A Chance escrita por Pauliny Nunes


Capítulo 33
Capítulo 32




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Já está anoitecendo em Londres, quando Beatriz pega o táxi. Em suas mãos está o endereço da casa da mãe de Flávio, o qual reza para não precisar ir. Mas foi como Sônia disse: "Melhor prevenir do que remediar". Tinha um pressentimento que Flávio ainda estaria com sua cobertura na cidade que é para onde pediu que o motorista a levasse.

O prédio parece mais imponente do que da última vez, fazendo com que Beatriz se encolhesse dentro de seu casaco preto que está sobre seu vestido da mesma cor. O concierge abre a porta para ela, deixando o acesso livre para a recepção.

— Boa noite, eu venho visitar o Sr. Wilkinson – informa Beatriz à recepcionista  em inglês— Ele se encontra?

— Quem gostaria? – pergunta a recepcionista de cabelos platinados.

— Beatriz Gouvêa, por gentileza – responde Beatriz com um sorriso tímido.

 — Um momento, por favor – pede a recepcionista ligando — Sr. Wilkinson... aqui é da recepção, a senhora Beatriz Gouvêa solicita visitação... tudo bem... comunico... boa noite.

—Então? – pergunta Beatriz, ansiosa.

— O acesso da senhora está liberado. Já a aguardam – avisa a recepcionista polidamente em inglês— Tenha uma boa noite.

Beatriz praticamente corre para o elevador. Seu coração está disparado, fica pensando em todos os diálogos que terá com ele e feliz por sua intuição não ter falhado. Ela bate o pé, nervosa, o elevador está muito devagar. ‘ Se ele autorizou, só pode significar que não está tão bravo comigo assim... Ele quer me escutar... O que direi a ele? Sobre o que conversaremos? Será que ele ainda me ama? Claro que ama, caso contrário não estaria subindo... E agora? Conto o que aconteceu entre eu e o Hugo?

O elevador finalmente para na cobertura, abrindo suas portas. Beatriz sai tentando demonstrar a segurança que ficou para trás. Toca a campainha delicadamente. Arruma o casaco e coloca um sorriso no rosto que desaparece assim que a porta se abre:

— Não acredito que teve a audácia de aparecer aqui .

****

— Olá, vossa graça – cumprimenta Beatriz, séria — Eu gostaria de falar com o Flávio.

— Acha mesmo que vai ter o prazer de falar com o meu filho depois de tudo o que fez? – questiona Georgiana impedindo o acesso.

— Deixe-me passar, milady. Ele não vai gostar de saber que está me impedindo...

— Acha mesmo que ele está em casa? – pergunta Georgiana com um sorriso irônico no rosto.

 — Com licença – fala Beatriz afastando Georgiana. Ela entra e chama — Flávio!!! Flávio!!!

— Ele não está – informa Georgiana fechando a porta — Fui eu mesma quem deixou você subir. Eu realmente queria ver a sua cara de pau de aparecer aqui.

— Você não sabe do que aconteceu... Então por favor... Diga-me onde ele está? – pede Beatriz se controlando.

— Eu não sei o que aconteceu? – repete Georgiana andando em direção de Bia — Meu filho se desfez da vida que construiu com muito esforço para ir atrás de você... Um sonho... Uma ilusão... Alguém que a única coisa que sabe fazer é destruir pessoas... Eu te avisei para se afastar do meu filho. Eu te pedi para que saísse do caminho dele... Mas você fez questão de me desafiar... Fez meu filho sair do caminho... Correr igual a um cachorro... Eu posso estar muitos anos na Inglaterra, mas eu ainda sou brasileira e sei como tratar pessoas como você.

— Do que está falando? – pergunta Beatriz diante de Georgiana — Eu não o incentivei...

— Sua víbora! – acusa Georgiana acertando um tapa no rosto de Beatriz a fazendo cair no sofá. Lady Wilkinson se aproxima  enquanto diz entre os dentes — Ele deixou o negócio pelo qual batalhou... Essa cobertura... Sua vida estável... E você se atreve a dizer que não o incentivou? Acha que eu não sei que foi com ele para o Cairo?  Que o fez se apaixonar e assim que voltou para o Brasil, voltou para o seu marido? Você quebrou o coração do meu filho e eu irei quebrar o seu pescoço.

— Pare, mamãe – grita Anna aparecendo na sala. Ela afasta a mãe de Beatriz que se levanta do sofá  — Solte-a!!! Não faça isso!

— Ela merece isso. Devia bater mais, fazer o que a mãe dela não teve coragem – comenta Georgiana com desprezo. Ela encara a filha — Ela não tem ideia do quanto foi difícil para ele recuperar e agora quer aparecer? O que pretende? Quer meu filho correndo atrás de você? Inflando seu ego? Pois se depender de mim, isso jamais acontecerá!

— Controle-se, mamãe – repreende Anna — A senhora disse que seria civilizada com ela.

— Impossível ser civilizada com pessoas assim. Eu já fui uma vez e ela não me levou a sério quem sabe assim ela entende que não é bem vinda.

