O fim de semana passou rapidamente e hoje a segunda feira já está no seu fim.

Foi um dia mórbido... Literalmente.

Desde já peço as minhas mais sinceras desculpas caso eu não seja capaz de escrever algo que esteja minimamente bom, mesmo que eu tenha certas dúvidas se alguma vez consegui alcançar esse patamar. Para além disso sinto-me bastante culpada por escrever neste Diário enquanto que tenho de terminar um trabalho de Inglês.

Aproveitem o lado mais triste das minhas narrações...

Para me conseguir explicar melhor terei que ser direta nos acontecimentos.

Aconteceu um acidente. O tipo de acidentes que acontece com gente inexperiente ou com piso molhado, em que o carro embate em algo e esse algo lhes desaba em cima. Foi isso exatamente... mas o carro ia cheio com cinco rapazes pouco mais velhos que eu.

O condutor não sobreviveu...

Lamento ter que vos contar algo tão dramático mas hoje tudo o que acontecia acabava por envolver o acidente trágico de sexta à noite. “Mas acidentes acontecem sempre, Cherry...”, pensam vocês, mas quem vive num lugar pequeno sabe que cada um conta como um pouco dos outros.

Na escola todos falavam sobre o assunto. Inclusive, um dos rapazes que iam no carro é da turma da Eva e tínhamos três disciplinas “juntos”.

Por falar em Eva... creio que ela mereça destaque hoje.

Posso ser considerada um pouco insensível com estas coisas mas todas aquelas noticias passaram por mim como um arrepio. Já a Eva estava péssima... Ela conhecia todos os cinco!

Só de relembrar percebo o quanto foi estranho ver a Eva, a rebelde, Eva a calada, Eva a estudiosa... a praticamente fugir à sala de aula enquanto passava os intervalos inteiros disfarçadamente abraçada a mim e à Lauren. E sim, foi estranho, já que a Lauren me contou que em dois anos apenas tinha recebido três abraços da outra.

A Eva não estava definitivamente bem...

O que mais me apertou o coração foi saber, mais tarde, e pela Lauren, que quando as duas estavam à espera do autocarro, Eva não parava de tremer e de chorar.

Se ela raramente abraça alguém imaginem quando é que ela chora! Nunca!

Decidi agora conseguir coragem para fazer os trabalhos de casa de Inglês, mas os meus olhos parecem colar às lentes dos meus óculos quadrados de tão secos e cansados que estão. Ah... a tentação de fingir que me esqueci... Quem nunca? O problema mesmo é a professora, mas isso não é relevante para este dia.

Hoje também descobri, e apenas hoje, que a Lauren é ruiva aloirada e não morena arruivada, para além de que a armação dos seus óculos é azul escura e ela vive perto de mim. Mas a sério... que raio de azul é aquele?!

Bem... essa é outra que se sentia terrível hoje. Imaginem que afinal o Andrew que “supostamente” queria o número dela não era o da nossa turma... mas um dos rapazes que teve o acidente? Fiquei chocada quando ela me contou isso...

Pelo que parece o tal Andrew é boa pessoa, bonito e tudo mais e que esse tinha mesmo pedido o número a ela mas ela recusou já que não o conhecia tão bem. Acontece que, no preciso dia em que ela decide adicioná-lo no Facebook e dar-lhe uma oportunidade de serem amigos... acontece o acidente.

Ao relembrar os momentos em que ela me contava isto percebo a sua cara quase branca de medo, culpa e compaixão ao aperceber-se de que poderia ter tido algo mais (não pensem nisto de maneira errada, atenção!) com ele em vez de o rejeitar de cara. Eu só penso que seria pior ter um amigo ou namorado em estado grave num dos melhores hospitais do país...

Passei a tarde com ela já que a minha mãe tinha prometido levá-la para casa quando saísse do trabalho e assim ela não precisaria de apanhar também o autocarro. Passámos a tarde toda a falar sobre isso e achei incrivelmente perigosa a quantidade de vezes em que a Lauren se colocava no papel dos outros em relação a isto. Quase arrepiante...

Mas e agora penso eu: e se fosse alguém realmente ligado a mim? Porque o mais novo do grupo era apenas um ano mais velho que eu!

Aliás, é ainda, já que apenas o condutor não aguentou e... pronto.

Amanhã será o funeral.

A escola será como um amontoado de fantasmas... assombrada por uma culpa inexplicável e um medo de perder mais alguém incorrigível.

– Cherry