Os Escolhidos - Destinos Interligados escrita por Angie


Capítulo 6
Capítulo 5 - Sono Eterno


Notas iniciais do capítulo

Aqui está o próximo. Porque Rennata me implorou muito. Rsrs



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Rennata aprendeu que as coisas funcionavam de um jeito muito fácil em Elísio. Havia poucas regras, mas a principal era: Faça o seu melhor.

E isso incluía até a escolha na decoração do quarto.

Mesmo que faltassem poucos dias para se mudar para a academia durante o período de aulas, ela se sentia na obrigação de terminar as coisas por ali. E não seriam paredes em branco que a impediriam. Mas estava sendo muito mais difícil do que imaginara. Ela encarou as paredes nuas por horas, e nada lhe ocorreu. Era deprimente.

– Ainda com dificuldades? – Chloe perguntou da porta, fazendo Rennata pular, pondo a mão sobre o coração. Ela não tinha percebido a chegada da semideusa. – Você é tão talentosa, não pensei que fosse ser difícil.

– Eu dividi o quarto com minha irmã a minha vida toda, agora é difícil fazer isso sozinha.

– Hum... Venha comigo. – Chloe a puxou pela mão, levando-a porta a fora.

Rennata achava que não importava quanto tempo morasse ali. Ela sempre se perderia pelos corredores. Ela nunca havia estado em uma casa tão grande e da última vez que estivera ali, não tinha se preocupado em prestar atenção.

A mansão era dividida em quatro andares, um dos quais era no subsolo, que acomodava várias salas de treinamento e parte da grande biblioteca. No terceiro andar ficavam os quartos dos moradores permanentes, o que para Rennata era um desperdício de espaço, pois eram poucas as pessoas que moravam ali. No segundo os quartos de hóspedes, onde ficavam todos feiticeiros e semideuses que viessem à cidade a negócios. Nesse andar haviam mais de trinta quartos, cada um deles contendo um escritório particular. No térreo ficava a outra parte da biblioteca, o salão de baile, seis cozinhas, alguns escritórios e várias salas das quais ela não conseguia lembrar. Mas Chloe não a guiou para muito longe. Abrindo a porta de um dos quartos naquele mesmo corredor, Chloe, ainda agarrada a sua mão, a levou para dentro.

– E esse é meu quarto. – ela disse, soltando sua mão e abrindo os braços amplamente, como que para indicar todo o espaço.

A roupa de cama trazia uma estampa florida, as paredes e os móveis eram de com cores quentes e alegres, do teto se dependuravam vários cristais multicoloridos, que refletiam a luz que vinha da porta de vidro que levava a varanda, enchendo o quarto de cores. Era ao mesmo tempo desorientador e acolhedor.

– É lindo. – ela disse sinceramente. Chloe sorriu.

– A chave é inserir tudo que você gosta. Nós poderíamos ir as compras hoje a tarde, e trazer alguns móveis do seu gosto, mas enquanto isso...

– Hum?

– Você gosta de pintar não é? – a filha de Apolo já levava um grande sorriso no rosto, pois era uma paixão que elas compartilhavam.

– Bom, eu...

– Tudo bem! Vou te levar a sala de artes, nós pegamos o material e você põe a mão na massa, – ela inclinou a cabeça de lado como se estivesse refletindo. – ou devo dizer na tinta? Ah, esquece. Siga-me.

E ela saiu rapidamente do quarto, sendo seguida pelo olhar de Rennata.

– Deuses, onde ela consegue tanta energia? – murmurou a garota, em seguida pondo-se atrás da semideusa. – Chloe! – ela chamou, com medo de perder a garota de vista.

Caminhava a passos rápidos, mas parou enquanto passava por uma das portas. Uma sensação estranha a atingiu. Era como se seu peito se aquecesse e a necessidade de ver o que havia por trás dela fosse mais forte que qualquer outra coisa.

Como se algo a chamasse.

Ela seguiu seus instintos e testou a maçaneta. A porta abriu.

Duas das paredes do quarto eram repletas de pôsteres de bandas de rock. Em uma outra estavam pendurados vários tipos de violões e guitarras. Todos os móveis eram pretos. Parecia um quarto típico de um garoto adolescente.

Na cama um garoto dormia profundamente. A presença dela não parecia tê-lo perturbado.

Será que ele está doente?, ela pensou.

Rennata andou em sua direção, mas parou bruscamente quando uma mão segurou seu braço.

– Você não deveria ter entrado aqui.

***

– Porquê você tem um sobrenome? – foi a primeira coisa que Selena perguntou a Aaron no dia seguinte à noite na praia.

