Let Me Go escrita por Mrs Jones, QueenOfVampires


Capítulo 3
Capítulo 3


Notas iniciais do capítulo

Hello people! Mrs Ruby aqui! Primeiramente, temos que agradecer a Jussara Rogers pela recomendação. Obrigada flor, nós amamos! Agradecemos também pelos comentários, adoramos saber que estão gostando da fic e que ela foi bem aceita. Muitissímo obrigada!
Ah também tenho uma notícia boa para compartilhar com vocês: eu passei no vestibular!!!! Sabem o que isso significa? Capítulos novos toda semana! kkkk Quem lê minhas outras fics sabe que elas estão atrasadas, mas agora vou ter mais tempo pra escrever porque não preciso me preocupar tanto com o Enem. Agradeço todo o apoio de vocês, muito obrigada mesmo por toda força que me deram.
Bom, espero que gostem desse capítulo, nós o escrevemos juntas. Não deixem de comentar. Beijos e até a próxima!



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Capítulo 3

Ela acordou com o barulho de passos pesados batendo no chão de madeira. Killian, Smee e mais dois homens traziam correntes e Ruby não precisou perguntar pra saber o que ia acontecer.

– Prendam os braços dela! – ordenou o capitão e Ruby se levantou de um salto.

– Não! Ninguém vai me prender!

– Você é uma criatura perigosa, todo cuidado é pouco. – disse um dos marujos.

– Eu sei controlar meu lado animal, não vou machucar ninguém – ela encarava os homens.

– É melhor não arriscar – falou o capitão - tenho que zelar pelas vidas de meus homens. Amarrem-na!

– Eu já disse, não vou machucar ninguém. – ela insistia.

O capitão, no entanto, não lhe deu ouvidos. Dominaram a moça e prenderam seus braços e pernas com as pesadas correntes, passando uma delas por seu pescoço pra completar. A coitada mal conseguia respirar. Killian dispensou os homens e se sentou a um canto, ia ficar pra ver a transformação. Ruby, é claro, não gostou nada e ficou encarando o capitão com um olhar mortal.

– Conforme-se, querida, não podemos ter tudo o que queremos – disse ele, indiferente ao sofrimento da moça.

Ela não respondeu. Desviou os olhos e ficou encarando o chão. Sabia que render-se era um sinal de fraqueza, mas se lutasse o capitão se convenceria de que ela era mesmo perigosa. Se ele soubesse o que ela fizera ao Peter... Não, não devia rebelar-se. Devia pensar em seu filho, devia protegê-lo. Ela vira o brilho nos olhos do capitão quando ele descobrira que era humana. Sabia que ela era uma criatura valiosa e faria de tudo pra lucrar em cima dela. Imagine o que faria quando descobrisse aquele bebê crescendo dentro dela...

Quando a lua brilhou no céu, Ruby sentiu o formigamento que antecedia a transformação. Seus olhos assumiram um brilho alaranjado e logo depois seus membros começaram a larguear e crescer. Pelos cresceram por todo o corpo, seu nariz se transformou num focinho, suas orelhas ficaram grandes e pontudas e seus dentes viraram presas. Suas garras arranharam o chão e ela emitiu um pequeno rosnado. Do outro lado do porão, sentado num caixote, Killian estava de boca aberta.

– Que extraordinário! – exclamou, impressionado.

A loba rosnou mais uma vez quando o homem se levantou e fez menção de se aproximar. Embora o rosnado fosse um aviso, Killian o ignorou e se abaixou ao lado da criatura.

– Você é um belo espécime – disse, sentindo a textura de seus pelos negros e lustrosos – vai me render um bom dinheiro...

Ruby gemeu. A corrente em seu pescoço a sufocava e ela ficara numa posição meio incômoda. A proximidade com o capitão em nada a ajudava, já que ela se sentia tentada a atacá-lo, mas ao mesmo tempo atraída por ele. Eles se encararam e Killian teve a impressão de que ela implorava com os olhos. Talvez tivesse sido muito cruel ao tratá-la daquela maneira, prendendo-a como um bicho perigoso, mas ele só o fez por se preocupar com a segurança de sua menina.

