Vida em Erebor escrita por Vindalf


Capítulo 47
Uma parada no caminho


Notas iniciais do capítulo

Thorin e os demais fazem uma visita



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Uma parada no caminho

Thorin e os demais fazem uma visita

Duas escoltas de elfos acompanharam os khazâd durante a travessia de Mirkwood. O novo Rei Sob a Montanha foi acompanhado pelo próprio príncipe Legolas na escolta de volta à Montanha Solitária, mas Kíli, o novo príncipe herdeiro de Erebor, ganhou escolta da capitã da guarda, Tauriel, até a fronteira da floresta, para continuar a viagem até Eriador. Aqueles dois precisavam se acertar, pensou Thorin de novo.

Isso ficou ainda mais evidente na viagem. O grupo seria cômico se não fosse trágico. Tauriel ia ao lado de Kíli, os dois trocando olhares românticos, suspiros e sorrisos; Thorin e Dwalin iam atrás (este último sem disfarçar o olhar de decepção para o jovem príncipe), e o resto da escolta élfica parecendo tão desconfortável como gazelas numa cova de leões.

Os elfos tomaram um caminho diferente do da companhia quando foram retomar a montanha. Assim era possível evitar o Rio Encantado e muitos dos perigos da floresta. Eles encontraram apenas um ninho de aranhas gigantes, e não tiveram dificuldades em derrotá-las.

Com exímios conhecedores da floresta no grupo, eles rapidamente chegaram a seu destino. Thorin agradeceu a gentileza dos elfos (Dwalin saiu na frente para se afastar dos malditos de orelhas pontudas), e a despedida de Kíli e Tauriel foi ainda mais demorada do que a de Fíli.

Thorin decidiu que falaria com Kíli na primeira oportunidade. Ele e a elfa precisavam se acertar mesmo.

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Depois que saíram da floresta, não demorou muito para os anões reconhecerem onde estavam, apesar da neve espessa no chão. Eram as terras de Beorn.

— Que acham? — indagou Kíli. — Vamos até a casa de Beorn dizer oi?

Dwalin lembrou:

— Talvez não seja uma boa ideia. Ele não gosta de anões.

Thorin opinou:

— Mas ele gosta de Anna. Vai gostar de saber que ela sobreviveu e saberá guardar segredo. Vamos lá.

Levou o pônei à frente, e Dwalin trocava um olhar com Kíli. A verdade era que os dois tinham plena convicção de que Thorin estava louco, dementado pela perda de sua amada. Eles estavam penalizados por ver seu antigo rei, antes um líder e baluarte de sua raça, reduzido à insanidade, agarrado a fantasias. Mas eles não iriam abandonar se parente à própria sorte. Iriam com ele até Ered Luin, onde ficaram khazâd fiéis aos Durin. Eles cuidariam de Thorin.

O trio aproximou-se cautelosamente da casa, atravessando os campos cobertos de neve, observando as abelhas gigantes. Uma neve grossa voltara a cair.

Os animais de Beorn, cavalos e cabras, logo vieram vê-los, e em seguida apareceu o homenzarrão. Ele os reconheceu:

— Thorin Oakenshield! O que faz longe de sua montanha?

Thorin respondeu:

— É uma longa história. Deixe-me contar.

— São só vocês? Muita diferença desde a última vez que estiveram aqui. Vamos, entrem.

Foi dentro da cabana de Beorn, apreciando uma cerveja quente e bolos enquanto o vento e a neve castigavam lá fora, que Thorin relatou:

— Beorn, vai gostar de ouvir o que tenho a dizer. Anna está viva.

O troca-peles o encarou com cuidado e quis saber:

— Quem lhe disse isso?

Dwalin e Kíli se entreolharam, alarmados por achar que Thorin expunha sua insanidade, mas o ex-rei respondeu:

— Anna veio até mim em Erebor. Ela me contou que estava em Rivendell e que iria visitar Bilbo.

Beorn repetiu:

— Ela veio até você? Quando foi isso?

