Dúbia escrita por Wolfie A


Capítulo 22
Capítulo 22




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Dois, três, quatro. Quanto tempo seria necessário até que aquilo chegasse ao fim?

Eu e Thomas chegamos ao hospital. Eu tinha a sensação de que eu parecia com uma cobra que havia há pouco engolido um rato. Meu inchaço na barriga me parecia maior do que devia estar no início do quarto mês. Começava a surgir umas dores nas minhas costas como se eu dormisse no chão duro há meses. Deitei na cama enquanto o doutor falava.

– Como se sente, Estela? Não se sentiu mal depois daquele dia?

– Bem... não. Digo, há essas dores nas minhas costas, mas nada demais.

– É cedo para ter dores nas costas, mas é comum. Bastante comum, na verdade. O bebê deve estar grande. Vamos conferir?

– Doutor, já saberemos sexo do bebê?

– Se o bebê estiver em uma posição que nos ajude, sim, Sr. Clouther. Estamos na décima terceira semana, poderemos ver claramente – ele colocou o gel na minha barriga. Em seguida, o aparelho correu minha barriga, gelado e maciço. A imagem surgiu no aparelho e eu não conseguia distinguir muito. O médico soltou um suspiro, como de surpresa, e pareceu sorrir. – Parabéns pelos bebês, estão grandes e saudáveis.

Meu coração parou e eu comecei a suar frio. Bebês?

– Bebês? – perguntou Thomas, ainda digerindo.

– Gêmeos. São gêmeas, Sr. Clouther. Duas garotas. Isso explica bastante às dores nas costas. Elas não são univitelinas, Estela, o que é algo bom. Gestações de gêmeos univitelinos são mais complicadas. Elas crescem em placentas diferentes e são alimentadas individualmente, cada uma com seu próprio cordão umbilical. Isso significa que o parto normal está em cogitação, embora...

– Parto normal? Doutor, ainda não estou louca – falei suave. Eu não tinha ficado assustada como eu estava agora, com a notícia. Duas crianças de uma vez só. Duas garotas. Mal conseguia lidar com dois irmãos em pé de guerra e agora me eram enviadas duas novas irmãs.

– Duas garotas? – Thomas não se continha. Estava com alguma água nos olhos e um sorriso enorme de lado a lado no rosto. Não parecia se lembrar do detalhe de que as crianças, as duas primeiras crianças do casamento, podiam ter sido roubadas dele. E se não fossem suas filhas?

– Duas garotas. É melhor prepararem o quarto delas.

O quarto delas. Como eu não tinha pensado em tudo isso antes? Levei a gestação como uma novidade comum e me esqueci dos enormes detalhes que aquilo tinha. Ainda não tínhamos informado a ninguém sobre a gravidez. Thomas insistira, mas Frank fez sua cabeça a manter a gravidez entre eles até que confirmassem o sexo da criança. Percebi que eu estava apavorada. Meu coração palpitava, mas em resposta eu sorria porque de certa forma eu não conseguia ignorar a felicidade de estar gerando vidas, agora no plural.

O médico limpou minha barriga com uma toalha e eu voltei a descer a blusa, agradecendo, marcando a próxima consulta e recebendo conselhos para a dor nas costas. Recomendou-me passar um dia por mês em um spa relaxante. Thomas disse que faria o possível para me garantir aquilo, mas eu só agradeci o conselho.

– Obrigada, até.

Thomas marcou um jantar de família, convidou os seus pais e os meus pais, contratou alguém para nos servir durante o jantar. Pus meu vestido de veludo negro, amarrei meus cabelos prateados em um rabo de galo alto com uma fita de cetim azul escura, calcei minha bota de salto quadrado e cano baixo e enchi meus dedos de anéis, como eu gostava. A aliança continuava ali, em seu símbolo de infinito. Minhas unhas estavam pintadas de cor de areia, foscas. O veludo acentuava o inchaço na minha barriga, deixando claro que eu não estava na minha forma normal. Coloquei um casaco para tentar amenizar a barriga. Funcionou.

– Olá – eu dizia, abraçando meus pais e os pais de Thomas com ternura. – Como vão? Sentem-se, por favor.

Frank chegou mais tarde, em um terno grafite e o galanteio que um dia tivera, como na primeira vez que o vi.

– Olá, Frank – eu disse, da mesma forma que havia dito antes. – Como está? Por favor, sente-se. Como vão os negócios?

– Bem. Thomas e eu conseguimos recuperar grande parte das ações, estamos conseguindo recuperar consideravelmente nossa área na empresa.

– Fico feliz – e eu realmente ficava. Dei meu sorriso, caminhei por entre as cadeiras e me sentei.

– Seus cabelos estão lindos, Estela – falou a mãe de Thomas, tinha um brilho intenso nos olhos e eu pude ver que eram de orgulho. – Como fez para ficar com eles tão naturais?

– Eles são assim, Marta. Nasci com essa despigmentação natural nos cabelos, mas eu sempre foquei em mantê-los tingidos.

– Eu sempre avisei para Estela que seus cabelos eram lindos. Ela tinha algum complexo com eles – falou meu pai, sorrindo para mim.

– Ah, crianças. Frank tinha medo de trovões – ela falou entusiasmada. Era uma mulher elegante, mesmo com idade, com volumosos cabelos mel e uma pose bonita. – Fomos um pouco duros com ele porque ele queria correr para nossa cama, mas depois de um tempo ele superou.

Frank estava ruborizado pela revelação. Não superou, não, eu pensei. Ninguém supera o medo com dureza. Sorri.