Ruby viu um vulto parado à porta do porão. Era uma pessoa de estatura baixa e a moça tomou um susto quando viu que era uma menina. Ela estava meio escondida por trás da porta, tentando dar uma boa espiada no lobo sem que o capitão visse. Killian, porém, deve ter sentido sua presença, porque se levantou e, sem olhar pra trás, perguntou:

– Catherine, eu não mandei você ficar na cabine?

A menina suspirou. Como é que ele sabia que era ela, se nem ao menos a tinha visto?

– Ah papai... – choramingou.

– Vá! - ele foi até a porta, bloqueando o caminho da garota - Já disse que não deve ficar passeando pelo navio.

– Já estou cansada de ficar na cabine – ela respondeu, encarando o pai – E, além disso, eu queria ver o lobo.

– Isto não é coisa pra criança. – o homem disse gentilmente - Está tarde, hora de ir pra cama.

– Eu não sou criança – ela cruzou os braços e empinou o nariz – sei me cuidar.

– A sua mãe também dizia isso e veja o que aconteceu.

– Aquilo foi diferente. Eu quero ver o lobo – tornou a pedir – Por favor, por favor...

É claro que ele não resistia àqueles olhinhos azuis olhando pra ele. Catherine podia ter herdado sua teimosia, mas também herdara o jeito encantador de Milah e conseguia convencer as pessoas a fazer o que ela queria.

– Está bem, mas não se aproxime muito – ele abriu caminho pra ela – é uma criatura perigosa.

Catherine desceu pela escadinha e deu uma olhada no lobo. A menina era muito parecida com Killian e devia ter entre treze e quinze anos. Fez como o pai dissera e ficou a uma distância segura do lobo. Observou o animal por uns instantes, depois se virou para olhar o capitão – que ficou por perto para o caso de a loba tentar atacar a menina.

– É macho ou fêmea? – perguntou.

– Fêmea.

– Ela é bonita.

– É, mas muito raivosa.

Ruby teve vontade de bater em Killian porque sabia que ele só estava dizendo isso pra provocá-la. Ah mas ela ainda ia dar um jeito naquele capitão...

– Vocês vão mesmo vendê-la? – Catherine indagou. Ruby identificou uma pontinha de desagrado em seu tom de voz.

– É claro! Sei o que pensa disso, querida, mas acontece que vão nos pagar uma nota preta por esta loba.

A menina ficou decepcionada. Como é que podiam fazer aquilo com um ser livre? Capturar um animal, privá-lo de sua liberdade apenas por dinheiro... Ela não podia aceitar isso.

– Por que pensam tanto em dinheiro, hein? – cruzou os braços, irritada - Já não basta termos casa e comida? Não precisamos de mais nada...

– Você não entenderia, Cath... Já chega, já pra cama.

Catherine suspirou, deu uma última olhada no lobo e então foi embora. Killian saiu atrás da menina, fechando a porta em seguida.

Vendo o modo como ele falara com a filha, Ruby podia até dizer que o homem não era tão ruim quanto parecia. Ele com certeza sabia ser gentil quando queria, mas não fazia nenhuma questão de tratá-la da maneira adequada.

Quem teria encomendado sua captura? Quem pagaria por ela e por quê? Eram muitas as perguntas que passavam por sua cabeça, mas ela só pensava naquele filho que carregava no ventre. Peter morrera por culpa dela, quem garantia que não ia acontecer o mesmo com aquela criança?

Não pensou mais nisso, no entanto. Tentava se livrar daquelas correntes apertadas, mas fazia tanto barulho que os marujos reclamaram. O alojamento deles ficava bem em cima do porão e as tábuas do chão não isolavam o som. Ela podia ouvir alguns deles roncando, assim como eles conseguiam ouvir seus gemidos e o barulho metálico das correntes.

– Quieta! – alguém berrou lá de cima – Estamos tentando dormir!

