Noites de Um Século escrita por Dead Coyote


Capítulo 6
Capítulo 6 - Máscaras




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6-         Máscaras

O vento que entra pela brecha da janela balança a cortina encobrindo o rosto do vampiro. Patric se levanta, fechando o vidro e fazendo a cortina acalmar-se de volta ao seu lugar sobre o criado, quase o tocando. O homem se posta ao lado de Ivan, olhando para a rua deserta. O que ele estaria procurando lá fora?

“Então, você será o narrador agora Patric. Veremos seus dotes para contar uma boa história.” Patric não olha para Ivan, sabia que ele dizia aquilo para provocá-lo, voltando a fazer sátira com suas tentativas de escrever roteiros para peças do teatro. O vampiro era mesmo inconveniente quando assim queria. Mas não iria se irritar com aquilo, então desvia o olhar da rua, direcionando-se para os olhos sobrenaturais de Ivan, que já o observava há algum tempo.

"Ivan..."

"Ainda está com febre?" diz, levando o dorso da mão à testa de Patric. O homem estava melhor, a febre abaixara e provavelmente até a próxima noite estaria bem. Os olhos dos dois se cruzam novamente e Patric sente-se aprisionado naquele olhar negro e profundo, como se algo dentro do brilho imortal daqueles olhos o chamassem para um labirinto misterioso. O vampiro escorrega levemente os dedos pela face quente do humano. Os contornos rosados pelo frio da noite pareciam atrair seus movimentos. Detém-se ao tocar seu lábio inferior. Os olhos de Ivan atraindo ainda mais Patric para aquele crivo, tudo ao redor escurecendo, podia ver apenas aqueles olhos.

Mas tudo volta de repente, e Patric sente o rosto úmido de suor, as batidas de seu coração aceleradas, cambaleia para trás e cai sentado sobre a cama. O que aconteceu?

“Não me olhe assim Patric. Pode se perder em um lugar que eu não terei como o traze-lo de volta. Principalmente alguém como você.”

“O que... o que foi isso?”

“Os olhos são o espelho da alma, já ouviu isso? Um ser amaldiçoado, como eu, também tem uma alma amaldiçoada... isso, se tivermos alma, os vampiros.”

O humano o olhava em silêncio, sem saber o que dizer, tentando entender aquilo.

“Então é essa a magia do sobrenatural...”

“Não fale sobre magia como se compreendesse tudo. O sobrenatural tem varias faces Patric.” Falando isso puxa o homem pela mão, levantando-o da cama. “Esqueça isso por agora. Vamos dar uma volta? Já está bem melhor, e precisa de ar fresco. E enquanto isso você aproveita para me contar sobre... suas faces!” Disse isso entoando bem as últimas palavras. Patric não gostava dos trocadilhos e frases prontas desse ser, mas aceita o convite, achando melhor assim do que dar-lhe motivos para mais insinuações. Aliás, não tinha por que se irritar com ele agora.

Caminhavam pela calçada, havia ainda bastante movimento na rua, no início daquela noite. Seguiam sem trocar palavras, apenas observando os transeuntes. A noite estava fria e ventava um pouco, mas não o suficiente para dispersar a neblina que rodeava baixa sobre as pedras do calçamento. Ivan pára, observando um gato caçando entre as ruelas e becos das casas do outro lado da rua. Patric espera-o um pouco mais adiante, mas sem dar atenção ao bichano que já tinha em mira um grande rato cinzento.

“Pode começar quando quiser, estou esperando.”

“Você está impaciente, Ivan...” O vampiro não responde. “É que não sei por onde começar... como se eu não tivesse nada para contar...”

“Comece pelo começo. A vida é sua... aliás... foi só um pedido, se não quiser atendê-lo...”

Mas Ivan foi interrompido pela mão de Patric que tocava de leve sobre seu braço, os olhares se cruzaram e o homem respirou fundo. Começou.

