castamente na boca dela – Eu estava tão assustado, nunca mais faça isso outra vez...

— Pare de me enrolar e me diga o que aconteceu com meus filhos Heitor! – Helena exigiu fechando os olhos, temendo a resposta. Saindo do êxtase de felicidade que sentiu ao vê-la acordada, ele percebeu a dor começando a se apossar de sua esposa – Eu os perdi não foi? – ela abriu os olhos o encarando.

— Helena, nossos bebês estão vivos – ele sorriu, os olhos azuis que ela amava brilharam de felicidade – Precisaram ficar na incubadora por algumas horas, mas estão fora de perigo.

Com um pouco de dificuldade, Helena se ergueu e abraçou o marido. Queria ter força para apertá-lo mais, ela respirou fundo, levando o nariz para o pescoço dele, aspirando o cheiro do perfume esportivo caro, misturado com o aroma urbano típico dele.

— Graças a Deus – ela se afastou e sorriu para ele – senti tanto sua falta.

— Eu também meu amor, eu também – Helena se inclinou e beijou com um pouco mais de pressão seus lábios, mas logo cessou.

— Quero ver meus filhos Heitor – se afastando, ele sentou ao lado dela na cama, envolvendo-a em seus braços.

Helena mesmo ainda muito dormente sentiu seu corpo todo dolorido e aproveitou para se aconchegar ao peito do marido. Sentindo uma pressão no seu próprio peito, abaixou a bata hospitalar e se impressionou ao ver a marca de um corte fechado.

— O que aconteceu comigo Heitor? – o olhou assustada.

— Você nos deu um susto enorme Helena, por um momento eu juro que... – sua garganta tremeu, a voz falhou, uma lágrima ousada fugiu – quase perdemos você... Alexandre, Bárbara e Dr. Hernánez precisaram fazer um procedimento do qual fostes cobaia, seu coração foi parado por um tempo, abriram seu peito para isso, Alexandre disse que a cicatriz será uma linha pequena e quase imperceptível, usou técnicas atuais para evitá-las, mas a menos que optes por um procedimento cirúrgico estético, irás carregá-la para sempre.

— Eu não me importo com ela, isso me lembrará sempre vida – ela sorriu – Você se importa?

— Não, nem um pouco – Heitor bicou o nariz de sua esposa – Eu só quero você ao meu lado, com cicatriz e ou sem... Fostes muito valente meu amor, eu não sei que teria feito se...

— Esqueça isso, estou aqui! – ela sorriu e Heitor fechou os olhos, se movimentando para beijá-la outra vez, quando sentiu uma palmada na bochecha.

— Ai Helena, posso saber porque acabei de apanhar? – ele perguntou sorrindo e passando a mão pela área afetada.

— Primeiro porque ficastes todo aquele tempo no Egito e me fez sofrer aqui sozinha, caramba Heitor! Eu ansiei por suas massagens especiais de último trimestre – ela sorriu, porém o sorriso logo morreu, desviando o olhar para as mãos, continuou – e talvez se eu não tivesse ficado a beira da morte você nem teria vindo...

— Helena, olhe para mim – ela atendeu o pedido – Eu fiquei o tempo todo aqui, só não acompanhei o parto porque não pude, Alexandre me proibiu devido a carga emocional a qual estávamos submetidos. Estava num avião para casa quando tudo aconteceu, eu ia lhe fazer uma surpresa, entretanto você se adiantou e me pegou de surpresa.

— Desculpe, eu não sei explicar como aconteceu. Me lembro da queda e depois bater a cabeça, então me vi acordando aqui.

— Sou eu quem lhe deve desculpas meu amor, eu errei muito ficando tão distante. Quase perde-la me fez perceber que não existe nada mais precioso que a família, você e as crianças são as maiores preciosidades que ganhei na vida, prometo que farei de tudo para estar presente sempre, vocês serão minha prioridades... nunca mais quero passar por isso de novo.

— Eu perdôo, mas va bene Heitor, va bene, porque eu preciso de ti aqui comigo, preciso do seu apoio com as crianças, ainda mais agora com os gêmeos. Sinto falta de você, do seu amor, da sua paciência com as birras de Gabriela, da sua disposição em atender Henrique, em ensiná-lo. Eu te amo Heitor e passar esse tempo longe de você foi um castigo muito cruel de sua parte.

