Minha Vida Existe Para Viver com Você escrita por Anita


Capítulo 5
Sentindo a Separação




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Havia música, havia pessoas. E todos a olhavam e se divertiam. Ela continuou a bailar despreocupada até o momento em que aquele homem a segurou firme. Não obstante uma máscara que lhe cobrir o rosto, sua identidade era evidente. Era seu príncipe. A quem estava disposta a devotar toda sua vida. Sempre.

Um calor lhe vinha ao coração e ela começou a sentir cócegas na bochecha. Um pingo quente deslizava desde seu olho.

Usagi abriu os olhos lentamente e passou as costas da mão contra seu rosto para secar suas lágrimas. Havia chorado por causa de um sonho novamente. E, mesmo havendo sido um tão bom, sentia-se como se faltasse uma parte dentro de si.

– O que há comigo? – perguntou-se em voz alta, envolvendo-se com os braços. Eles estavam arrepiados, apesar de já ser início de verão e de sua pele estar úmida de suor.

Sentou-se no sofá, onde havia cochilado sem querer, e percebeu uma nova mensagem em seu aparelho. Motoki mais uma vez lhe avisava que Reika havia saído para se encontrar com Mamoru naquela noite. Já devia ter imaginado, era mais uma em que seu marido avisara que não o esperasse para a janta. Quantas dessas foram verdadeiramente em razão do trabalho?

Após encher a boca de ar e o deixar sair todo de uma vez tal qual uma bolha que explodia, Usagi discou o número de Motoki. Precisava gritar com alguém ou enlouqueceria.

Usagi? Foi mal, mas não é uma boa hora – disse o amigo apressado antes mesmo de ouvi-la.

Contudo, também não era uma boa hora para se rejeitar Usagi.

– Como se sua esposa está com meu marido? – bufou de volta. – Não tem como você estar ocupado às onze da noite!

Vamos, fique calma.

– Calma!?

Escuta, foi você quem decidiu não falar com ele, fingir que não sabia.

– Escute você aqui, Motoki...

Mas ele a cortou.

Realmente tenho que ir. Marcamos outro dia, tá?

– Vou precisar de algo mais específico, já que você só tem tempo pra me mandar ser sua babá. – E cruzou os braços por despeito, apesar de ele não poder vê-la assim.

Que tal no próximo sábado?

Ao desligar, Usagi não se sentia mais tranquila com a data. Não aguentava mais a forma que seu relacionamento vinha tomando. Aquela sequer era ela, uma mulher de ficar no sofá esperando homem. Usagi Chiba não parecia em nada Usagi Tsukino.

Não havia muito como descontar mais em Mamoru. Ele nem vinha jantar nos dias em que ela cozinhava. Assim não podia misturar laxante ou arsênico como ela fantasiava fazer. E sexo ele já devia estar ganhando muito melhor fora de casa do que quando o conseguia dentro. Não que ela andasse com coragem de se deitar com ele. Desde aquela noite quando ouvira tudo, sequer permitira que o marido se aproximasse de seu corpo.

Deveria pedir divórcio? Não era como se fosse dar o neto que o casal Chiba esperava...

– Aaaaah! – gritou, apertando o tecido do sofá. Odiava como havia passado a sentir ciúmes dele, mas seria pior se Mamoru descobrisse.

Ademais, Motoki não parecia muito feliz com a ideia de ser pai, aquela gravidez talvez até acelerasse o divórcio dos outro casal. E Usagi não estava disposta a facilitar a vida do marido, justo quando Motoki parecia prestes a liberar a mulher.

Ainda incerta do que fazer ou pensar, pegou sua bolsa e uma muda de roupas. Passaria a noite em sua verdadeira cama. E não deixaria um só aviso.

*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*

– Oi, gatinho!

Minako levou a mão à cabeça de um dos gatos que vinham aparecendo com frequência no muro em frente à porta de seu apartamento. Era bem branco, mas este tinha um curioso sinal que lhe lembrava de uma lua crescente. Era sempre bom vê-lo após mais um dia cansativo de trabalho no café, por isso vinha tentando alimentar ele e a gata que o acompanhava às vezes. Após mais um cafuné, despediu-se do felino e entrou.

– Cheguei! – anunciou, percebendo que sua companheira de quarto também já havia voltado pelo sapato deixado na entrada.

