Minhas pernas bambearam e meu coração palpitou, num misto de medo e arrependimento, até que minhas pernas não foram fortes o bastante pra suportar o peso da minha amargura e eu cai sentado no antigo chão de madeira do meu quarto. Fechei meus olhos por alguns segundos, permitindo a mim mesmo derramar aquelas tão pesadas e angustiantes lágrimas de meus olhos. Assim que terminei de por pra fora, alguém limpou meu rosto. Se eu já não a conhecesse, diria que o que secou minhas lágrimas havia sido uma pluma, e não sua mão. Gabriela estava como sempre, e com a indispensável companhia de Kakabel. Ouvi uma voz do outro lado da linha, vinda do telefone que eu ainda segurava em mãos.

–Cícero, você está aí??

– Oi Abigail... Estou sim, e já estou indo aí, beijos.

Desliguei o telefone e encarei os amarelos olhos de gato de Gabriela.

–Você não ligou pra ele não é...?

Ele estava ajoelhada ao meu lado e seus longos cabelos ruivos chegavam a alcançar o chão. Peguei uma mecha de cabelo sua que estava mais ao meu alcance e fiquei brincando com ela. Neguei com a cabeça, respondendo à sua pergunta.

– Cícero... Não são todas as pessoas que tem o privilégio que você tem, de ter um anjo só pra elas. E você tem que confiar mais no que eu digo, por que se eu vim aqui pra te falar algo, é porque é importante. Você está me entendendo? -Sua voz suave era música para meus ouvidos, e decidi ficar apenas absorvendo e amenizando toda aquela situação, sem nem me importar se as palavras dela faziam sentido ou não. Acenei quando ela parou de falar, mesmo não tendo entendido nada do que ela dissera.

Gabriela se levantou, Kakabel havia subido em seu ombro, em algum momento, sem que eu me desse conta, e permanecia ali até agora. Ela estendeu seus brancos e esguios dedos para que eu me apoiasse neles para me levantar. Foi o que fiz. Assim que me levantei, ergui a cabeça em tom de alto confiança e abri o guarda-roupa, escolhendo algumas roupas aleatórias e colocando-as dentro da minha pequena mala de viagem. Antes de abrir a porta, dei uma olhada breve para Gabriela, que me indicou com a cabeça um gesto afirmativo. Abri a porta e desci as escadas correndo. Passei na pequena secretaria da igreja, avisando da minha futura ausência por um período de três ou quatro dias, para que um outro padre pudesse me substituir, e pegando a chave do carro pertencente à Igreja. Assim que entrei, ouvi um miado baixo, e me dei conta de que Kakabel estava viajando comigo, mas não Gabriela...

–Onde ela está?- perguntei mais para mim mesmo do que para o gato. Recebi um ronronar baixo como resposta e olhei para ele com interesse

–Ela não vem?

Ele fez um micro-gesto negativo com a cabeça e senti meu coração apertar.

Porque meu corpo tremia com o simples som da sua voz? Não... Isso é impossível.. Não é?