O Terrorista Íntimo escrita por Lu Rosa


Capítulo 11
Onze




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Cinco meses...

Um casal caminhava a beira mar na tarde que morria. O céu começava a pontilhar-se de pontos brilhantes e alguns banhistas começavam de se despedir da praia.

De vez em quando ela fingia correr dele para que ele a pegasse e rodopiasse com ela imerso na mais livre alegria.

Logo os dois se cansaram da brincadeira e se dirigiam à um barzinho que ficava rente à areia da praia.

Sacudindo os pés, eles entraram e se dirigiram ao balcão.

– Olá, Roberto. Como está tudo por aqui? – perguntou o homem.

– Olá, Sr. Edward. Por aqui está tudo bem. Daqui a pouco recomeça o movimento.

– Está bem. Nós vamos pra casa agora e mais tarde eu volto pra te render, certo?

– Claro, Sr. Edward. Dona Mary, como vai? E o bebê?

– Crescendo, Roberto... Crescendo...

O casal se despediu e saiu em direção ao carro estacionado junto à calçada. Não viram que a Roberto se juntara um outro funcionário e os dois ficaram observando o casal se distanciar.

– Olhe, - começou Roberto – eu estou pra ver casal mais feliz que este. Em cinco meses, eu nunca vi o senhor Sinclair ou a Sra. Sinclair de cara amarrada.

– É.Eu também não. – concordou o outro funcionário. – Lembra dos antigos donos daqui? Só viviam de mau humor, rapaz! Era um povinho muito dos mal encarado, sô.

– Eram mesmo. Mas o casal Sinclair dá gosto de ver. Só o senhor Edward que tem um jeito esquisito de falar... Render... Parece coisa de quartel, não acha?

– É. Será que ele já foi do Exército ou coisa assim?

– Sei lá, rapaz. O que eu sei é que ta começando a chegar gente. Simbora trabalhar, rapaz.

– Simbora.

Os dois rapazes não sabiam o quão perto da verdade eles estavam...

O casal Edward e Mary Sinclair foi muito bem recebido quando chegaram à pequena cidade litorânea. Despertou um porco de curiosidade inicial por serem americanos, mas a felicidade do casal era tanta que eles foram aceitos quase que instantaneamente.

Mas era entre as paredes do quarto do casal na casa confortável em que viviam que Edward e Mary Sinclair se tornavam Michael e Lisa Smith.

– Eu adoro a espontaneidade dos brasileiros. Apesar dos problemas eles sempre estão alegres. – declarou Lisa colocando a bolsa sobre a cama. – Quantos filhos Roberto têm agora? Cinco?

– É. – concordou o marido – Nasceu o quinto semana passada, você não lembra?

– Eu me lembro é de você chegando em casa cantando o hino dos Estados Unidos em alto e bom som. Que vergonha, senhor Smith – brincou ela, apertando a orelha dele de leve, fingindo uma reprimenda.

– Ah, a alegria dele com o nascimento do filho acabou me contagiando. E pensar de daqui a quatro meses, será a minha vez...

– É. Eu estou tão ansiosa... Mas estou me sentindo tão pesada... – lamentou-se olhando no espelho.

Michael aproximou-se dela, segurando-a pelos ombros.

– Você está linda, meu amor. Mas não dá mais para escalar árvores usando galhos... – ele piscou maliciosamente.

Lisa lembrou daquele dia fatídico há cinco meses atrás.

– Você acha que eles estão bem? – Voltou-se para o marido.

– É claro. Você não lembra dos jornais?

– Sim, eu lembro. Mas o que diz os jornais é uma coisa, a realidade pode ser outra bem diferente.

– Bem, - começou ele afastando-se – eu sei que eles estão bem.

A veemência demonstrada por ele, fez com que Lisa observasse Michael com mais atenção.

– Sabe, como?

Ele demorou um pouco para responder.

– Eu falei com seu pai, hoje de manhã.

– Michael!

– Está bem, eu sei. Foi arriscado. Mas eu queria que ele soubesse que vai ser avô. Você não?

– É claro que sim. E como estão eles?

– Bem, considerando as circunstâncias...

Lisa se lembrou das manchetes nos jornais do mundo inteiro:

““Jovem heroína morre junto com marido em atentado”, “Pais de jovem casal morto em atentado recebem homenagem póstuma no Congresso americano”, “Condenado por terrorismo morre de doença misteriosa em prisão americana”, somente para citar alguns. Por várias noites, Lisa derramou lágrimas ao lembrar dos gritos das pessoas, enquanto ela, Michael e o agente Collins fugiam pelo subterrâneo de Washington.

