E se...? escrita por Nicoly Faustino


Capítulo 16
Capítulo 15




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Quando meus pais chegam em casa, conto a eles sobre minha mudança para Paris, e em meio a muitas lágrimas eles ficam felizes e orgulhosos. Mesmo em Londres, minhas visitas deixaram de ser frequentes, o fato de eu ir para Paris não iria mudar muita coisa. Eu gostaria de estar feliz também, mas não estou. Janto em silêncio e vou para meu quarto, ciente de que vai demorar muito para eu voltar a vê-lo, a dormir nessa cama que parece ter ficado pequena para mim. Ligo para Rachel e o esperado sim, custa a sair de minha boca. Quando desligo o telefone, repito para mim mesma – Sim, eu vou para Paris – e planto em minha mente que isso é algo para eu ficar extremamente feliz, não arrasada como me sinto nesse momento. Sei que terei que falar com Eric quando voltar para Londres, mas decido largar de infantilidade e ligar para ele. No primeiro toque, sua voz cheia de surpresa atende.

– Emilly, o que houve? Pra que tomar uma atitude assim? Achei que fôssemos adultos.

– Me desculpe, mas você não me deixou muita escolha.

– E você? Deixou?

– Deixei quatro anos pra você escolher o que queria da vida ao meu lado, mas pelo visto não foi o suficiente – replico, arrependida por ter ligado.

Silêncio.

– Vamos conversar pessoalmente. Quando você volta? – ele pergunta, parecendo cansado.

– Amanhã. Mas acho que não temos muito o que conversar. A não ser sobre negócios.

– Sim, temos que conversar sobre nós, e sobre negócios. Você já decidiu se vai para Paris?

– Eu vou Eric. Não tem nada que me prenda a Londres.

– Mas e eu?

Silêncio. Suspiro.

– Você me ama? A ponto de querer se casar comigo? – pergunto.

– Que pergunta. Você sabe o que sinto por você.

– Você não me respondeu.

– Emilly, pare com isso.

Isso deixa claro como a luz da lua lá fora, a resposta dele, que de certa forma eu sempre soube.

– Você não me ama – constato.

– Eu amo você sim. Mas casamento é outra coisa.

– Que outra coisa? – pergunto irritada.

– Me responda você então. Você me ama? Desistiria dessa mudança para ficar comigo? – ele grita.

Penso em Jack. E a resposta sai de minha boca mais rápido que uma lagrima que cai, rola em meu rosto.

– Não Eric. Eu não desistiria disso, não por você.

Desligo o telefone, sentindo um alívio imenso por ter em fim falado algo que sempre esteve dentro de mim. Eu posso gostar muito de Eric. Mas nunca foi amor, mesmo tendo chegado bem perto. Adormeço aos poucos, enquanto tento expulsar a lembrança dos lábios de Jack nos meus, que não passou de um adeus. Espero que ele não esteja sofrendo tanto quanto eu, mas sei que isso é algo inútil de se desejar, pois ele está sofrendo. Eu sei que está.

Meus pais me acordam antes de irem para o trabalho, para me desejar boa viagem. Me enchem de abraços molhados, e imploram para que eu venha visita-los. Prometo que virei, mas eu sei que nunca mais quero voltar a Brighton. Com o tempo irei convence-los a ir até mim. Talvez até se mudem para Paris, mas por ora, é mais fácil enche-los de promessas vazias, algo que eu sei fazer muito bem. Arrumo minhas malas lentamente e vejo que não usei nem metade do que trouxe. Esperava que as coisas tivessem sido diferentes. Enquanto estou tomando banho, escuto a campainha tocar, e frustrada pela ideia de sair no meio do banho, apenas me enrolo na toalha, para dependendo de quem for, dispensar rapidamente e voltar para meu agradável banho. Uma luzinha no fim do túnel pisca desejando que seja Jack. Mas quando grito perguntando quem é, a resposta me deixa quase sem ar. Abro a porta e ficamos nos encarando por um longo tempo, até que ela resolve quebrar o silêncio.

– Oi!

– Oi Jéssica. O que você faz aqui? – pergunto surpresa.

