A chuva parecia cair com mais intensidade sem Annabeth ali, para me abraçar e corar com as minhas cantadas furadas. Como isso aconteceu?! Ou melhor... Como eu pude deixar acontecer?!

–Droga! -Resmunguei enquanto jogava a bola de futebol contra o teto, deitado em minha cama. Não sei como o cara do apartamento de cima não reclamara ainda.

Em uma semana, Annabeth havia me mostrado mais de mim mesmo do que eu jamais sonharia em ver ou perceber. Ela me fazia dar risada sobre coisas sobre as quais eu nunca acharia graça, ou me sentir mal perante um típico caso de "frescura", como o antigo Percy diria.

–Droga. -Arremessei com mais força.

As cenas das horas anteriores projetavam-se para fora da minha cabeça e eram repassadas, detalhe por detalhe: Os sorrisos e os últimos beijos, e então, subitamente, os sorrisos sendo trocados por lágrimas e os beijos por tentativas falhas de explicação.

Sentei-me na cama. A cabeça girando com as frases profanadas há apenas alguns instantes.

"Me perdoa..."

Como ela poderia me perdoar? Em uma semana, eu havia feito com que ela se apaixonasse, se sentisse segura no meu abraço, para então deixar que tudo fosse por água abaixo como as gotas que batiam violentamente contra minha janela entreaberta. O vento assoprando as cortinas de forma que a escuridão que eu desejava fosse se dissipando a cada rajada.

–Perseu, querido? -Sally batera na porta trancada do meu quarto. -Tudo bem?

Eu não respondo de imediato, esperando que ela finalmente vá embora e só me deixe sozinho, com a consciência martelando em meus ouvidos, querendo me deixar maluco. Como isso não acontece, só murmuro um fraco e mentiroso "estou bem".

–Eu só quero te ajudar, Percy... -A voz dela era convincente mas não o suficiente.

–Eu não quero ajuda, obrigado.

E ela respeitou a decisão tomada precipitadamente, já que eu claramente precisava de ajuda. Então me deito novamente com os olhos atentos no marco cunhado á base das pancadas que eu dava com a bola no teto. Eu evitava fechar meus olhos, já que toda vez que eu os fechava, uma loira com os olhos inchados e vermelhos murmurava:

"Esquece..."

Eu tentava não me sentir culpado. Tentava me recolocar no pedestal em que eu geralmente ficava, isolado de culpa ou frustração alguma. Tentava colocar um sorriso galanteador no rosto, erguer a cabeça e arrancar suspiros por onde eu passasse. Mas não dava! Alguma coisa impedia.

Impedia que eu colocasse a culpa em Jason Grace, por ser um completo idiota, por não ter percebido que estava no viva voz, por ter proposto aquele acordo idiota. Assumo que por muitas vezes tentei me livrar da responsabilidade assim, mas toda vez que eu estava quase lá, eu caia em mim novamente.

–Não posso continuar nesse quarto, chorando e falando sozinho! -Falei comigo mesmo, desistindo de abrir um buraco no teto com uma bola de futebol e caindo com a cabeça no travesseiro, cansado. -Tenho que sair dessa... Vamos lá, Percy!

Suspirei.

Me levantei da cama com dificuldade por estar muito tempo em uma posição só. Destranquei a porta e caminhei pelo corredor de cabeça baixa, como um condenado caminharia até a forca. Avistei meu celular jogado no carpete no chão da sala, exatamente como eu havia deixado ao jogá-lo em qualquer lugar ao tentar impedir que uma garota perceptivelmente magoada saísse.

O número com a foto de uma Annabeth sorridente reluzindo na tela do celular chamava sem atender. Eu tentei uma, duas, seis vezes, e nada. Na caixa postal, deixei o recado:

–Sabidinha? Aqui é o idiota que estragou tudo há algumas horas. Se estiver ouvindo isso é por que não surtou quando viu meu nome na sua caixa de entrada. Isso é um bom sinal. Por favor, me dê uma chance. Não quero te explicar tudo por telefone, ainda mais quando não posso ouvir sua voz em resposta. Sei que está chateada e que não quer me ver tão cedo, mas me faça esse último favor, eu realmente quero te explicar tudo. Te vejo no café amanhã ás duas? Estou arrependido, Annie, de verdade...