Mas a pior lembrança era ter visto a mãe em frente às câmaras de televisão quando seus pais agradeceram todo o apoio da nação.

É claro que, tanto o general Benedict quanto sua esposa sabia que Lisa e Michael estavam vivos e muita gente estranhou quando Arthur e Priscilla não choraram no funeral do jovem casal. Mas muito atribuíram a falta de lágrimas à rigidez militar do general e sua esposa, uma vez que ela também era de uma família de militares.

Lisa somente sentiu um pouco de alegria quando eles chegaram à nova cidade em um claro dia de sol. Do convés do veleiro, Lisa e Michael entraram em contato com a exuberante natureza da pequena ilha.

Como Michael já havia falado antes com o oficial da Imigração conhecido do general, um representante dele os aguardava no cais. Realizada as formalidades e assinado os documentos Lisa e Michael Smith se tornaram Mary e Edward Sinclair.

O mesmo representante encontrou para eles uma casinha simples mais confortável e, como ele estava de partida para Brasília para assumir um novo cargo, Michael assumiu o seu pequeno hobby: um barzinho na praia. Logo o casal Sinclair se tornou a grande novidade da Ilha, se tornando presença obrigatória em eventos e festas.

Um mês mais tarde, a alegria de Lisa e Michael se tornou completa com a notícia da chegada de um bebê. Ele parecia ter ganhado uma nova vida e mimava Lisa de todas as maneiras possíveis. E ela, aos poucos, começou a se libertar dos rígidos ensinamentos do pai e se tornou uma pessoa mais flexível quanto a horários.

Mas Michael sabia que não havia um dia passado naquele paraíso em que Lisa não pensasse nos pais e contrariando todas as normas de segurança mandou uma mensagem para o sogro: “Estamos bem, apague depois de ler”.

Então, periodicamente, e sem que Lisa soubesse, ele começou a mandar fotos dos estágios da gravidez de Lisa para os sogros, sempre com a mensagem “apague depois de ler”.

A alegria do casal Benedict foi imensa. Em face do sofrimento de ficar longe da filha, as fotos enviadas por Michael era um alento na vida deles. Priscilla acabou se arrependendo de não ter ido com a filha e o marido dela para o exílio voluntário, mas ela nunca deixou que o marido percebesse o seu arrependimento, e eles foram levando a sua vida.

Um dia o general Benedict estava particularmente deprimido, pois no dia anterior ele e Priscilla haviam ido ao enterro de um amigo muito querido. O pai de Thomas Sullivan havia adoecido e morrido de uma estranha moléstia que durara apenas alguns dias. O velho soldado era um ídolo para o filho e Thomas estava seriamente deprimido também.

De repente um bip começou a soar do celular do general e ele o pegou para atender.

Era mais uma mensagem de Michael e dessa vez trouxe lágrimas aos olhos da Arthur. Era a foto de um ultra-som 3D que Lisa havia feito no dia anterior e mostrava claramente o rosto do pequenino ser. A mensagem dizia: “É um menino. Vai se chamar Arthur”. O general abriu um sorriso imenso e correu para mostrar para a esposa. Ao chegar à porta da biblioteca, Arthur notou que a esposa falava ao telefone. Ele não teria dado muita importância ao fato se não notasse um tom autoritário na voz da esposa:

– Eu não quero saber de suas desculpas, Dr. Willianson. Se eu não tivesse agido rápido todos teríamos afundado junto com Phelps. Só me faça um favor e me diga que tudo está caminhando corretamente. – Ela aguardou na linha por algum tempo, assentindo algumas vezes. – Ótimo. Isso é muito bom. Não quero saber de falhas novamente. – Delicadamente, ela pousou o telefone no gancho.

O general pareceu naquele instante ter envelhecido cem anos. Sua esposa, a mulher que ele adorava era a líder de toda aquela organização. E, em sua mente, alguns fatos começaram a se encaixar. Sua esposa nunca aceitara muito bem a vitória do atual presidente, ainda nas prévias do partido. E embora tenha dito que votara no presidente eleito, com ele próprio havia feito, Priscilla fora bem discreta ao comemorar.

Neste momento sua esposa o viu parado no corredor:

– Querido, você já chegou! Por que não me chamou?