Os dois estavam caminhando em meio a floresta densa que havia atrás da mansão, em direção aos treze templos de pequeno porte que haviam sido erguidos há oito anos. Cada um deles carregava uma cesta de frutas para que Selena pudesse dá-las como oferenda.

Uma garoa fina tinha começado a cair fazia pouco tempo, deixando minúsculas pérolas de água nas folhas das árvores e na vegetação rasteira e molhando o tecido fino do seu vestido de linho branco. Por todo seu nervosismo, Selena não tinha prestado atenção no dia anterior quando pegara uma muda de roupas na mala, mas quando foi desfazê-las, notou que Chloe havia retirado quase tudo que ela havia escolhido e substituído por roupas brancas. Se a ruiva achava que isso poderia mudar seu estado de espírito estava muito enganada.

– Doce por doce, querida. – disse Aaron.

Selena suspirou.

– Tudo bem, pergunte.

Ele nem precisou de tempo para pensar.

– O que foi aquilo ontem a noite?

Ela vinha tentando se esquivar dessa pergunta a algum tempo. Ontem tinha dito que estava muito cansada para explicar – o que não era exatamente uma mentira – mas acabou não dormindo e levantou da cama de manhã com ele batendo em sua porta. “Nós precisamos conversar”, foi a primeira coisa que ele disse quando ela abriu.

– Foi um feitiço de transferência. – respondeu, sendo o mais vaga possível.

– E o que isso quer dizer?

– Agora é minha vez. – ela sorriu. – Responda minha pergunta.

– Fui criado como um humano. – ao que parecia ele era tão bom em ser vago quanto ela. – O que exatamente faz aquele feitiço?

– Eu liberei um pouco de trevas de mim e transferi para a terra, onde poderia ser purificada. – Selena não via o porquê de esconder isso de Aaron. Poucas pessoas eram capazes de sentir a magia negra nela e a maioria procurava se afastar, mas não ele. Ela ficava agradecida por isso. – Eu fiz isso pela primeira vez no jardim da mansão Elísio. Todas as flores se desintegraram. Minha irmã ficou louca comigo. – ela olhou de relance para Aaron e viu que ele estava sorrindo e antes que ela pudesse perceber, um sorriso já tinha aparecido em sua face também. Parecia ser mais fácil para ela sorrir quando ele estava por perto. Ele desviou sua atenção para ela e foi nesse instante que Selena percebeu que o estava encarando com um sorriso idiota na cara. Sentiu seu rosto esquentar na hora.

Ele riu.

– Você fica bonita dessa cor também. – ele disse.

– O-o quê? – agora seu rosto estava pegando fogo.

– Vermelha. – ele não ia aliviar para ela.

Selena pigarreou e decidiu mudar de assunto.

– Quantos anos você tem?

– Quantos acha que eu tenho?

– Bom, nunca se sabe com os deuses. – ela disse. Aaron parecia se divertir mais a cada palavra que ela proferia. – Seu pai, por exemplo, com aquele jeitão todo intimidador, parece ter no máximo vinte e cinco, apesar de ter mais de cinco mil.

– Intimidador? – ele arqueou uma sobrancelha.

– Ah, qual é? O cara parece um chefão da máfia.

– Tudo bem, ponto para você. Mas eu não acho que ele se agrade com a descrição. – falou. – Minha vez. Quantos irmãos você tem?

Dessa vez ela não exitou.

– Um de sangue e dois de alma. Meu irmão de verdade se chama Thomas, mas eu cresci com Chloe e Christopher desde que posso me lembrar e eles sempre cuidaram de nós como bons irmãos mais velhos, por isso os chamo assim.

– Irmãos de sangue e alma. – ele refletiu. – É isso o que eu costumo dizer a minha irmã Shannen. Nós compartilhamos apenas sangue materno, mas convivo com ela a anos e não posso imaginar como seria não tê-la conhecido.

– Sei como é, também me sinto assim com meus irmãos. Mas você está me enrolando, quantos anos tem afinal?

– Cento e cinquenta. – ele disse, totalmente sério.

Ceeerto. Cento e cinquenta anos não eram quase nada para um deus, mas, ainda assim, Selena ficou boquiaberta... e então Aaron caiu na risada.

– O que é tão engraçado? – ela questionou.

– Você deveria ver sua cara. Era brincadeira, ok? Eu tenho dezessete.

Selena deu um tapinha no braço dele.

– Palhaço. – mais agora ela ria também.

– E você? – ele indagou, depois de se acalmar um pouco.

– Eu o quê?

– Tem dezesseis, não é?