Usando um avental, Ami esticou o corpo da cozinha e lhe deu as boas-vindas da usual forma contida.

Devia ser essa timidez que chamara a atenção de Minako quando a vira no trabalho da mãe. Na época, Ami estava apenas fazendo algumas horas para ajudar a pagar os livros da faculdade e não precisar pedir à mãe. A senhora Mizuno nunca teria permitido se soubesse que havia algo no caminho entre a filha e os estudos. Entretanto, de tantas coisas que podiam haver atrapalhado a faculdade de Ami, Minako não acreditava que quaisquer delas fossem as culpadas de verdade.

– Vou terminar a sopa em cinco minutos, por que não se troca para comermos?

– É realmente nojento como você soa como minha esposa... – Minako comentou resignada.

– Revezaremos assim que puder fazer coisas comestíveis.

Qualquer um teria dito algo assim em tom de brincadeira, mas Ami prosseguia a mexer na cozinha como se houvesse apenas dito o óbvio. Uma simples declaração do que aconteceria. Esse era o jeito daquela pessoa, Minako só gostaria que ela sorrisse mais. Não havia desafiado a mãe e largado a medicina? Alguém tão forte assim deveria seguir a vida com mais vontade em vez de apenas se tornar uma dona de casa.

– Sabe, encontrei com aquele homem de novo. O bonitão da empresa perto do meu trabalho.

– Quer dizer que já jantou? – Ami levantou os olhos sem esconder a surpresa.

– Não, não! – Balançando as mãos enfaticamente, continuou: – Acho que ele é gay.

– Ele disse alguma coisa assim?

– Bem, desde aquele dia, ele nunca mais me chamou. – Ao notar que Ami não entendera a que se referia, explicou-se: – Aquele dia, quando fomos naquele café e vimos o marido de uma das minhas clientes, amiga do Shin. – Quando a moça demonstrou recordar-se, Minako assentiu satisfeita. – Bem, nesse dia, ele ficou todo estranho e pensativo. E agora, mesmo indo sempre no meu trabalho, nem fala comigo direito. E ele também não me beijou naquele dia. Será que foi como minha amiga? Gays gostam de amigas mulheres, né? E aquele cara que vimos... o Shin o olhou também meio torto. E já sei que vai me lembrar da sua teoria. – Minako fez uma careta de desprezo. – Eu sou a deusa do amor, saberia se aquilo fosse um encontro. Ha! Não mesmo.

Ami apenas deu de ombros e lhe apontou para um armário. Seguindo as instruções, Minako parou de beliscar os pequenos tomates com maionese que estavam perto dela e começou a pôr os pratos na mesa.

– Você ainda duvida dos meus poderes, né? – gritou desde a sala de jantar. – Eu sei que está pensando naquele músico.

– Não como você insinua...

– E repito: deveria dar uma chance ao amor. Aí, aproveita pra descobrir o nome verdadeiro daquele sujeito. Não engulo aquele nome artístico brega. Quem quer se chamar Zoisite, hein? Aposto que tem algum nome chato como Koichirou, Tanaka ou coisa assim.

Ao perceber que a outra não respondia, voltou à cozinha para flagrá-la absorta com um pedaço de jornal em mãos. Para quem desistira de completar a faculdade, Ami continuava bastante interessada pelo mundo intelectual e se mantinha em dia com as notícias e com os livros mais cultos. Mas nunca comentava esse hábito com a companheira de quarto.

Nesse momento, ouviu a campanhia do apartamento tocar e correu para a porta. Era ele de novo. Toda noite em torno daquele horário, Zoisite, um músico que prestava serviços para a empresa onde Ami trabalhava, vinha trazer uma flor. Bem, toda noite era exagero, mas a frequência vinha se aproximando disso nos últimos tempos. Desde que ele fora rejeitado.

Minako esticou a língua até tocar a bochecha enquanto fazia seu plano. Então, correu para o banheiro.

– Ami, pode atender pra mim? Vou demorar um pouco aqui – pediu antes de se trancar lá.

Como deusa do amor, ela sabia que aquele era o par certo para Ami. Apenas precisava dar tempo para que sua amiga o admitisse.

*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*

Prendendo a respiração, Mamoru abriu a porta de seu apartamento e sentiu o alívio lhe quebrar os nós de tensão dos ombros. O chinelo de andar em casa da esposa não estava lá. Ela os estava usando no momento. Ela havia retornado.