Ruby aquietou. Não queria que eles tivessem motivos para atacá-la verbalmente. Também não queria que fossem se queixar com o capitão. Mal suportava o homem e não estava com vontade nenhuma de vê-lo por ali. Gostara da menina, no entanto. Catherine. É, gostara dela.

“Se eu conseguisse me aproximar da menina...”, pensou “Mas ele vai fazer de tudo pra mantê-la longe de mim”.

Toda sua esperança se esvaiu. Killian Jones ia vendê-la sem sequer saber que ela esperava um filho.

***

Durante o dia Ruby ficava no convés do navio, a maioria dos marujos já haviam se acostumado a ela e alguns até conversavam com a moça, principalmente o senhor Smee. Ele acabou por ser responsável pela moça, levava comida e a acorrentava quando a noite chegava.

O homem cuidava de Ruby quando ela estava sentindo seus enjoos e ele acreditava ser por causa do balanço do navio e a alimentação precária, então ele a levava para a cozinha e dava alguma comida que estivesse pronta por lá.

– Sr. Smee! – Ruby chamou sentada em um caixote na cozinha do navio – Aquela garota... É mesmo filha do capitão?

– Bom... Sim, ela é! Eu não deveria falar nada dela para você! - Ele falou enquanto estava esquentando uma canja para Ruby.

– O capitão não quer que ela descubra que sou humana, não é?

– Não é isso... Quer dizer, em parte é! Mas eu realmente não deveria estar contando isso para a senhorita! – O homem ficou nervoso enquanto falava.

– Então eu vou perguntá-lo! – Ruby se levantou e foi para o convés, olhou ao redor e não viu o capitão em lugar nenhum, então deduziu que ele estaria em sua cabine.

– Senhorita Ruby! – Sr. Smee veio a seguindo – Por favor, não entre naquela cabine!

– Por que não? – Ruby pôs as mãos na cintura – Sabia que a lua cheia vai acabar em 3 dias? E o que ele vai fazer? Me prender como humana?

– Então espere que ele saia de lá para esclarecer suas dúvidas! – Smee quase implorava.

– Não! – Ruby deu as costas e foi marchando em direção à cabine.

– Oh céus! – Sr. Smee exclamou e foi atrás dela.

Ruby chegou na porta da cabine e começou a bater chamando pelo capitão. Lá dentro Killian estava olhando alguns mapas enquanto Catherine desenhava algo em uma grande tela.

– Isso é voz de mulher? – A garota perguntou olhando em direção à porta.

– Er... – Killian ficou confuso e irritado, não sabia o que dizer – Ah droga! Entre!

– Com licença, capitão! – Ruby abriu a porta e entrou, Catherine fez uma cara de surpresa quando viu a moça.

– Quem é ela? – A garota perguntou encarando o pai.

– Er... Essa é a Ruby! Nossa nova cozinheira! – Killian falou coçando a cabeça, como se estivesse nervoso.

– Você não sabe mentir, pai! – Catherine pôs as mãos na cintura igual à Ruby que estava parada na frente da porta – Diga a verdade!

– Eu estou dizendo! Vamos lá Ruby, diga à ela! – Killian foi andando até a moça com uma feição ameaçadora.

– Sim... Eu sou. – Ruby ficou o encarando desconfiada.

– Viu? – Killian sorriu para a filha.

– Não me convenceu... Por que não me contou sobre ela? Quando ela chegou aqui? Como a contratou? Já a conhecia? – Catherine começou a tagarelar perguntas e mais perguntas.

– Ei! Calma aí! – Killian pediu – Não contei porque não era necessário, ela chegou aqui no dia que zarpamos do último porto, a contratei em um bar e eu não a conhecia! Satisfeita?

– Ela veio junto da loba! Ela veio da aldeia da loba! – A menina falava animada – Você já a viu? Ela é linda não é?

– Er... Sim, eu já tinha visto antes... – Ruby respondeu vendo sua chance bem na sua frente – Soube que seu pai quer vendê-la, mas eu não concordo.