– Estela tinha medo de aviões – revelou minha mãe. – Nunca disse que tinha, mas sabíamos. Sempre foi uma garota forte.

– Thomas sempre foi focado. Muito concentrado, aumentou os lucros da empresa surpreendentemente. Temos filhos de ouro e dou graças por Thomas ter casado com uma mulher tão inteligente e bela. Eu tinha medo que fizesse coisa errada ao se casar, mas escolheu muitíssimo bem – confidenciou o pai dos irmãos. Minhas bochechas doíam de tanto sorrir, mas o sorriso era verdadeiro e sincero. Eu me sentia agradecida.

– Bem – disse Thomas em um tom alto e forte, ficando de pé. – O motivo do jantar em família é uma novidade. Estela e eu estamos esperando uma criança.

Pensei que ele levaria o assunto devagar, mas foi direto. Segurou na minha mão e me pôs de pé e então me beijou. Senti como se aquilo fosse um aviso pessoal para Frank, que pareceu ficar embaraçado e enciumado com aquilo. Depois houve uma pequena ovação, minha mãe tinha os olhos cheios de água e a mãe de Thomas sorria tanto que pensei que fosse alcançar as orelhas. O pai dele atravessou a mesa e deu um abraço caloroso no filho e deu os parabéns. Minha mãe me abraçou com força e sentiu a minha barriga e chorou ainda mais.

– Já está redondinha – comentou, fazendo os olhos todos caírem em mim. – Quantos meses?

– Quatro. São duas crianças, não uma – afirmei. – Duas meninas.
Houve mais uma ovação de felicidade. Frank se levantou e abraçou os pais rapidamente, depois o irmão, me parabenizou, se despediu de meus pais e foi embora.

– Tenho um compromisso, fico feliz por vocês – falou, mas não parecia nem um pouco feliz. Ignorei aquilo e segui com os abraços e os comentários, as avós comentando sobre nomes e os avôs prontos para mimar as garotinhas. Eu as imaginava tão doces e graciosas, minhas meninas, e então me lembrava de que uma vida não pode ser planejada e que eu era a maior prova disso. Eu tentava me libertar de planos para serem quando crescessem, de famílias a constituir, de tudo aquilo que não estava ao meu alcance. Eu só sabia que as amaria além de tudo. Eu já as amava. Uma sensação terna de amor incondicional que me corria nas veias e me fazia feliz só de imaginar os dois projetos de pessoas em mim.

– E os nomes? – perguntou o Sr. Clouther, feliz. – Quais serão os nomes das princesinhas?

– E a casa, Thomas? – perguntou a mãe. – Esse apartamento é muito pequeno para duas crianças. Você não está pensando em pegar um dos quartos de hospedes e transformar no quarto das garotas, não, está?

– Bem, eu acho o apartamento razoavelmente grande – comentou minha mãe.

– Eu devo concordar que não é pequeno, mas é pequeno para duas crianças.

– Mãe, vamos olhar uma casa com um grande jardim em breve.

– Thomas, ela já está no quarto mês! Isso tem de ser feito já, querido.

– Qual o problema com o apartamento? – perguntei.

– Ora, querida, as meninas vão precisar de espaço para crescerem, vão precisar de cuidados. Aqui é agradável para um casal, mas não para um casal com filhos.

– Sua mãe está certíssima, Estela. Thomas deve preparar uma casa. Quer ajuda na escolha?

– Mãe, tenho certeza que Estela saberá escolher a casa. Olhe só para ela, ela nasceu para reger.

– Agradeço o elogio, Thomas, e eu realmente adoraria escolher tudo por conta própria, mas um bom palpite dos nossos exemplos de mãe seria incrivelmente bom.

– Ah, ótimo. Vou sentar com a sua mãe e vamos falar sobre as crianças.

– Eu quero saber dos nomes, querida. Quais nomes você pensa em dar para as minhas princesas? – o pai de Thomas parecia o mais entusiasmado com a ideia das netas. Meu pai também estava, mas sabia que ainda estava alguns meses distantes o amor que teria por elas.

– Pai, Estela e eu ainda não decidimos. Estamos pensando em Amy e Rose, mas ainda não é certeza.

– Amy e Rose. Já senti uma enorme empatia pelos nomes. Vamos deixá-los.

– Mãe, isso nós que decidiremos – falei suave.

O jantar seguiu regado de perguntas e ordens para como tratar as meninas. “Elas precisam de mais espaço. Elas precisam de um enxoval. Não deixem tudo para última hora. Elas vão ser lindas! Qual será a cor dos olhos delas?” Comi feliz o bacalhau. O vinho era seco, mas delicioso. Cuidei para não tomar demais.

– Obrigada pela visita. Mantenham contato, devemos marcar mais jantares como esses.

– Claro que devemos – afirmou a Sra. Clouther. – De preferência um que Frank não esteja ocupado. Tenho certeza que está muito feliz com as sobrinhas. Até mais. Fiquem bem, amores. Estela, as filhas vão ser lindas. Eu até quis ter uma menina, mas dois filhos eram o suficiente.

– Vamos, Marta. Depois você conta para Estela sobre meu sonho de ter tido uma menininha. Ah, mas agora terei duas! – disse o pai de Thomas enquanto iam embora.

O silêncio que o apartamento ficou depois que todos foram embora foi ao mesmo tempo acolhedor e devastador. Apalpei minha barriga e falei baixinho com as minhas meninas. “Mamãe não vai sair inteira disso, queridas, mas nada ferirá vocês”. Pensei na saída brusca de Frank e do que aquilo era prelúdio. “Espero que tudo se ajeite”.


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Notas finais do capítulo

Comentem e deixem o feedback. Abraços.



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