Deixou-se estar por um momento. Inspirava o ar de uma casa de família, não o apartamento vazio para o qual ele retornara na noite anterior.

Ao contactá-la para perguntar onde estava, Usagi lhe havia dado a desculpa de que fora passar a noite na casa dos pais e logo desligara o telefone. Após uma noite passada com apenas sua culpa, Mamoru ficara todo o dia fantasiando com o momento em que chegaria e encontraria não apenas a casa vazia, mas o armário também sem as roupas da esposa.

Em vez de voltar apressado para conferir se seus temores tinham fundamento, ele mesmo acabara por chamar Reika para um café. Não havia mais como negar: o casamento todo havia naufragado. De alguma forma, Mamoru havia feito Usagi correr longe.

E ele sequer podia reclamar, tecendo ele próprio sua parte da teia de mentiras. Hoje mesmo, ele havia de seu trabalho às cinco da tarde em ponto e mesmo assim enviara uma mensagem avisando que chegaria tarde. Sem mencionar em momento algum seu jantar com Reika.

Após o banho, continuava sem se sentir melhor. Teria agora que encarar as costas silenciosas da esposa.

Lembrou-se do que Reika lhe dissera no dia anterior e repetira naquela noite. Sabia que a encontrar era um veneno, que só piorava tudo; contudo, ela estivera certa sobre Usagi desta vez.

Olhou a esposa virada de lado para longe dele. Haveria como consertarem o que possuíam? Fazia sentido continuarem assim? Precisava se esforçar um pouco mais, talvez pudessem voltar para antes daquela noite. Da noite em que ela fora ver Motoki.

Ele podia engolir tudo. Para aquele relacionamento dar certo, alguém teria que ceder. E Usagi já fizera sua parte casando-se sem realmente querer.

Fechando os punhos, Mamoru

– Como foi nos seus pais?

Ela ficou silente inicialmente. Então, mexeu-se um pouco, deixando evidente que debatia com si mesma quanto ao que responder. Ou se responderia? Enfim, ela lhe falou sem esconder o ressentimento do tom de voz:

– Muito melhor que aqui.

Mamoru preferia nunca haver sabido sobre a verdade por trás de tudo. Sentia-se não apenas perdendo aquele que fora seu melhor amigo, como também sua esposa. O que ele podia fazer? Não havia como voltar no tempo; só poderia seguir em frente. Começava a compreender um pouco o que Reika sentia quando se encontravam, pois tinha vontade de voltar àquele restaurante e conversar amenidades. Não ter que encarar aquelas costas a seu lado.

Droga, se lá é tão melhor que aqui, por que Usagi simplesmente não o trocava? Tornaria tudo mais fácil. Serem sinceros um com o outro.

*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*

Era já final de expediente na empresa quando Makoto pegou seu celular e olhou para a tela por um momento. Espiando Usagi em seu computador, quem passava a limpo uma tabela de despesas, voltou a mexer em seu aparelho. Queria conversar com a amiga, ao menos desabafar tudo o que vinha enchendo sua cabeça, mas não conseguia dar o primeiro passo. Apesar de toda aquela necessidade, Makoto não estava acostumada a conversas de garotas. Então, porque se sentia quase obrigada a contar para a outra?

Desceu a tela de sua lista de contatos até chegar ao nome de Masato Sanjouin. O homem do goukon. Mesmo assim o chamando, ele apenas acontecera de estar no mesmo bar que os participantes do evento. E no mesmo apartamento quando ela recuperara a consciência no dia anterior. Nua. Chega de lembrar isso! Makoto sacudiu sua cabeça e fechou o celular.

Que mal teria em contar para Usagi sobre seu reencontro com Masato? Havia apenas corrido atrás dele e pedido desculpas pelo dia em que fugira de seu apartamento. Também aceitara o convite de tomarem algo enquanto a chuva não diminuía. Terminado o pequeno encontro, trocaram informação de contato. Mas ele ainda não havia ligado. A única mensagem fora para dizer que havia gostado muito de revê-la. Makoto também não a respondeu ainda.

Após essas lembranças, Makoto percebeu seu superior com o olhar fixo naquela direção. Era verdade, ainda estava no horário de trabalho. Não era para mexer em celular, pensar em homens ou fofocar com amigas. Não obstante retornar à sua própria tarefa – qual fosse, fingir estar ocupada para não receber mais nada a fazer naquele dia – Shin seguia a observá-la. Irritada com aquela pressão, a moça olhou direto para ele e reclamou:

– O que foi?