– O que está fazendo? – Killian sussurrou segurando o braço de Ruby com força quando ela fez menção de se aproximar da garota.

– É, eu também não concordo! – Catherine se aproximou – Hum, você não tem cara de cozinheira... Tem cara de uma das mulheres que meu pai arruma nas cidades em que visitamos!

– O que? – Ruby ficou vermelha de raiva da garota, com certeza ela era filha do capitão, atrevida como ele.

– Ei! Volte para o que estava fazendo! – Killian falou e a menina deu as costas voltando para sua tela, então ele saiu levando Ruby para fora da cabine.

– Devia educar melhor sua filha! – A moça falou puxando seu braço das mãos do capitão.

– Bem feito! Não tinha nada que aparecer ali... – O pirata deu uma risada divertida.

– Enfim! Eu preciso tirar uma dúvida com você... Senhor Capitão! – Ruby falou com deboche.

– Fale, lobinha! – Ele segurou o queixo da moça dando um sorriso malicioso – Tão linda!

– Não toque em mim! – Ela bateu na mão dele – Escute, em 3 noites a lua cheia acaba... Por acaso vai me manter presa enquanto sou humana também?

– Espera... Está me dizendo que não se transforma toda noite? – Killian ficou sério.

– Claro que não! Só em noites de lua cheia, no geral duram 8 noites... Uma vez por mês. – Ruby revirou os olhos como se explicasse o óbvio.

– Como assim? Quer dizer que quando chegarmos ao seu comprador, ainda terei que esperar mais um mês para provar que peguei o lobo certo? – O capitão começou a elevar a voz ficando nervoso.

– Devia ter procurado informações certas sobre o que estava caçando... Ah! E só pra constar... Pegou o lobo errado, não sou eu que ataco as pessoas da vila! Existem outros e que não sabem se controlar!

– Existem mais? – Killian de repente pareceu interessado – Quantos?

– Não sei... Vários! Ou talvez apenas um... – Ruby deu de ombros.

– Poderíamos voltar e pegar os outros, mais dinheiro pra mim! – Ele deu um sorriso ganancioso.

– Só pode estar brincando! Acabei de dizer que eles não sabem se controlar!

– Nós te pegamos, poderemos pegá-los também!

– Não pode não! Eu tinha consciência, eles não têm! – Ruby começou a ficar preocupada – E não vá achando que eu mesma não era capaz de te matar naquela noite... Eu só não queria arriscar...

– Não queria arriscar o que? - Killian colocou a mão no queixo desconfiado – Você é muito auto preservativa... Mais do que o normal!

Ela deu de ombros.

– Não sou uma assassina. Não queria arriscar me tornar uma. – e deu as costas ao homem.

Killian observou enquanto a moça se afastava. Havia algo de errado com aquela lobinha, ele só não descobrira ainda o que era.

– SMEE! – berrou e o gordinho veio correndo enquanto ajeitava o gorro vermelho.

– Sim, capitão?

– Que foi que eu disse sobre ficar de olho em nossa convidada? – ele encarava o marujo com um misto de desagrado e irritação – Agora Catherine sabe sobre ela.

– Desculpe, capitão, é que ela é muito impulsiva e não tive tempo de impedi-la de...

– Está bem, está bem! – Killian levantou a mão pra fazer o outro se calar – Apenas certifique-se de que ela fique longe da menina. Não quero essas duas conversando, a lobinha pode colocar ideias erradas na cabeça de Cath e se isto acontecer, minha chance de fazer fortuna vai pelo ralo.

Nos dias que se seguiram, Smee fez o máximo possível pra manter Ruby ocupada. Ela se entediava facilmente, agora que não podia sair pra seus passeios pela floresta e corridas noturnas. Sentia falta da avó e de Peter, e se preocupava com a criança que esperava. Acabou por ir ajudar na cozinha, já que precisava manter a farsa de que era cozinheira, antes que Catherine descobrisse o que ela realmente era.

