"Mamãe! O que está acontecendo?!"

A garotinha de aparentemente 7 anos que estava com as mãos tapando as orelhas enquanto olhava para sua mãe em busca de respostas ao barulho ensurdecedor que parecia ficar cada vez mais alto.

"Para de baixo da mesa. Agora!"

A senhora que aparentava não ter mais de 35 anos, puxou a menina de pele dourada pelas mãos e se jogou no chão por cima dela, parando em baixo da mesa em busca de proteção. Não se passaram 10 segundos depois, o som ficou insuportável, mas logo o som de um estrondo seguido de uma explosão foi ouvido.

O cheiro era de terra, em outros momentos a criança teria apreciado isso, mas desta vez era diferente. Ela podia sentir seu rosto endurecido com a poeira, a mesma que estava quase entupindo suas narinas. Seu corpo todo doía, ela tentou abrir os olhos, mas descobriu que o esforço apenas fez a dor piorar, então esperou mais um tempo tentando descobrir o que se passava ao seu redor. Até que ouviu uma tosse bem próxima a seu rosto, o que a fez se lembrar de sua mãe. Demorou um tempo para os olhos, incrivelmente, azuis se acostumassem com a escuridão. E quando o fez, ela estava em um lugar quase tão escuro como quando estava de olhos fechados, mas ela poderia distinguir a silhueta de sua mãe que estava posicionada em cima dela, o que explica a pressão que sentia sobre seu pequeno corpo, mas algo estava errado, sua mãe parecia quase imóvel.

"Mamãe?"

A menina sussurrou e tentou se locomover, mas percebeu que não podia.

"Mamãe?"

Ela tentou mais alto, e sentiu sua mãe responder fracamente ao seu chamado.

" B-Bela? Você está bem?"

"Não consigo mexer meu pé, mamãe..."

"Está tudo bem, darling... Vai ficar tudo be-"

Sua mãe começou falando suavemente, até que uma crise de tosse tomou conta de seu corpo. O peso sobre a garota aumentou, de acordo com que o corpo enfraquecido de sua mãe ficava cada vez mais mole e se apoiava ainda mais sobre o corpo menor.

"Mamãe. Mamãe! O que está acontecendo? Mamãe!"

A voz da menina crescia cada vez mais estridente e chorosa a medida que não ouvia nada de sua mãe.

"N-Não, não... Se preocupe, minha Bela. V-Você, você é muito especial. A mais especial e Bela de todas. Eu te amo, minha filha. Você sempre será minha Ororo..."

Com um último suspiro, o corpo da mulher caiu completamente em cima do de sua filha. A pequena de cabelos brancos e olhos unicamente azuis, começou a chorar, gritar e tentar sair daquele lugar, mas a cada tentativa parecia que o lugar diminuía de tamanho, a sufocando cada vez mais e mais...

"Não! Nãããoooo! Mamãe, Mamãe!! Por favor acorda, por favor. Não me deixa aqui. Mamãe, por favor, me salva. Alguém!! Me tirem daqui!! Por favor! Socorrooo!! Mamããããããee... Nãoooo!"

—_________________________________________________________

"... Nãoooo!"

Eu me sentei na cama de repente. Percebi que estava um pouco suada e minha respiração estava acelerada assim como as batidas do meu coração. Ainda de olhos fechados tomei algumas respirações profundas tentando me acalmar. Abri meus olhos lentamente e me dei de cara com a escuridão. Novamente meu coração começou a acelerar, e minhas mãos começaram a ficarem molhadas de novo. Com um pulo corri para a janela e abri as cortinas, soltando um suspiro aliviado ao sentir a luz do sol batendo em minha pele. Quando me viro novamente para dentro do quarto, algo que peguei com o canto do olho chama minha atenção e me viro naquela direção para tomar um grande susto.

"Wolverine! Você me assustou"

Minha mão direita havia ido automaticamente em direção ao meu peito com o susto repentino. O ar faltou um pouco também, mas nada que eu não me recuperasse rapidamente, principalmente quando minha atenção foi chamada novamente para o homem sentado em meu sofá quando ele falou comigo depois de alguns dias.

"Eu costumo causar esta impressão nas pessoas."

"O que você está fazendo aqui?"

Eu ainda estava ofegante, tentando lentamente me recuperar do ocorrido.

"Uau! Como você está Ororo? Ah! Eu vou muito bem por sinal. Obrigado por perguntar."

"Tempestade."

"O quê?"

"Pra você é Tempestade."

