O Terrorista Íntimo escrita por Lu Rosa


Capítulo 1
Um




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Lisa Benedict começou aquele dia como ela sempre começava os outros. Exatamente as sete e trinta e cinco ela atravessou o hall de entrada da empresa onde trabalhava em direção aos elevadores que a levariam ao trigésimo andar. Onde se localizava os escritórios da diretoria da Phelps Farmacêutica.

Chegando lá, ela se dirigiu ao seu vestiário, onde trocou os sapatos de salto baixo, pelas sandálias de salto alto. Arrumou o lenço em volta do pescoço e ajeitou uma mecha de cabelo que escapara do coque na nuca.

Embora só tivesse trinta anos, Lisa se comportava como se tivesse quarenta ou cinqüenta anos. Ela era uma das últimas a sair do escritório, não se reunia para almoçar com os colegas, nem era vista na sala de café batendo papo com as outras secretárias. Um drink no final do expediente de sexta feira era inconcebível. Era só trabalho e trabalho.

Filha e neta de militares, a pontualidade pra ela era sagrada. Eram vários os pretendentes recusados apenas por uma questão de atraso em um almoço ou em um encontro. O que deixava sua mãe desesperada e seu pai orgulhoso.

Por ser tão metódica, ela realmente estranhou quando, ao passar em frente a sala de seu chefe, ela reparou na porta entreaberta e na presença de alguém na sala.

“Será que o Sr. Phelps deixou algo pendente ontem?” pensou Lisa, olhando pela fresta.

Qual foi a sua surpresa ao ver os irmãos Phelps discutindo:

– Isso é errado, Lionel! – dizia John Phelps, o mais velho. – Suas atitudes só me darão dor de cabeça com o governo.

– Você não sabe o que está dizendo, John. –retrucou Lionel – Eu autorizei essas pesquisas, porque sabia que nos daria muito lucro. Eles vão nos pagar muito bem.

– Eles, quem? A Al-qaeda, o Taleban? Por que só eles estariam interessados em algo assim! Isso é traição, Lionel.

– Só será traição, se o governo souber.

– Eu sei. E é o que importa. Isso vai acabar já. – Determinou John, pegando no telefone. – Você é meu irmão, mas eu não vou ser acusado de alta traição.

– John, por favor, não faça isso! Eu vou para a prisão, se não pegar a pena de morte por isso. – implorou Lionel.

– Você vai cancelar as pesquisas? - perguntou John

– Vou sim. - respondeu Lionel, cabisbaixo.

– Ótimo. Você sempre foi um bom rapaz. Diga aos seus contatos que a pesquisa não deu certa e que você lamenta, mas não poderá ajudá-los mais. – John levou-o até a porta.

Lisa apressou-se em direção à sua mesa.

Assim que saiu da sala do irmão, Lionel sacou o celular o celular do bolso do paletó e discou um número.

– Ele não aceitou como você disse. Vamos resolver isso hoje. – Ele aguardou por alguns minutos, como se alguém estivesse falando. – Você já fez isso antes, não vou me meter em seus métodos.

Lisa não soube dizer por que, mas aquela frase lhe causou um arrepio.

Assim que terminou de dar o telefonema, Lionel saiu sem ao menos olhar na direção de Lisa.

Ainda pensando no que havia ouvido Lisa assustou-se ao ouvir o sinal do interfone.

– Pois não, Sr. Phelps?

– Lisa, você poderia vir até a minha sala, por favor.

– Pois não, Sr. Phelps.

Lisa entrou na sala dele, cautelosamente.

– O que deseja Sr. Phelps?

– Lisa, feche a porta e venha até aqui.

Lisa fez o que lhe foi pedido e aguardou.

– Lisa este envelope contem alguns documentos que eu não quero que fiquem no escritório. Você poderia levá-los para sua casa?

Lisa franziu o cenho. – Para a minha casa, senhor?

– Sim. Tenho certeza que eles ficarão mais seguros lá.

– Mais seguro do que em um cofre no banco, senhor?

– Não confio mais nos bancos, Lisa. Como sabe, eu não tenho cofre particular em nenhum banco. Todos os documentos da empresa são levados pelo jurídico e somente os presidentes têm autoridade para abrir o cofre da empresa. Mas estes são documentos particulares e eu não quero que meu irmão tenha acesso a esses documentos.

– Bem, sendo assim – Lisa pegou o envelope – eu fico com eles.

