Brittle escrita por Isabelle


Capítulo 1
Prólogo


Notas iniciais do capítulo

Boa Leitura, espero que gostem. :3



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Prólogo

A tempestade lá fora não parecia sessar.

Ela havia começado a cerca de duas horas e já havia decidido que não pararia de soltar suas lágrimas grossas tão cedo. O vento uivava violentamente o que fazia com que as janelas velhas da sala de música se abrissem toda hora e ensopassem os pianos que eu havia terminado de limpar há poucos minutos. Corri até a janela e enfiei uma barra de ferro para acalmar aquela tempestade desnorteada, mas ela parecia persistente em molhar os pianos, e em me irritar.

A pequena sala era constituída de quatro pianos, dois pretos e dois marrons, que haviam sido substituídos há pouco tempo. Eles ficavam sobrepostos a um chão amarelado e desbotado que tinha a maioria dos pisos quebrados ou trincados. As paredes não eram muito melhores, haviam sido pintadas de branco faziam somente duas semanas, mas já estavam todas encardidas e esverdeadas por conta do mofo. Uma pequena lousa branca estava coberta por notas musicais e se eu não tivesse parado para limpá-la lentamente, eu nunca teria escutado a melodia que tentava ultrapassar o som da chuva.

Ela começava lentamente e depois se reforçava nas notas mais fortes. Eu já havia escutado aquela música mil vezes vinda daquela mesma sala, mas nunca tinha me importado de saber quem era que a tocava ou qual música era, mas naquele dia foi diferente.

Caminhei lentamente pelo corredor escuro que abrangia nossa pequena escola de música. Não conseguia enxergar nada, mas sabia aqueles caminhos de cor, então não foi difícil encontrar. O pátio principal estava sufocado pelas gotas de chuva que explodiam ao se encontrar com chão, mas eu apenas ignorei os pingos leves que caiam sobre mim, e caminhei até a sala.

A porta estava semiaberta e revelava uma pequena garota com um instrumento que parecia ser bem maior do que ela. Ela estava de costas e seus cabelos vermelhos caiam em mechas que eram mais puxadas pro laranja nas pontas de seus cabelos longos e lisos. O violoncelo que ela segurava parecia ser sua única certeza da vida. Não conseguia ver seu rosto, mas via a forma em que ela se expressava ao tocar aquele instrumento. Não existia ela e o violoncelo, mas sim, uma pessoa única fundida a uma habilidade musical maravilhosa que tocava com toda a paixão do mundo.

A sala em que ela estava se assemelhava totalmente a sala dos pianos, tirando o fato que haviam diversos violoncelos e violinos espalhados por todo o recinto.

Estranhei ela estar ali naquele horário pois as aulas de violoncelo começavam as quatro horas e costumavam terminar as sete. Porém, ali estava ela as dez horas da noite com uma gravadora de som simples, e com fones de ouvido, concentrada de mais em sua própria melodia para me ver ou perceber que já passava da hora de ela ir para casa.

Fiquei esperando alguns segundos na porta enquanto a observava tocar, eu não tinha certeza se deveria a interromper, não achava que era uma boa ideia já que ela parecia tão focada e espirituosa. Contudo, o tempo lá fora só piorava e não achava uma boa ideia nós dois permanecermos ali.

Caminhei até ela e removi seus fones de ouvido.

Os olhos dela pareciam querer saltar de seu rosto e ela largou o violoncelo fazendo um grande estrondo. Ela se levantou e se afastou um pouco de mim, como se eu realmente tivesse acabado de a assustar, mas depois de um tempo ela pareceu me reconhecer e relaxou. Seus olhos castanhos voltaram as orbitas de seu rosto fino e robusto; e ela parecia me analisar enquanto eu fazia o mesmo nela. Ela usava uma blusa do seriado Friends e calças jeans. Seus cabelos vermelhos eram notavelmente tingidos, por sua raiz escura e uma franja mal cortada tentava esconder uma cicatriz rosada na testa.

Ela mordeu o lábio inferior, e andou lentamente até o violoncelo, o pegando e o ajeitando para guardar em seu estojo.

― Você é idiota ou algo do tipo? ― Foram as primeiras coisas que ela me disse ainda focada em guardar o instrumento.

― Me desculpe. ― Soou mais como uma pergunta, mas eu não me importei.

Ela olhou para mim sem emoção e eu percebi que aquela era a segunda vez na vida, que eu via o rosto dela por completo. Eu já havia visto aqueles olhos antes. Somente os olhos e a testa coberta pela cicatriz que eu sempre quis saber como foi causada, porém eu nunca tinha me preocupado em falar com ela. Nem mesmo uma vez se quer. Nem quando nos dois fomos para a excursão no museu de música juntos. Nem mesmo quando ela estava sentada a poucos metros da minha mesa do lanche sozinha escondida por trás do livro da Agatha Christie, eu nunca havia pensado em falar com ela, até aquele dia.

Ela não parecia estar interessada em ter amigos ali no conservatório e eu não me preocupava em incomoda-la.

― A propósito, eu sou o William. ― Eu cruzei as mãos e descruzei no mesmo instante para pegar meu celular e verificar as horas.

22:37

― Quantas horas? ― Ela não pareceu ter me escutado, ou se tinha escutado, acabara de me ignorar.

― Dez e trinta e sete. ― Eu falei despreocupado, porém os olhos dela pareciam estar prestes a saltar de seu rosto novamente.

― Eu estou tão ferrada. ― Ela começou a organizar os seus livros que estavam empilhados ao lado do aparelho de gravação, e jogou todos dentro da bolsa.

Um trovão estralou no céu fazendo as janelas de vidro fino da pequena sala tremerem.

― Por favor, me diga que passa algum circular nesse horário. ― Ela saiu andando da sala de aula e observando se chovia muito.

― Acho que nesse horário não. ― Eu dei de ombro e encostei em uma parede, achando graça da sua expressão apavorada.

Outro trovão estralou e ela deu um passo para trás assustada.

― Minha mãe vai simplesmente me matar. ― Ela afundou a mão no rosto. ― Eu nunca mais vou segurar um violoncelo de novo.

― Eu não costumo oferecer caronas para alunas, mas eu posso te levar. ― Eu sugeri dando de ombros.

― Eu prefiro chegar em casa viva e molhada, ― Ela olhou de cima a baixo para mim. ― Do que estuprada e jogada numa vala escura.

Eu sorri e depois fingi estar ofendido.

― Você que sabe. ― Dei de ombros e sai andando de volta para a sala de piano.

Caminhei lentamente até a mesa acinzentada,peguei minha apostila de partituras e a chave da minha camionete velha e amarelada.

Me virei para sair da sala e a encontrei toda encolhida na porta me esperando.

Não pude deixar de soltar um sorriso fraco e caminhar para a camionete com ela me seguindo.


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Notas finais do capítulo

Clichê ♥



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