O superior devolveu-lhe uma expressão de inocência. Como ele podia fingir não estar olhando para lá com aquela cara feia? Antes que Makoto pudesse vociferar esses pensamentos, porém, Shin se aproximou de sua baia. Mas foi Usagi quem ele abordou:

– Bem conheci seu marido noutro dia. Num café.

No canto do olho, Makoto espiou a reação da amiga. Esta apenas havia erguido o olhar das folhas a seu lado. Insatisfeito com a evidente falta de interesse, o outro prosseguiu:

– Sabe, ele estava com uma ruiva muito bonita. É melhor tomar cuidado. – Agora sim com a expressão aliviada de missão cumprida, o superior retornou à sua área de trabalho sem esperar resposta.

Uma ruiva bonita... só podia se tratar da esposa de Motoki, Reika. Makoto juntou os beiços em uma careta. Superada sua reação natural à lembrança daquela mulher, voltou-se bruscamente para Usagi. Sabia que a amiga já tinha conhecimento de todo o caso, mas não por ela. Aquela era a primeira vez que Makoto tinha a chance de confrontá-la. Insistiu em seu olhar por uma reação da outra.

– O que foi, Mako? Acha que me importo com o que aquele idiota faz? – após assim dizer, retornou às tabelas.

– Pois você está mentindo. Sei que se importa.

– Tá. Mas é claro que sim; o que faço com todos os convites da festa se rompermos? Já enviei todos. E digo logo: se aquele idiota do Mamoru me cancelar esse casamento, não devolvo presente algum. Ele que cuide de toda a dor de cabeça que tá causando.

Apesar de sua preocupação não haver passado com aquela resposta evasiva, Makoto forçou uma risada e disse:

– Bem, homens têm amantes... Não quer dizer que vão cancelar casamentos. Eles não associam uma coisa na outra. Olha seu amigo, o Motoki. Vive fugindo de casa e da esposa, mas nunca pensa em apenas pedir um divórcio. Só ficar livre logo.

Usagi balançou a cabeça.

– Ele não o fará agora que a Reika está grávida. Se bem que, se o filho não for dele, eu mesma cancelarei o casamento deles junto com minha festa. Pensando melhor, a festa já vai ter acontecido quando essa criança nascer e fizerem o teste, né? Melhor pra mim, já disse que não devolvo presente.

– Grávida? – Incapaz de se manter calma e processar o resto do que lhe era dito, Makoto levou a mão até a boca.

– Bem, não sei se meu marido é burro o bastante para me trair dessa forma. Se era pra fazer filho alheio, não precisava de mim. Deve ser do Motoki mesmo...

– Quero dizer, a esposa dele tá grávida? E eles não sabem de quem é?

Tinha consciência de que era para estar consolando a amiga. Antes, Makoto apenas precisava tirar do rosto o sorriso ao perceber a possibilidade que se formara. Motoki mesmo lhe havia dito que mal vinha se encontrando em casa com a esposa. Então, como a teria engravidado? E ele nunca perdoaria. Homens poderiam considerar a esposa uma parte da casa a se evitar e até conseguir amantes por aí sem considerar o divórcio uma só vez. Mas Motoki não pensaria em outra coisa uma vez que o filho de Mamoru saísse da mulher que devia ser sua.

Contudo, quando Makoto, enfim, se sentiu pronta a consolar a amiga, esta fora chamada pela recepção do prédio. Havia uma visita a esperando na entrada da empresa. Por isso, pudera apenas observá-la sair intrigada. E inevitavelmente pensar:

Droga, não conto nada pra ela e ainda fico feliz com a tragédia iminente – e certa – na vida dela. Grande amiga que sou...” Então, abriu a lista de contatos de celular. Mas a lembrança da novidade que acabara de ouvir a fez mudar de Masato para Motoki o contato para quem iria mandar mensagem.

*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*

Bastou ver Usagi sair do elevador para um arrepio percorrer seus braços. Era ela. A mesma das visões que o fogo sagrado havia mostrado a Rei.

