Seis meses.

Seis meses se passaram desde a morte do Vince. E não, não parou de doer. Só ficou mais fácil esconder a dor.

É engraçado como a morte de alguém tem o poder de mudar a vida das pessoas. Às vezes para pior, às vezes para melhor. No caso dos meus amigos foi para melhor. No meu para pior.

Nero, Natalie, Christian e Blake estão quase morando na minha casa. Passam a maior parte do tempo lá. Christian e Dane viraram melhores amigos. Blake e Sophie estão namorando. Nero está ensinando John a consertar carros. E Liz e Natalie estão se dando muito bem.

Natalie foi uma surpresa especialmente boa. Ela não tem nada de personalidade infame da Jennifer, e tem se mostrado uma garota incrível. Gosto de tê-la por perto. Na verdade, gosto de ter todos eles por perto. Mas ainda assim, me sinto sozinha.

Eu voltei para faculdade, mesmo tendo que refazer o período, e arranjei um emprego novo. Tenho tentado me manter ocupada o tempo todo. Quanto mais eu me ocupo, menos tempo eu tenho para pensar nas minhas tristezas. Vince morreu e Hunter foi embora sabe-se lá Deus para onde.Parece que quanto mais tempo passa, mais o vazio no meu peito aumenta.

Agora eu estou voltando do trabalho a pé. Eu podia ter aceitado a carona de Sophie, ter pedido para John ir me buscar, ter pego o metrô ou algo do tipo, mas preferi andar, como sempre tenho feito ultimamente.

A rua está excessivamente vazia para uma sexta-feira a noite. Há poucos carros circulando. Mas não estou prestando atenção até que um carro preto em alta velocidade se destaca no pequeno fluxo de carros. Ele está vindo na contramão, ziguezagueando pela rua.

Diminuo meus passos enquanto observo o carro se aproximar. Quando o tal carro sobe na calçada vindo na minha direção, tento correr para o lado, para sair do ângulo do carro. Ele acelera, vindo como um monstro para cima de mim. E um segundo antes de me acertar, o carro desvia, voltando para a rua e indo embora em disparada. Com o susto, caí no chão, ralando meus joelhos e a palma das mãos.

Continuo caída no chão, sem reação. Involuntariamente, lembrei-me de quando conheci o Vince, quando ele me atropelou. Afasto a lembrança rapidamente. Com o Vince havia sido um acidente, e dessa vez não. Dessa vez o tal carro havia me perseguido.

Senti um par de mãos me segurando, me ajudando a levantar. Fiquei de pé e me virei para ver quem me ajudara. Um garoto mais ou menos do meu tamanho, com olhos cor de âmbar. Seu cabelo era bem curto, raspado rente a cabeça, mas era visivelmente loiro, e ele ostentava um sorriso enquanto segurava minha mochila que havia caído no chão na correria. Eu o conhecia. Ele estava fazendo faculdade comigo.

- Você está bem? - perguntou ele ainda sorrindo.

- Estou. Não foi nada. - garanti-lhe, pegando minha mochila de suas mãos.

- Lembra de mim? Sou Jared. - ele estendeu a mão e eu a apertei rapidamente. - Jared Collins.

- É, eu lembro sim.

- Você é Meg Hill, não é?

- Megan. - corrigi-o.

- Ah, claro. Megan.

- Bom, obrigada pela ajuda, - que não foi quase nenhuma, mas enfim. - mas eu preciso ir,

- Quer que eu te acompanhe? - ofereceu-se.

- Não, não precisa. Mas obrigada. - virei-me para ir embora, mas ele segurou meu braço.

- Tem certeza? - insistiu. - Eu posso te fazer companhia, se quiser.

- Realmente não precisa disso. - disse-lhe séria.

Soltei meu braço da sua mão e fui embora, andando o mais rápido que meus joelhos doloridos permitiam. Me repreendi mentalmente por estar usando um short jeans e não uma calça .

Percorri o caminho de casa apressadamente, olhando nervosamente ao redor, com medo de mais algum carro maluco aparecer querendo me matar. Se bem que aquele carro não queria me matar, porque se quisesse não tinha desviado de mim.

Quando cheguei em casa encontrei Natalie, Sophie e Liz sentadas juntas no chão da sala. Nem John, nem Christian ou Dane estavam a vista.

- Você está bem? - perguntou Nero com um olhar preocupado.

- Sim, sim, tudo bem. - respondi com um sorriso forçado sentando-me no sofá.

- O que aconteceu com seus joelhos? - quis saber Sophie.

- Eu cai. - dei de ombros, como se fosse algo simples.

- Vou pegar um kit de primeiros socorros. - disse Liz levantando-se.

- Você caiu assim do nada? - perguntou Blake parado atrás do sofá.

- É, mais ou menos.

- Como assim? - quis saber Nero parado ao lado do Blake.

- Voltei. - anunciou Liz. Ela entregou o kit a Natalie, que começou voltando a limpar e a cuidar dos meus joelhos.

- Eu estava voltando, quando um carro veio na contramão e quase me atropelou. - disse-lhes com leveza. - Mas não foi nada.

- O quê?! - exclamou Liz.

- Como era esse carro? - perguntou Nero calmamente.

- Não sei, não deu para ver direito. Só sei que era preto.

- Pode nos contar detalhadamente o que aconteceu? - pediu Nero sentando-se ao meu lado.

Não me parecia uma boa ideia dizer-lhes que um cara maluco subiu na calçada e jogou o carro em cima de mim, mas resolvi contar-lhes. Nero me interrompia a todo instante, cobrindo-me de perguntas, pedindo mil detalhes. Detalhes que eu não tinha para dar-lhes.

Ao final, quando terminei de contar tudo, Nero levantou-se e saiu de casa, com Blake o seguindo. Natalie acabou de fazer os curativos e me liberou. Antes que eu tivesse tempo de ir para o meu quarto, John, Dane e Christian apareceram. Tive que contar a história toda de novo.

Enfim, consegui acabar o interrogatório. Subi para o meu quarto feliz por poder ter um pouquinho de sossego. Mas assim que cheguei no quarto minhas esperanças de ter sossego se desfizeram, A janela estava escancarada e o vento balançava violentamente as cortinas. Sobre a cama jazia um papel preto onde lia-se em letras vermelhas:

CUIDADO AO ANDAR NA RUA, ACIDENTES DE CARRO ACONTECEM O TEMPO TODO

Embaixo das palavras havia o desenho de um sorriso macabro. Encarei o bilhete, lendo-o diversas vezes seguidas, esperando que as palavras mudassem ou sumissem. Mas nada aconteceu. A ameaça velada continuava lá, latente. Aproximei-me da janela, olhando a rua escura do lado de fora. E então um vulto chamou minha atenção. Um corpo envolto em sombras. Ele permaneceu parado, como se estivesse me encarando. Depois saiu correndo e desapareceu na escuridão, deixando um rastro de medo no meu peito.