— Vou me odiar para sempre por isso. Porém, acredite, irei compensá-la minha amazona.

Uma batida na porta fez Heitor se levantar e ir atendê-la. Era Alexandre com os dois pequenos bebês Herrera, Heitor virou a cabeça e percebeu a esposa curiosa, sorrindo ele ouviu seu amigo dizer baixinho.

— Vim trazer os bebês para o quarto, já não precisam mais da incubadora.

— Ótimo, Helena acabou de acordar. Está ansiosa para vê-los – ele saiu fechando a porta, deixando a esposa confusa.

Quando entrou de novo, estava com Otávio e Catarina nos braços, Helena abriu um sorriso emocionado e se endireitou na cama, os olhos brilharam com lágrimas felizes.

— Oh minha nossa – Heitor se inclinou e mostrou o rostinho dos filhos para ela. Catarina dormia e o irmão olhava para ela com os olhinhos claros espertos – Heitor, como são lindos, deixe-me pegá-los – ela estendeu os braços.

— Cuidado, sua cirurgia... Você não pode fazer pressão contra seu peito!

— Eu não me importo de me abrir toda outra vez, apenas me dê meus filhos. Preciso sentir o cheirinho deles e fazer com que eles me conheçam... ou daqui a pouco vão achar que uma das enfermeiras é a mãe deles.

Com um cuidado demasiado, Heitor passou primeiro o garotinho acordado e em seguida, a pequena mocinha dorminhoca. Tirando o gorrinho de suas cabeças, Helena passou o nariz por elas, depois desceu pela roupinha, passando o indicador pelos contornos dos rostinhos, deitando ambos sobre cada seio.

— Vou amamentá-los, devem estar com fome se saíram da incubadora só agora. Vamos lá, me ajude, agora são dois Bonitão e eu ainda me sinto muito anestesiada...

Depois de arrumar os bebês nos braços da mulher, com auxílio de almofadas, sentou ao lado dela, admirando a cena. Otávio começou a mamar avidamente, Catarina ainda sonolenta demorou um pouco mais, sugando com pouca pressão.

— Por quanto tempo eu apaguei?

— Sua cirurgia terminou por volta das 8h da manhã, agora já são 15:42h.

— Minha nossa, tempo demais... Gabriela e Henrique, com quem estão?

— Seus pais levaram Sonia para passar a noite com eles e acalmá-los um pouco.

— Ela também veio? – perguntou agradavelmente surpresa.

— Claro, tenho certeza que se fosse o inverso, você também teria ido até ela.

— Certamente... – olhando mais uma vez para os bebês em seu colo, Helena não resistiu sorrir e beijar suas cabecinhas – Quero meus outros filhos aqui perto de mim Heitor.

— Você ainda está muito abatida querida, não pode movimentar-se muito e...

— Por favor – Helena suplicou carinhosamente, fazendo o biquinho que Heitor não sabia resistir.

— Ok! Vou conversar com Alexandre, se estiver tudo bem, eu os trarei.

— obrigada! – sorrindo ela virou a cabeça e alcançou os lábios dele. Heitor devolveu-lhe o beijo, logo em seguida encostou o nariz na sua testa, movimentando as mãos de leve pelas costas dos filhos, em um gesto de puro carinho, envolvendo os quatro numa áurea de amor maravilhosa – Eu amo você.

— E eu te amo muito mais minha linda.

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Alguns minutos depois, Heitor havia deixado o quarto com intuito de falar com Alexandre. Catarina logo adormeceu, ainda presa na névoa de sono na qual estava, Otávio, maior e mais esperto, ainda fazia sucção no seio da mãe, mesmo que o sono já o tivesse atingido também.

Quando o marido entrou no quarto de novo, estava sorrindo, ainda encantada com os bebês, mas bocejando levemente. Ainda se sentia anestesiada, dolorida e cansou-se rapidamente.

— Esse menino é um guloso. Já está dormindo e ainda não largou o seu seio.

— Puxou ao pai dele – ela riu dissimulada, mordendo o lábio inferior e arqueou uma sobrancelha, jogando charme.