“Minha mãe... ela casou-se muito jovem, com um homem que poderia ser até seu pai. E desse casamento eu nasci pouco tempo depois. Ela não deveria ter mais de dezoito anos, e o parto foi complicado. Mas, ao fim, tudo correu bem, a não ser que possivelmente ela não conseguiria engravidar novamente. Não vou dar certeza, mas conhecendo-a como só eu a conheci, acho que posso dizer que se casou pelo dinheiro do velho e não se importaria em ter ou não filhos.” Ivan vira-se para observar Patric, que olhava para o chão enquanto falava. Sentia que, de alguma forma, relembrar do que passou poderia não fazer bem àquele homem. “Meu pai faleceu quando eu era muito jovem ainda. Não me lembro, mas eu deveria ter pouco mais de sete anos. Nessa época eu já tinha um grande apego por ele. Só não me lembro se ele realmente era alguém certo para ser apegado. Era um bom pai pelo menos. E também não duvido que a morte dele possa ter sido planos de minha mãe, pois não tardou nem ao fim da missa de sétimo dia e ela já mantinha alguns amantes em nossa casa.”

“E você?” recomeçaram a caminhar, e se aproximavam da praça.

“Aprendi a me acostumar com aquilo. Tanto que se tornou normal para mim encontra-la com diversos homens em casa, cada dia um. À medida que eu ia crescendo, passei a freqüentar o teatro, simplesmente para evitar encontrar-me com aquelas pessoas. Enquanto isso ela esbanjava o dinheiro que recebeu como herança, além de limpar também os bolsos daqueles que lhe serviam de companhia.”

“Perece que não tem muitos motivos para gostar de sua mãe...”

“Em algum momento cheguei a dizer que não gostasse dela? Posso não sentir tanto por sua morte.” Encara Ivan. “Mas ela sempre me deu tudo que precisei para viver. E, como disse, me acostumei com aquilo, cresci naquele ambiente...”

“Deu-lhe tudo? Não estaria escondendo que...”

“Que não tinha o amor ou a atenção que queria dela? Não Ivan. Não tinha, mas sabia também como conseguir, pois ela mesma havia me ensinado a chamar a atenção. Ela se mimou, e eu aprendi a ser mimado observando-a.”

Estavam em frente ao teatro. Lá dentro as pessoas já se acomodavam em seus assentos para a peça daquela noite. Provavelmente um drama musical ou uma orquestra.

“Quando eu tinha quinze anos, me envolvi numa discussão em casa, entre minha mãe e um de seus amantes. Um homem jovem, filho de boa família, que ela conquistara facilmente em um baile, provavelmente com intenções de usufruir de seu dinheiro e do nome dessa família. Eu não me dava com ele. Foi um dos poucos com quem eu nunca quis dividir o mesmo cômodo. Desde o primeiro dia não suportei a presença daquele homem em nossa casa. E foi nessa noite, quando eu voltava de uma taberna e o encontrei na sala, bêbado e falando em voz alta, coloquei-me entre os dois, não sabia nem o que estava acontecendo, só queria um motivo, e essa briga foi o que eu tanto esperava. Não posso dizer exatamente como ocorreu, acertei-lhe um soco e ele revidou, me derrubando. Quando levantei foi tudo muito simples. Eu tinha um ferro de lareira em minhas mãos, e ele, o pescoço rasgado, jorrando sangue. Caiu ali mesmo.”

“Matou-o?”

“Sim.”

“E sua mãe?”

“Não disse nem fez nada... Não. Minto. Ela reclamou de manchar o tapete.”

Riram-se, mas logo fizeram silêncio e voltaram a caminhar.

“Ivan... nada disso faz sentido para mim hoje...”

Ele não fala nada, apenas observa, estudando o rosto e o olhar distante do ruivo. Patric poderia não perceber, mas o vampiro sabia que algo por trás daquela história explicava muito mais sobre sua personalidade do que poderia imaginar.