— Deixe-me  explicar... – pede Beatriz com a mão no pescoço. Ainda não tinha conseguido recuperar todo o fôlego — Eu sei que não mereço... Mas eu preciso falar com ele... e você gostando ou não... Ele gosta de mim...

— Ele pode até gostar de você,mas pode ter certeza que ele tem convicção e quando ele não quer mais... Não há quem o faça mudar de ideia – argumenta Georgiana com sorriso de satisfação — E ele não a quer mais... Então faça o favor de ir embora e ficar com seu marido.

— Como pode ter certeza? – questiona Beatriz — Você está na cabeça dele? Eu sei que ele me ama e vou te provar... Assim que ele descobrir que estou aqui, você verá.

— Mas você não estará aqui quando ele chegar – retruca Georgiana segurando o braço de Beatriz e a levando para a saída — ele nunca saberá que esteve aqui... E se ousar aparecer aqui novamente... Terá muito mais do que recebeu e minha filha não poderá te ajudar.

— Espere – pede Beatriz quase caindo do lado de fora. Ela tenta se virar, mas a porta já está fechada. Bate algumas vezes, até desistir. Sussurra baixinho — Por favor... Por favor, me deixe falar com ele.

Ela se encosta na porta, decide que ficará esperando ele ali, mesmo que Georgiana ousasse chamar a segurança. Beatriz está decidida que não sairia dali enquanto não falasse com ele. Então um barulho vem da porta a fazendo levantar, nervosa. Depois de alguns minutos Anna aparece cautelosa, com o dedo nos lábios.

— Eu sinto muito – começa a dizer Bia.

— Shhhh... – diz Anna.  Ela fecha a porta devagar e sussurra — O Flávio está no restaurante, onde você foi conosco. Se correr, é capaz de encontrá-lo lá.

— Por que está me ajudando? – pergunta Beatriz confusa — Achei que me odiasse...

— Eu não acho certo  o que fez ao meu irmão, mas só ele tem o direito de decidir isso... – explica Anna, séria — Além dele não ser o mesmo sem você...

— Obrigada – agradece Beatriz, emocionada.

— Não me agradeça – recusa Anna abrindo a porta — Quando chegar lá, espero que não desista tão fácil... Como sempre faz.

****

A chuva pega Beatriz de surpresa, enquanto tenta pegar um táxi.  Depois de muito tempo um finalmente parou e deixou que ela entrasse ensopada. Em menos de vinte minutos ela já estava na frente do edifício Michelin. Seus passos apressados chamam atenção das pessoas e da recepção que praticamente a impede de entrar.

— Boa noite, senhora – cumprimenta a recepcionista  em inglês— O nome de quem está à reserva?

— Oi? – indaga Beatriz sem entender.

— A reserva – reforça a moça de cabelos pretos — Hoje temos somente mesas reservadas, em qual a senhora está?

— Na mesa Wilkinson, por favor – mente Beatriz em inglês.

— Mesa nove, que seria para três, então? – questiona a recepcionista franzindo a testa — Deve haver algum engano,pois está marcado para duas pess... senhora?... Espere, senhora! – chama a  recepcionista indo atrás de Beatriz que já está andando pelo salão à procura de Flávio.

Ela praticamente corre por entre as mesas atrás do rosto dele, chamando atenção dos clientes.  Seu nervosismo só piora a busca pelo Flávio. A recepcionista já está bem perto com os seguranças, quando ela o encontra. Ali na mesa do canto, Flávio está sentado sozinho bebendo tranquilamente seu uísque, alheio a movimentação.

— Senhora nos acompanhem, por favor – pede segurança tocando no ombro de Bia. — Antes que nós tenhamos de chamar as autoridades.

— Flávio! – grita Beatriz tentando chamar atenção de Flávio.

Ele coloca o copo na mesa e olha para a direção da Beatriz, surpreso. Flávio se levanta e diz:

— Bee...? O que faz aqui?

— O senhor a conhece? – pergunta o segurança em inglês.

— Sim... podem soltá-la – pede Flávio,confuso.

— Obrigada – agradece Beatriz tentando arrumar seu cabelo molhado que em algum momento esteve preso em coque.

— O que está fazendo em Londres? – pergunta Flávio — Como veio parar aqui no restaurante? Aliás, como sabia que eu estava aqui?

 — É uma longa história... Que eu não tive tempo de analisar para colocar dentro das palavras que eu quero te dizer.

— Tudo bem... Então diga o que veio me falar – pede Flávio apontando para Beatriz.

— Bom... – solta Beatriz, nervosa. Ela olha ao redor e percebe que todos a encaram. — Eu... Eu gostaria de falar em outro lugar... Mais privado...

— Eu estou no meio de um jantar importante, Beatriz... – avisa Flávio, ríspido — Se tem algo a me falar , terá que me dizer aqui mesmo.

— Okay – concorda Beatriz — Como você quiser.

— Seu tempo está passando – reforça Flávio friamente.