Quase não a reconheço. Além de ter engordado um pouco, seu cabelo antes castanho claro e armado, está vermelho sangue e liso, mas um liso estranho. Ensebado. Sua maquiagem pesada demais, suas roupas pequenas demais. O que houve com aquela garota que um dia foi minha melhor amiga?

– Posso entrar? – ela pergunta, com receio.

– Ah, é que eu estou no meio do banho, mas é, pode – respondo.

Ela entra e fica parada olhando a casa como se nunca tivesse a visto antes.

– Sabe, eu sinto saudades daqui, dos seus pais, e de você também.

Isso me pega desprevenida e eu não sei bem o que responder. Ela se senta no sofá, e espera até que eu faça o mesmo.

– Eu sei que agi como uma idiota com você, mas, você também agiu como uma idiota comigo – ela começa, e eu faço uma careta por ela ter vindo até aqui me insultar – mas você precisa saber, que eu amava Jack de verdade, e você o roubou de mim.

– Olha, se você veio aqui para isso, é melhor...

– Espere – ela me interrompe – deixa eu continuar. Eu achava que você tinha o roubado de mim, mas depois eu vi que não. Você tinha se mandado daqui e mesmo assim o Jack não me quis. Ele não quis ninguém na verdade. Eu nunca vou entender como você pôde deixar ele para ficar desenhando essas roupas idiotas, mas você precisa saber que aquele cara ama você. E já que você está aqui, talvez você possa tentar, sei lá, ficar com ele de novo.

Ela suspira. Eu fico boquiaberta, sentindo um nó na garganta se formar.

– Por que você está me dizendo isso?

– Porque eu me importo com Jack. E por mais que eu tenha te odiado por muito tempo e sentido inveja de você, eu me importo com você também. Nós fomos amigas um dia, lembra? – ela dá de ombros – eu sei que vocês nunca serão felizes, se não estiverem juntos.

– Jessy... Eu... – começo a chorar.

Ela me abraça, e eu sinto como é bom abraça-la novamente. Por mais que ambas tenham errado uma com a outra, e ela muito mais comigo, eu senti falta da nossa amizade. A única pessoa que considero como amiga é Rachel, mas mesmo assim, não chega nem perto do que tive com Jéssica.

– Eu sei que nós nunca vamos ser amigas de novo, mas, eu precisava me desculpar. E te dizer que, Jack nunca te esqueceu. Eu tentei fazer com que ele te esquecesse – ela ri, nervosa, enquanto se afasta sem jeito, de mim – mas, eu não seria capaz de fazer isso, comparada a você.

Enxugo minhas lágrimas. O nó na garganta aumentando.

– Acho que nós tivemos o nosso tempo, não dá para voltar e fingir que nada aconteceu. Mas obrigada por ter vindo até aqui e dito essas coisas. Só que, eu também tive meu tempo com Jack, mas já acabou. Infelizmente.

– Por que você acha isso? – ela pergunta surpresa – Ele voltaria para você num segundo. Até iria para Londres se fosse preciso.

– Iria para Paris também?

– O que você disse?

– Eu vou me mudar para Paris. Surgiu uma oportunidade inegável, e é isso. Eu falei com Jack, mas... enfim, como eu disse, eu tive minha chance e não aproveitei.

Jéssica se levanta, e parece furiosa de repente.

– Você é uma vadia mesmo – ela grita. – Uma puta ambiciosa. Eu nem devia ter vindo aqui. Você não merece um cara como Jack. Nunca mereceu.

Ela vai até a porta e antes de sair, me olha descrente.

– Vê se não volta mais aqui, depois de anos, para torturar aquele coitado de novo. Quem sabe um dia ele não consegue te esquecer. Só que, não sei se você sabe, que dinheiro nenhum, fama nenhuma, vai te dar alguém que te ame desse jeito.