– Quem te contou?

– Lori.

– Hum. Farei dezessete no mês que vem. – e isso era algo que ela odiava lembrar. Decidiu perguntar algo que não conseguia tirar da cabeça. – Ainda não entendi uma coisa. Porque você foi criado como humano? – O sorriso dele sumiu e ela se arrependeu de ter perguntado. – Não precisa responder se não quiser.

– Não, tudo bem. – ele pausou, como se estivesse escolhendo as palavras certas. – Eu sou filho de Zeus e Afrodite...

A cesta de frutas que Selena estava segurando caiu no chão.

– Isso não é possível. – ela se ajoelhou e começou a recolocar todas as frutas dentro da cesta. – Eles são dois dos treze deuses principais, eu deveria saber.

Selena sempre teve contato com os deuses, seria impossível que tivesse deixado passar algo de tal magnitude.

Na noite anterior, quando ele a tinha levado a seu quarto, ele tinha comentado brevemente que era um filho de Zeus quando ela perguntou quem era seu pai olimpiano e isso já a havia deixado chocada o suficiente, mas saber que ele era filho de dois membros do conselho era algo muito maior do que qualquer outro caso de Zeus.

Aaron se ajoelhou ao seu lado e segurou suas mãos.

– Os deuses sabem esconder segredos. – parecia haver um pouco de amargura em seu tom.

– Você fala como se não fosse um deles.

– Eu nunca fui. – ele segurava a suas mãos como se precisasse se agarrar a algo. – Como você deve imaginar, Hera não ficou muito feliz em saber que havia sido traída... de novo. Muito menos com alguém que fazia parte do conselho divino.

– Você deveria fazer parte do conselho. – ela disse incisiva. – É seu lugar de direito.

Ele riu amargamente.

– Eu não tenho domínios, Selena.

– Todos os deuses possuem domínios.

– Até um deus menor possui domínios, mas eu não. Isso é o quão inútil eu sou.

– Você não é um inútil.

– Sim, eu sou. – ele parecia convencido disso. – Uma família foi designada por Hera para me criar aqui na terra e eu passei a maior parte da minha vida estudando em um internato em Londres. Posso ir ao Olimpo, mas não posso viver lá. Nenhum deus se levantou ao meu favor, nem mesmo meus pais.

– Isso é horrível. Eu não pensei que pudessem ser tão...

– Selena. – ele olhou fundo em seus olhos. – Os deuses levam segredos muito maiores que eu e você. Eu não os culpo. Tudo que eles fazem tem uma razão. Não acredito que tudo tenha sido por uma simples vingança da parte de Hera.

Selena estreitou os olhos. Talvez fosse algo no tom dele que o denunciava, ou talvez ela fosse simplesmente desconfiada demais, mas...

– Você está escondendo alguma coisa de mim? – a pergunta saiu rapidamente, antes que ela pudesse se conter.

– Não é nada demais. – Ele se levantou, puxando-a consigo. Logo depois, a cesta que ele estava segurando e que havia apoiado no chão a pouco tempo, flutuou para suas mãos e o mesmo aconteceu com a de Selena.

Ela encarou a cesta nas próprias mãos, pensando em como Aaron usava telecinese sem nem mesmo se preocupar com isso. Ele parecia ter total controle de seus poderes, sem o mínimo de esforço. Aaron se dava menos crédito do que deveria.

– Vamos. – ele disse. – Os templos já estão perto daqui

***

– Quem é ele? – Rennata perguntou a Chloe, soltando seu braço do aperto da garota e trazendo-o junto ao peito. Voltou a se aproximar da cama, dessa vez podendo ver claramente o rosto do garoto. Ele tinha a pele pálida e traços bem desenhados. Seus cabelos eram negros e um pouco compridos, caindo suavemente sobre a testa. Sua expressão demonstrava tanta tranquilidade...

Mas alguma coisa lhe dizia que havia algo errado.

– O nome dele é Thomas. – Chloe respondeu, observando-a atentamente.

Rennata não pode deixar de se sentir desconfortável sob o olhar intenso da semideusa.

– Ele está doente?

A filha de Apolo sentou-se do lado esquerdo da cama e estendeu a mão, afastando o cabelo dos olhos dele.

– Pode-se dizer que sim. – a forma como ela falava demonstrava tristeza e afeto. – A alma dele está ferida. Ele não pode acordar.

– Você tem certeza? – Rennata não pode deixar de se sentir um pouco triste também. Thomas era tão novo, poderia viver tanto ainda. Mas ao invés disso estava preso em seu próprio sono. – Como isso aconteceu?