“Essas coisas passavam, e era só mais uma máscara para mim. Foi nessa época que comecei a criá-las, uma a cada situação. Divertia-me fingindo!” pausa. “Bem... mas vamos voltar um pouco, teve algo essencial para elas, para a primeira máscara realmente.”

Patric olhava distante, algumas prostitutas numa rua mais escura. Não tinha expressão no rosto, mas os olhos pareciam sorrir um sorriso frio e cheio de desprezo. Seria por si próprio, por aquelas mulheres ou por sua vida? Continua andando, voltando a olhar para Ivan, o rosto tomando o semblante típico de alguém cansado e sozinho.

“Não lembro como ela se livrou do corpo... fui para o meu quarto sem nem olhar para ela e de lá lembro-me apenas de ouvir a voz da criada assustada, gritando e então ela se calou, minha mãe gritava de volta com ela, mas eu não dava atenção. Em seguida tudo ficou quieto e ouvi passos no corredor. Parou à porta do meu quarto enquanto eu me jogava na cama, como estava. Minha mãe olhou-me dentro dos olhos e saiu. Mas não eram olhos de repreensão. Não sei dizer o que compreendi com aquele olhar dela, naquele momento. Pra mim não interessava, nada interessava. Nos dias seguintes não nos falamos. Não sei quando tempo se passou exatamente, talvez uma semana. Mas ela não levava mais homens para lá, não que eu visse. Foi em uma madrugada de chuva que ela chegou ao meu quarto, com uma vela para iluminar meu rosto. Colocou-a na cabeceira da cama. Limitei-me a observá-la, mas sem nada dizer. Foi ela quem começou o dialogo.”

“’Não os trarei mais aqui. Não preciso mais.’ Ela olhava pela janela.”

“‘Eu nunca disse que eles me incomodavam. Faça o que quiser, só não arrume confusão.’”

“’Patric... o que você acha de mim?’”.

“Ela me perguntou isso enquanto sentava-se na beirada da cama. Eu estava de costas, também olhava a chuva, sem dar atenção para minha mãe, mas de algum modo o que ela disse causou-me uma estranha sensação, um pressentimento. Virei-me. Ela estava nua, a roupa jogada ao chão.”

“’Não quero que meu filho pague prostitutas por algo que nem deve ser chamado de sexo.’ Eu não tinha ação, na verdade estava entediado e a presença dela ali só me fazia desejar cada vez mais que ela desaparecesse.”

“’O que quer, sua doida? ’ Falei virando-me novamente para a janela.”

“’Você já é homem, não finja que não sabe o que quero. Você também quer. Eu sei, sou sua mãe.’ E ela estava certa. Sem perceber eu sempre a desejei. Via seu corpo jovem, as curvas perfeitas sendo tocadas pelas mãos de outros homens. Eu era o dono dela. Era assim que deveria ser. Ela estendia o braço para mim, só naquela noite percebi, esse braço sempre esteve estendido para mim. Agarrei-a e a puxei sobre mim.”.

“Ivan, pode imaginar como eu me sentia? Claro que não! Na verdade eu só vim a pensar o que isso tudo significava alguns anos depois. Naquele momento...”

“Então, você fez...”.

“Fiz sexo com ela.”

“Você não presta.”

Patric pára em frente a Ivan, estava sério.

“Vai me julgar? Eu te disse que não conseguia me importar com aquelas coisas...”

“Você a desejou. Um filho que deseja a própria mãe...”

“Seria melhor então que eu fizesse apenas para agradá-la? Que a odiasse depois e ela a mim?”

“Não deveria ter feito. Isso sim.”

“Ela não era minha mãe. Nunca consegui vê-la como minha mãe, porque ela nunca me tratou como filho. Então não tenho motivos de arrependimento.”

“É estranho, mas essa indiferença com os costumes humanos é o que me atrai em você...” Ivan sorri e dá alguns passos, parando às costas de Patric, que não se virou.