– Estou gostando de ver, lobinha – o capitão a elogiou, em seu quarto dia a bordo do Jolly Roger – Você está se fazendo útil.

– Quer parar de me chamar assim? – ela pôs as mãos na cintura, furiosa. Ele teimava em chamá-la daquele jeito quando Catherine não estava por perto e Ruby sabia que ele só o fazia para provocar – O que acontece se sua filha ouvir você me chamando assim?

– O que eu não posso ouvir? – Cath apareceu na pequena sala de refeições do navio.

– Nada! – os outros dois exclamaram juntos.

– Eu quero saber! – ela cruzou os braços – Não têm que esconder nada de mim, não sou criança.

– Acontece que esta é uma conversa de adultos, baixinha – o capitão também cruzou os braços.

– Eu sou bem adulta! – ela empinou o nariz, depois olhou pra Ruby – Que foi que ele disse a você?

– Ah... er... me chamou de amorzinho. Só isso.

Cath gargalhou.

– Ah! E por que achou que eu não podia ouvir isso? Acredite, meu pai diz coisa pior para as mulheres que traz pra cá.

Killian ficou constrangido e Ruby segurou uma risada ao ver a cara do capitão.

– Como é que você sabe as coisas que eu digo? – ele indagou com uma sobrancelha arqueada – Por acaso fica com o ouvido colado à porta quando estou com uma de minhas... convidadas?

– Ah papai, por favor! As paredes nesse navio não isolam nenhum som, todos conseguem te ouvir.

O rosto do capitão quase pegou fogo de tão vermelho e Ruby e Cath soltaram risadinhas abafadas. Felizmente, Smee apareceu acompanhado de outros marujos e interrompeu a conversa ao puxar seu superior para um canto.

– Capitão, ontem foi a última Lua Cheia – afirmou, em voz baixa.

– Eu sei – o outro se preocupou – Ela só vai voltar a se transformar no próximo mês. Cath não pode saber de nada, devemos mantê-las o mais afastadas possível – ele deu uma olhada na direção de Ruby, que parecia meio desconfortável entre os piratas. Estava muito quieta, enquanto Catherine tagarelava e ria das idiotices que os homens diziam.

– Sim, capitão, mas a menina é curiosa. – Smee contestou – Um dos marujos a flagrou ontem à noite, quando ela tentava dar uma espiada na loba. Escute, uma hora ou outra ela vai descobrir.

– Não se ficarmos de olho na loba. – Killian sussurrou e deu mais uma olhada na direção de Ruby, que o encarava. Ela desviou o olhar logo em seguida – Faça sua parte e farei a minha.

Smee assentiu e foi sentar-se no lugar de costume. O capitão abriu caminho entre os marujos que bebiam e falavam alto; avistou Ruby sentada a um canto, distraída, e então gritou, assustando-a:

– Cozinheira! Onde é que está nossa comida?

– Onde mais? Na cozinha... – respondeu a contragosto. Aquele homem se achava no direito de tratá-la como empregada? Ela só não acabava com aquela farsa de cozinheira porque temia que a matassem, ou pior, fizessem algo que machucasse seu bebê.

– Pois vá buscar!

– Não é tarefa minha! – ela retrucou – Não é pra isso que existe um Quarteleiro?

O Quarteleiro, ou Imediato, era o senhor Smee, o braço direito de Killian. Era tarefa sua manter as coisas em ordem quando o capitão não se encontrava e ele também era responsável pela divisão das refeições e dos tesouros.

– Smee apenas divide a comida, é tarefa sua trazer as panelas até aqui – disse o capitão, um tanto irritado. Se havia algo que ele não gostava, era quando as pessoas se recusavam a cumprir suas ordens. – Vamos, mexa-se!

– Pode deixar, capitão, eu busco – Smee fez menção de se levantar, mas Killian fez um gesto pra que ele se sentasse.

– Eu dei uma ordem a ela – e apontou para Ruby, que não se movera e encarava o homem com um ar desafiador – Eu lhe dei uma ordem! Vá trazer as panelas!