Viera até o prédio confirmar que suas visões estavam sendo tais quais sonhos: seu cérebro apenas processava informações já conhecidas. Vira Usagi em alguma foto de Jadeite. Tivera todas as oportunidades de se encontrar com a menina da agência de casamentos. Não passavam de garotas que fizeram parte da paisagem e que agora seu cérebro transformava em visões. Ainda que tentasse dizer-se tudo isso, aquele arrepio ao se encontrar tão perto de Usagi não enganava a sacerdotisa dormente nela.

– Princesa Serenity... – murmurou sem entender por que a chamava assim.

Então, percebeu que a mulher caminhava em direção aos recepcionistas do prédio. Rei não sabia o que dizer a ela, que desculpa dar. Usagi sequer fazia parte do mesmo departamento que seu namorado. Com os pensamentos nublados pela adrenalina, fugiu para o exterior do prédio, escondendo-se entre algumas pilastras.

E se Jadeite realmente fosse um homem mau? Estaria a princesa em perigo por se encontrar tão próxima dele? Mas o que Rei poderia fazer? Levou a mão à cabeça, agarrando seus cabelos e os puxando até sentir o couro cabeludo incomodado. O que estava acontecendo, afinal? Fechou com força os olhos, numa tentativa de se recordar de todas as visões tidas até então. Nenhuma formava uma história, era um conjunto de imagens e informações pouco conectadas. Vilões e guerreiros. E um reino antigo, parte de outra vida. Mortes.

Rei começou a sentir dificuldade em respirar. Estava mesmo prestes a cair em prantos? Por quê? Após consertar os cabelos, ela inspirou fundo até se controlar e encarou a jovem loira que olhava confusa a seu redor. Os recepcionistas deviam ter acabado de dizer que sua visita sumira. “Que papelão, Rei...” pensou, estalando a língua. Enfim, retornou ao interior do prédio, como que marchando em direção a Usagi.

– Desculpa o atraso – começou a dizer, apesar de não ser propriamente um atraso. – Eu me chamo Rei Hino.

– Hã... É um prazer. – Ela se curvou com hesitação. – A senhora vem em nome de alguém? Posso ajudá-la com algo?

– Sinto muito, não sou uma cliente. Eu vim vê-la. Podemos conversar em um lugar mais calmo? Jadeite me comentou que abriu um café aqui perto.

A jovem entortou a cabeça pensativa; então pareceu perceber algo.

– Você conhece o Jadeite?

Brigando consigo mesma pelo deslize, Rei tentou assentir brevemente. Após mais um momento, a outra acabou por aquiescer e a guiou até o café restaurante sobre que seu namorado comentara uma vez.

– Sejam bem-vindos! – Uma garçonete de cabelos escuros as recebeu e anotou seus pedidos.

Estava frente a frente com Usagi, mas voltava a perder a confiança no que viera fazer. Aquela moça devia estar vivendo uma vida normal, sem monstros e sem mortes. Tal como Jadeite, como sua namorada deveria sabê-lo mais que qualquer outra pessoa. Então, qual era a necessidade de mexer naquilo? Até onde sabia, tudo não passava de acontecimentos de uma vida passada.

– Hã... então... Disse que conhecia Jadeite? – Usagi a olhava desconfiada.

Mesmo que Rei já houvesse perguntado diretamente para seu namorado, este não parecia conhecer muito sobre Usagi. Departamentos diferentes, mal se falavam. Sem qualquer informação útil sobre aquela moça, como iniciar a conversa de forma a alertá-la do que estava acontecendo? Da forma como o destino parecia se mexer ao redor das duas mulheres? Toda sua alma lhe gritava que estavam em perigo. Não dissera nada a tal Ami Mizuno, mas aquela era a Princesa Serenity. Tinha que haver algo de especial com ela. Era a pessoa que sua encarnação anterior parecia proteger com a própria vida.

Ignorando a pergunta de Usagi, decidiu ela própria escolher um assunto:

– Soube que iria se casar, meus parabéns.

– Ah. Sim, obrigada. Na verdade, já nos casamos.

– Que bom, espero que sejam felizes.

– É... digo, obrigada de novo.

– Jadeite não me disse que tipo de pessoa era seu marido.

– Apenas um assalariado comum.

Os cafés chegaram naquela hora, o de Usagi estava acompanhado de um bolo cheio de cobertura e marshmallow. Rei a observou comer rapidamente, enquanto sorria. Era uma cena estranhamente familiar. Elas realmente já haviam se conhecido... Aquela conversa não era com uma total estranha. Seu coração se sentia quente tal como se houvesse acabado de encontrar a melhor amiga dos tempos de escola. Não podia mais esconder o segredo.