“Não foi só essa vez, Ivan. Todas as noites seguintes, o desejo dela era também o meu. Nunca mais, nos anos seguintes, nos próximos dezoito anos, ela procurou outro amante.”

“Dezoito anos?”

“Não a chamei novamente de mãe. Nunca mais. Ela era Scarlet para mim, apenas Scarlet, minha amante. Assim, não tinha vontade de me casar. Não sei se ela permitiria também. Para mim pouco importava. Apareceram boas pretendentes, mas não me interessavam.”

“O que me distraia quando não estava com ela era o teatro, e quando não estava no teatro, era ela. Foi nessa época que passei a freqüentar aquelas peças mais assiduamente. E comecei a me interessar por elas, o que me fez querer escrever. Acho que o maior motivo dessa vontade pelo teatro você sabe muito bem.”

“Como você não tinha uma vida propriamente sua, preferia inventar outras vidas...”

“E ver pessoas vivendo as minhas farsas.”

“Suas farsas?”

Voltaram a caminhar ao redor da praça.

“As historias que eu criava eram da minha própria falsa vida. Quando eu ia para o teatro era uma pessoa. Quando estava com ela, era outra. Até quando caminhava na rua ou jantava, eu usava máscaras. Até com minha própria mãe. Principalmente com ela... não sei ao certo, mas a tratava no mínimo de três formas diferente. Uma quando estávamos a sós, mas não como amantes, eu a chamava de mãe, conversávamos como uma família, sim. Havia aí um pouco de afeto, mas que não passava de uma característica dessa máscara também, que supria em mim essa vontade de ser querido por alguém, de ter alguém importante. Mas, de repente, se estávamos na presença de alguém, ou caminhando na rua, éramos como uma dama e seu protetor. Ela destacava-se entre as demais pessoas, e eu, ao seu lado, impedia que qualquer um pensasse em se aproximar, fosse dela, ou principalmente de mim. E durante a noite... amantes. Simplesmente isso.”

Olhando através das arvores da praça, parecia admirar o teatro ao fundo. Dando as costas à construção recém reformada, o homem caminha em direção ao vampiro, que estava um pouco atrás e ainda observava aquele local que fazia parte de muitas lembranças de quando ainda era humano. De alguma forma o vampiro percebia que para Patric aquele lugar também tinha algo especial, fosse bom ou ruim. Espera-o se aproximar em passos lentos, os olhos ocultos pela franja longa que o vento desarrumava.

“E o teatro me atraía, Ivan, pois nele eu poderia desabafar todas essas histórias e ver o público me aplaudir como aplaudia as operas.” Um curto silêncio. “Mas nunca aconteceu. Não me aceitavam, as minhas peças, eles não compreendiam...”

Ele se senta em um banco, voltado para o lado do praça oposto ao teatro. Ivan fica de pé ao lado, apenas o acompanhando com o olhar. O vento sopra, balançando aos galhos das árvores, derrubando algumas folhas. Os cabelos avermelhados de Patric tampando-lhe os olhos, movendo sobre seu rosto como se o vento desses-lhes vida própria.

“Naquela noite também.” Olha para Ivan, dentro de seus olhos. “Naquela noite eu estava no teatro.” Ivan desvia o olhar de Patric. “Talvez se não fosse essa fixação que vinha crescendo em mim pelas peças, naquela noite você me encontraria naquele quarto. Se eu estivesse lá com ela, você nos atacaria mesmo assim?”

“Provavelmente não. Eu sabia que ela estava sozinha. Até porque não gosto de me alimentar dentro da cidade.”

“Teve algum motivo para nos escolher? Você já sabia, não é? Já sabia o que éramos...”

“Não.”

“Então por que logo eu depois de tão pouco tempo? Não me faça de besta...”

