– Tudo bem, pode se virar. - Disse Draven. Lentamente vou me virando e me dou de frente para o espelho, mas o reflexo que havia nele não era Chester Shephard. Era algum tipo de galã mirim de novelas juvenis onde crianças de quinze anos demonstram com clareza a sua promiscuidade. Draven arrepiou meus cabelos até parecerem chamas se direcionando para o céu. Relutantemente, deixei com que passasse um pouco de rímel sobre meus cílios e sombra sobre os olhos. A cor negra destacou meus olhos azuis e admito, até que ficou bacana. Do pescoço para baixo, estou usando um macacão negro que se grudou ao meu corpo deixando apenas meus braços de fora. Também estou usando um par de luvas negras sem dedos e botas cujo os canos vêm até meus joelhos.

– Show de bola. - Digo levantando o dedo polegar pra ele.

– Eu sei. Fui eu quem fiz. - Ele se levanta do banco onde estava recostado e se aproxima. - Foi combinado que cada distrito usaria algo que representasse sua principal função. - Ele segura um cilindro na mão direita e o chacoalha. Ele direciona para os meus cabelos e começa a espirrar o líquido fixador em meus cabelos.

– Meu distrito é responsável pela comida. E também pelas tésseras. O que isso... - Digo apontando para minha roupa. - tem a ver com comida?

– Ainda tenho guardada uma fantasia de chefe de cozinha se for da sua preferência.

– Ah. - Digo. - Esse aqui está ótimo. - Ele ri.

– Ok, vamos indo. Ou as carruagens vão partir sem você.

– Carruagens?! - Ele não responde. Me pega pelo pulso e me conduz porta à fora.

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Sim, eram carruagens. Puxadas por cavalos e tudo. O fato mais curioso era que não haviam cavalheiros, apenas cavalos. Aquilo estava me deixando com uma pulga atrás da orelha. Porque nada nesse lugar faz sentido?

– Lá está sua irmã. - Diz Draven apontando com o dedo indicador. No meio da multidão reconheci os longos cabelos loiros. Agora estavam encaracolados apenas nas pontas. Uma coroa negra cintilava sobre sua cabeça e ela usava o mesmo macacão negro que eu. Nos dirigimos até a carruagem e ela me vê.

– Chester, você está lindo! - Ela diz estupefata.

– Não mais que você, é claro. - Digo fazendo coceguinhas em sua bochecha. Ela se encolhe cheia de vergonha.

– Chester, quero que conheça Leslie, minha parceira de trabalho. - Ele conduz pela mão uma linda mulher com a pele da cor de amêndoas. Os olhos dourados se destacavam por debaixo de um cílios da mesma cor. Ela usava um vestido verde que lhe cobria apenas um ombro indo até seus joelhos. - Foi ela quem transformou sua irmã na dama mais cortejada da noite. - Lucy lhe direcionou um sorriso enquanto eu apertava a mão da mulher.

– Prazer em conhecê-lo Chester. - Ela diz. - Vejo que Draven fez um ótimo trabalho.

– Obrigado! - Eu e Draven dizemos em uníssono. A mulher ri.

Tento olhar em volta e ao lado das demais carruagens encontram-se ou outros tributo. Todos parecem felizes no momento. Acredito que a ficha ainda não caiu. Na verdade, acredito que nem mesmo para mim e Lucy a ficha caiu. Mas como eu mesmo disse, vamos deixar o tempo nos levar e ver no que dá. Uma vos ecoa pelo ar anunciando que temos trinta segundos até a primeira carruagem começar a se mover.

– Ok. Os dois, pra cima. - Ele pega Lucy pela cintura e a ergue para a carruagem. Subo para o meu lugar e seguro a mão de Lucy.

– Ham, Draven? - Pergunto nervoso. - Cade os caras que deveriam estar nos cavalos? - Ouço Draven soltar uma gargalhada.

– Não há os caras, Chester. - Tenho tempo de lhe lançar um olhar apavorado quando um som de metal rangindo preenche o ar, as enormes portas metálicas começam a abrir revelando uma luz segante. Seguro a mão de Lucy com mais força.

– Você acha que se cairmos daqui, morremos? - Ela pergunta olhando para baixo.

– Você, talvez. Eu consigo me safar com uma perna quebrada.

– Bom, melhor ficarmos firmes então.

Nossa carruagem começa a se mover. O primeiro impulso nos jogou pra trás e Lucy deixou escapar um grito curto porém agudo. Por um terrível momento realmente achei que iria cair, mas fui me acalmando quando notei que era possível ficar de pé.

Passamos pela grande porta e nos deparamos com uma multidão estupidamente grande gritando e atirando rosas. Lembrei do que Gendry disse e ergo a mão abanando para a multidão. Lucy faz o mesmo. Por um momento nos vejo nos telões instalados sobre as paredes do centro de treinamento. Também vejo, logo atrás de nós os tributos do distrito 10 que nem mesmo sorriam, e então penso se não estamos fazendo papel de idiotas.

A carruagem começa a perder velocidade e todas são posicionadas em semicírculo diante do círculo da cidade. Aquilo me faz pensar se aqueles cavalos eram reais. Poderiam ser tão treinados assim? Mas meu pensamento se perde quando vejo o presidente Samwell Snow surgindo de uma sacada do centro de treinamento. Ele faz um gesto pedindo silêncio para a multidão ensurdecedora, quando não se ouvem nem grilos mais, ele começa:

– Cidadãos de Panem. Todos sabem que passamos por tempos difíceis. O país sangrou pelas mãos dos rebeldes, mas eu lhe garanto uma coisa... - Ele mostra o dedo indicador. Vejo que estou apertando a mão de Lucy, descontando o meu ódio. Ela me lança um olhar preocupado e alivio a pressão. - Deus escreve o certo, por linhas tortas. E os rebeldes tiveram o que mereceram perante a ira dele. - O que é isso agora? Uma missa?. - Lembrem-se meus caros, bons Jogos Vorazes, e que a sorte esteja sempre ao seu favor.