– Papai, não seja tão grosso... – Cath ralhou com o pai, que em seguida gritou com a menina.

– E você não se meta, Catherine! – voltou-se para Ruby, repetindo pausadamente – Vá-buscar-as-panelas.

A moça se levantou, ainda encarando o capitão, lhe deu as costas e entrou na cozinha. Argh! Como ela odiava aquele homem! Aquele exibido e arrogante! Sua vontade era virar a sopa na cabeça dele, mas aí não teriam almoço e ela precisava se alimentar muito bem. Levou uma panela de cada vez. Hoje teriam sopa de legumes e galinha assada. Desde que ela assumira o posto de cozinheira, o capitão sempre vinha supervisionar seu trabalho e controlava a quantidade de alimentos que ela podia usar, para que não faltasse comida futuramente

Ruby levou a panela de sopa primeiro, que era a que estava mais pesada. Ninguém moveu uma palha pra ajudá-la. O capitão ria de uma piada e a moça sentiu tanta antipatia pelo homem, que depositou a panela no centro da mesa com brusquidão, e uma boa quantidade de caldo derramou.

– Ei, mais cuidado! – ele disse e voltou a rir.

– Filho da mãe desgraçado! – ela disse baixinho quando voltou à cozinha pra apanhar o tabuleiro de assados. – Ele ainda vai me pagar por tudo isso...

A tarefa de Smee, no entanto, era bem pior do que a de Ruby, ela percebeu. Não era raro que os piratas demonstrassem insatisfação com a comida e vez ou outra aconteciam brigas à mesa. Nessas horas o capitão não impunha sua autoridade e o pobre Smee tinha que se impor sozinho.

– Ei, ei, ei! Por que eu sempre fico com as coxinhas da asa e Miguel fica com as coxas? – reclamou o carpinteiro do navio, assim que Smee colocou uma porção da comida em seu prato.

– Pensei que gostasse da coxinha... – desculpou-se o homem.

– Isso é injusto, sempre fico com a cabeça – reclamou outro.

– E eu sempre tenho que comer o fígado – dizia outro.

Logo uma confusão se estabeleceu e Ruby estava prevendo que iam colocar a culpa nela. Como é que o capitão esperava que três galinhas fossem o suficiente para saciar a fome de pouco mais de cinquenta pessoas? Mas ele nem ligava, sentava-se ali e fingia indiferença enquanto comia o peito do frango.

– JÁ CHEGA! – Smee berrou – Deixem de ser egoístas, sabem que não podem ter tudo o que querem.

– Esta divisão é muito injusta, sempre digo isto – o carpinteiro voltou a dizer – Por que é que alguns sempre ganham as partes boas do frango e os outros ganham os restos?

Os outros marujos ovacionaram, apoiando o companheiro.

– Vocês sabem que o peito do frango é do capitão e da senhorita Catherine, não posso fazer nada se as outras partes não são tão boas. – falou Smee, irritado – Já estou cansado, escolham o que quiserem e me deixem comer em paz.

Ruby imaginou que o capitão fosse dar chilique, já que Smee não cumprira bem com sua tarefa, mas o homem não disse nada, continuou a mastigar seu peito de frango. Os marujos trocaram os pedaços de carne entre si e alguns deles elogiaram a sopa de Ruby.

– Ela cozinha melhor do que o Epaminondas – disseram.

Epaminondas era o velho cozinheiro, que, de tão gagá, confundia o sal com açúcar, queimava a comida e até adicionava ingredientes estranhos às suas sopas. Uma vez o capitão encontrou um rato morto no meio da comida e depois disso todos votaram para que escolhessem um novo cozinheiro. Nos últimos tempos, alguns marujos andaram se aventurando na cozinha, mas nenhum deles tinha conhecimentos suficientes e a comida virara uma gororoba. O capitão bem que estava satisfeito por Ruby ser uma boa cozinheira, mas não disse isso a ela.