— Umas três semanas, talvez mais. Por quê?

Dwalin tentou dizer, constrangido:

— Thorin, por favor-

Desta vez Thorin o interrompeu, irritado:

— Eu não estou louco! Eu a vi!

Beorn sorriu, dizendo:

— Eu sabia que Esquilinho terminaria contando a você. Bem que eu disse a ela para avisá-lo. Quase implorei. Mas ela insistia que ninguém podia saber. Estava apavorada.

De olhos arregalados, Kíli indagou ao grandão:

— Que quer dizer? Falou com ela?

— Ela veio direto para cá depois do ataque — revelou Beorn. — Ela e o pequeno, os dois só com a roupa do corpo. Eu os acolhi. O pequeno chorava muito, estava fraco. Ela estava tão apavorada que não me deixou avisá-lo. Queria que todos pensassem que morrera.

Dwalin mal podia crer:

— Então é verdade? Ela está viva?

— Claro que é verdade — garantiu Beorn, sorrindo sem esconder o orgulho. — Esquilinho é uma pequena esperta. Mas ela teme pelo filho, por isso se recusa a voltar para a montanha.

— Por isso estamos aqui, rumo aos elfos, seus parentes — disse Thorin. — Vou pedir a ela que venha morar comigo.

Beorn lembrou:

— Então vai perder seu tempo, Rei Sob a Montanha — disse o anfitrião. — Ela não vai voltar para Erebor.

Thorin esclareceu:

— Só que não sou mais rei. Nem morarei com ela em Erebor. Deixei meu trono para ficar com minha família. Quando eu pensava estar viúvo, não conseguiria governar direito. Quando descobri que ela estava viva, não tive dúvidas do caminho que deveria tomar. Deixei o trono e agora quero passar o resto de minha vida com Anna.

Beorn o encarou, admirado. Kíli e Dwalin mal podiam acreditar no que ouviam. O jovem quis saber:

— Como estava meu primo? Eles chegaram bem?

Beorn perdeu o sorriso:

— Não, não estavam nada bem; mal estavam vivos. Estavam exaustos e doentes. Anna estava apavorada e triste com o que acontecera. Ela sentia sua falta, Thorin Oakenshield, e sofria por saber que você também estava sofrendo. Seu primeiro instinto foi de jamais contar a ninguém que tinha sobrevivido. Eu disse que avisaria você, mas ela me fez prometer que nada diria. Então o mago castanho veio para levá-la a Gandalf, que a levaria a Rivendell. Mais tarde eu soube que ela foi à floresta no sul, chamada por outros elfos.

— E Gandalf?

— Faz muito tempo que não vejo o mago cinza. Mas se Esquilinho esteve com você, é porque ela está bem.

Kíli ainda estava admirado:

— Minha tia está viva!... É difícil de acreditar.

Beorn quis saber:

— Então daqui vocês vão até Rivendell?

— O mais rápido que pudermos — respondeu Thorin. — Se os goblins realmente foram banidos daqui, poderemos atravessar em menos tempo do que na última vez.

— Tenho patrulhado as redondezas — informou o troca-peles. — Vejo wargs desgarrados: os orcs aparentam ter se refugiado em Gundabag ou talvez no sul. Goblins, contudo... Eles parecem ter sumido das Montanhas Sombrias. Mas goblins são como vermes que se escondem dentro das rachaduras da montanha. Se eu fosse vocês, evitaria o Caradhras.

— Cara o quê? — indagou Kíli.

— Baranzibar — respondeu Dwalin, falando o nome Khuzdul. — É o nome antigo da trilha das montanhas ao norte. Os homens a chamam de Passagem Vermelha.

Thorin sugeriu:

— Podemos ir por dentro de Moria. Está livre de orcs desde que os derrotamos.

Thorin falava das guerras entre orcs e anões. Ele participara da batalha de Azanulbizar, da qual se dizia que a menção fazia orcs tremerem e anões lamentarem. Lá Thorin perdera o irmão Frerin e o avô Thrór. Dwalin e Balin perderam o pai Fundin.