“Filha da mãe provocante” ele pensou.

— Bonitona, faça o favor de guardar suas provocações para quando você estiver sarada, faço questão de revidar todas, agora não posso fazer muito.

Sorrindo Helena pediu sua ajuda.

— Me ajude aqui, meus braços estão mais dormentes que o normal, pegue eles e os ponha no berço, por favor, estou me sentindo tão cansada que pareço ter corrido uma maratona.

— Ainda é o efeito da anestesia geral que lhe deram – se aproximando pegou a filha e a pôs em um dos dois berços hospitalares no canto do quarto..

— Então... Alê liberou a entrada das crianças? – Heitor agora tomava o menino no colo e o colocava no outro bercinho.

— Sim, vou buscá-los, estão tão ansiosos que a pobre Sonia já não sabe mais o que fazer – eles riram – Também estou com muitas saudades, vou tentar acalmar a euforia deles com os presentes que trouxe.

— Estou estranhando algo... Onde está mi papá que não entrou correndo por essa porta?

— Ele e sua mãe haviam saído quando tentei avisá-los que você tinha acordado, acredito que foram procurar algo para comer. Mas já retornaram e eu pedi para chamá-los, a qualquer momento devem chegar.

— Você disse que ele e Elizabeth saíram juntos para comer?! – Helena franziu o cenho e sorriu descrente.

— Bem, eu não sei direito o que aconteceu, entretanto preste atenção neles quando chegarem.

— Como assim Heitor? – perguntou novamente confusa – Não estou entendendo nada.

— Quando eles entrarem você vai perceber o mesmo que eu – ele foi interrompido pela voz de Inácio, que havia dado uma batida na porta e colocado a cabeça para dentro.

— Podemos entrar? – alargando a abertura da porta, ela avistou Elizabeth com um sorriso doce. Helena balançou a cabeça e os dois se aproximaram da cama.

— Oh minha querida – ele se inclinou beijando a testa da filha – que susto você nos deu – sorrindo ele a encarou e abraçou com cuidado.

— Papá, eu estou bem, juro que não foi proposital – eles sorriram e ela se aconchegou no abraço do pai mais alguns segundos.

— Helena – Elizabeth chamou com um sorriso e Inácio se afastou, olhando-a com um sorriso que há tempos Helena não via e a incentivando com um aceno de cabeça – eu... eu tive tanto medo de perdê-la também, graças a Deus você está viva.

Se aproximando, ela tomou as mãos da filha nas suas, segurando-as contra seu coração, Helena sorriu, agradecendo o gesto.

— Eu estou bem Elizabeth, obrigada por se importar.

— Me importar?! Eu daria minha vida no seu lugar sem hesitar... Só de pensar sentir aquela dor outra vez, eu preferia a morte.

— Não diga isso Lizzie – Inácio falou por impulso, tocando o ombro dela e Helena o encarou assustada. Heitor tinha razão, algo de muito estranho tinha acontecido.

— Okay, eu definitivamente perdi algo aqui... Diga-me a verdade Heitor, por quanto tempo eu dormi?! Você não quer buscar meus filhos porque quando eles passarem por aquela porta, Henrique já será um homem com barba e Gabriela como rebeldia da adolescência fez um arco íris no cabelo só para desafiar um de vocês?!

Sorrindo, Inácio enlaçou Elizabeth com um braço e com o outro afagou os cabelos de Helena, que os olhava completamente confusa e atordoada.

— Eu avisei – Heitor cochichou do outro lado da cama.

— O que está acontecendo entre vocês dois?!

— Acho que nós achamos o caminho de volta um para o outro – ele buscou os olhos de Elizabeth, ambos abriram um sorriso tímido, depois olharam para a filha.

— Definitivamente eu estou sonhando – ela riu desacreditada – Deixe-me ver se eu entendi, vocês se... se... reconciliaram?

— Nós resolvemos recomeçar Helena, tivemos uma conversa difícil noite passada, não menos do que essa que precisamos ter contigo hoje, mas... – Elizabeth procurou as palavras certas.

— Mas percebemos que não podíamos permanecer vivendo com tantos ressentimentos, principalmente porque ainda sentíamos algo muito maior do que o ódio que nutrimos, na verdade, que eu nutri.