– Usagi, gostaria que ouvisse um aviso para você.

A moça levantou o olhar após engolir o último pedaço do bolo. O canto de sua boca estava com uma mancha enorme de marshmallow. Tentando ignorar a visão, Rei prosseguiu:

– Eu posso estar enganada, mas há duas pessoas na sua empresa que podem tentar matá-la.

– O quê? – Não era uma pergunta cheia de susto e temor. Usagi havia começado a gargalhar. – Isso é algum vídeo pra tevê? – E olhou ao redor.

– Não tem câmeras aqui.

– Mas! – E gargalhou mais uma vez, incapaz de falar.

– Sua idiota, apenas me escute! Eu vi no fogo sagrado que tanto Jadeite quanto Kunzite são espíritos malignos.

– Kunza- o quê? – Ela passou a segurar o estômago, como se assistisse a um programa de comédia.

Rei começou a ficar consciente dos olhares que as garçonetes e os clientes lhes lançavam; estes eram cada vez menos disfarçados.

– Kunzite, digo, Shin Saitou. Seu chefe e Jadeite são enviados de uma organização maligna e podem estar com um plano para matá-la.

Usagi havia parado de gargalhar e a olhou por um momento. Enfim, parecia começar a entender a gravidade do que lhe era dito.

– Você tem razão – começou a lhe dizer. – Eu bem que estava desconfiando de que meu chefe queria me matar. – Mas voltou a gargalhar ainda mais alto. – Você não imagina o trabalho chato que ele me deu pra fazer hoj- AAAAAAAAAAAAI! Mas por que me bateu!? – Usagi levou a mão ao lugar da cabeça onde havia sido socada.

– Porque você não está me ouvindo.

– Claro que estou! – replicou com a voz chorosa. – Não tenho culpa se você acabou de me falar coisas tão doidas.

Ela realmente não sentia nada? Não havia qualquer estalo dentro de seu corpo? Rei olhava agora para a princesa que deveria proteger e via uma imbecil com a bochecha suja de marshmallow. E pior, que a olhava sem qualquer agradecimento pelo aviso.

– Pois bem, acredite no que quiser. – Rei abriu sua carteira e pôs duas notas de mil ienes sobre a mesa. – Se acha que Jadeite e Kunzite são apenas bons rapazes que só por coincidência foram trabalhar contigo, fique à vontade. Tenha uma boa morte, princesa Serenity. Não vou perder minha vida para proteger uma idiota.

Assim dizendo, deixou a mesa e o café. Mas não sem antes esbarrar em uma garçonete loira recém-chegada da rua. Era... Encontrar aquela outra pessoa de suas visões religou-lhe o alarme de alerta dentro de sua mente. Havia se apressado em deixar Serenity com a própria sorte? Dessa vez, não repetiu a falha de quando se encontrara com Ami Mizuno, mas aquela garçonete era sim a Sailor Venus.

Era como se o destino estivesse juntando todas as peças. Assim pensou, ao notar que Venus correu para cumprimentar uma Usagi ainda perplexa e na mesma posição em que Rei a deixara.

O que estaria para acontecer? Ou aqueles seriam apenas tempos de paz? Paz... Rei nunca mais teria paz. Não enquanto tremesse só em olhar o namorado, sem saber qual a verdadeira identidade de Jadeite.

*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*

Vinha passando os últimos dias perdida em pensamentos. Ouvir aquele nome pareceu haver lhe ligado algum botão e lhe despertado uma parte desconhecida dentro de si. Princesa Serenity, era como aquela mulher a havia chamado. Toda a conversa parecera um enredo de anime até então. Como um nome tão estranho pudera mudar tudo? Teria corrido atrás dela se não houvesse reencontrado Minako logo em seguida. Quando enfim terminara a conversa e pagara a conta, a desconhecida não estava mais à vista.

Passou a ter pensamentos estranhos e a se recordar de imagens de sonhos. Vinha culpando seu casamento repentino por aqueles sonhos, mas e se a mulher estivesse certa? Um fogo sagrado teria revelado a ela sobre espíritos malignos que tomaram a forma de Shin e Jadeite. Fogo sagrado...