Dwalin descartou, cenho franzido:

— Muito ao sul. O caminho mais rápido é pela Passagem Alta. O único risco, além da neve fechar o caminho, são os gigantes de pedra.

— Mal sobrevivemos uma vez — lembrou Kíli. — Que garantia temos de sobreviver agora?

Thorin respondeu:

— Nenhuma. Mas nunca houve garantias, Kíli.

— Aye — lembrou Dwalin. — Só acho que seria uma pena que você e a pequena não se vissem depois de tudo isso só porque fomos esmagados por gigantes de pedra ou ficamos soterrados na neve.

Thorin ia repreendê-lo quando o anfitrião fez um ruído desagradável e ergueu-se:

— Procurem dormir junto ao fogo esta noite. A nevasca só piora. De manhã, não saiam antes de falar comigo. Vou verificar as condições da estrada.

Saiu, deixando o trio a entreolhar-se. Eles não contavam com o inverno rigoroso.

Na manhã seguinte, foram servidos por cavalos e carneiros. Arrumavam suas coisas quando Beorn apareceu.

— Venham comigo.

Ele os levou à varanda e lá estavam três pôneis carregados de provisões. Beorn instruiu:

— Levem esses pôneis. Eles tomarão o caminho da Carrock. Ao pé das montanhas sombrias, quando tiverem que deixar os pôneis, uma águia gigante irá encontrá-los. Ela vai mostrar o melhor caminho para chegar a Rivendell. E não se preocupem: os pôneis conhecem o caminho de casa.

Thorin encarou-o, surpreso:

— Beorn, é muita generosidade. Fico muito agradecido.

O troca-peles confessou:

— Eu não gosto de anões. Mas você é um anão diferente, Thorin Oakenshield. Ganhou meu respeito e admiração ao mostrar dar valor a coisas além das pedras preciosas e do metal da terra. Vou chamar você de amigo.

O ex-rei garantiu:

— Por tudo que fez, por Anna, por mim e por meu povo, eu sempre o chamei de amigo.

Apertaram-se as mãos e lá foram os anões, fortemente encasacados, montados nos pôneis de Beorn. A ida até a Carrock foi lenta devido ao clima. A neve dificultava a visão, e eles não conseguiam avançar muito rápido. Finalmente, após quase dois dias, chegaram à encosta das Montanhas Sombrias. Era hora de soltar os pôneis.

Enquanto descarregavam os animais, Kíli indagou:

— Alguém vê alguma águia?

— Não — respondeu Thorin, franzindo o cenho. — Beorn disse que uma águia viria nos encontrar.

— Pela minha barba! — exclamou Dwalin. — É melhor esse bicho aparecer logo, pois se ficarmos parados muito tempo neste frio, vamos congelar!

Terminaram de retirar as provisões e bagagens, e gritaram para espantar os pôneis. Pelo menos parara de nevar, pensou Thorin, olhando as nuvens cinzentas em meio ao vento cortante.

Por estar de olho no céu, ele foi o primeiro a ver. Mas foi Kíli quem apontou:

— Ali!

Para espanto do trio, do céu vieram três águias gigantes, ao invés de uma única, como dissera Beorn. As aves majestosas circularam os anões antes de pousar. Uma delas apresentou-se:

— Eu sou Landroval, segundo em comando de Lord Gwaihir, Senhor das Águias de Manwë. Atendemos a um pedido de Beorn. Estes são Luaithre e Meneldor. Nosso mestre envia saudações a Thorin, aquele a quem chamam de Oakenshield, Rei Sob a Montanha.

Thorin apresentou-se, com uma reverência:

— Milord, meu nome é Thorin, antigo Rei Sob a Montanha, e comigo estão Dwalin, capitão da guarda e Kíli, príncipe herdeiro do rei Fíli de Erebor. Saudações a Lord Gwaihir.