— Eu não entendo, nunca imaginei que vocês... que vocês se... – ela não sabia se devia usar a palavra seguinte.

— Se amavam?! – Inácio falou por ela – Parece que sim – sorrindo para a mulher em seus braços mais uma vez.

— Oh por favor, parem de se olhar assim... Vocês estão parecendo dois adolescentes apaixonados – Helena revirou os olhos.

Elizabeth, Inácio e Heitor sorriram divertidos pela reação de Helena, que agora alcançava o braço do marido sobre a cama e o beliscava por sorrir dela.

— Ai Helena...Vejo que alguém está recobrando a força perdida – ele a cutucou de leve no braço.

— Como vocês chegaram a isso? – ela voltou a olhar para os pais.

— Quando você percebe que pode perder alguém Helena, mesmo que você tenha mágoas profundas por essa pessoa, o que verdadeiramente sente por ela vai falar mais alto. Eu percebi que muito maior do que qualquer outro ressentimento que eu guardei, o amor que sinto por sua mãe prevaleceu.

— Mas a vida em risco era a minha não?! – ela perguntou, tentando digerir tudo, ainda faltavam peças ela sabia, as coisas continuavam desconexas.

Pai e mãe compartilharam um rápido apreensivo olhar, era a hora de por todos os pratos na mesa e acabar de vez com os segredos guardados.

— Ontem eu e seu pai conversamos como dissemos anteriormente a você, e eu lhe contei algo, um segredo que guardo há anos. E hoje preciso lhe revelá-lo também, eu não queria lhe importunar com isso, mas precisamos fazer da forma certa dessa vez, sem segredos e sentimentos ruins, por isso seu pai e eu decidimos vir aqui conversar contigo.

— Bom – Heitor percebeu que agora a conversa era reservada apenas aos três, por mais que não lhe pediriam para sair, ele entendia que aquilo, era a espécie de assunto guardado para pais e filhos – eu vou deixá-los a sós, preciso ir buscar as crianças – Helena pediu com olhos para que ele ficasse  – Você está em boas mãos, confie em mim – ele sussurrou em seu ouvido, lhe dando um beijo na bochecha em seguida.

— E se eu precisar de você?! – ele perguntou com outro sussurro.

— Eu vou estar de volta em um piscar de olhos lovely. Chegou a hora, ouça seus pais, em especial sua mãe.

— Não sei se sou forte o suficiente Heitor – ela pediu o encarando com os olhos marejados, os pais mais afastados, admirando os netos adormecidos, deixando-o confortá-la.

— É claro que é minha vida, olhe para você bonitona, veja o quão resiliente és – ele apontou para o peito costurado – seu coração em especial. Minha força sempre veio de você – ele sorriu e beijou seus lábios, se demorando um pouco, até que ouviram um pigarreio de Inácio, “será que ele nunca vai perder essa mania?”, a amazona sorriu – Vai dar tudo certo.

Respirando fundo, ela acenou com a cabeça enquanto ele se afastava e seus pais se aproximavam.

— Lembrem-se que ela ainda está bastante debilitada, cuidado com as emoções elevadas – Heitor falou baixo apenas para os sogros ouvirem e ambos balançaram positivamente a cabeça.

Helena se acomodou melhor na cama, ficando numa posição que não forçasse tanto seu peso sobre o peito, por mais que Heitor tivesse lhe dito que era forte, ela se sentia fraca e debilitada, pelo menos seu corpo estava dessa maneira, ainda muito inerte e sem tantos movimentos. Inácio sentou-se ao lado dela, passando o braço pelos seus ombros, como sempre ela se rendeu ao carinho e repousou a cabeça em seu peito.

Elizabeth sentou-se mais afastada, no espaço próximo as suas pernas. Como ela desejava desfrutar da intimidade que a filha tinha com o pai, como queria acalentá-la como Inácio fazia e senti-la relaxar sobre suas carícias como quando era apenas uma garotinha serelepe, tal qual sua neta, o peito doeu e ela engoliu um nó que os pensamentos formaram em sua garganta. Tinha sido covarde anos atrás e perdeu isso, a sensação de intensa felicidade e amor gracioso que toda mãe tem quando toma sua criança em seus braços, agora Helena era uma mulher, uma mãe muito melhor que ela própria havia sido e Elizabeth não sabia se um dia, teria isso outra vez.