Quando a refeição terminou, Killian ordenou que Ruby recolhesse os pratos e saiu em direção ao convés. Ele e Smee estavam absortos numa conversa importante, por isso nenhum dos dois se lembrou de Catherine, que ficou por ali e ajudou Ruby com os pratos.

– Tudo bem, não precisa fazer isso – disse a moça à menina.

– Eu quero ajudar, estou cansada de ficar na cabine.

– Você está bem? – Ruby notou que Catherine não dissera uma palavra durante a refeição e parecia bastante chateada.

– Não, não gosto quando ele grita comigo. – Cath enxugou uma pequena lágrima.

Ela ficara magoada com o pai, já que ele gritara com ela daquele jeito. Na maioria das vezes, Killian era um pai atencioso e carinhoso, que vivia em função da filha; mas acabava por tornar-se agressivo às vezes, principalmente quando o contrariavam.

– Oh... Desculpe em lhe dizer, mas seu pai é um insensível e arrogante. – Ruby depositou os pratos na pia – Eu não teria aceitado esse emprego como cozinheira se soubesse o quanto ele é atrevido.

– É, todos dizem isso, mas ele não tem culpa. Ele só é assim porque sente falta da mamãe.

– Hum, entendo. – Ruby encarou a garota e quis dizer algo que a consolasse, mas nesse momento o capitão entrou na cozinha.

– Catherine, volte pra cabine, a Ruby tem trabalho a fazer.

– Mas eu queria ajudar...

– Isto não é tarefa sua, volte para suas telas.

Cath saiu sem dizer mais nada e Ruby confrontou o capitão.

– Escute aqui, senhor capitão, você se acha no direito de me tratar como sua empregada? – ela falava em voz alta – Não basta ter me prendido como um bicho, ainda se acha no direito de gritar comigo e me maltratar? – ela enfiou um dedo no peito dele – Isto não vai ficar assim.

– É mesmo? – ele riu, achando graça da reação dela – E o que você vai fazer? A Lua Cheia pode ter acabado, mas ainda posso mantê-la trancafiada no porão.

– E que tal eu contar à Catherine o que realmente sou? – os dois se encaravam ferozmente, como animais selvagens – O que ela vai pensar de seu querido pai quando souber que ele mantém a suposta cozinheira como prisioneira?

– Não pense que minha filha vai ser sua salvação. – Killian aproximou seu rosto ao da moça e, se não estivesse com tanta raiva dele, ela poderia até ter imaginado como seria beijar aqueles lábios – Pode até tentar envenenar a mente dela, mas não se esqueça: eu sou a autoridade maior nesta embarcação, eu faço as regras e eu é quem decido o que deve ou não ser feito. Você já está na corda-bamba, muito em breve será vendida e então enriquecerei. Não há como mudar um destino que já foi escrito.

– Eu vou encontrar um jeito! – Ruby rebateu e se afastou.

– Bem, então divirta-se tentando, amorzinho – ele provocou, girou nos calcanhares e saiu porta afora.

***

– Então é isso, vai me trancafiar no porão toda noite.

– Ninguém vai ficar de olho em você durante a noite, por isso devemos nos certificar de que não vai causar problemas. – Killian explicava, tentando fazer com que Ruby entendesse que aquela era uma medida de segurança e não crueldade

– Que problemas eu causaria? – Ruby cruzou os braços – Não há como eu fugir, caso não tenha notado. E já lhe disse que não sou uma assassina, não vou matar ninguém. Sabe o que parece? Você tem medo de ela descobrir! – e sorriu vitoriosa quando o capitão ficou sem fala – Sei que ela ama você e aposto como ficaria decepcionada com sua crueldade.

– Crueldade? Se soubesse o que é crueldade de verdade, não diria isso.

Pelo tom de voz do pirata, Ruby podia dizer que ele já vira coisas horríveis antes. Talvez tivesse passado por atrocidades e isso o transformara no que ele era hoje.

– Você ficaria surpreso com as coisas que sei. – a moça retrucou – E me vender não é crueldade o suficiente? Vou morrer por ser uma aberração! Isso é uma atrocidade! Devia se envergonhar por colaborar com meu sofrimento.

