Losing my Humanity escrita por Jae Renald


Capítulo 24
Cap.23 — Conscience


Notas iniciais do capítulo

sim, dois num dia, de nada u-u



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Abro os olhos devagar, deixando- os se acostumar com a luz do ambiente. Dou uma breve checada ao redor, tentando entender onde estou.

Vejo muito verde, árvores frondosas, flores coloridas tomando parte do chão, como um belo tapete. O céu está límpido, um tom de azul que se assemelha a cor dos meus olhos. Ao longe, no alto das árvores, ouço o canto afinado dos pássaros, e observo borboletas de todos os tamanhos voando graciosamente ao meu redor.

Estou deitada na grama fofa, e a temperatura é tão agradável, o ar tão fresco, que desejo poder ficar desse jeito pra sempre. Me levanto devagar, e observo minhas próprias roupas: um vestido branco suave , de tecido gostoso e bem confortável, pés descalços e os cabelos soltos.

Não sei bem o que fazer, não é o tipo de lugar que faz você questionar profundamente aonde você esta, ou como chegou lá. Tudo parece transmitir paz. Apenas por uma parte mais distante do bosque, uma área onde as arvores estão inclinadas tristemente, seus galhos retorcidos, o céu escuro acima delas, o chão terroso e lamacento, poderia quase dizer que é um lugar perfeito.

Fico caminhando como uma boba, reparando nos detalhes, até que ouço um latido vindo dentre as árvores, e vejo um filhote de beagle correndo em minha direção. Ele tem a língua pra fora, e o rabinho abana feliz enquanto ele pula em meus calcanhares e começa a me lamber gentilmente.

—D’artagnan!

Ele late em reconhecimento de seu nome. Me abaixo e o pego no colo, deixando que ele me dê beijinhos de cachorro.

— O que? C- Como... Você? Oh, céus, estou falando com um cachorro.

“Um que deveria estar morto”, penso. D’artagnan foi meu bichinho de estimação quando eu tinha seis anos, minha mãe deu a ideia do nome, já que eu gostava tanto dos três mosqueteiros. Eu nunca soube muito bem o que houve, já que eu era muito pequena, mas D’artagnan tinha ido para “o céu dos cachorros” a pelo menos 11 anos atrás.

Mas ele parecia bem vivo agora, um filhotinho brincalhão como me lembrava dele. O ponho cuidadosamente no chão, e ele começa a brincar ao meu redor.

— É uma boa lembrança — me ouço dizendo por um momento. Exceto que eu não disse absolutamente nada. Mas tenho certeza que foi minha voz o que eu ouvi.

Me viro na direção da voz, e não sei bem como reagir. Eu estou parada na minha frente.

— Você... Você, e-eu...

— Você é tão boa com as palavras que me dá vontade de chorar — a outra Julie responde, me analisando dos pés a cabeça.

Ela parece tão bonita! Um vestido azul marinho perfeitamente ajustado ao corpo, o cabelo bem preso num penteado elegantemente trançado. Brincos pequenos e redondos de labradorite, sapatos de couro preto com saltos largos, os olhos brilhando com um azul-cinzento intenso. Ela parecia comigo. De algum jeito eu sabia que ela fazia parte de mim. Mas era sem dúvida uma mais impaciente e carrancuda, além de bela, versão de mim.

— O que é você? — consigo finalmente perguntar, a voz saindo mais firme do que esperado.

— Sou sua consciência — ela diz, virando os olhos impacientemente — Você tem me ignorado tanto ultimamente, que não tive alternativa. Tive de te trazer.

— Uh, certo — digo, um tanto sem graça — Onde exatamente é aqui?

— Sua mente, claro. Você tinha de ver o quão decadente esse lugar anda ultimamente.

— Parece tudo bem pra mim — digo, dando uma pequena olhada ao meu redor. D’artagnan ainda brinca, fuçando nossos pés e tentando pegar uma das borboletas que pousa no seu focinho.

— Porque você obviamente está ignorando aquela área ali — ela aponta para o lugar de árvores tristes — Como você faz com tudo de errado eu te acontece. Você ignora.

— Eu não... — minha voz morre antes que possa concluir minha desculpa. Ela é eu, minha consciência. Como poderia esconder qualquer coisa?

— Você, sim. Vamos lá, você precisa entender o que está acontecendo.

Ela me pega pela mão, seu toque quente contra minha pele. Estremeço, e ela parece notar, mas apenas começa a caminhar mais rápido, me segurando mais firmemente. Travo quando noto que estou sendo levada para a parte escura da clareira. Julie Consciência se vira um tom urgente em sua voz:

— Vamos, não temos muito tempo!

— Eu não quero ir, me mande de volta!

— Tudo bem, me escute com atenção. Isso tudo — ela faz um movimento abrangente — É sua mente. Onde estamos indo agora é onde você tem reprimido tudo o que vem acontecendo com você. Nunca havia acontecido quando você era humana. Você precisa ver, pra encontrarmos uma solução.

Respiro fundo, e sem responder, começo a caminhar na direção das árvores tristes.