“Foi simplesmente por você estar no lugar errado e na hora errada. Eu estava nessa praça, nesse banco, e quando vi você saindo do teatro me chamou a atenção. Só isso.”

“Não acredito.”

“Não precisa. Eu nem sabia que você era filho dela. Não gosto de vigiar minhas futuras vítimas. Se eu as conheço demais acabo desistindo, não sei. Escolho ao acaso, simplesmente.”

“Então se eu estivesse lá você não atacaria. Hum... foi uma boa peça aquela noite, não me arrependo.”

Ivan o fita friamente. “Não desejaria mudar isso, não é?”

“Não Ivan. Mas às vezes desejei ter deixado você me matar... mas agora não. Estou gostando dessas nossas noites.”

“Não fale assim. Quem ouvir vai pensar o que?” ri baixo, Patric balança a cabeça, achando graça também. “Vamos, continue.”

“Sim... vamos voltar àquela noite. Tem algo que sempre passa em minha mente, mas ainda não te perguntei. Agora que já sabe quem eu sou, e quem era aquela mulher, me responda. Você percebeu? Quando a matou...”

Ivan fica sério. O olhar preso pela certeza acusadora que emanava dos olhos de Patric, interrogativo. Tenta desviar o olhar, não acreditava que o que o humano queria dizer era o exatamente o que estava imaginando. Aquele instante se paralisou, o silêncio se prolongando infinitamente entre eles. Ivan respira fundo, fecha os olhos. Não conseguiria dizer nada se continuasse encarando aquele humano. Que feitiço foi aquele que esse mortal criou?

“Então você também sabia...”

“Ela não me esconderia nada.”

“Percebi sim, mas compreendi apenas quando ela estava morrendo. Em seus últimos momentos de luta, alguma outra força a mantinha ali. Foi a primeira vez e única até hoje que experimentei algo assim. Foi incrível, mas assustador para mim a sensação de uma mãe morrer e dentro de seu ventre um ser continuar lutando. Dois sangues distintos, duas vidas...” o vento sopra assoviando entre os galhos. “Era seu filho que ela esperava?”

“Sim.”

O sopro forte do vento era o único som audível entre os dois. Nada mais existia ali, não tinha necessidade de existir. O momento poderia ser de tensão, deveria ser. Mas ambos estavam calmos, tranqüilos, como se aquilo fosse apenas frases decoradas de uma cena que ensaiavam em um palco vazio. O vento pára. Até a natureza silenciou-se para ouvir o final da peça.

“Ela engravidou depois de tanto tempo. Imaginava que não poderia ter mais filhos além de mim. Quando ela me disse, foi um susto. Minha máscara de filho caiu, quebrou-se e eu nunca mais consegui remonta-la. Eu seria pai de meu próprio irmão. Estranho isso não é. Mas aceitamos, aliás, a máscara do amante e do protetor ainda estavam inteiras, não é? E eu poderia usá-las eternamente. Facilmente criaria a máscara do pai. Mas...”

“Eu impedi que acontecesse. Eu fui o juiz, que mesmo sem conhecer o crime deu a sentença aos réus.”

“Deixe de metáforas, Ivan. Você a matou. Foi isso. A ela e a meu filho, que ela carregava no ventre já há quatro meses. Você os matou. Não sabia da história e não tem porque se culpar hoje. As minhas máscaras foram se quebrando aos poucos, as que restavam. E quando te encontrei você derrubou-me a última. A máscara do falso protetor, que por não poder protegê-la de você, te odiou. Mas eu, essa máscara, te odiei como o órfão, e não como o amante. Foi ai que eu me perdi. Você atacou a máscara, mas atingiu o ator.”

Os olhares se cruzam mais uma vez, e o vento volta a soprar.

“Você me deu uma chance, pois julgava ter matado meu irmão? Um irmão que eu ainda nem sabia que teria. Não é isso? Ou sabia que eu era o pai?”