"Vem cá.. É assim que você trata suas visitas? Esperava mais de você. O que será que todos vão pensar ao saber o quão rude nossa diretora é de verdade..."

Ele disse em um tom sarcástico e com aquele sorriso irritante nos lábios. Se eu não tivesse acabado de sair de um pesadelo e não estivesse me sentindo tão cansada, provavelmente eu teria achado graça e teria rido junto com ele, mas acontece que eu não estou neste estado de espirito. Ele pareceu notar isso, porque com a falta de uma resposta minha ele ficou sério e abaixou um pouco a cabeça.

"Eu estava apenas brincando"

"Hum. Eu sei"

Eu disse tentando parecer o mais suave possível, sem deixar transparecer a enorme dor de cabeça que estava se iniciando.

"Eu queria pedir desculpas. Eu não deveria ter feito o que fiz"

"Claro. Eu te perdoo, agora se puder me dar licença eu tenho que dar aula."

Eu me aproximei dele e o puxei pela mão até que ele ficou de pé, enquanto eu falava eu o empurrava em direção a porta.

"É sério Ororo. Eu quero me redimir."

"Eu estou falando sério também, eu já me esqueci e se quiser se redimir.. Saia do meu quarto. E é Tempestade."

"Por quê disso agora? Todos te chamam de Ororo porque eu tenho que te chamar pelo seu codinome?"

"Você sempre me chamou assim, eu até achei que era porque você nunca soube meu nome. Acabei me acostumando. Além de que apenas três pessoas me chamam pelo meu nome o resto vem com um Senhorita ou Diretora na frente e-"

Eu fui cortada antes mesmo de terminar a minha frase porque me esbarrei em algo. Quando percebi Wolverine tinha parado bruscamente, fazendo com que eu, que seguia atrás, batesse nele. Eu fechei a cara e estava preste a repreendê-lo quando vi que ele farejava o ar.

"O que foi? O que você farejou?"

Perguntei em um volume mais baixo, não tendo certeza do que isso significava, ao certo.

"Algo... Metálico. Sangue."

"Sangue? Mas o quê-"

Fui cortada novamente por ele, mas desta vez ele puxou meu braço e me virou de costas pra ele. De repente senti uma pontada atrás da minha cabeça. E me afastei rapidamente dele, quase em um pulo.

"Ai! Mas o quê você pensa que está fazendo?"

Eu exclamei e levei minha mão para o local onde senti uma dor, a mesma dor de cabeça que começou quando acordei. Ao pousar minha mão atrás da minha cabeça, estremeci de dor um pouco e percebi que toquei em algo molhado. Estranho. Ao trazer minha mão para minha visão pude notar que ela estava um pouco suja de sangue. Ainda sem entender muito bem, repeti o processo. Até que Wolverine me puxou pelo pulso e me arrastou para fora do quarto.

"Ei, ei, ei! O que você está fazendo? Para onde estamos indo?"

"Para o laboratório."

Ele disse como se fosse a resposta mais óbvia do mundo. Ainda no topo da escada que levava ao andar de baixo, me desvencilhei da sua mão possessiva e voltei para o meu quarto.

"Você por um acaso me perguntou o que eu achava disso primeiramente?"

"Não precisa você está machucada, precisa de um curativo."

"Não, eu não. Nem está tão machucado assim. Eu faço um curativo eu mesma."

"Pode deixar que eu faço."

"Eu agradeço sua preocupação, mas não obrigada. Você já pode sair."

"Eu não vou sair até ter certeza de que fez o curativo."

"OK, tudo bem. Tanto faz."

Com isso ele entrou no meu banheiro e depois de dizer a ele onde eu guardava o kit de primeiros socorros, ele reapareceu no quarto e se sentou atrás de mim na posta da cama e começou a fazer o curativo.

"Pronto."

"Obrigada."

"Onde você conseguiu isso?"

Me virei para ele e respondi sinceramente com um sorriso agradecido. Ao perceber que ele havia feito uma pergunta referente ao pequeno corte em minha cabeça, eu apenas encolhi os ombros e respondi que não sabia. Caímos em um silêncio confortável, até que Wolverine falou novamente.

"Você quer conversar sobre isso?"

"Sobre o quê?"

"Sua lembrança."

"Como você sa-"

"Eu já tive vários como este. Sei como se sente. Às vezes conversar ajuda."

"Como você pode saber, se nunca compartilhou nada com ninguém além de si mesmo?"