Logo na entrada posso ver pequenos objetos no chão, quebrados, como minha primeira bicicleta, um colar que eu gostava e disco de bandas que nem ouço mais. Quanto mais adentramos no bosque, os objetos parecem ficar mais pessoais, como meu diário perdido, uma camisa rasgada com marcas de garras, a faca que usei para matar o wendigo que me sequestrou.

Não consigo evitar atrasar o passo. Julie Consciência me puxa mais insistentemente, até que chegamos numa área onde apenas pequena feches de luz passam pelas folhas densas acima de nós. Avisto alguém sentado aos pés de uma árvore, e quando esse alguém se vira eu a reconheço. Foi a garota que me atacou, a garota que eu devorei. Ela tem o capuz sobre o rosto, e quando me encara, sua expressão é vazia.

Dessa vez eu agarro a mão da Julie Consciência com força, e ela retribui, me forçando a continuar. Vejo o homem do beco, que eu matei e tornei minha primeira vítima. Seus olhos encontram os meus, mas parecem tão vazios quanto poços rasos no deserto.

Continuamos, até avistarmos um rapaz, com roupas sujas e esfarrapadas, com cabelo comprido bagunçado. Fico parada sem saber o que sentir, até que ele se vira em minha direção.

— Carter.

Ao contrário dos outros, quando seus olhos se encontram com os meus há reconhecimento ali. Ele sorri fracamente, e corro até ele, hesitando por um momento, até que ele estende seus braços e me entrego ao abraço.

— Oi Só Julie.

— Como isso é possível? — pergunto, apertando suas bochechas enquanto ele ri.

— E importa? — ele diz, dando de ombros.

— Na verdade não — admito.

Ficamos em silencio por um minuto. Reúno coragem suficiente pra pronunciar as próximas palavras:

— Carter, você está...

— Morto? — apenas consigo balançar a cabeça em concordância, sentindo lágrimas embaçarem minha visão — Não aqui.

— Sinto muito.

— Não foi sua culpa. Você é vitima tanto quanto eu.

— Talvez, mas eu... Eu comi sua carne. Como pode ser compreensivo assim?

— Este lugar é seu. Se você não sente nada, nenhum de nós sente.

O encaro confusa, mas sua expressão permanece a mesma. Me viro, procurando por minha consciência, e ela está lá, o rosto impassível, braços cruzados, com um olhar de “Eu te falei”.

— Quer dizer que desde que me tornei uma wendigo, minha culpa e meus pensamentos obscuros estão reprimidos em um lugar isolado da minha mente?

— Basicamente — ela responde

— E por que seria ruim?

— Eu estou presa aqui!

— Ainda não vejo problemas...

— Você não entende mesmo, não é? Sou basicamente seu termômetro de humanidade. Se estou presa aqui, você não sente culpa, o que te afasta de outras emoções verdadeiras, te tornando um uma animal que age por extinto.

Respiro fundo e tento processar a ideia. Me viro rapidamente, e Carter ainda está lá, a mesma expressão no rosto.

— Mas isso é um sonho, certo?

— Sonho, pesadelo, visão, epifania, chame como quiser — ela diz, balançando os braços no ar, exasperada — O importante é: você entende a gravidade da situação?

Sua imagem começa a tremeluzir, e por um instante tudo fica escuro.

— Rápido! — ela grita — Me diga, você entendeu?

— Acho que sim— respondo também tendo de gritar, enquanto tudo começa a ficar borrado — Mas não entendo, o que devo fazer agora?

— Não é minha responsabilidade — ela responde — Agora é com você!

Me viro a tempo de ver o rosto de Carter assumir uma coloração cinzenta doentia, enquanto sua cabeça cai dos ombros. Eu grito, um vento forte me atinge, e sou jogada de volta à realidade.

***

— Julie! Julie! — Stiles chama, a voz soando desesperada.

Abro meus olhos e bruscamente levanto, buscando ar pros pulmões. No rosto de Stiles, uma expressão de pânico, enquanto ele me segura pelos ombros, tentando me manter estável.

— O que houve? — pergunto entre respirações pesadas.

— Você estava tremendo, seus olhos... — ele balança a cabeça confuso, enquanto parece tentar entender o que aconteceu — Eles estavam completamente brancos. Estava quase gritando seus pais quando você acordou.

— Foi apenas um sonho — respondo pondo a mão em minha cabeça, a sentindo latejar fortemente — Estou bem.

— Não pareceu só um sonho — ele diz, me soltando devagar.

Minha própria voz ecoa em minha mente, e quase posso ver Julie Consciência parada em minha frente, enquanto diz “Agora é com você”.

Respiro fundo algumas vezes, sentindo meus batimentos cardíacos finalmente estabilizarem. A dor de cabeça parece começar a desaparecer, e, quase não tendo coragem, encontro os olhos de Stiles nos meus e digo:

— Pode guardar um segredo?


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Notas finais do capítulo

Tchan Tchan Tchan Tchaaaaaan ....
e ai, o que acharam ?