– Sim, tenho certeza. Ele já está assim a alguns meses. – ela juntou as mãos no colo. – A única que poderia reverter isso é a líder do conselho dos feiticeiros, mas devido a alguns acontecimentos, isso é infelizmente impossível agora. Ela não tem mais esse poder. Quanto a causa, não cabe a mim lhe dizer isso.

– O que ele é para você? – Rennata surpreendeu a ambas perguntando.

Não sabia como, mas parecia haver uma ligação muito forte entre eles. Até mesmo inquebrável.

– Eu sempre cuidei do Thomas como um irmão. – respondeu a ruiva, com um mínimo sorriso no rosto, que logo sumiu. – Eu, Chris, Selena e Thomas éramos inseparáveis desde crianças. Mas nos últimos meses... Bom, tem muita coisa acontecendo. Muita coisa ruim.

– Por favor, me diz que eu não entrei no meio de uma guerra no estilo Harry Potter. – Rennata pediu com falso desespero, tocando as costas das mãos na testa, tentando aliviar o clima.

– Hum... Talvez. – Chloe não parecia estar brincando. – Você não deveria ter entrado aqui...

– Tenho quase certeza de que você já disse isso. – interrompeu-a Rennata.

– … mas nunca se sabe o que os deuses planejam. – ela prosseguiu, como se Rennata nunca houvesse a interrompido. – Porque veio aqui, afinal?

– Eu... senti que... deveria vir. Eu sei, parece bobagem, mas...

Ela parou de falar. Não via motivo para começar a tentar explicar, já que havia entrado em um mundo onde nada fazia muito sentido para ela. Seria forçar a barra demais, pois nem ela mesma compreendia.

Chloe assentiu como se entendesse.

– Vamos, você ainda tem um problema de decoração para resolver.

– Você tinha mesmo que lembrar do meu fracasso?

A ruiva deu de ombros.

– É para isso que servem as amigas.

E depois de passar pelo que pareceram centenas de corredores e dezenas de escadas, Rennata e Chloe haviam finalmente chegado a sala de artes.

Agora com todos os materiais que havia levado para o quarto com a ajuda da amiga, largados no chão ao seu redor, Rennata encarava novamente a parede em branco.

Mas não adiantava, sua mente estava tão vazia quanto a parede.

Suspirando, levou as mãos as têmporas, massageando o local. Pôs-se a andar para fora dali e quando deu por si já estava no quarto de Thomas novamente. Caminhando até a cama, ocupou o lado oposto a onde Chloe havia sentado.

– Parece que estamos os dois presos não é? – e então percebeu como tinha soado. – Não que minha situação seja pior que a sua, não me entenda mal. É só que... – suspirou. – minha vida está virando de ponta cabeça, sabe? Eu não pedi nada disso, só queria ser uma garota normal. Pelo menos se eu fosse boa em algo... Tudo que eu tento fazer dá errado do pior jeito possível e ás vezes eu nem quero fazer nada, só... acontece. Não que meus pais acreditassem nisso. Dá para acreditar que eles nem me ligaram até agora? Ao que parece eu nem consegui ser uma boa filha. E pensar que foi uma parede estúpida que me fez ficar assim. Uma PAREDE me deixou em depressão, isso é tão ridículo. – Ela olhou para ele. – Eu sou muito egoísta, né? Você aí desse jeito e eu pensando em como decorar meu quarto. Isso é tão... fútil.

Ela afastou os cabelos dele para o lado como Chloe havia feito, admirando o quanto ele era bonito. Grande erro. Um breve toque foi o suficiente. Emoções conflitantes jorraram sobre ela em cascata. Ódio, tristeza, agonia, solidão, culpa. Principalmente culpa. Rennata afastou a mão depressa, querendo levar-se para longe de tudo aquilo. Ela pode sentir todos aqueles sentimentos com uma intensidade que a surpreendeu. Isso nunca tinha acontecido com qualquer outra pessoa, mas ela sabia que nada daquilo deixava de ser real por apenas esse simples motivo. Gostaria de se enganar, mas havia sentido cada um daqueles sentimentos em si mesma, fazendo-a em pedaços de dentro para fora.

Por baixo daquela face calma de um garoto dormindo, havia uma alma atormentada e sombria.

Onde quer que Thomas estivesse preso em sua inconsciência, ele estava sofrendo.

– Eu vou te tirar dessa. Confie em mim.

Nesse momento nada mais importava. Mesmo que passasse a vida inteira tentando, ela cumpriria essa promessa.

Pousando um beijo leve no rosto dele, ela levantou e saiu.


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Notas finais do capítulo

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