Ele agradeceu aos céus por ser um veterano de guerra, pois só assim ele pôde olhar para ela e dizer com voz embargada:

– Olhe o que chegou... – E mostrou a foto para ela.

Os dois choraram juntos: Ele, de tristeza, pela pior descoberta que já fizera em toda a sua vida. Ela, de alegria, na certeza que Lisa estava bem e feliz, completamente ignorante de suas ações.

Lisa chorou também ao ter conhecimento das atitudes de Michael em relação aos pais dela. Ele podia simplesmente, em nome da segurança deles, não dar estas noticias aos seus pais. Mas, para tornar a vida dos velhos mais feliz, mandara as fotografias.

Certo dia, o bebê mexia-se com mais freqüência em sua barriga. Lisa atribuiu o fato ao desenvolvimento do bebê, mas não comentou o fato com Michael. Então ao chegarem a casa, Lisa foi se refrescar antes do jantar e Michael começou a assistir o noticiário noturno.

Ao tirar a nécessaire da bolsa, Lisa viu um envelope dobrado dentro do bolso interno da bolsa. Era a sua favorita e a única que havia trazido de sua antiga vida. O envelope estava endereçado a seu pai e ela lembrou-se de que nunca havia entregado a carta de John Phelps à seu pai.

Dando de ombros, ela começou a procurar uma roupa confortável para vestir quando Michael a chamou.

Voltando para a sala, ela perguntou:

– O que foi querido?

– Amor, olha só o que estão dizendo.

Ela sentou-se ao lado de Michael e prestou atenção as palavras do jornalista:

– “Uma nova espécie de gripe está assolando toda a América do Norte. Já são 800 casos confirmados da chamada Influenza A. 40 mortes já ocorreram nos Estados Unidos. A mais recente no Condado de Arlington, Estado da Virginia. Um ex militar de 75 anos chamado Edward Sullivan. O governo dos Estados Unidos já pesquisa uma vacina desde que os primeiros casos foram confirmados no México. O medo de uma epidemia começa a tomar conta dos habitantes. Uma corrida descontrolada às farmácias atrás do único medicamento capaz de combater essa nova gripe, faz com que as autoridades de saúde exijam a completa retirada dos medicamentos e o envio dos mesmos para os centros de atendimento à população”.

Uma idéia começou a se formar na mente de Lisa e ela correu de volta para o quarto. Pegando a carta de John Phelps para seu pai ela começou a ler:

“Arthur, talvez o que mais temêssemos aconteceu. Meu irmão se juntou a um grupo extremista de centro-direita e eu descobri planos deles de espalharam um novo vírus à população para causar uma epidemia. Como você sabe, meu irmão é um infectologista brilhante e se há alguém que pode fazer isso é ele. O novo vírus seria um mutante do vírus da gripe e aparentemente imune às vacinas já fabricadas. Estou lhe enviando um relatório onde eu detalhei tudo. Desde os envolvidos até os planos elaborados e suas principais conseqüências. Espero que ainda haja tempo para deter estes terroristas íntimos que querem derrubar o maior símbolo de liberdade e igualdade que este país já conseguiu: o governo do nosso atual presidente, um afro-americano. Não podemos deixar que a intolerância destrua os ideais de liberdade e igualdade que nossos antepassados lutaram e morreram para defender.

Seu irmão,

John Phelps.”

Lisa não ignorava que Phelps era um Maçon. Ela só não esperava que seu pai também fizesse parte dessa sociedade. Mais uma descoberta que ela fazia da personalidade do pai.

Com lágrimas nos olhos, ela voltou lentamente para a sala e entregou a carta para Michael sem nada dizer.

Quando ele terminou de ler a carta, ficou um bom tempo fitando o vazio e ela buscou o abrigo seguro de seus braços e se aninhou em seu peito largo. Movidos pelo mesmo sentimento, os dois colocaram as mãos sobre o ventre de Lisa, olhando-se com amor.

Todos os ensinamentos e dissabores que a vida lhes dera os tornaram fortes para todos os desafios. Eles enfrentaram e venceram, não importando os que ainda teriam pela frente.

FIM


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Notas finais do capítulo

Queridos, espero que vocês tenham gostado. Este romance tem uma continuação chamada A Conspiração das Sombras que ainda está em andamento. Assim que der, eu postarei a continuação da história de Lisa e Michael. Um abraço.



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