Percebeu uma foto de um templo xintoísta colada em um mural e estendeu a mão para tocá-la. Fogo sagrado seria algo de um templo daqueles, né? Usagi tentou tatear o local através da imagem e era como se pudesse ver todos os detalhes. Dois corvos pousados enquanto uma jovem de cabelos longos e negros usava uma vassoura de palha para juntar folhas secas. Era aquela mulher!

– A senhora vem pensando em um casamento tradicional?

Usagi se virou para encarar a encarregada da agência de eventos, a senhora Aino. A seu lado, Mamoru a observava sem esconder a curiosidade. Estava tão distraída que se esquecera de era o meio de uma conversa. Sacudiu a cabeça para a mulher.

– Só tava olhando.

Mas a mulher não pareceu convencida e passou a explicar:

– Temos alguns templos conveniados e este acontece de estar bem na região onde moram. O sacerdote é um senhor de idade simpático que ficaria honrado, caso considerem ter uma cerimônia lá.

– Esse é o templo Hikawa, certo? – A voz de Mamoru a assustou; vinha de muito perto de seu ouvido. Ele havia se aproximado para observar melhor a foto.

– Exatamente! Já esteve lá, senhor Chiba?

– Ah, sim. – Ele passou a mão na cabeça. – Acho que sim.

Antes que ele pudesse se aprofundar no assunto, uma jovem de uniforme da agência se aproximou segurando uma grossa pasta, que foi entregue à sua superior. Mamoru lembrava-se de havê-la visto uma vez conversando com Usagi, por isso, cumprimentou-a com um aceno de cabeça.

– Ah, olá! – Sua esposa pulou à frente, como se estivesse prestes a abraçar a recém-chegada.

Talvez o houvesse feito, caso a outra não houvesse dado alguns passos assustados para trás. Parecendo se recuperar, a jovem mostrou também reconhecê-la e a cumprimentou.

– Como está seu amigo? – perguntou a Usagi.

– Ah, você tinha razão, Ami. Não precisava mesmo de hospital. Acho que já está tudo bem.

Ami sorriu discretamente, sem dar pistas sobre o que as duas conversavam. Normalmente, Mamoru apenas não se incomodaria com ignorar, mas tudo relacionado à sua esposa o vinha tirando do que ele sempre considerara ser o seu “normal”.

– Hospital? De quem estão falando? – inquiriu, sem esconder o tom de demanda.

– Só o Motoki na outra noite. Ele acabou machucando a perna, e a Ami estava passando por ali na hora. – Usagi voltou-se para a moça: – Sinto muito pela cena, ele tava bastante bêbado.

– Eu estou acostumada, não se preocupe. Havia muitos onde eu trabalhava antes.

– Oh, que legal! Você já trabalhou num bar ou algo assim, é? – perguntou Usagi com sua característica familiaridade exagerada.

Sem conseguir se interessar com o restante da conversa, Mamoru quedou-se a observar a esposa pelo restante do dia. Como podia lhe dizer que estivera com outro homem usando um tom inocente? Usagi lhe contara de forma tão factual, ou até cotidiana, que ele não teria dado importância não fossem os avisos que recebia de Reika constantemente.

*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*-*

Haviam mesmo chegado ao ponto em que Usagi não se importava mais com o que o marido pensava? A lembrança da noite que ela passara fora de casa retornava à sua mente. Teria sido nesse dia? Ela estivera mesmo com Motoki, tal qual Reika lhe expusera? Mamoru sabia que bastava perguntar à senhora Tsukino, mas não aguentaria a resposta. Talvez, ela sequer importasse.

Foi enquanto concluía assim algumas horas mais tarde e já de volta à casa dos dois naquela noite de sábado que Mamoru recebeu uma chamada de sua mãe no celular.

– O que houve? – Usagi correu até o quarto atrás dele.

Sem parar de pegar peças de roupa aleatórias, explicou-lhe apressado:

– Meu pai passou mal e está internado no Quioto. Preciso correr para não perder o trem.

Quando achou que ela não lhe diria sequer uma mensagem de apoio, percebeu que a esposa também pegava uma de suas malas menores.

– Eu vou junto.

– Não. – Fechando a própria mala, ele começou a caminhar para a porta.

– Como assim? Também é meu pai agora!

Aquelas palavras pareceram parar um pouco o tempo para ele e lhe tirar temporariamente o peso dos últimos tempos. Não mais se contendo, Mamoru caminhou até onde ela estava parada e fez menção de lhe beijar. Tal qual já esperava, Usagi se encolheu em resposta.