Apenas percebi o que eu disse quando ele abaixou a cabeça e suspirou baixinho. Rapidamente toquei sua mão e baixei minha cabeça tentando encontrar seu olhar.

"Me desculpa. Não foi isso o que quis dizer. Quer dizer, foi. Mas... Me desculpa"

"Não você está certa."

"Não, não estou. As pessoas reagem de formas diferentes, o seu era apenas guardar para si mesmo. E você está conversando comigo, então eu acho que você não é tão fechado assim... Será?"

Ele riu um pouco e eu sorri alegremente.

"Um avião."

"O quê?"

Finalmente ele levantou o olhar, mas eu não conseguia deixar a cabeça erguida por muito tempo, agora, então abaixei e tentei segurar as lágrimas de novo.

"Quando eu tinha 7 anos, a minha casa foi atingida por um avião. Minha mãe morreu tentando me salvar. Eu passei três dias com o corpo da minha mãe em cima de mim com centenas de quilos a cima de nós, até que o resgate veio e me tirou de lá. A partir de então, tenho medo de lugares muito fechados ou muito escuros. Por isso Charles me deixou ficar aqui no porão, é o maior quarto que tem e possui claraboias o que deixa o quarto, mesmo durante a noite, não muito escuro."

"Eu sinto muito."

"Pelo quê?"

"Por ter feito você passar por essa sensação de novo."

"Não foi culpa sua. Não totalmente. Vamos apenas dizer que eu também não fui totalmente justa com você."

Eu ofereci um sorriso que ele retornou de bom grado. Caímos em um silêncio confortável novamente, mas desta vez olhando profundamente nos olhos um do outro.

"Seus olhos são lindos"

Eu corei sem graça com o elogio repentino, mas não desviei meu olhar do dele.

"Obrigada."

"Eu nunca tinha percebido que eles eram azuis."

"Hã?! Azuis? Oh! Essa não.."

Me levantei com pressa e corri até o meu espelho na parede. Ao me examinar pela primeira vez aquela manhã, me senti péssima. Eu parecia um lixo, meu cabelo desgrenhado, as olheiras estavam dominando meu rosto, olhos levemente inchados e avermelhado por causa do choro, eu aparentava cansada, e aparentava ter 40 anos... O que de certa forma não é ruim, principalmente se comparada a minha idade real, mas comparada com o que eu aparento ter, eu não estava nas minhas melhores condições. Finalmente olhei para os meus olhos, eles brilhavam em um tom incomum de azul, rapidamente corri até a minha cômoda e tirei um pequeno pote de dentro.

"Droga! Devo ter perdido minhas lentes durante a confusão."

"Lentes? Tipo, lentes de contato?"

"Exatamente. Agora vou ter que mandarem fazer outras."

Com a cara fechada me joguei na cama de novo, desta vez deitada olhando para o teto e pensando em um momento para ir até a cidade e arranjar algumas lentes, já que Charles não está mais aqui eu terei que fazer isso sozinha. Talvez Hank pudesse conseguir pra mim....

"Pra quê você precisa de lentes? Pera ai. Você usava lentes de contato?"

"Sim. Castanhos escuros."

"Não tinha percebido."

"Isso porque você nunca me notou."

"O quê? Eu não ouvi."

Percebi pelo seu tom de voz que ele realmente não sabia do que eu estava falando então apenas balancei a cabeça e disse que era nada. Depois de me deitar na cama de novo, respirei fundo e descobri que ainda estava cansada. Fechei os olhos e tentei descansar um pouco mais, quase me esqueci de que Wolverine ainda estava do meu lado. Tanto é que até estremeci de susto quando ele voltou a falar.

"Eu não entendo. Por quê esconder atrás das lentes olhos que são tão bonitos?

"Eu não gosto de chamar atenção, eles não são normais Wolverine, se você não notou eles são de um tom incomum de azul. Como se já não chamasse muita atenção uma morena de cabelos brancos."

"E o que há de errado com o incomum? Você não deveria se sentir assim com a sua mutação. É o que te faz ser quem você é. A Bela Ororo Munroe."

"Rsrsrsrs. Eu já passei por algumas experiências não tão boas por ser incomum.... Bela.."

"Ah me desculpe, eu não quis que você interpretasse mal."

"Não, não. Isso me lembra da minha mãe. Ela sempre me chamava de Bela..... Minha Bela"

Sorri tristemente ao se lembrar da minha mãe, eu já havia perdido o meu pai quando era muito mais nova, então cresci muito apegada a ela. Inclinei a cabeça levemente para baixo e funguei baixinho tentando reprimir algumas lágrimas que apareceram nos meus olhos.