Nos segundos que passaram, pai e filha silenciosamente apreciavam o carinho e amparo do abraço no qual se acolheram, ele sussurrava palavras de amor no ouvido de Helena, como quando ela tinha pesadelos e precisava acalmá-la, funcionou sempre, mesmo quando ela era uma adulta, tal qual hoje. A morena senhora refletia que quando decidiu sair de casa, não imaginou que de fato estava perdendo as duas filhas. Isabel nunca mais estaria em seus braços por culpa do cruel destino e Helena por sua própria má escolha. Uma lágrima solitária escapou de ambos os olhos dela, um fungado baixo distraiu Inácio e a amazona, enquanto em vão, Elizabeth tentou disfarçá-las.

— Se for por mim, por favor, não chore, já estou bem e não corro mais perigo – Helena disse e esticou a mão, colocando-a sobre a coxa da mãe e apertando-o.

— Não é só isso querida, bem, é por vocês dois, pelo que perdi de ambos... Acho que – seus lábios tremeram e ela puxou o fôlego para continuar – que nunca poderei ter isso que vocês tem, essa intimidade que geralmente os pais tem com os filhos...

— Elizabeth... – Inácio a cortou gentilmente.

— Não Inácio, é verdade. Passei os últimos anos, desde que comecei a estar mais presente na vida de Helena por causa dos meus netos, sentindo inveja de você – ele se surpreendeu com a revelação – Por que todas as vezes em que ela sentia medo, corria para ti, quando discutia com Heitor, nunca foi por mim que ela chamou, quando precisava de conselhos sobre as crianças, sempre foi seu número que ela discou, por todos os abraços que eu perdi e foram destinados a você, todos os beijos e carinhos – as lágrimas agora banhavam seu rosto – por que há mais de 20 anos eu não tenho um abraço, nem ouço ninguém me chamar de mãe, quem dirá mamá, enquanto você nunca deixou de ser o seu papá...

— Eu... – Soriano tentou, Helena também não sabia como responder aquilo.

— Eu não fiz de propósito – elas se encararam e Elizabeth soluçou – mas...

— Tudo bem Helena, eu sei que não foi proposital, nunca foi sua culpa, e sim minha. Porém, como você viria até mim? Como buscaria conforto no meu abraço, ou como buscaria sabedoria maternal em mim, se metade da sua vida eu não fui isso para você! Eu percebi que só colhi o que plantei... Você e seu pai tem uma relação linda, sempre tiveram – ela sorriu para ambos – algo que eu sempre ansiei conseguir desde que tivemos aquela conversa onde você me apresentou Henrique.

— Desculpe Elizabeth, mas meu pai sempre esteve comigo, ele foi o abrigo que eu encontrei quando estava perdida e sozinha no meio de uma tempestade.

— Eu sei meu bem, não quero fazer você se sentir mal, só preciso dizer aos dois como me sinto... Eu me lembro da noite em que você nasceu, eu sei que você também – ela sorriu para Soriano – quando o médico me disse que era uma menina eu temi por uns instantes, assim que ouviu teu choro, seu pai entrou no quarto, vibrando, ele falou sobre ter um garoto a gravidez inteira, ele correu na minha direção, você já tinha se acalmado um pouco em meu colo, eu disse que era uma menina e o vi vacilar por uns segundos, mas logo um sorriso apareceu em seu rosto, ele te pegou dos meus braços, você se agitou um pouco, logo ele se movimentou devagar e começou a acalentá-la, não demorou mais que um minuto para ele se apaixonar por ti...

“- ela é linda Lizzie, assim como você... Veja esses olhinhos, como é esperta!”

— Você não está decepcionado por não ser um garoto?

— Não mais, eu não trocaria essa preciosidade por nada.

— Vamos chamá-la como tínhamos acordado caso fosse uma bambina?