Ela bate à porta quando sai, e me deixa sentada no sofá enrolada em minha toalha, e numa camada de vergonha. As verdades que Jéssica disse, foram um tapa na minha cara, que está queimando em meu coração. Termino meu banho, coloco uma roupa básica, calça jeans preta, camiseta branca. Calço botas cano curto, prendo o cabelo num rabo de cavalo, e saio sem olhar para trás, com minhas malas, e meus exagerados óculos escuros que escondem toda tristeza em meu olhar. Vou até o restaurante em que Jack me levou, na esperança de que ele esteja lá. Me perco no caminho, mas depois de uma hora, consigo chegar. Adam me atende felicíssimo, e logo estou saboreando um delicioso Strogonoff de camarão. Como tudo dessa vez, e deixo uma boa gorjeta junto com a conta.

Rodo pelas ruas de Brighton, incapaz de seguir adiante. Tenho a esperança de encontrar Jack. Mas para quê? Depois de tudo o que ele me disse, sei que não haverá conversa. Reconciliação. Nada. Passo por seu pub, por onde era sua casa, passo em todos os lugares onde costumávamos ir. Menos um. Não tenho coragem de ir até nosso refúgio escondido. Nem sei se aquele lugar mágico ainda existe. Já está entardecendo, quando decido pisar no acelerador e seguir em frente. Dirijo me sentindo sufocada. Conforme me afasto dessa cidade cheia de lembranças, me sinto cada vez mais triste. Começa a anoitecer, decido ligar o rádio, para tentar me distrair e tornar os últimos minutos de viagem menos tortuosos. Ao longe avisto as luzes de Londres. O que não é reconfortante. Paro o carro no acostamento, me sentindo muito mal. Coloco a culpa no Strogonoff, mas sei que não é isso. Sei que o que está me consumindo não tem nada a ver com comida. Eu posso estar ficando louca, mas eu não consigo seguir em frente. Não, sem tentar pelo menos mais uma vez. Manobro o carro, fazendo os pneus cantarem, e volto correndo o máximo que posso para Brighton. Ultrapasso todos os carros possíveis como se eu não pudesse mais esperar. Na verdade eu não posso. Dirijo sem pensar direito no que dizer, onde encontrar Jack, o que fazer se ele me aceitar, o que fazer se ele não me aceitar... Sou desviada de meus pensamentos, quando começa tocar uma música familiar. É Runaways. Jack estava ouvindo essa música quando me buscou para almoçar. Quando se está desesperado, qualquer coisa se torna um sinal. Considerei como um sinal, o fato de justamente essa música começar a tocar. Subitamente, começo a chorar. Não consigo nem pensar, em ser rejeitada por Jack mais uma vez. Aumento o volume ao máximo, e começo a cantar junto.

You gotta know that this is real, baby
(Você precisa saber que isso é real, baby)
Why you wanna fight it?
(Por quê você quer lutar contra isso?)
It's the one thing you can't choose
(É a única coisa que você não pode fazer)

Enquanto as lágrimas aumentam, uma ideia me acomete. Viro uma rua, que eu sei que me levará até o lugar que eu tentei evitar, hoje mais cedo. Até o lugar em que deixei Jack esperando quando decidi partir.

We can't wait 'till tomorrow
(Não podemos esperar até amanhã)

Pego meu celular na bolsa, e começo a digitar uma mensagem, um olho na tela, outro na estrada.

“Não posso desistir sem lutar. Estou te esperando naquele lugar que você sabe qual é. O que costumava ser nosso refúgio.”

I'm not gonna let you runaway
(Não vou deixar você fugir)
I knew it when I held you
(Eu soube quando eu te abracei)
I wasn't letting go
(Eu não estava de deixando ir)

Fico um tempo com o celular na mão. Em dúvida. Piso fundo no acelerador, depositando todas as minhas energias nessa última tentativa. Tento lembrar o número de Jack, e torço para que ainda seja o mesmo. Trêmula, digito os números, e hesito.

We can't wait 'till tomorrow
(Não podemos esperar até amanhã)

A música me faz tomar coragem. Estou quase chegando, a estrada está deserta. Aperto o botão para enviar, e fico olhando fixamente para o celular. Quando finalmente aparece na tela “mensagem enviada”, olho para estrada e sou cegada pela luz de dois faróis a poucos metros de mim. Tento desesperadamente frear, mas só percebo o quanto é inútil, quando absorvo todo o impacto do meu corpo contra o para-brisas do meu carro, escutando as últimas palavras da música, antes de tudo se resumir a dor, medo, e escuridão.


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