— Não gosto dos meus dedos. Detesto quarta feira. Sou péssima para dizer não. Adoro meu cabelo natural – pontua Beatriz também usando os dedos — Prefiro gatos a cachorros. Sou alérgica a amendoim, Ronco quando vou dormir tarde e babo. Muito. Detesto conversar durante um filme. Não tenho uma música favorita. Amo o trajeto de uma viagem e não o destino. Rôo unha, por isso corto sempre. Estalo os dedos do pé quando estou nervosa, como estou fazendo agora. Choro em filmes que algum animal acaba morrendo. Não sei guardar segredo.

— Você atravessou o oceano para dizer que rói unha...?

— Detesto quando me interrompe quando estou falando – continua Beatriz desconsiderando a pergunta de Flávio — Eu sou chata de manhã e melhoro durante o dia. Implico com pasta de dente aberta e toalha em cima da cama. Não gosto que bebam suco direto da boca da garrafa. Não suporto que dêem as costas para mim quando estou falando. Sou a última pessoa que entende uma piada ou sarcasmo. Eu não posso ter filhos, nem hoje, nem amanhã... Talvez daqui três anos eu possa tentar falar a respeito da adoção...

— Aonde está querendo chegar, Beatriz?  – questiona Flávio erguendo a mão — Não estou entendo tudo isso.

— Eu dormi com ele – confessa Beatriz — Eu dormi e não sei o motivo. Eu não estava bêbada, nem fui sedada... Eu fiz aquilo e não tem explicação. A mais próxima é a que afirma que você estava certo o tempo todo... Eu sou fraca... Sou influenciável e achei que as coisas poderiam voltar ao que eram... Mas nada isso importa, pois  eu cometi o maior erro da minha vida  quando achei que conseguiria viver sem você.

— Okay... Você dormiu com o Hugo – fala Flávio com uma leve irritação — E decide vir aqui me contar! Você sabe que existe telefone, certo? Se quiser machucar alguém, esse é o método mais fácil e discreto de fazê-lo. 

— Eu não queria te humilhar... – argumenta Beatriz tentando tocar em Flávio que se afasta.

 — Então o que você quer? – esbraveja Flávio vermelho de raiva — Diga-me o que você quer? Porque eu estou cansado de tentar entender você... – senta-se à mesa, desolado — Por que está me contando isso? Para me ver sofrer? 

— Porque eu jamais falei disso para alguém... Porque eu nunca fui sincera com ninguém, além de você... Pois a única pessoa que tem o direito de saber tudo isso é você. Eu amo você mesmo sem te conhecer o suficiente, mesmo sem saber se é capaz de aceitar minhas imperfeições, minhas manias e o meu jeito. Amo você mesmo sem saber se me ama. Eu quero dar a você tudo de mim, mesmo se não quiser receber. Eu amo você e é só você... Mesmo que não me queira nunca mais. Eu não estou dizendo isso por falar, mas sim porque sinto isso aqui dentro. – finaliza Beatriz tocando em seu peito.

Flávio passa a mão nos cabelos, não está acreditando que Beatriz está na sua frente. Como ela o encontrou era a pergunta que rodeia sua cabeça agora. Beatriz olha para ele esperando uma resposta. Todos  no restaurante observam a mulher toda molhada que acabara de falar para o homem sentado. Alguns sorriem, outros repudiam a atitude, mas todos esperam o desfecho da história.

— Bee... – começa Flávio encarando Bia. Seus olhos estão com mistura de decepção e tristeza.

— Você não sabe a alegria que ficaram quando eu contei a novidade para eles – diz uma voz feminina atrás de Beatriz que se vira. Loira, alta um pouco pálida, mas encantadora, em torno dos trinta anos. O cabelo longo cortado em camadas a deixa ainda mais deslumbrante ornando com o tubinho preto que usa. Ela encara Beatriz, confusa e pergunta para Flávio — Quem é ela?

— Janet, essa é Beatriz de quem te falei. Beatriz essa é Janet... –apresenta Flávio apontando uma para a outra.

— Sua ex-noiva – comenta Beatriz, séria estendendo a mão para Janet que retribui sorrindo. Beatriz encara o belo solitário na mão direita da jovem. “Noivos!”, pensa chocada — Desculpem-me por  interromper o jantar de vocês... Parabéns pelo noivado.

— Obrigada! – agradece Janet olhando para o anel — O pedido foi feito ontem à noite, não é Flávio? Não consigo parar de olhar.

— Sim – admite Flávio sério encarando Beatriz.

— Você vai adorar a história – comenta Janet tocando no braço de Bee que se afasta.

— Eu tenho que ir – avisa Beatriz, transtornada, saindo de perto deles.

Beatriz praticamente corre pelo restaurante, aquilo tinha sido demais para ela.  Sente que alguém a segue e apressa mais ainda os passos chegando à frente do edifício. Um casal está prestes a pegar o táxi, mas Beatriz entra antes, ouvindo xingamento da parte deles.

— Vá – ordena Beatriz, nervosa olhando para janela. 

— Para onde, senhora? – pergunta o taxista.

— Sai com carro logo! – grita Beatriz chorando.

Flávio finalmente aparece na porta do restaurante. Ele se aproxima do táxi, mas o carro se movimenta impedindo que abra a porta. Beatriz fecha os olhos, se recusando a olhar para trás.


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