— Sim – ele sorriu, voltando os olhos para a pequena menina – Helena, meu raio de sol, prometo amá-la mais do que a mim mesmo ou qualquer outra coisa que eu possua, todos os dias enquanto viver, serás minha princesa preciosa.”

— Naquele dia, quando você envolveu o dedo indicador do seu pai com sua minúscula mãozinha, ele já era caso perdido. Te fez uma promessa e a cumpriu com esmero – com os olhos cheios de emoção ela olhou para o pai e se aconchegou mais no abraço – Eu lhe pedi perdão anos atrás e você foi tão nobre e corajosa como só um Soriano sabe ser – ela sorriu para Inácio – ao me aceitar em sua vida, na vida dos meus netos e serei infinitamente grata por isso. Mas agora lhe peço perdão novamente, peço aos dois, por tê-los prejudicado tanto, eu errei, fui egoísta no começo e covarde depois, por favor me perdoem, mesmo que eu não mereça vocês, adoraria fazer parte dessa família de novo, pois é doloroso demais viver mais dias sem o amor que eu recebia dos dois, ainda me lembro do som da sua voz infantil me chamando de mamãe Helena, dos seus beijinhos de borboleta a noite depois das historinhas de dormir, de como me sentia quando Inácio dizia que me amava, que eu era a mais linda de todas as mulheres – Elizabeth chorava novamente – quero terminar meus dias ao lado da minha família, tentando reparar o dano terrível que causei a vocês, eu preciso dessa redenção para viver meus dias restantes em paz...

Inácio e Helena choravam também, novamente ela sentiu uma dor no peito, não era físico, ela sabia, o resquício do ódio no qual se agarrara por tanto tempo, a única ligação intensa que tinha com sua mãe. Elizabeth estava lhe pedindo um recomeço e isso significava destruir a única ponte de sentimentos existente entre elas, mesmo que precária. Ela não acreditava nem poder chamar de ódio o que sentia, há muito tinha deixado esse sentimento ruim ir embora, sem nem mesmo perceber. Ao que ela se agarrava tanto assim então?!

— Eu me agarrei a esse ressentimento por tanto tempo Elizabeth, era a coisa mais recente que tinha de você, eu me esqueci como era ter uma mãe, me esqueci depois de tanto tempo sem ti... – Helena levantou a cabeça do peito do pai e buscou o olhar de sua mãe – Mas eu não quero mais viver no passado, não quero mais migalhas de lembranças velhas e esfarrapadas, quando podemos construir novas... Meu pai me disse uma vez que eu precisava abaixar minhas barreiras para outras pessoas além dele entrar. Primeiro fiz isso com Heitor, Alexandre e Sonia, meus filhos não precisaram, já tinham meu coração a partir do momento em que soube da existência deles, entretanto você, eu só a deixei ver por cima da muralha... Acho que... acho que – ela uniu suas mãos – está na hora de deixá-la entrar também, chega de tanta dor, eu não quero mais isso...

    Elizabeth estava perdida em lágrimas, beijou a mão da filha que estava unida a sua e sorriu. Inácio a convidou com um olhar a se encaixar no abraço. Do outro lado de Helena ela sentou e disse para a filha, depois de beijar sua cabeça.

— Eu também não quero mais isso entre nós querida, nós três – ela tomou a mão de Inácio entre as delas – vamos recomeçar hoje...

— Eu me preocupei tanto em te manter afastada que eu me esqueci que ainda te amava... Sim, vamos recomeçar, como uma família – Helena sorriu para ambos os pais, os três limpando os rostos marcados por lágrimas, deliciando-se no abraço.

— Eu queria poder lhe dar um abraço apertado Helena, pena que não posso... Mas assim que você estiver melhor eu farei minha querida.

— Esperarei ansiosa... – Helena descansou a cabeça contra o ombro da mãe dessa vez, os lábios vacilando... “seria o momento certo?!” – mamma.

— Oh Dio – Elizabeth sem palavras fitou Soriano, os olhos escuros enchendo-se de emoções outra vez, ela não sabia nem o que falar, Helena continuava apreciando o amparo, com os olhos fechados, se sentindo relaxada depois de liberar sentimentos ruins presos tantos anos. Beijando sua cabeça ternamente, a amazona sentiu uma gota rolar por sua bochecha enquanto ouvia sua mãe lhe dizer – minha menina valente, durma querida, durma... – não demorou muito e foi vencida pelo sono e torpor ainda envolvendo seu corpo.