– Até parece que sou um monstro ou um assassino. – Ele estalou a língua, esforçando-se para não transparecer a dor trazida pelo balde de água fria. – Quando eu voltar, quero que resolvamos sobre o divórcio.

– O quê!?

– Mal nos casamos e tudo o que você faz é me evitar. Olha, sei que tenho que entender. Sabia desde o início de que você foi mais empurrada para cá do que veio por vontade própria. Mas você escolheu ao menos permanecer aqui... Só que meus pais, claramente, não têm todo o tempo do mundo. Eu preciso cumprir o que prometi a eles.

– Basta esperar o exame.

Mamoru a observou por um momento, mas nenhuma explicação se seguiu. Ela apenas o encarava com o queixo erguido em desafio.

– Não é hora de brigar – disse ele por fim, voltando a pegar sua mala.

– Estou falando do seu filho com a Reika. Se ele realmente for seu, nem precisamos nos divorciar. Temos nosso casamento, seus pais um neto.

– Como?

– Eu pensei que isso era justamente motivo para um divórcio, mas sabe de uma coisa? Não vou perder cara assim. Não assino papel algum, enquanto não soubermos sobre aquele bebê. Vamos ter a nossa família disfuncional mesmo. Você que aguente.

– Espera, você está mesmo me acusando de traição? Eu não passei noite alguma fora de casa.

– E por que acha que fui pra casa dos meus pais, Mamoru? Recordemos aquele dia, seu hipócrita insuportável. Você me disse que chegaria tarde, já foram tantas que nem lembro se você se deu ao trabalho de culpar seu trabalho daquela vez. Agora, diga-me: para onde você levou aquela mulher naquela noite?

– Eu fui mesmo me encontrar com a Reika, mas era porque sabia que você estaria com o Motoki.

– Motoki!?

– Eu quero o divórcio, Usagi.

– Não dou. – E cruzou os braços.

Seria uma cena da qual Mamoru riria se não estivesse acontecendo com ele próprio. Gostava daquela parte de Usagi. Droga, ele gostava dela. Mas devia a seus pais. Havia assegurado aos dois que logo poderiam segurar seu neto. Não importava o quanto a esposa insistisse que não estivera com Motoki, não era mais a questão sendo discutida. Por isso, insistiu:

– Quero que volte para casa amanhã. Se não quiser assinar os papéis, eu contratarei um advogado e resolveremos isso em litígio.

Foi quando algo concomitantemente previsível e inacreditável aconteceu. Ela começou a chorar.

Mamoru não queria mais estar naquela cena. Incapaz de fazer qualquer coisa para melhorar, pôs-se a andar em direção à saída do apartamento. Caso não se apressasse, mentiu para si mesmo a fim de ocultar-se a covardia, apenas poderia pegar o trem do dia seguinte.

– Seu idiota! – ela gritou com toda a força, fazendo-o parar. – Seu traidor idiota!

– Pela última vez – retorquiu ele – não fui eu quem traiu aqui. Foi você quem passou a noite com Motoki.

– Não passei não! E aquele filho?

– Não posso prestar conta de toda a vida social da Reika pra responder, mas garanto que não é meu.

– Mentiroso – disse ela entre soluços.

Mamoru suspirou e forçou a se afastar mais. Apenas não conseguia. Não com ela chorando assim. Por mais chorona que Usagi fosse, aquele som ainda parecia apertar seu coração. Com uma força que não achava que tinha, conseguiu, enfim, deixar o apartamento e caminhar até o elevador. Antes que este chegasse, porém, sentiu a presença da esposa a seu lado.

– Eu disse que iria também.

Foi tudo o que ela lhe disse até a chegada à estação de trem bala em Quioto.

Continuará...


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Notas finais do capítulo

Este e o capítulo anterior devem ter sido os mais difíceis de sair. Ficou um clima muito ruim se formando que acabou dando nisso tudo. Pra mim, quando a Usagi decidiu que iria com o Mamoru foi quase como um raio de luz: "chega de ficar sentadinha aqui só dando o troco e vamos agir um pouco pra variar". Não sei se os leitores também têm essa impressão. Deixem seus comentários :D

No próximo capítulo, será que eles vão se resolver ou Quioto virará a lua de mel para terminar o casamento de vez?



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