A águia mexeu a cabeça, antes de ir direto ao ponto:

— O amigo Beorn informou sobre sua necessidade de chegar a Rivendell com urgência.

— Isso é verdade. Pode nos informar o melhor caminho até o vale?

— A neve desta noite provocou uma avalanche que bloqueou as principais vias. Não há como passar.

Kíli exclamou, alarmado:

— Estamos bloqueados!

Thorin comentou:

— E do jeito que está esse tempo, não vai clarear tão cedo. Vamos ter que voltar.

A águia sugeriu:

— Meu lord Gwaihir nos autorizou a atravessá-los sobre as montanhas até próximo do vale de Imladris.

Thorin repetiu:

— Ele autorizou?

Landroval explicou, altivo:

— Nossa raça não se presta a transporte de outros. Mas considerando tratar-se do consorte de Eldalinossë e seu kin, a exceção foi autorizada.

Dwalin rosnou:

— Do que ele chamou a rainha?

Uma outra águia parecia ofendida ao responder:

— Sua rainha é uma dádiva que nem todos os anões souberam valorizar. Ela veio nos visitar e contou-nos o que aconteceu. Nosso povo a venera como kin.

Thorin curvou-se:

— Aprecio o respeito com minha consorte. Também ficamos mais do que honrados com a oferta de nos levar ao Vale Escondido. Transmita a Lord Gwaihir nossa mais profunda gratidão.

Landroval orientou:

— Nossa irmã Luaithre levará sua carga. Podem montar e procurem se segurar bem. Não voamos com outros montados em nosso corpo e por isso vocês podem estranhar a viagem.

Ágeis, os anões arrumaram a bagagem para que a terceira águia pudesse levá-la. Thorin montou Landroval e Meneldor, a águia irritada, ficou com Kíli e Dwalin.

A viagem não foi nada semelhante à que eles se lembravam da ida a Erebor, quando as águias os ajudaram, chamadas por Gandalf. Agora eles estavam enregelados, sofrendo os rigores do inverno a muitos metros de altura. Thorin logo percebeu que o corpo da águia era mais quente e procurou ficar abaixado, esquentando-se como podia. Kíli e Dwalin entenderam a dica e fizeram o mesmo.

Felizmente, porém, a travessia das Montanhas Sombrias durou menos tempo do que Thorin previa. A viagem a pé poderia tranquilamente levar uma semana ou mais, e com as águias durou algumas horas.

As aves majestosas pousaram na encosta da montanha, já na face oeste do maciço. Os três anões saltaram e foram resgatar as bagagens na outra águia. Landroval virou a cabeça para o oeste:

— Essa é a direção de Rivendell. Podem segui-la. Não podemos ir até o vale pois o espaço entre as montanhas é pequeno demais para nossas asas.

Thorin garantiu:

— Já nos ajudaram muito. Somos profundamente gratos.

A ave inclinou a cabeça, respeitosamente, antes de dizer:

— Aqui nos despedimos, consorte da Eldalinossë. Que sua jornada seja livre de incidentes e que o vento possa bater na direção de suas asas.

Thorin curvou-se:

— O povo de Erebor mais uma vez se vê em débito com o bravo povo de Lord Gwaihir, Senhor dos Ventos. Agradecemos seu auxílio e esperamos poder ser úteis no futuro. Obrigado.

A águia garantiu:

— Ver a Eldalinossë com seu consorte será nossa alegria. Boa viagem.

Com novas reverências, as três levantaram voo. O trio de Erebor ficou observando sumirem no horizonte. Quando finalmente elas tinham sumido no céu, Kíli virou-se para os demais:

— E agora?

Thorin olhou o dia cinzento e fez um gesto para a estrada à frente, respondendo:

— Agora caminhamos.

Palavras em Sindarin

Eldalinossë = ninfa, literalmente kin dos elfos

Palavras em Khuzdul

khazâd = anões, povo anão

amad = mãe, mamãe

ghivashel = tesouro de todos os tesouros


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