Os pais a deitaram confortavelmente na cama, Elizabeth se sentiu mais leve do que uma pena, felicidade preenchia cada espaço seu. Inácio parou atrás dela e a envolveu em seus braços, descansando o queixo em seu ombro.

— Eu ainda preciso dizer a ela sobre minha doença... – Soriano estremeceu de leve, a apertando mais contra si.

— Não hoje, quando Helena e nossos nipotes estiverem em casa e ela estiver mais recuperada nós falaremos com ela a respeito disso...

— Ela me chamou de mamma Inácio... Você ouviu? – sorrindo ele acenou e beijou sua têmpora.

— Ouvi sim.

— Será que ela vai me chamar assim agora?!

— Dê tempo a ela... Helena passou por muita coisa esses dias, deixe o tempo e suas ações curarem nossa filha.

— Todo o tempo que restar será para vocês...

—______________________________

Sonia tinha acabado de tomar um banho, deixou Gabriela e Henrique aos cuidados de uma babá enquanto fazia isso, procurou outra blusa folgada e com bastante movimento. “Desculpe baby, mas preciso escondê-lo até decidir se devo ou não revelar sobre você ao seu pai...”.

— Titia – Gabriela chamou da porta do quarto – titia... – a babá apareceu e tomou a menina no colo.

— Desculpe senhora, Gabi é muito rápida e quando pisco os olhos ela já não está mais onde a deixei...

— Tudo bem – ela se aproximou delas – Venha cá – pegando-a no colo lhe indagou – O que você quer meu bem?

— Minha mamãe – ela fez beicinho.

— Que bom então que vim buscar vocês para vê-la – Heitor entrava no quarto. Ao identificar a voz do pai, Gabriela pulou do colo de Sonia e correu trotando até ele.

— Paaapaaai – ela se chocou contra ele, que logo se inclinou e a tomou nos braços – que saudade de você...

— Oh minha princesa, eu também estava com saudades de você lindinha...

Heitor a apertou contra seu peito, os bracinhos gorduchos enrolados por seu pescoço, seus olhos encheram-se de lágrimas quando o perfume suave e doce o invadiu. Logo ele sentiu a menina fungar e percebeu que ela também chorava.

— O que foi my sunshine?

— Eu só senti sua falta paizinho... – beijando sua cabeça, ele a embalou por um tempo, numa dança silenciosa, esquecendo-se até mesmo que Sonia estava ali.

— Filha olhe para o papai – ela obedeceu, o nariz vermelho – Eu prometo que essa vai ser a última vez que você vai ter que ficar longe assim de mim outra vez!

— Promete de mindinho?

— Sim – sorrindo ele uniu seus dedos mínimos.

— Você não vai mais voltar então?

— Não, vou só pegar o restante dos meus pertences e ajeitar umas coisas do trabalho, mas isso não levará mais que 3 ou 4 dias, ok?!

— Sim.

— Pai?! – Henrique entrava no quarto. A babá tinha ido chamá-lo.

— Hey homenzinho, como você cresceu – ele o puxou para um abraço, ainda segurando Gabriela com um dos braços – Senti sua falta filho.

— Eu também papai... O que você disse para Gabi é verdade? Não vai mais voltar para o Egito?!

— Não meu rapaz, prometo! – Henrique se manteve envolto nos braços do pai por mais alguns segundos, Heitor percebeu que ele fungava e se amaldiçoou internamente por ter machucado sua família dessa maneira. “Grande idiota você hein Heitor!”.

— Henrique, Gabi... eu prometo que não vamos precisar ficar separados outra vez, eu vou estar sempre presente na vida de vocês, ok?!

— Sim – as duas crianças responderam juntas.

— Vamos ver a mamãe e conhecer seus irmãos?!

— Eeebaa!


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Notas finais do capítulo

Não sei quando o próximo vem, porém uma coisa é certa, só depois do dia 14/06 pq é a data que tenho que entregar a segunda parte do TCC. Love you ♥ xoxo

Uma fotinha da nossa Gabi.



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