Abro meus olhos, tento enxergar, mas estou cego pela luz branca. Faço um esforço em minha mente, mas não consigo me lembrar como ou porquê estou deitado aqui esta noite.

Não consigo suportar a dor em meu corpo inteiro, partes que eu nem mesmo conhecia doem, não posso fazer a dor ir embora. Mas o que diabos aconteceu? Porque estou deitado aqui? Porque não consigo enxergar nada?

Me lembro como um flash de luz. Eu correndo até o outro lado da rua para alcançá-la, o grito desesperado dela me chamando, os faróis vindo em minha direção e então tudo ficou escuro, até eu abrir meus olhos e enxergar essa luz branca. Eu fui atropelado, deduzo.

Como isso pode acontecer comigo? Sim, cometi meus erros, que não foram poucos. Aliás, estou aqui, deitado, por causa de um erro. E então a ficha cai, eu não tenho para onde fugir; A noite continua e estou sumindo aos poucos.

Enquanto estou deitado aqui faço uma reflexão sobre minha vida e percebo que não quero mais ser quem sou. Estou cansado dessa vida, e eu só quero gritar por toda a dor que estou sentindo, por toda a dor que ja passei, por toda a dor que já fiz os outros passarem...

O som em meus ouvidos volta lentamente. Todos á minha volta estão gritando, ouso a voz dela desesperada e está perto, acho que ela está debruçada sobre mim ou algo do tipo. Tento fazer um som, mas tudo que sai é um gemido, e acho que ninguém escuta.

Você pode definir a vida como você quiser e a minha situação sempre será a mesma aqui. Se a vida é uma bacia cheia de água, eu estou deslizando até a borda, se a vida é um circo, estou pendurado por um fio. Se formos resumir minha situação estou morrendo e sinto isso.

Mas, não quero morrer. Ou quero? Eu não sei, estou confuso. Talvez eu queira. Mas e ela? Sempre tão segura de si, sempre tão orgulhosa. As únicas vezes que a vi chorando foram por minha causa. Eu iria fazê-la chorar novamente?

Tento me segurar por esse "fio", lembrando-me. Lembrando-me de quando nada mais no mundo importava além de mim, foi uma época boa. Pode falar que sou egoísta o quanto quiser, mas fazer as coisas apenas para seu próprio bem é uma coisa maravilhosa, porque seus obstáculos são tão pequenos.

Mas então eu a conheci, e como todos sempre diziam, nos somos a versão do sexo oposto um do outro. Safados, egoístas, orgulhosos e talvez até coração de gelo. E, sabe aquela história de que os opostos se atraem? Não, isso não é bem verdade. Ela foi a única pessoa em toda a minha vida que eu realmente amei. Não posso explicar o que aconteceu, só aconteceu.

E agora vou morrer depois de uma discussão com ela. Eu fiz a pior coisa do mundo, e eu não posso mudar isso, nunca vou poder mudar.

Eu a traí.

E o pior não foi ela me flagar, o pior foi a expressão de dor nela. Eu nunca tinha visto aquela expressão em seu rosto. E aquilo, foi pior do que se ela tivesse gritado comigo, se ela tivesse me espancado. Aquela expressão, acho que é justo eu morrer com aquela expressão nítida em minha mente. Eu fui um canalha.

E vou morrer nos braços dela.

Sinto as mãos dela em minha bochecha, sei que são as mãos dela por causa do perfume inconfundível. Sinto lágrimas saírem de meus olhos e um suspiro aliviado dela, eu ainda não estou morto.

Tento abrir os olhos mais uma vez, a luz ainda é cegante, mas posso enxergar seus cabelos castanhos e seus lindos olhos castanhos que fariam qualquer outro olho claro no universo se sentir inferior.

Ela sorri para mim e tento retribuir, mas tenho certeza de que saiu mais como uma careta. Mesmo assim, ela me beija e eu retribuo. Quando nos separamos, consigo vê-la melhor.

- Sirius! - Ela disse com um sorriso lindo em meio as lágrimas. - Eu fiquei tão preocupada! Por Merlim! Eu pensei que...

- ...Lene. - Foi tudo o que eu consegui dizer. Ela riu. - Me... me desculpa Lene?

Ela me olha confusa por um minuto e então sua expressão se torna brava, depois triste.

- Sirius o que você fez foi... inaceitável. - Ela disse, mas balançou a cabeça. - De alguma forma não estou surpresa, quero dizer, já esperávamos desde o inicio que alguém ia trair alguém certo? Mas... eu meio que te admiro por me aguentar por um ano e... é eu te perdoo.

Tento sorrir novamente, mas não acho que deu muito certo. Mesmo assim, ela sorri de volta.

- É por isso que gosto de você, Lene. - Eu digo e ela ri. - Você não é uma princesinha chorona, sabe como o mundo é... de verdade.

- Acho que isso foi uma declaração. - Ela disse rindo.

- Não, não foi. - Eu disse sério. Ela me olha surpresa.

- Você não gosta de mim Sirius? - Ela perguntou chorosa.

- Não Lene, eu te amo. - Disse. - Eu te amo Marlene!

Ela riu e me beijou. Quando nos separamos, ofegantes, eu senti que respirar doía. Estávamos ficando sem tempo. Eu podia sentir minha vida se esvaindo.

- Lene, eu te amo tá? - Eu disse deixando as lágrimas caírem livremente. - Não se esqueça disso nunca!

Ela entendeu minha despedida pois gritou um "não" e começou a chorar mais ainda.

E eu sentia a minha vida indo.

E eu desaparecia mais a cada segundo.

E toda a minha certeza naquele momento era que eu amava Marlene.