No exato momento em que pegou o envelope, Lisa sentiu novamente um arrepio.

– Obrigado, Lisa. Você me tirou um peso das costas.

“É claro, Sr. Phelps. O senhor transferiu o peso para a sua escrava.” pensou Lisa.

A verdade é que John Phelps precisava da metódica Lisa. Ele a observara muito nos últimos meses, desde que descobrira as ações ilegais do irmão e sabia que podia contar com sua lealdade.

De posse do envelope, Lisa voltou para a sua mesa, tentando colocar as idéias em ordem para começar o seu dia.

E ela nem tinha idéia de como seria um longo dia.

Ainda assim, John Phelps não estava tranqüilo. O que descobrira a respeito das ações de seu irmão, já há alguns meses lhe tirara o sono. Não era segredo pra ninguém que Lionel Phelps queria a presidência absoluta da Phelps Farmacêutica e que tudo faria para isso. Então quando John descobriu que seu irmão estava negociando armas biológicas, ele tomou algumas providências junto a alguns conhecidos.

Lionel não sabia, mas a discussão de antes fora somente uma encenação de John. Ele queria ter a certeza que seu irmão não era o traidor que ele havia descoberto. No fundo ele queria que seu irmão se arrependesse que agisse de acordo com os valores impostos pelo pai, o fundador da empresa, que dissesse que agira por um impulso de auto-afirmação. Mas não, a cobiça pelo posto de presidente e pelo dinheiro foi mais alta e Lionel vendeu sua alma ao diabo.

E sabendo dos detalhes das ações de Lionel, ele sabia que havia colocado sua secretária em perigo. Sabia que Lisa morava sozinha, que não vinha de carro ao trabalho que caminhava cerca de três quarteirões e, em Washington, três quarteirões era uma distância relativamente longa.

Até que suas providências surtissem efeito, Lisa iria precisar de uma companhia discreta, mas eficiente.

Buscando na agenda do celular, ele localizou o número de Michael Smith.

Incessantemente, o olhar de Lisa posava na gaveta onde colocara o envelope que John Phelps lhe dera pela manhã. Seus nervos estavam à flor da pele, como se estivesse aguardando algo. Mas, de acordo com seus princípios, ela estava desempenhando suas funções como sempre.

Mas aquele dia não estava sendo um dia comum. Inexplicavelmente calmo. Como numa tempestade, quando o ar pára e há aquela calmaria antes que ela desabe.

Lisa não saiu para almoçar naquele dia. Contrariando uma de suas regras, ela abriu o envelope.

O que ele continha a deixou aterrorizada. Era muito pior do que ela supunha. Armas biológicas, ataques terroristas a empresa, assassinato... Era absurdo demais. Ela não podia crer que um cidadão americano como Lionel Phelps podia se prestar a tais atitudes.

Mais uma vez o bip do interfone tocou, tirando Lisa de seus pensamentos.

– Pois não, Sr. Phelps?

– Lisa, eu estou esperando uma pessoa chamada Michael Smith. Quando ele chegar anuncie-o imediatamente, sim.

– Claro Sr. Phelps. Como quiser.

– Obrigado, Lisa. Ah, antes que eu me esqueça, Você tem ido visitar seus pais ultimamente?

– Meus pais, senhor?

– Sim.

– Estive com eles no feriado de Ação de graças, senhor.

– Ah. Antes de ir embora, você poderia pegar uma carta para levar ao seu pai. É importante que ele receba esta carta ainda hoje.

– Hoje, senhor? Mas já são quatro horas. Eu não poderei voltar a tempo de trabalhar amanhã.

– Não tem problema. O importante é que ele receba esta carta hoje. Junto com o envelope que lhe dei.

– Senhor, eu posso falar com o senhor por um instante?

– Claro Lisa. Pode vir.

Lisa pousou o fone no gancho e foi até a sala de John.

– Sr. Phelps, o senhor me entregou este envelope pedindo para guardá-lo em minha casa e agora o senhor pede para eu leva-lo até o meu pai. – Lisa estava muito agitada. – Como o senhor conhece meu pai e porque ele tem que receber este envelope? - perguntou, esquecendo-se completamente da hierarquia.

– Lisa, seu pai e eu nos conhecemos no Exército. Trabalhávamos para o Pentágono. Ele na estratégia e eu na inteligência. Quando eu herdei o comando da Phelps Farmacêutica, sai do Pentágono, mas nossa amizade continuou. Foi por amizade a ele que lhe dei o cargo de minha secretária.