"Ei.."

Wolverine segurou o meu queixo e levantou minha cabeça fazendo com que eu olhasse para ele. Então ele me abraçou. Uma atitude que eu realmente não esperava da parte dele, mas que aceitei de muito bom grado. O abraço dele era reconfortante e quente, eu apenas me deixei levar pelas sensações calmantes que ele causava em mim.

"Eu não queria que você ficasse assim..."

"Você não fez. De certa forma, ao menos três pessoas me chamam assim sempre."

Sai dos seus braços para encontrar Wolverine com o rosto contorcido em uma careta de que claramente não entendeu o que eu falei. Eu ri de sua expressão e ele deu um sorriso pequeno e fez um biquinho, o que me fez rir ainda mais alto.

"Meu nome... Rsrsrs... Meu nome, Ororo é Bela na minha língua nativa."

"Combina com você, Ororo."

"Tempestade, combina comigo ainda mais, sabia?"

Eu sorri pra ele e levantei uma sobrancelha na sugestão.

"Por quê mesmo eu não posso te chamar pelo primeiro nome?"

"Não estou acostumada a você se referir a mim dessa forma. E é uma exceção que guardo para os amigos, entende?"

"Agora você me ofendeu 'o'. Então quer dizer que eu não sou seu amigo?"

"Você é meu colega de trabalho. Ainda não chegamos a um nível que possa ser chamado de amizade."

"E o que é preciso fazer para se tornar amigo da Ice Queen?"

"O quê? Ice Queen?.... Ah, é melhor esquecer. Bom um amigo está com você todas as horas, conversa com você, te anima quando precisa, essas coisas."

"Eu sempre estou nas batalhas com você e estou na mansão o tempo todo."

Eu olhei pra ele com uma sobrancelha levantada.

"Tá bom, não o tempo todo... Quase nunca. Mas eu converso com você."

"Wolverine, as nossas conversas são sempre baseadas em 'oi' ou um aceno de cabeça. Não sei nem se pode se classificar como uma conversa. Acho que essa é a primeira vez que temos uma conversa de verdade."

"E isso já não conta?"

Ele fingiu estar chateado com bastante exagero, o que me fez rir. Em tom de brincadeira continuei:

"Sinto muito, mas não. É fazer coisas como..."

"Como isso?"

Ele então pulou em cima da cama e começou a fazer cócegas, pela minha barriga. Eu mal conseguia respirar direito e era impossível eu tentar sair das suas mãos nervosas, pois toda vez que eu tentava sair ele provocava mais.

"Pa...Para, por favor... hahaha.. Para.. Wolv... Wolv.. hahaha"

"Só se você disser..."

"Ok.. ok... Você é meu amigo agora... haha... Melhor?"

"Bem melhor, O-ro-ro"

Eu ri da sua infantilidade, e depois de alguns momentos recuperando o fôlego percebi que ele ainda estava em cima de mim. Quando olhei nos seus olhos ele estava olhando intensamente para mim, senti minhas bochechas queimarem um pouco e desviei o olhar para encontrar o relógio na cômoda ao lado da minha cama. Arregalei meus olhos e empurrei Wolverine pra longe de mim, quase o fazendo cair da cama e sai em disparada em direção a porta.

"Pelos Deuses! Já são 10:25, estou atrasada para a aula!"

"Ororo, espera!"

"O que foi, Wolverine? Estou atrasada."

"Você realmente vai querer sair assim?"

"O quê você quer dizer com- Oh Deusa! 'o'.."

Eu olhei rapidamente pra mim e não acreditei no que vi, então me virei para o espelho e constatei que realmente eu estava apenas de camisola, ela era longa, porém com um decote bastante generoso. Envergonhada por ter sido o Wolverine que percebeu isso, joguei os braços na frente do meu peito e corri até o banheiro. Depois de dez minutos saí revigorada, percebi que Wolverine ainda estava no mesmo lugar, então corri até a cama e abracei o meu novo amigo.

"Obrigada por tudo, Wolverine."

"Logan."

Eu parei e olhei para ele de volta com um sorriso emocionado no rosto.

"O que foi? Eu não sou tão chato como você, Ororo."

"Quem diria que o bruto do Wolverine pode ser descontraido desse jeito..."

"Não conte a ninguém. Tenho uma reputação a zelar."

Rindo e balançando a cabeça abri e porta e sai em direção as escadas, pronta para retomar minhas atividades.