– Você não vai morrer, pediram o lobo vivo. – ele se afastou, cansado daquela conversa.

Ruby o seguiu.

– Quem garante que não me matarão assim que me tiverem em mãos?

– Que idiotice! – ele parou subitamente e virou-se para olhá-la – Por que pediriam o lobo vivo se fossem matá-lo? Não seria mais óbvio me mandarem matá-lo logo? Você não é lá muito inteligente...

– Ora! Escute aqui, seu atrevido, para seu governo, sou muito inteligente!

– Se fosse, teria me matado quando teve a oportunidade– ele assumiu seu lugar ao leme.

– Eu já lhe disse: não sou uma assassina. Por que tanta dificuldade em entender isso? Se bem que vindo de você...

– O que quer dizer? – ele assumiu uma expressão ameaçadora.

– Ora, piratas matam por diversão e...

– Não sou um assassino! – esbravejou o capitão - O que ainda está fazendo aqui? Vá dormir!

– Não pode nem ao menos me colocar em instalações melhores? – ela quase implorou – Todos têm sua própria cama, por que sou obrigada a dormir no chão?

– Ora, achei que, sendo uma lobinha, você não se importasse em dormir no chão. – ele sorria daquele jeito provocativo, que ao mesmo tempo era muito atraente.

– É claro que me importo! Agora estou na minha forma humana e é extremamente desconfortável me acomodar no chão, sem falar que aquele porão malcheiroso me dá náuseas. A não ser que queira que eu fique doente e abatida, sugiro que me trate da maneira adequada. Não vai querer vender um lobo doente, não é? Não que eu queira ser vendida, é claro, mas já que não tenho opção de escolha...

Ele detestava o fato de ela ter bons argumentos. Já estava cansado do falatório da garota, por isso apenas assentiu e a dispensou com um aceno de mão.

– Tá bem, tá bem, amanhã resolvemos isso. Smee, leve-a para o porão.

A moça acompanhou Smee, que apenas trancou a porta do porão. Ao menos não havia correntes desta vez, mas ainda assim, ela considerava aquilo uma brutalidade sem tamanho. Trancar uma pobre moça no porão apenas por achar que ela era uma ameaça... era típico daquele capitão. Se ao menos ela tivesse tempo de falar com a menina sem ninguém por perto...

Acabou por cochilar depois de um tempo, embora o balanço do navio ainda lhe enjoasse. Pelo menos era livre nos sonhos e esta liberdade ninguém poderia tirar dela. Sonhava com Peter, que esperava por ela num jardim todo florido. Ele sorria e ela correu até ele, mas acordou antes de chegar a seus braços. Alguém entrara no porão e fizera barulho ao descer a escada.

– Ruby? Que está fazendo trancada aqui? – Catherine arregalou os olhos, confusa. Olhou em volta, à procura da loba – E a loba?

Mas Ruby, que tanto ansiara pra contar a verdade à menina, não conseguiu dizer nada. Ficaram se olhando enquanto Cath pensava numa explicação plausível para tudo aquilo.

– Você não é uma cozinheira – ela acabou por concluir. Já desconfiava que o pai estivesse mentindo, mas agora tinha certeza – é prisioneira...

– Sim...

– Seqüestraram você – Catherine se aproximou, ainda pasma– Por quê?

– Bem... é complicado...

– Não sou criança, você pode me contar a verdade – disse a menina e cruzou os braços, indicando que não sairia dali até que soubesse de tudo.

Ruby hesitou por uns instantes, depois, temendo que alguém chegasse e sabendo que aquela era sua chance, revelou:

– Seu pai... pretende ganhar dinheiro em cima de mim.

– Por quê? – Catherine ficou ainda mais pasma e boquiaberta, se é que isso era possível – Pensei que a loba fosse a coisa mais valiosa que ele já teve. E por falar nisso, onde é que ela está?

– Eu sou a loba.


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