“Não adiantou de nada minha graduação em Administração”, pensou Lisa.

– E o que meu pai vai fazer com os documentos deste envelope?

– Nesta carta, eu explico tudo para ele.

Neste momento, Lionel entra na sala, dizendo:

– Ah, John... Oi, Lisa, como vai? – seu olhar se detém no envelope nas mãos de Lisa – eu esqueci a minha agenda. Você vai embora agora?

– Não ainda tenho que dar algumas orientações à Lisa. Porque você não vai à frente.

– Tudo bem, eu posso esperar você.

Sentindo o ambiente um pouco carregado, Lisa pediu licença e andou em direção a porta da sala.

– Não se esqueça do que nós conversamos. Lisa. E dê lembranças minhas aos seus pais.

– Sim, senhor. Eu as darei.

Quando Lisa voltou à sua mesa, um homem alto e magro esperava de pé na sala.

– Pois não, posso ajudá-lo?

Quando o homem olhou para Lisa, ela sentiu algo inexplicável. Ninguém nunca a olhara com tanta intensidade. Havia algo de felino no homem.

– Sou Michael Smith.

– Ah, sim. O Sr. Phelps vai atendê-lo agora.

Lisa pegou o interfone e avisou John da chegada de Michael.

– Ele pediu para que entrasse. Por aqui. – Ela bateu na porta e a abriu.

Quando ele passou por ela, ela novamente sentiu um arrepio. Mas não igual aos outros.

Quando Michael Smith recebeu aquele telefonema, sabia que aquele trabalho não era como os outros. Ele sabia de onde John Phelps vinha e que ele esperava dele. Mas a natureza da missão o surpreenderia. Essa missão mudaria sua vida para sempre.

– Sr. Phelps.

– Sr. Smith. Por favor, sente-se.

Não passou despercebido à Michael, o exame minucioso a que foi submetido pelo outro homem que também estava na sala.

Sentindo isso, John apressou-se em fazer as apresentações:

– Sr. Smith, este é meu irmão Lionel Phelps.

Para Michael, um aceno de cabeça já era suficiente como cumprimento. Ele era um homem de poucas palavras.

– Lionel, você poderia nos dar licença. Tenho alguns assuntos a tratar com o Sr. Smith.

Lionel disfarçou bem a sua irritação e assentiu:

– Claro. Vejo você mais tarde. Vou até a minha sala.

Já em frente da mesa de Lisa, ele perguntou:

– Lisa você sabe que é esse senhor que está com meu irmão?

– Não senhor.

Ele pareceu pensativo por alguns instantes.

– Sujeito estranho, não?

Ele realmente não conhecia Lisa, se queria tirar dela alguma informação.

– Não sei senhor.

Vendo que não conseguiria nenhuma informação, ele começou a sair. – Ah, Lisa, - disse ele voltando-se – meu irmão não deixou com você algum documento para eu assinar. Ele disse que estaria dentro de um envelope pardo. Você não o viu por ai?

– Não senhor. Mas vou perguntar por ele assim que puder.

– Não, não precisa. Talvez eu tenha deixado este envelope na minha mesa.

Lisa sabia muito bem a que envelope ele se referia.

– Está bem, senhor.

Lisa agora estava muito preocupada. Subitamente ela tomou uma decisão. Iria digitalizar todo o conteúdo do envelope. Olhando para o relógio de pulso, ela viu que não teria muito tempo, então começou a agir.

Numa empresa como aquela, todos os funcionários eram observados. Se ela saísse de sua sala com aquele envelope, em dois minutos Lionel saberia que os documentos estavam com ela o tempo todo e ele poderia acionar a segurança. Então ela resolveu usar a sala de reunião, pois era a única que não tinha “olhos” e que ela tinha total acesso.

Em poucos minutos, todo o conteúdo do envelope estava dentro do computador e sendo copiado para um disco. Revisando todo o disco para ver se não se esquecera de nada, ela apagou os dados do computador. Voltando para a sua sala, Lisa dedicou-se a destruir todos os documentos com exceção da carta ao seu pai. Pegando um maço de papéis ela o colocou dentro do envelope pardo. Depois, pegou o disco, fez mais uma cópia e colocou um deles em um estojo de maquiagem. O outro ela colocou dentro de um estojo. Feito isso, ela suspirou aliviada.

Ela não sabia se agira certo, só tempo lhe diria.


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