“Não sabia. Tive uma estranha impressão, mas você me disse que ela era sua mãe. Logo imaginei que você ainda não saberia da gravidez. Por esse motivo me senti culpado. Tirei a vida de um ser inocente, de seu suposto irmão. Principalmente por isso. Ter matado apenas a sua mãe não seria tão dramático para que eu o poupasse.”

“E agora se arrepende de ter me dado essa chance.”

“Não. Pelo contrário. Estou realmente feliz de tê-lo feito.” O vampiro sorri. Estende a mão direita para Patric a sua frente, ainda sentado no banco. Ele aceita, e pega a mão de Ivan, que o puxa, levantando-o. As mãos dadas. “Você é uma pessoa interessante Patric. Bela história!” Sorri, mas o humano não retribui. O que não incomoda o vampiro. “Vamos indo. Eu logo terei que me retirar e tem algumas coisas que quero fazer ainda. Aliás, está ficando frio demais para você que ainda não está totalmente recuperado.”

O caminho de volta é feito em silêncio. Patric não esperava que Ivan reagisse tão naturalmente. Estranho como às vezes o vê mais humano do que si próprio, aquele vampiro. Mas para Ivan foi apenas mais uma história, das muitas vidas que já conheceu. Diferente, porém, dos demais, aquele humano parecia ter algo tão bem escondido dentro de si que até ele não saberia. E Ivan queria descobrir isso, mesmo tendo dúvidas do efeito que sua companhia poderia causar àquele ser vazio.

Chegam à porta da frente da grande casa. O jardim parecia abandonado, provavelmente Patric não cuidara mais dele após a morte de Scarlet.

“E a criada? Você se esqueceu dela. Ela sabia algo?”

“Não esqueci, ela não fazia importância. Se ela sabia ou não, sei lá. Mas se sabia, era esperta e não se metia onde não devia. Só começou a me irritar depois da morte de minha mãe, aí a mandei embora. Às vezes me arrependo. Gostava da comida dela.”

“Hum... quer que mande Damien novamente amanha?”

“Seria bom... aliás, quem é ele?”

“Filho de uma família pobre, ninguém especial. Eu matei o pai dele há algum tempo. Aí acabei cuidando dele e da irmã. Não os conheço muito bem. Não são ninguém, como disse.”

“hahaha... realmente você se apega mesmo às suas vitimas!”

“Foi o que eu disse...” sorri, dando as costas a Patric e caminhando devagar em direção à rua.

“Se continuar desse jeito não vai consegui me matar depois.”

“Você é um caso a parte Patric. Terei prazer em te matar.” Mentia para si mesmo, suspeitava ao afastar-se. Vira-se de volta, acenando. “Tenha um bom dia! Trarei vinho para você amanhã.” Desaparece nas sombras e na neblina da rua, como se nunca tivesse estado ali. Patric entra. Estava cansado e só agora se deu conta. Deita-se na cama como estava e logo adormece.

O vampiro entrega a bolsa de dinheiro para a garota. Damien dormia encolhido a um canto debaixo de uma velha coberta, no chão. Não fala muito, ela não precisava saber demais, apenas comprar comida que o garoto levaria para Patric de manhã.

Continua a caminhar. Virando uma esquina, Ivan chega ao estreito beco, senta-se na caixa velha e espera. Algo no início da noite o perturbou e agora desapareceu. Mas ele estava certo de que não tinha simplesmente ido embora. Aquela estranha sensação não foi sem motivo. Alguém o estaria vigiando? Ou era aquela data que se aproximava?

Fica ali esperando o tempo passar, as horas se vão lentas e silenciosas. A mente apaga os últimos pensamentos. O céu começa a clarear no horizonte e é hora de retirar-se.


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Notas finais do capítulo

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E então gente? só um review até agora?
O que estão achando até aqui? esse capítulo foi bem inesperado, até mesmo para mim! ^_^
Comentem!

Coyote
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